Capítulo 12 As Damas

Aquela semana, ou melhor dizendo, terça e quarta-feira. Durante o intervalo tive que me dividir em duas para poder passar um tempo com Vitória e com Kety. Vitória não se importava em me perder por uns minutos, pois dentro da sala de aula nós falávamos pelos cotovelos. Só sentia um pouco de falta do Rafael, eu tinha me acostumado a ouvir as piadas ruins dele e ver Vitória sorrindo para ele não se sentir constrangido. Mas não podia negar que também estava gostando de passar um tempo com Kety e seus amigos mais velhos. Eduarda ainda não me descia, mas decidi não me importar, de qualquer forma os outros compensavam sendo legais comigo.

Eu achava tudo aquilo muito novo e fantástico. Logo eu que sempre fui de ficar no meu canto, não chegava nas pessoas para conversar, pois sabia que em qualquer lugar que eu fosse não valeria a pena me apegar nas pessoas porque eu não ficava muito tempo em cidade nenhuma. O que era diferente naquela chuvosa cidade.

E ter tantas pessoas dispostas a serem meus amigos era algo que me trazia muita alegria, embora eu me contasse. Naquela cidade nublada de fim de mundo, eu estava começando a me sentir feliz de verdade.

Quando chegou a quinta-feira, logo quando cheguei na escola em uma manhã congelante, fui recebida por Vitória aos berros.

— Bom dia, minha linda! — Veio saltitante até mim.

— Bom dia, chuchu! — disse com o máximo de ânimo que consegui mesmo tremendo de frio.

— Hoje faremos a terceira regressão. Está animada? — perguntou.

— Eu acho que nunca vou estar realmente pronta para isso. Mas sim, eu sempre fico animada de certa forma — respondi.

— Opa! Oi, Paloma — saldou Rafael se aproximando. — Posso ir com a Vitória ver você falando de suas vidas passadas? Sério, eu gostei bastante e já que sexta vai ser a minha vez já vou me preparando.

— Claro! Mesmo horário de sempre?

— Sim — respondeu Vitória.

Assim que deu o sinal, Rafael se dirigiu até sua sala e Vitória e eu fomos para a nossa. Entrei dentro da sala e fui recebida por um abraço de Kety, aquilo me surpreendeu, não tinha noção de quando nos tornarmos tão íntimas. Mas não posso negar, o abraço dela era o melhor do mundo.

— Ela está animadinha com você — comentou Vitória quando nos sentamos.

Olhei para o outro lado da sala e disfarcei quando Kety olhou para mim.

— Nós somos apenas amigas — afirmei.

— Sei — disse Vitória sorrindo maliciosamente.

No intervalo, fui até o refeitório com Vitória e Rafael pois segundo eles, o lanche daquele dia valia a pena. Chegando lá, era cachorro quente, não era grande coisa mas estava bom. Mesmo que Rafael perguntasse sem parar se eu iria comer o meu. Depois da primeira mordida, eu gostei e ele desistiu. Foi engraçado.

Enquanto riamos das gracinhas de Rafael, Kety e Eduarda e entraram no refeitório, pegaram o lanche e se sentaram conosco.

Senti que Rafael ficou um pouco sem jeito, era como se toda a seriedade do universo houvesse lhe atacado de repente.

— Olá, meninas! — saudou Vitória segurando o cachorro quente à centímetros do seu rosto.

As garotas, sorriram e começaram a comer também.

Era como se aquele momento com o cachorro quente fosse tão precioso, que não poderia ser interrompido com palavras.

— Você vai ir no jogo sábado? — perguntou Kety a Vitória.

— Sim, a Paloma me convidou — respondeu ela.

Kety me olhou e sorriu.

— Sim, e vou levar minha família também — afirmei.

— Então teremos um grande público, não podemos decepcionar, Eduarda — disse Kety.

— E quando decepcionamos? — disse Eduarda, convencida. — E você, Rafa? Não foi convidado.

Senti a tensão de Vitória ao meu lado, era tanta que naquele momento pensei que ela fosse pular aquela mesa e pegar os cabelos de Eduarda.

