Luísa acordou somente no fim da tarde sentindo menos dor. A enfermeira trouxe seu jantar balanceado a mulher fez um pouco de esforço para comer. Ela também lamentava não ter conseguido ficar acordada para ver Daniel, sua mãe e Berta.
- Eu não posso ter um acompanhante? – Perguntou ao médico enquanto ele lhe examinava e com estetoscópio logo depois de se alimentar.
- Assim que passá-la para um quarto comum vai poder ter um acompanhante, agora você ainda está em risco e precisa ficar na UTI em acompanhamento. Sua imunidade também está extremamente baixa e não posso deixar que você se contamine nem com uma simples gripe. – O médio colocou o estetoscópio de volta no pescoço, suspirou e sorriu. – Felizmente você está ficando bem melhor do que esperávamos e respondendo bem ao tratamento. Ainda temos bastante caminho pela frente, será preciso repouso constante, mas esses dois estão ficando bem mais fortes e saudáveis, os batimentos estão mais regulares.
Luísa arregalou os olhos confusa.
- Dois? – Ao mesmo tempo que expôs a dúvida, começou a chorar.
- Ninguém contou a essa menina que ela está carregando duas crianças? – O médico se virou procurando a enfermeira.
- Bom, ela passou maioria do tempo desacordada e a única vez em que falou sobre a gravidez foi pedindo para salvar o bebê antes da cerclagem. Acho que ninguém lembrou de falar sobre isso.
- Mas... - O homem mordeu o lábio inferior e deu de ombros se divertindo com o choque de Luísa. - É, são dois aí. – O médico levantou apontando a caneta com uma expressão animada. – E fique tranquila, senão vamos ter que dopar você de medicamentos de novo.
- Tudo bem. – Ela limpou as lágrimas ao mesmo tempo em que novas se formavam e tentava rir ao mesmo tempo.
Era desesperador saber que vinha filhos em dobro, mas ao mesmo tempo sorriu, pois finalmente tudo estava ficando bem.
A noite passou tranquila, já que com os medicamentos Luísa dormia bem. Na manhã seguinte lhe chegou uma surpresa, a enfermeira lhe trouxe um pequeno pacote cinza, esterilizado e lacrado.
- O que é isso?
- Abra para ver. – A mulher sorria enquanto administrava os remédios da manhã em seu acesso de soro.
Era um celular novo. Ainda curiosa ela destravou a tela que estava sem senha e logo no papel de parede inicial havia uma foto dos cinco lhe acenando sorridentes. Luísa também sorriu e uma lágrima de felicidade lhe escapou.
- E aí? – A enfermeira perguntou também sorridente. Agora ela era amiga de Luísa e a única que lhe fazia companhia enquanto não podia receber mais visitas.
- Eles são loucos. – Ela mostrou a tela do celular à outra. – Mas são ótimos, a melhor família do mundo. Olha, essa no meio é minha irmã, a de trás minha mãe, ao lado da minha irmã é o Felipe e do outro lado a Berta e o Daniel.
Depois de citar o último ela passou o dedo carinhosamente na figura dele na tela. Se permitiu chorar.
- Eles estão sempre aqui, se revezando na sala de espera, mesmo que o médico já os tenha mandado para casa milhares de vezes.
- Eu nem acredito que ele está mesmo aqui, eu queria tanto que ele viesse aqui novamente.
- Vão se ver em breve, não se preocupe e nem fique ansiosa. Se concentre em se recuperar que logo tudo fica bem.
Uma notificação de mensagem chegou a surpreendendo.
“Como a mulher mais linda do mundo se sente hoje? E os nossos filhos? Estão fortes? Todos aqui estão ansiosos para vê-los de novo.”
Agora Luísa não conseguia parar de chorar.
- Iii, olha só, se essa choradeira não parar eu vou ser obrigada a ir lá fora dar uma bronca neles. – A enfermeira repreendeu carinhosamente.
- Não, tudo bem, parei. – Luísa riu. – É que estou muito feliz.
Mais que imediatamente ela respondeu com outro texto.
“Estamos todos bem, meu amor. Eu nem acredito que você está bem. Queria ter visto você.”
Segundos depois o celular tocou num volume baixo e se atrapalhando um pouco ela tentou atender rapidamente.
- Oi, amor, tenta ficar calma. – A voz de Daniel soou suave do outro lado. Ele tentou não deixá-la nervosa, mas não adiantou muito. – Amor, não chore...
Ele não conseguiu terminar a frase, pois imediatamente os outros começaram a tagarelar ao mesmo tempo falando várias coisas que ela não conseguia entender. Ouviu até mesmo sua irmã tentando sobrepor a voz para conseguir desejar melhoras e dizer que todos estavam torcendo por ela.
