Prefiro Você
Muitas vezes na vida não sabemos explicar algumas sensações. Algumas passam e nem damos importância. Porém, existem outras que cravam em nosso peito e parecem que nunca mais irão sair. Por outro lado, existe uma em questão, que ninguém nunca conseguiu explicar com total certeza até hoje — e acredito que não será desvendada tão cedo —, essa sensação se chama amor. E muitas vezes, o sentimos e nem sabemos. Isso aconteceu comigo, mesmo que por muito tempo tentasse negar a mim mesma que não podia amar uma pessoa, isso foi inevitável. Pois de alguma forma aquele amor impossível e fora dos padrões que a sociedade, sobrepôs a barreira de qualquer preconceito.
Quando pessoas estão destinadas a ficarem juntas, por mais que a vida complique, de alguma forma o destino as unirá. Há quem ache isto uma tremenda besteira. Almas gêmeas? Que idiotice! Como há quem acredite em lendas, como a lenda oriental Akai To. Que fala sobre um fio vermelho no dedo dos casais destinados a ficarem juntos. Este fio pode se esticar, emaranhar e mesmo assim essas pessoas estarão conectadas e que haverá um momento na vida que estás pessoas irão ficar juntas.
Há também quem acredite em carma, em assuntos a serem resolvidos, sobre almas que dependem uma da outra para evoluir espiritualmente.
Enfim, todas essas lendas e crenças afirmam que existem pessoas que estão ligadas, destinadas a ficarem juntas e que por mais que os fios estranham, que um abismo os separe, que tudo seja contra o amor. Essas pessoas encontrarão um meio de ficarem juntas. Pois o amor é isto. E muitas vezes é uma batalha a ser vencida.
Eu particularmente aprendi isso após conhecer uma pessoa especial, que abalou o meu mundo, mudou os meus conceitos sobre muitas coisas. Que me mostrou que o amor poderia vir de quem menos esperamos. E que por mais que eu negasse mil vezes a mim mesma. Era impossível ficar distante, pois os nossos destinos estavam ligados, nesta e em outras vidas.
(...)
— Acorde, acorde, dorminhoca! — exclamava minha irmãzinha mais nova, Amanda, enquanto pulava em cima de mim.
Me escondi por baixo das cobertas, não queria levantar da cama, ainda era muito cedo e estava frio.
— Vamos, Paloma! A mãe disse que você tem que levantar! — insistiu Amanda.
— Me deixa dormir só mais um pouquinho — resmunguei. — Sai daqui.
— MÃE, ELA NÃO QUER LEVANTAR PARA IR PARA A ESCOLA! — gritou Amanda.
Escutei passos vindo até meu quarto. Tirei as cobertas da cabeça e olhei para a porta do meu quarto. Minha mãe estava lá, com os cabelos presos para trás e vestida para sair. Com um olhar que me obrigava a levantar da cama.
— Você está atrasada, Paloma. Sua escola nova abre às oito — disse minha mãe com autoridade.
— Já estou levantando, Dona Marta — resmunguei me sentando na cama e passando a mão nos olhos sonolentos.
— Te dou trinta minutos — disse ela, e se retirou.
Minha irmãzinha continuou no meu quarto, me olhando e sorrindo bobamente. O que era fofo demais. Já que ela tinha apenas nove anos. Nove anos de pura esperteza.
— O que foi? — perguntei constrangida pela forma que ela me olhava.
— Você está animada? — perguntou eufórica.
— Ah? É só mais uma escola — murmurei e me levantei da cama.
— Não é só mais uma escola, maninha. Você vai para uma escola nova na nossa nova cidade. Eu pensei que você pudesse estar nervosa como eu estou. Ainda bem que a minha aula é só à tarde — disse ela, enquanto eu andava até meu guarda roupa e pegava o meu novo uniforme.
— Estou bem, não vai ser nada de mais — disse me virando e olhando para Amanda ainda pulando na minha cama.
Olhei novamente para o uniforme da minha nova escola. Era feio, parecia um colégio interno. Qual é a necessidade de uma saia? Mas fazendo uma comparação, ele era mais estiloso do que os anteriores.
Na minha antiga escola o uniforme era verde, horroroso.
Havíamos mudado a pouco tempo para aquela nova cidade sem graça e chuvosa. Depois do divórcio dos meus pais, minha mãe começou a viver uma vida de nômade atrás de um emprego. Em três anos moramos em quatro cidades diferentes. Às vezes até me sentia uma criança de circo, que não deveria fazer amigos na escola, pois logo iria embora. “Mas desta vez é diferente!” disse minha mãe. “Agora temos casa própria e eu tenho um bom emprego fixo no jornal da cidade”. Minha mãe era uma ótima jornalista. Mas naquela cidade que só se via campos, criações agrícolas e plantações. Pensei que não houvesse grandes coisas para ela escrever. “EXTRA, EXTRA! UMA VACA SE AFOGOU NO RIO!” É claro que minha mãe não gostou muito da minha piada durante a viagem de carro.