Rafael estava com a boca cheia, então só fez que não com o rosto.

— Então eu te convido a ir ver nosso time ganhar como sempre — disse Eduarda.

Rafael engoliu e respondeu:

— Se as meninas já tinham planejado ir é meio óbvio que eu iria também, mas obrigado — disse simplesmente.

Quando Rafael lançou aquela resposta, todo o processo de flerte de Eduarda foi por água a baixo e ela ficou desconcertada, ao contrário de Vitória que ficou sorrindo convencida.

— Então... Rafael, vamos emprestar nossa amiga um pouco. Vem! — Vitória se levantando e colocou a mão sobre meu ombro. — Nos vemos depois.

Rapidamente Rafael se levantou e ficou ao lado dela como um cão fiel.

Ficamos em silêncio até que os dois saíram do refeitório. Quando isso aconteceu, senti aquele abandono de quando você só tem uma amiga e ela falta aula.

— Vocês viram aquilo? — disse Kety, sorrindo maliciosamente.

— O quê? — perguntei.

— Eu que te pergunto — rebateu ela. — Está havendo algo entre eles?

— Que eu sabia não — respondi simplesmente.

— Ele é um idiota! — disse Eduarda ainda emburrada.

— O Rafael só estava tentando não deixar a Vitória com ciúmes — comentou Kety. — Você tem que entender que aquele ali já foi fisgado.

Eduarda revirou os olhos. E eu me segurei para não rir enquanto Kety consolava sua amiga.

— E você Paloma? Vai ser legal te ver torcendo sábado — disse Kety.

— Sim, da última e primeira vez que eu fui no clube eu gostei bastante. Eu nunca fui muito ligada nisso de futebol. Mas acho que é uma das coisas que eu aprendi a gostar aqui.

— Fico feliz em saber que você está feliz nesse fim de mundo — disse ela.

Sorri e dei de ombros.

— Mas ainda acho a capital um lugar muito melhor — disse Eduarda.

— Lá é muito bonito, tem muitos lugares legais. Mas não tem algo que eu encontrei aqui. Quando cheguei nessa escola fui recebida por muitas pessoas. Enquanto quando cheguei na escola na capital, eu era apenas mais uma garota.

— Isso é verdade — afirmou Kety. — Pessoas do interior são muito mais amistosas.

— Isso — falei.

— Mesmo assim, se eu pudesse me mandar daqui não pensaria duas vezes — disse Eduarda, ainda emburrada.

Kety deveria ter percebido assim como eu que o motivo da chateação de Eduarda, foi o recente fora que ela havia levado de Rafael, então como eu não podia, Kety sorriu.

— Eu vou ao banheiro — disse Eduarda, levantando-se e saindo do refeitório.

— Ela morre de ciúmes do Rafael — disse Kety se aproximando de mim no banco.

Senti um frio na espinha quando ela se sentou ao meu lado.

— Eu percebi — falei enquanto olhava para minhas mãos para ter uma desculpa para não a olhar nos olhos.

— Eu estava pensando... — disse ela. — E se depois do jogo nós duas fôssemos até a praça conversar um pouco, só nós duas. Só para tirar a estranheza da última vez que saímos juntas.

— Não sei. Acho melhor não. Aquilo que aconteceu foi um erro. Não quero te dar falsas esperanças — afirmei.

Kety moveu seu rosto a fim de que eu a encarasse.

E foi inevitável não olhar em seus olhos verdes que me causavam tanta nostalgia.

— É justamente para corrigir esse erro que estou te convidando. Eu entendo que você só queria ser minha amiga, por isso, quero me redimir pelo que aconteceu. E não precisa se preocupar com meus sentimentos, eu estou bem com o que aconteceu.

— Se é assim, tudo bem — afirmei. — Eu gosto muito de você, e se eu puder evitar um mau entendido. Eu farei.

— Entendo... você é que é um amor de pessoa — disse sorrindo bobamente e jogando seus cabelos para o lado.

— Então nos vemos depois do jogo — afirmei.

— Vou fazer o possível para você não se arrepender — disse sorrindo.