De repente, assim como começaram a tagarelar, também silenciaram. Luísa precisou olhar a tela para saber se ainda estava conectada em ligação e sim, eles ainda estavam lá. Colocou o aparelho no ouvido e pôde ouvir o motivo de terem parado a algazarra, o médico estava passando um sermão.
- Se vocês não quiserem ser expulsos daqui, façam silêncio, respeitem os outros pacientes, senão vou restringir a visita mais alguns dias.
Luísa acabou rindo ao ouvir a voz deles se desculpando baixinho.
- Você ouviu isso, não é? – Daniel perguntou segundos depois.
- Sim.
- Bom, pelo menos agora você está sorrindo, valeu a pena a bronca.
- Que bom que você está vivo, desculpa dizer que não o perdoaria, eu nunca imaginei que poderia te perder de verdade...
- Esqueça isso. – Ele a interrompeu. – Deixe o passado no passado. Olha, sua mãe quer falar com você, está quase arrancando o telefone da...
- Oi, meu amor, Luísa, meu Deus. – Laura começou a dizer e a chorar.
- Calma mãe, sua pressão. – Luísa riu para tentar tranquilizar a mãe. – Faça o que o Daniel acabou de me dizer, esqueça e vai ser melhor assim.
Depois de ter um breve momento de conversa com eles Luísa precisou desligar para não levar mais bronca de a algum médico. Antes de guardar o aparelho chegou uma outra mensagem.
“Olhe a galeria de fotos.” Daniel pediu.
Obedecendo, ela abriu e se distraiu durante toda a manhã observando as poucas fotos que conseguiram tirar antes de darem o celular a ela. Haviam mais fotos de todos eles, fotos das primeiras roupinhas que ganhou da mãe e da irmã, tinha também Jonas, mas maioria saiu desfocada porque ele provavelmente não parava de correr.
Luísa ficou mesmo intrigada com a proximidade de Felipe com sua irmã em algumas das fotografias, inclusive, em uma das fotos, pôde reparar na mão dele na cintura da outra, fazendo pose para foto. Ela guardou essa nota mentalmente para questionar o que estava havendo. Ela conhecia muito bem o olhar de Patrícia para saber que ali havia algo a mais acontecendo.
Após mais alguns dias Luísa foi liberada para o quarto, mas com a condição de continuar com os mesmos cuidados da UTI. O acompanhante também deveria seguir tudo à risca. O difícil mesmo foi escolher quem ficaria com ela, já que só poderia uma pessoa e Laura, Daniel e Patrícia queriam muito ficar.
- Mãe, olha só, Daniel é o pai dos bebês, acho que seria justo deixar que ele fique e nós vamos vê-la no horário de visitas. – Patrícia sugeriu depois de ficar de saco cheio dos dois jogando pedra papel e tesoura e toda hora pedindo revanche quando o outro ganhava. – E você, Felipe, para de ficar incentivando os dois a competir.
A garota apontou o dedo para ele, porém rindo junto de Berta que só podia achar graça. Felipe adorava colocar lenha na fogueira para as competições dos dois.
Por fim, ficou decidido que Daniel entraria de acompanhante, o que aconteceu a noite, quando o médico a liberou antes de sair do plantão e ser substituído por outro médico.
O rapaz recebeu a instrução de pegar o elevador social depois da recepção até o andar correspondente ao quarto. Um pouco ansioso para ver novamente a mulher, ele andava apressado em expectativa pelo longo corredor onde havia vários outros quartos de pacientes. Assim que chegou na porta do quarto onde estava Luísa ele parou um momento, respirou fundo e abriu sem bater. Ele a viu logo, deitada um pouco inclinada e meio que virada de lado. Estava dormindo serena, com um cobertor mais fino lhe cobrindo até a altura dos seios. Se aproximando devagar ele reparou que ela parecia melhor, as bochechas mais coradas, a pele mais viçosa e totalmente recuperada dos hematomas e machucados.
Daniel sentou na cadeira ao lado devagar para não fazer barulho e a observou por longos minutos. Enquanto o tempo passava, já ficando um pouco sonolento, ele segurou a mão de Luísa, fazendo-lhe carinho com o polegar, de cabeça baixa, com a testa encostada na cama.
Luísa abriu os olhos devagar ao sentir que alguém segurava sua mão. Seu coração se aqueceu imediatamente ao notar os cabelos escuros de Daniel de cabeça baixa. Uma formigamento de euforia passou por todo seu corpo e tentou se conter ao máximo para não berrar de felicidade e acabar elevando a pressão, fazendo-a passar mal. Abriu seu melhor sorriso ao passar a outra mão pelos cabelos macios do homem. Ele levantou assustado e quando a viu de olhos abertos a primeira coisa que disse foi “desculpa”. Repetiu muitas vezes, se sentindo culpado por tê-la deixado sozinha.