Eu não estava criando grandes expectativas com aquela cidade, nem com as pessoas de lá. No meu ponto de vista, seria apenas mais uma passagem. Logo, minha mãe se cansaria e iríamos pular para outro lugar, que eu esperava ser uma cidade mais animada do que aquela.
A verdade é que eu estava cansada. De me mudar toda hora, de não poder fazer amigos por medo de me apegar a alguém que eu sei que seria apenas de passagem. Estava cansada de arrumar meu quarto em casas diferentes. Estava cansada da euforia da minha mãe. Mas esperava que encontrássemos logo um lugar para chamar de lar.
— Espero fazer muitos amigos — disse Amanda.
— Você é um amor, maninha. É claro que vai fazer. — Me virei para trás e sorri para ela.
E me retirei do quarto, rumo ao banheiro para tomar um banho quente.
Depois que me vesti e sequei os cabelos, fiquei me olhando no espelho do banheiro enquanto penteava meus cabelos castanhos escuros, meio ondulados e recém cortados na altura dos ombros. Eu parecia uma órfã vestida com o uniforme daquela escola e com aquele cabelo ridículo. Meus olhos castanhos estavam cansados. Eu deveria ter dormido mais. Porém, na noite passada fui contemplada por sonhos estranhos. Eu via uma praia, um casarão, uma cabana, um castelo e sempre os mesmos olhos verdes hipnotizantes. Sabia que não deveria levar a sério, eram apenas mais dos meus sonhos idiotas sem sentido algum.
— Já está pronta? — perguntou Marta, surgindo na porta do banheiro.
— Sim — respondi.
— Ótimo, vamos! — disse ela animada, como se fosse o seu primeiro dia de aula.
O que na verdade deveria ser a euforia de ter um novo emprego.
Entramos no carro, um Opala preto que consumia gasolina como um bêbado bebe cerveja sexta feira à noite.
Enquanto o carro se afastava, eu olhava para o nosso novo lar. Uma chácara no meio do nada, herança de uma tia solteirona da Marta.
Era um lugar agradável, não podia negar. Além de muito bonito, o único problema era a distância da civilização. A cidade era do interior, e o bairro onde eu estava morando era o interior do interior. Só se via árvores e morros. E no meio de mato, algumas poucas casas dos meus vizinhos mais próximos.
— Estão animadas? — perguntou Marta, para minha Amanda e eu no banco de trás.
— Sim! — respondeu Amanda animada, para ir para a casa de uma tia avó que morava no centro e topou cuidar da menina enquanto minha mãe trabalhava.
Sinceramente, eu tinha um pouco de pena da velhinha, pois minha irmãzinha era muito elétrica.
— E você, Paloma?
Eu estava distraída, olhando uma plantação de milho pela janela. Olhei para frente e minha mãe me olhou pelo espelho retrovisor.
— Estou tranquila — respondi normalmente.
— Que bom — disse Marta sorrindo. — Vai dar tudo certo. Sinto isso. Esse é um novo começo, minhas filhas. Sei que seremos muito felizes nesta cidade. E que ficaremos por muito tempo.
— Vamos fazer amigos que vão durar para sempre! — exclamou Amanda.
— Amigos caipiras — comentei.
— Melhor do que nada — rebateu ela, sorrindo convencida.
— Vamos pensar positivo que vai dar tudo certo — disse Marta, não sei para nós ou para si mesma.
Chegamos no centro da cidade. Pensei que seria como em um filme de época. Mas não. Havia lojas, mercados, escolas, prédios públicos. Todos muito próximos. E uma praça.
Marta deixou Amanda na casa da nossa tia avó e seguimos o caminho para a minha nova escola. Que para minha surpresa, ficava próxima a praça.
Assim que Marta estacionou o Opala na frente da escola. Todos os olhares caipiras caíram sobre nós. Senti minhas bochechas queimarem. E Marta percebeu que fiquei constrangida.
— Desculpa, filha. Da próxima estaciono mais a diante.
— Agora não faz diferença — disse jogando a mochila nas costas. — Que horas você vem me buscar?
— As onze e meia.
— Ok. Tchau.
— Tchau.
Saí para fora, fechei a porta e minha mãe deu partida no carro. Me deixando sozinha no meio daquela multidão de estranhos.