Quando o sinal tocou, fui andando sozinha até a minha sala. O “Você não vai se arrepender.” que Kety havia dito não saía da minha mente. Comecei a pensar se havia agido certo aceitando o convite dela. Daquela primeira vez havia jurado a mim mesma me afastar para justamente evitar que ela criasse expetativas comigo. E lá estava eu de novo, aceitando sair com ela mais uma vez. Eu queria que fosse possível me afastar dela, mas eu sabia que de certa forma nossos destinos estavam interligados. Não podia ignorar tudo que havia visto nas minhas vidas passadas, todo aquele amor que minha alma — se assim posso dizer — sentia pela alma dela. Não era algo que eu poderia ignorar assim do nada. Por toda minha vida sonhei em amar alguém. Mesmo que eu soubesse que nem sempre relações são saudáveis. E como tudo na vida, o amor também passa. Eu sei, vi isso acontecer com meus pais, mas o amor que eu sentia por meio de Piper e Pietro era algo tão intenso, que não duvidaria se eles sentissem por toda a vida e que transpasse para as próximas vidas também.

Por algum motivo tudo era diferente agora, tudo parecia ser mais difícil. Amar para mim parecia algo impossível se a pessoa amada fosse Kety. Eu gostava muito dela, mas isso não significava que me via fugindo com ela e morando em uma cabana. Não existia toda a intensidade que eu sentia nas vidas passadas. E as vezes me pegava pensando assim, pois depois de ver dois finais trágicos. Pensava que era melhor ter uma vida tranquila, me casar com alguém que me proporcionasse uma vida sem grandes emoções, do que amar loucamente e não viver muito tempo para aproveitar.

Quando finalmente subi todos aqueles degraus, cheguei na sala e vi Vitória e Rafael sorrindo e conversando.

— E aí? Como foi lá? — indagou Rafael assim que me aproximei.

— Foi tranquilo — respondi. — E aliás. Gostei do que você falou para a Eduarda.

— Você também não gosta dela? — perguntou ele sorridente.

— Não me desce — falei.

— Aquela menina é muito sem noção. Depois do que ela fez para a Vitória uns dois anos atrás, nunca que vou ser amigo dela.

— Bons amigos odeiam as mesmas pessoas — afirmou Vitória, sorrindo. — Por isso que eu amo vocês dois!

— Eu preciso contar algo à vocês — disse sem jeito.

— O que foi agora? — indagou Rafael.

Olhei para os lados me certificando que ninguém, muito menos Kety, estava ouvindo nossa conversa.

— A Kety me convidou para sairmos juntas depois do jogo. Ela disse que quer se redimir pelo que aconteceu. Nós meio que vamos começar de novo depois daquele mau entendido — falei.

— Hum — comentou Rafael, sorrindo maliciosamente. — Não foi em um encontro assim que aquele beijo aconteceu?

— Aquele beijo foi um erro. E como eu já disse: vamos sair para desfazer o mau entendido — disse seriamente.

— Eu acho uma hipocrisia você agir como se vocês duas fossem só amigas, depois que você ficou sabendo que nas suas vidas passadas vocês foram muito além disso. Só acho. Não precisa ficar brava comigo. — Rafael deu de ombros.

Olhei escandalizada para Vitória, esperando que ela me defendesse.

— Ele tem razão — disse ela. — Não adianta tentar evitar um sentimento que está na sua natureza.

Fiquei revoltada por dentro. Eu odiava ser contrariada. Pensei em sair correndo e nunca mais falar com eles. Mas que grande idiota eu seria se fizesse isso. Eles eram meus amigos e só estavam falando a verdade. Era difícil para mim acreditar, mas era a verdade.

— Vocês irão ver que entre a Kety e eu nunca vai haver nada. No meu destino só quem manda sou eu! — disse seriamente.

Naquele mesmo instante a professora abriu a porta da sala e eu entrei sem olhar para trás. Não estava brava com meus amigos, estava determinada a fazer diferente das minhas vidas passadas.

Na quinta-feira, não posso negar que estava animada para a sessão de regressão que faríamos aquele dia. Nas duas primeiras eu ficava nervosa de início, mas naquele dia de manhã acendeu com um raro bom humor que significa que o dia seria bom.