- Prometo nunca mais deixá-la sozinha. – Ele falava enquanto a abraçava.
- Está tudo bem agora. – A voz de Luísa saiu animada, embora ainda fraca de sono.
Ele se atreveu a apertar os lábios contra os dela sem aviso enquanto algumas lágrimas escorriam por seu rosto. Foram muitos beijos, abraços, carícias e pedidos de desculpa para que tentassem compensar um pouco da saudade.
Passado esse primeiro momento, Daniel inclinou a poltrona de acompanhante e ficou na altura da cama de Luísa. Ele deitou de lado para ficar com o rosto mais próximo ao dela e também continuou segurando sua mão.
- Estava com muita saudade desse olhar. – Ele falou colocando alguns fios de cabelo de dela atrás da orelha carinhosamente. - Amanhã você vai começar uma consulta com psicólogo. Vai se sentir bem com isso?
- Sim, acho que vai ser bom.
- Se você não se sentir a vontade nós podemos cancelar até que se sinta bem.
- Tudo bem, acho que preciso conversar e esclarecer tudo. Quanto mais cedo eu puder deixar tudo isso para trás será melhor.
- Ok. – Ele sorriu e a observou por alguns segundos. – Eu não suportaria te perder, me perdoa por ter ido.
- Está tudo bem, de verdade. Se isso tudo não tivesse acontecido, mesmo com algumas coisas ruins pelo caminho, nós não estaríamos bem agora. – Ela pensou um pouco e continuou: - Eu não sei se isso faz de mim uma pessoa ruim, mas estou aliviada que ele tenha morrido.
- Você não é ruim, só queria ter sua liberdade, ser feliz, se livrar de uma coisa ruim. Acho que qualquer outra pessoa no seu lugar teria surtado ou cometido um crime. Pelo menos, penso assim, se ele não tivesse se matado eu o mataria.
- Não fale besteiras. – Luísa sorriu e acariciou o rosto dele. – Eu sei que você não faz mal a uma mosca.
- Mas por você e meus filhos eu viro um monstro.
- Obrigada, mas eu não ia querer que você se tornasse um assassino. No fim deu tudo certo. Afinal, como foi a morte dele? Como você sobreviveu? Como vocês me encontraram? Eu não soube todos os detalhes.
- Bom, fiquei mal, internado, mas foi só um susto. Já no seu caso, quando recebi a ligação de que a encontraram eu corri até o local, mas antes de chegar você já estava saindo numa ambulância.
- Eu estava numa casa, numa passagem secreta.
- Sim, depois passou em todos os noticiários o seu esconderijo. Era naquele hotel mesmo, mas em um dos quartos do segundo andar havia uma passagem que dava para uma casa que ficava na rua de trás. As paredes eram coladas e jamais imaginaram que você estaria lá. Levaram cães farejadores para rastrear seu cheiro, mas não foi seu cheiro que detectaram e sim o de Franco, vindo do hotel. O delegado disse que os cachorros ficaram loucos para todos os lados e pelo que entendi interceptaram uma mulher que também tinha o cheiro dele. Alguns policiais vasculharam novamente o hotel e outros foram guiados para a casa pela mulher, ela confessou, acharam o esconderijo e quando invadiram o quarto você já estava desmaiada. Franco estava pronto para atirar, mas lhe deram um tiro no ombro. Rapidamente ele atirou em si mesmo. Foi questão de segundos. Chegaram a levá-lo ao hospital, mas não resistiu.
A mulher ficou calada, não tinha o que dizer sobre isso, até porque tudo já havia acabado. Ela tentou se ajeitar na cama de sua posição que incomodava, tirando a mãos da de Daniel.
- Olha! – Luísa afastou o lençol e revelou o volume ainda pequeno de seu ventre através do pijama do hospital. Estava em seu terceiro mês de gestação e finalmente seus bebês podiam se desenvolver saudáveis.
Daniel voltou a chorar, dessa vez encostando a testa na barriga dela.
[...]
No dia seguinte Luísa recebeu visita dos outros e alguns presentes. Após tanta insistência e encherem o saco do médico, puderam entrar de dois em dois, além de Daniel de acompanhante, para terem mais tempo de visita.
Primeiro entraram Berta e Laura, que fizeram questão de competir entre si para ver quem traria mais mimos para as crianças que ainda não sabiam o sexo.