Até que para uma cidade de fim de mundo, aquela escola estava bem cheia.
Talvez meus conceitos estivessem errados.
Enquanto andava até o que me parecia um mural de turmas e horários, todos, sem exceção, olhavam para mim. O que me fazia sentir uma estranha, extraterrestre. Aquele não era o meu lugar.
Cheguei no mural em busca do meu nome. Paloma Pereira, 1° ano, turma 103. Primeira aula história, sala 5.
O que eu não imaginava é que aquela escola além de ter o uniforme do colégio interno, também se parecesse com um. Era uma construção enorme, de três andares. Não imaginava tudo aquilo em uma cidade do interior.
Eu nunca iria achar a tal sala cinco. Não tinha nenhum conhecido e estava envergonhada demais para pedir ajuda para alguém. Então fiquei olhando para o mural, em busca de algo que pudesse me ajudar.
Passei alguns minutos naquela situação, até que apareceu uma menina e ficou ao meu lado olhando para o mural.
— Eu sou mesmo uma desastrada — resmungou ela. — Ficar sem celular um dia antes da escola mandar os novos horários, só eu mesma.
Olhei de relance para ela. Era magra, mesma altura que eu, cabelos castanhos cacheados até a cintura e pele morena. Usava uma calça do uniforme, que ficava tão bonita no corpo dela que nem parecia que ficava ridícula na maioria das garotas. E sorria do próprio azar enquanto o olhava para o mural.
— Você é nova aqui? — perguntou ela, finalmente me olhando.
— Sim — respondi.
— Deve ser difícil chegar assim no final do primeiro trimestre. Bem, é um prazer te conhecer — disse ela me entendendo uma mão. — Eu me chamo Vitória, e você?
— Paloma.
— Ok, Paloma. Você está olhando para esse mural por tempo de mais. Por acaso está perdida?
— Acho que estou.
— Como é seu nome completo?
— Paloma Pereira.
Vitória se aproximou mais do mural e ficou passando o dedo enquanto lia os nomes.
— Hum, aqui! Paloma Pereira, 1° ano, sala cinco. Que sorte! — disse sorrindo de uma forma que me obrigou a sorrir também. — Somos colegas!
— Legal — comentei.
— Vem! — disse ela. — Vou te lavar até a sala.
Então fui puxada pela mão até o terceiro andar daquele colégio repleto de alunos.
Chegando na porta da sala eu estava exausta, após subir as escadarias.
— Você está bem? — perguntou Vitória.
— Estou, só que as escadarias...
— Eu sei — interrompeu Vitória. — Com o tempo você se acostuma.
— Espero que sim — disse ainda ofegante.
— Vamos entrar na sala, já estão todos lá — disse andando até a porta fechada.
Vitória abriu a porta e entrou confiante. Antes de entrar eu já ouvia as pessoas a cumprimentando.
Fiquei nervosa, o que era muita idiotice. Aquela não era a primeira vez que eu entrava no meio do ano em uma escola nova. E tinha que ver um monte de caras novas. Não seria daquela vez com um monte de caipiras que seria diferente.
Respirei fundo e entrei depois de Vitória.
Todos os olhares caíram sobre mim. E sem saber o que fazer, segui os passos de Vitória.
— Pode se sentar ao meu lado se quiser — disse ela. — Eu sempre gostei de me sentar sozinha, mas posso fazer uma exceção. — Sorriu enquanto se sentava no fundo da sala.
— Obrigada — falei.
— De nada — disse Vitória.
A professora entrou em seguida e assim que me viu abriu um largo sorriso.
— Não sabia que a aluna nova viria hoje — disse ela, uma mulher idosa, loira e baixinha. — Como você se chama, querida?
— Paloma — respondi e todos voltaram a olhar para mim.
— E vem de onde? — continuou a professora.
— Da capital — respondi.
— E o que está achando da nossa cidade?
— Ainda não sei. Cheguei há uma semana.
— Entendo... espero que você goste da cidade e da escola. Sei que somos diferentes das pessoas da capital. Mas posso afirmar que podemos ser mais acolhedores do que você imagina. E seja bem vinda à Escola Vasconcelos!
— Obrigada — agradeci e voltei a me sentar.
— O que ela quis dizer com isso? — perguntei à Vitória.
— Aqui é uma cidade pequena, e meio que todos se conhecem. Então cuidado com o que faz. As fofocas se espalham como fogo em grama seca por aqui.
— Entendi.
Só achei a referência um pouco caipira.
— O que você fazia para se divertir lá na capital? — indagou Vitória.
— Ah, não fazia muita coisa. Depois que meus pais se separaram, mudei de casa muitas vezes. Não tinha muito tempo para fazer amigos.