Cheguei na escola e fui recebida como sempre por Vitória, juntas subimos as escadas em direção à nossa sala de aula. No caminho encontramos Rafael, que logo veio falando dos nossos planos para a tarde.

— Vou prestar muita atenção, hoje — disse ele enquanto andávamos pelo corredor repleto de alunos. — Para amanhã quando ser minha vez, tudo der certo.

— É claro que vai dar certo — disse Vitória. — Eu sou praticante uma profissional.

— Até agora não falhou uma, então... — Tive que concordar.

— Vai fazer aquele bolo de novo? — Rafael perguntou à mim.

— Você só pensa em comer? — Vitória debochou.

Rafael sorriu e deu de ombros.

— Se der tempo eu faço o bolo — falei.

— Sua mãe ainda não sabe que vamos lá na sua casa? — perguntou Vitória.

— É melhor assim — respondi.

E chegamos na frente da sala.

— Sua mãe não deixa ir gente na sua casa? — indagou Rafael.

— Deixar ela até deixa. Mas se eu falar que vocês estão indo lá. Ela vai perguntar o que nós ficamos fazendo e eu tenho vergonha de dizer que estamos recobrando memórias das minhas vidas passadas. Ela vai me achar uma idiota.

Vitória e Rafael se entreolharam e começaram a gargalhar.

— Vamos fazer o possível para sua mãe não desconfiar, se você acha que é o melhor, amiga — disse Vitória.

— Obrigada — falei.

O sinal tocou e Rafael tinha que ir para sua sala.

— Mesma hora do que da última vez? — perguntou Rafael.

— Sim. — Vitória e eu respondemos em uníssono.

Assim que cheguei em casa, almocei com a minha família e logo depois elas saíram de casa. Eu queria poder contar para a minha mãe o que meus amigos e eu estávamos fazendo à tarde, porém, tinha certeza que ela acharia algo muito ridículo e me forçaria a parar. E eu não queria isso, sentia que saber como foram minhas vidas passadas me ajudariam de alguma forma a entender melhor minhas angústias atuais.

Angústias nas quais eu gostaria muito de perder.

No mesmo horário do que da última vez, Rafael e Vitória surgiram no portão da minha casa com suas bicicletas e sorrisos eufóricos.

— Fiz um bolo de laranja para vocês. Minha trouxe ontem do trabalho algumas laranjas. Então pensei: por que não um bolo?

Enquanto eu falava, meus amigos deixaram suas bicicletas encostadas na porta da minha casa e entraram.

— Tenho certeza que ficou ótimo — disse Rafael, sorrindo.

— Podem se acomodar na sala, eu já levo o café — disse as pressas.

— Você é um amor, amiga — agradeceu Vitória.

Assenti e corri para a cozinha. Peguei a bandeja mais grande que encontrei, coloquei o bolo e levei até a sala, onde coloquei na mesa de centro. Vitória e Rafael ficaram me olhando, enquanto eu fiquei envergonhada por não ter feito aquilo antes.

Em seguida trouxe o café e eles se serviram. Eu preferi não beber café, pois pensei que pudesse atrapalhar na minha concentração. E enquanto eles comiam e bebiam ficamos em silêncio por um instante.

— Acho melhor começarmos logo com a sessão — afirmou Vitória.

— Ainda é cedo — disse Rafael, olhando o relógio de pulso.

— É melhor não perdemos tempo — alertou ela.

— Concordo — falei.

— Ótimo — disse Vitória bebendo o último gole de café e se recompondo no sofá com seu caderno em mãos. — Está pronta?

— Estou — afirmei me deitando no sofá.

— Ótimo. — Vitória pegou o celular e colocou o som de cachoeira. — Feche os olhos, Paloma.

Respirei fundo e fechei os olhos. Já tinha uma noção do que estava por vir.

E então Vitória começou:

— Tente ficar o mais confortável possível, nada te aflige agora. Calma, sem fome, sem sede. Apenas em paz. Agora respire fundo cinco vezes, lentamente.