- Berta, você é tão sensata, não entre na onda da minha mãe, ela é ciumenta. – Luísa piscou sorrindo. – Mas obrigada, eu amei tudo.
- Espero que sejam duas meninas. – Laura começou sem dar atenção. – Assim posso encher de laços e...
- Mãe pelo amor de Deus, já basta Patrícia e eu, nunca vou me esquecer das roupas cor de rosa e o quanto eu me sentia uma árvore de natal.
Daniel ria sozinho num canto, recolhendo o que as outras duas colocavam em seu colo. Pelo que Luísa soube, ele se aproximara muito de sua mãe. Ele a achava divertida por viver tirando sarro de Felipe. O melhor amigo e ela viviam discutindo animadamente quando se encontravam.
Na vez da visita de Patrícia e Felipe eles trouxeram dois ursos feitos de crochê e sapatinhos. Quando Felipe passou o braço pelos ombros da irmã descontraidamente com uma mão no bolso da calça Luísa parou imediatamente de prestar atenção aos presentes e os olhou seriamente.
- É isso mesmo que você está pensando. – Daniel falou rindo ao perceber o olhar da mulher.
- O que mais aconteceu na minha ausência?
Patrícia olhou para Felipe sorridente e depois deu de ombros.
- Pergunte a ele. – Apontou para Felipe. – Estou esperando.
- Esperando o quê, Patrícia? – Luísa se consertou na cama e cruzou os braços. – Sua fama não é muito boa. – Falou para Felipe em seguida.
- O que andou dizendo a ela? – Felipe olhou de cara feia, mas brincalhão com Daniel.
- Eu avisei. – Daniel falava com humor ainda rindo da atitude de Luísa.
Patrícia sentou na beirada da cama de Luísa e sussurrou cobrindo a boca com uma das mãos.
- Estou esperando ele me pedir em namoro.
- Mas eu já fiz isso. – Felipe retorquiu de mau humor após ouvir o sussurro alto.
- Você chama aquele pedido meia boca de namoro? Eu quero um pedido direito e falando com a minha mãe formalmente, não me pegando de surpresa na sala de espera do hospital como se fosse um malandro me abraçando e abaixando os óculos escuros. “E aí, gatinha? Tá a fim de um compromisso mais sério?” – Na última frase Patrícia tentou imitar a voz dele fazendo pose.
Luísa trocou um olhar divertido com Daniel enquanto Patrícia colocava ordem na bagunça.
Finalmente sozinhos, Daniel guardava todos os presentes para levar para casa depois.
- Não leve tudo, deixe os sapatinhos. – Luísa estendeu a mão para pegar de volta.
- Eles são muito pequenos, é uma graça. – Ele disse devolvendo.
- É, me fazem perceber que a maternidade é mais real.
Daniel sentou ao lado e lhe deu um beijo na lateral da cabeça.
- É real, meu amor. Você tem uma família que te ama muito e a família está crescendo.
Ele tomou o espaço e deitou ao lado dela, trazendo-a para seu peito.
- Você sabe que se a enfermeira te pegar aqui de novo vai brigar contigo, não é?
- Não me importo, quero te abraçar. – Ele a aconchegou. – Estou ansioso para ter vocês em casa de novo, fora desse hospital.
- Mas isso é importante para nossa saúde, estamos nos recuperando.
- Eu sei, mas aqui eu nem consigo abraçá-la direito e eu gosto da minha esposa em casa, dormindo na nossa cama. – Daniel olhava para o teto.
- Eu não sou sua esposa. – Luísa falou brincando, mas sorriu amarga.
- Claro que é. – Ele pegou a mão dela onde estava a aliança e mostrou a ela.
- Não é de verdade...
- Não oficialmente, mas logo vai ser. – Ele se levantou de repente e se colocou de joelhos ao lado da cama, pigarreou e pegou a mão da mulher. – Senhorita Luísa, se não for incomodar muito, aceita casar comigo e passar o resto da vida ao meu lado?
- Oh, claro que não é incômodo algum, Senhor Daniel, e sim, eu aceito. – Luísa ria da palhaçada. - Felipe está estragando você.
A porta do quarto foi aberta de repente e a enfermeira estagnou ao ver a cena. Daniel tratou de se levantar e passar a mão atrás da cabeça desconcertado.
- Sabe como é, segundo pedido de casamento... – Ele falou.
- Melhor do que deitar na cama com ela, não é? – A mulher deu uma piscadinha para Luísa e foi pegar o prontuário.
Luísa e Daniel se olharam sorrindo.
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Atualizado até capítulo 21
Comments
Luna
😍😍😍😍ahhh mds depois da tempestade sempre vem ah calmaria☺☺
2020-03-22
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