— Lamento. Então você não vai ficar muito tempo por aqui também?
— Aqui é diferente. Minha mãe ganhou uma casa de herança e conseguiu um emprego fixo. Ela é jornalista e vai trabalhar no jornal da cidade. Mas ainda não sei se ela vai querer ficar aqui. Ainda depende do humor dela.
— Vai ser o trabalho mais fácil do mundo! — gargalhou Vitória. — Aqui não acontece nada.
Gargalhei.
— Foi o que eu disse para ela — comentei.
— Então sua mãe é jornalista. Legal. A minha é psicóloga e hipnóloga.
— Isso sim é legal.
— Sim. Quando eu era pequena e até hoje quando não tenho aula ela me leva para o consultório.
— E como é? — perguntei curiosa e feliz por estar conversando com alguém logo no primeiro dia de aula.
— Resumindo em uma palavra... Fantástico! As pessoas procuram minha mãe para fazer regressão, sabe? É incrível como o cérebro humano é capaz de recobrar de lembranças de vidas passadas. Eu adorava ouvir as histórias das pessoas.
— Isso é possível, mesmo? Não é só algo que a pessoa cria na hora? Quero dizer... imagina?
— Claro que não. São memórias mesmo. Além de ser uma ótima terapia. Pois a vida passada pode ajudar a atual.
— Parece ser mesmo muito interessante — afirmei.
— Se você quiser um dia, podemos fazer — disse Vitória.
— E você sabe mesmo? — perguntei receosa, olhando para o quadro, onde a professora começava a passar o conteúdo de história.
— Claro que sei. Minha mãe me ensinou tudo. Fora o que eu vi pessoalmente no consultório. Se você quiser, podemos marcar um dia. — Convidou Vitória, sorrindo amavelmente.
— Não sei, não — falei rabiscado o caderno. — Acho que tenho medo do que posso ver. Imagina se eu fosse um guerreiro sanguinário. Não gostaria de ver algo assim.
— Fica tranquila, amiga... — Espera, ela me chamou de amiga? Recém nos conhecemos. — Não precisa ter medo de suas vidas passadas. É só aceitar o que virá. E você é uma menina doce pelo que notei até agora. Duvido muito que tenha sido alguém do mau.
— Pode ser, então — aceitei. — E onde você mora?
— Moro no bairro Rio Branco, sei que é bem afastando aqui do centro. Mas se eu pedir, minha mãe pode te buscar em casa — disse Vitória, um pouco desconcertada por morar em um bairro mais remoto.
Foi quando me lembrei que estava morando lá também.
— Acho que posso ir a pé na sua casa. Eu também moro neste bairro.
— Nossa! Que perfeito! Fico feliz em ter alguém legal perto de casa. A maioria por lá já passou dos sessenta anos.
— Eu percebi — afirmei.
E rimos juntas.
O que posso afirmar sobre meu primeiro dia de aula naquela escola, foi que não prestei atenção na aula naquele dia. Vitória e eu tagarelamos a manhã toda e sem dúvida nos tornamos amigas. É incrível como funciona esse negócio de conexão, você pode se identificar e querer levar para o resto da vida uma amizade de cinco horas. Assim como pode conhecer uma pessoa há anos e não confiar nela. E com Vitória, senti que nossa amizade seria de anos. Resumindo, ela era uma pessoa muito legal, divertida, gostava dos mesmos filmes e livros que eu e nunca deixava o assunto morrer.
Quando cheguei em casa almoçamos com minha mãe e eu, já que Amanda estava na casa da minha tia avó. E depois do almoço minha mãe voltou para o trabalho e eu fiquei sozinha em casa a tarde toda.
— Como foi seu primeiro dia de aula? — perguntou minha mãe no jantar.
E Amanda respondeu animada:
— Incrível! Só hoje fiz oito amigas!
— Nossa! Oito amigas — disse Marta sorrindo. — E você, Paloma?
— Hoje foi legal — falei revirando a comida no prato. — Acho que fiz uma amiga Ela disse que mora aqui perto e me convidou para ir na casa dela, o nome dela é Vitória.
— Isso é muito bom, filha. Fico feliz por vocês terem gostado da escola. Eu disse que seria bom. Seremos muito felizes aqui — afirmou ela, alegremente.
Sinceramente, eu esperava que sim.
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Atualizado até capítulo 27
Comments
Sthefany Santos
me identifiquei bastante né episódio se e assim que se diz pois eu achei muito parecido com muitas coisas que tem acontecido em minha vida
2024-10-20
1
Joy
Vou salvar na minha biblioteca ☺️
2024-05-06
2