E eu o fiz.

— Agora vamos imaginar que sua paz tomou conta de seu corpo. Tanto, que ele está protegido por uma armadura de luz branca que te protege de influências negativas. Você está protegida — disse com a voz aveludada.

— E então, aos poucos você se vê novamente naquele lugar magnífico. O branco corredor repleto de portas. Você sabe que é a última, no final do corredor que está o que você procura. Sendo assim, corra até lá e abra a porta.

Essas foram as últimas palavras que ouvi Vitória pronunciar. Era como se com a experiência eu soubesse o que fazer sem responder perguntas. Era dona de meu destino.

Cheguei até a porta branca como leite e a abri lentamente. Rapidamente meus olhos foram cegados por uma intensa luz branca.

Quando abri meus olhos novamente. Me deparei com um teto muito bonito acima de mim. Fiquei o analisando por alguns segundos e depois olhei para o quarto em que estava repousando. Sem dúvidas um quarto de menina. Um elegante quarto, eu diria. Pensei que quem fosse aquele pessoa, era de uma família rica. Eu estava deitada em uma cama muito confortável e sentia uma preguiça tão grande que queria passar o dia inteiro ali. Mas não podia.

Me sentei na cama e olhei para o resto do quarto, móveis antigos no estilo vitoriano, decoração que exagerava nos detalhes, quadros lindos na parede e uma penteadeira dourada, que com certeza deveria ser de ouro.

— Desculpe a minha intromissão em seu sono, milady — disse uma jovem empregada doméstica que abriu a porta do quarto.

— Não há incômodo algum — respondi. — Já estava me levantando. E aliás, preciso que você penteei meus cabelos novamente, minha querida. Ninguém possui tamanho talento para isto quanto você — falei gentilmente.

A garota entrou animada no quarto e andou até mim.

— É um prazer ajuda-la, milady. A senhorita possui os cabelos castanhos mais lindos que já vi. Para mim penteá-los se assemelha a pintar uma obra de arte.

Me levantei da cama e me dirigi até a penteadeira.

— Então comece sua obra prima, minha cara — incentivei.

Ou melhor dizendo, a garota rica incentivou.

Aproveitando que ela estava na frente de um espelho tendo seus longos cabelos castanhos sendo penteados pela moça. Olhei para o rosto que antes era meu.

Aquilo de certa forma me alegrou e apertou o coração. Aquela garota na frente do espelho parecia tão feliz e despreocupada. Com certeza ainda não havia se deparado com o mesmo par de olhos verdes que eu, Piper e Pietro. Ela era linda como nunca pensei ser. Seus cabelos brilhavam de tanto que eram sedosos, cascateavam seus cachos castanhos até a cintura. Seu rosto branco possuía uma trilha de sardas que contornavam seus olhos e nariz. Ela era perfeita. Mesmo que ainda estivesse usando apenas uma camisola branca.

Pensei que aquele fosse o momento perfeito para começar a conversar com ela e tirar todas as minhas dúvidas.

“Como você se chama?” perguntei.

“Sou a Condessa Penélope Holly”

Eu queria o sobrenome, mas de alguma forma isso foi impedido. Pensei que pudesse ser um truque do universo para eu não saber tão rápido quem eram minhas vidas passadas. Mas no meu tempo, havia Internet e assim que voltasse a primeira coisa que faria seria pesquisar sobre a Condessa Penélope Holly.

“Em que ano estamos? Onde estamos? Quantos anos você tem?” perguntei.

“Estamos em 1858, na Inglaterra. E eu tenho dezesseis anos de idade.”

Me lembrei de uma vez na escola estudar brevemente sobre a Rainha Vitória, embora o que mais marcou seu reinado fosse a moda.

— Sua mãe está lhe esperando para o desjejum — afirmou a garota atrás de mim.

Em seu reflexo, involuntariamente olhei em seus olhos, Foi quando aquela simples garota se tornou uma de minhas conhecidas. Os seus olhos eram os mesmos de Vitória, a minha Vitória. Só poderia ser ela mesmo, ninguém seria tão gentil comigo daquela forma.

— Essas formalidades são esgotantes — afirmei.

— Não vejo nada de esgotante em usar vestidos finos e comer o que a de melhor — disse ela, indo até o meu armário e pegando um lindo vestido azul turquesa. — O que acha de vestir este? Eu particularmente o acho lindo.

— Então fique com ele para você. Este não me serve mais. Eu o usei muito quando era mais moça, garanto que minha mãe não se importará.

— Receio que vá irrita-la — disse preocupada.

— Não se preocupe quanto a isso. Creio que serei capaz de convence-la.

— Se é assim. Aceitarei o presente de bom grado — agradeceu fazendo uma reverência. — Mas se tratando da condessa. Qual seria o mais apropriado para hoje?

— Hoje será só mais um dia. Não vejo motivos para exageros.

— Milady, ainda não sabe das novidades? Em breve chegará uma convidada que passará uma temporada no casarão.

— E quem seria está convidada? — indaguei arqueando uma sobrancelha.

— A criadagem disse que ela já é uma antiga conhecida da família. Que a senhorita e ela eram amigas quando crianças.

— Está garota... — disse pensativa. — Por acaso é a filha de um rico mercador americano chamado Thomas Watson?

— Creio ter ouvido isto entre os múrmuros — afirmou ela.

— Então melhor notícia não poderia haver! — exclamei. — Minha grande amiga Kate Watson está vindo passar uma temporada em nossa propriedade. Não me sinto feliz desta forma há tempos! É uma pena que não chegará hoje. Você acha que leva muito tempo de navio da América até aqui.

— Não faço ideia, milady. Mas se tratando do seu vestido de hoje — disse a criada animada como eu. — O que acha deste vermelho? — Ela pegou o vestido do armário, trouxe até mim e colocou na frente do meu corpo.

Olhei para o espelho e sorri.

— Extremamente chamativo. Perfeito.

E sorrimos uma para a outra.

Lembro-me de que assim que vestida, desci as presas as escadarias da mansão e me juntei a minha mãe na sala de jantar.

Ela estava tão animada quando eu. Sabia que de certa forma sua alegria não se tratava da presença da visitante. Não exatamente isso, ela estava feliz por eu ter finalmente uma companhia em que ela confiasse.

Era extremamente solitário viver naquele casarão. Minha única amiga era Wanda a jovem criada francesa que havia me dado a boa notícia. Porém, por toda demanda de trabalho que aquele lugar despenhava, Wanda não tinha muito tempo para me fazer companhia.

Minha mãe estava sempre ocupada organizando eventos, enquanto meu pai tutelava grandes prioridades além das tarefas de Conde. Sendo assim, eu era apenas mais uma jovem que tinha tudo, ao mesmo tempo que não tinha nada.

Mamãe havia dito que a viagem de navio da América para a Inglaterra levaria algum tempo. E que eu teria de ser paciente. Porém, não pude conter minha euforia. Finalmente eu teria uma companhia naquela casa enorme.

O que mais me alegrava era que Kate seria essa companhia. A última vez que nos vimos havia sido a nove anos atrás, quando sua família se mudou para a América. Nós duas passamos praticamente a infância juntas. Nossos pais eram grandes amigos e sócios, o que resultava em visitas diárias de minha melhor amiga. Quando a vi embarcar em um navio, juramos que seríamos melhores amigas para sempre independente da distância. Eu tinha apenas sete anos na época e ela deveria ter oito anos de idade. Não sei se seria provável que ela se recordasse.

Os dias se passam mais lentamente quando ansiamos por algo. E isto senti na pele enquanto esperava por Kate. Era como se minha triste vida finalmente encontrasse algum sentido, se não agir como uma condessa deveria se portar. Sempre gentil, calada e cortes.

Os dias preguiçosos se passaram. E em uma manhã de primavera. Wanda veio ao meu quarto mais animado do que de costume.

— Acorde, milady! É hoje que sua amiga chegará. Temos que apontar tudo. Incluindo a senhorita. Tem que estar mais deslumbrante do que nunca!

Estava ainda sonolenta, e confesso que os gritos de Wanda me assustaram, pois ainda dormia profundamente.

Entretanto, ela tinha razão. Aquele dia teria de ser perfeito.

Wanda tirou de meu armário o vestido salmão mais exuberante que me pertencia. Ela dançava por meu quarto, segurando o vestido na frente de seu corpo, como se a mesma estivesse em um salão de festas.

Não tínhamos muito tempo para brincadeiras. Logo nossa convidada chegaria. Sendo assim, Wanda tratou de fazer um belo penteado em meus cabelos castanhos.

O vestido ficou perfeito. Eu não havia o usado com muito frequência. Vestidos muito luxuosos tendiam a ficar desconfortável. Se não por serem pesados ou muito apertados. O problema era em como a dama deveria se portar ao usa-lo.

Desci correndo as escadas enquanto assegurava a barra de meu vestido. Sei que mamãe me reaprenderia se me visse correndo feito uma criança. Porém, aquilo não me importava no momento.

Quando cheguei ao saguão. Mamãe aguardava-me com os braços sobre o colo e seus olhos me repreendiam.

— Está atrasada — disse ela. — Você sem dúvida é a dama mais distraída da corte.

— Desculpe-me.

— Você está exuberante. Ao menos o atraso valeu de algo.

Olhei para mamãe e ela sorria em cumplicidade.

Foi quando eu, Paloma. Olhei fixamente para os olhos daquela mulher elegante.

Meu coração bateu em deparada quando vi nos olhos daquela mulher minha mãe, Marta. Senti sua doçura e carinho. Que mesmo que fosse uma mulher distante naquela época. Ainda me amava muito.

Nem mesmo o som do vento se batendo conta as paredes de pedra do casarão conseguiam amenizar o som do coche se aproximando. O som dos cascos dos cavalos batendo conta o piso da entrada da imensa residência me faziam a cada segundo mais eufórica.

Logo a diante pude ver melhor o coche coberto de minha família se aproximando. Sem dúvidas o cocheiro havia acordado cedo com as galinhas para ir até o porto buscar nossa convidada.

O coche aproximou ainda mais, estacionado de forma que a porta ficasse de frente para mamãe e eu. O cocheiro desceu e abriu a porta gentilmente. Foi então que meu coração acelerou em disparada, pois surgiu da escuridão a garota mais encantadora que já havia visto. Kate havia se tornado uma bela moça de cabelos loiros encaracolados, pele bronzeada e feições provocativas. Por um minuto pensei que uma dama desceria do coche. Mas para nossa surpresa, em um pulo desceu uma garota pequena de cabelos rebeldes e vestida com roupas que pareciam de montaria. Mesmo assim, linda como um anjo.

Mamãe não consegui esconder seu espanto, enquanto eu sorri baixinho de sua reação.

— Paloma! — exclamou ela assim que me viu. — Como é bom estar em sua presença novamente!

— Digo o mesmo, cara Kate Watson. — Fiz uma reverência.

Kate sorriu e me abraçou. Confesso que fiquei sem reação e pensei em quão diferentes eram os hábitos americanos.

— Seja bem vinda a nossa residência, senhoria Watson. Espero cumprir o que seus pais pediram nesta temporada que passará aqui. Lamento no momento não poder lhe oferecer a devida companhia. Mas sei que a jovem condessa o fará da melhor forma possível — disse mamãe olhando para mim e sorrindo.

— Farei de bom grado, mamãe — respondi.

— Excelente. Nos vemos na hora do chá — dizendo essas palavras, mamãe deu as costas e entrou no casarão.

— Gostaria de ver o jardim? Creio que está deverás diferente do que você pode se recordar — disse educadamente.

— Será um prazer. — Ela sorriu.

Ambas saímos pela propriedade. Ela era diferente das demais moças que eu conhecia. Seu modo de andar, falar, se portar. Era ao mesmo tempo selvagem e encantador.

— Ah algo que eu gostaria de lhe perguntar se não for incômodo — falei.

— De forma alguma — disse ela. — Pergunte.

— Por que seus pais lhe mandaram para a Inglaterra? Aconteceu algo na América?

— Não há nenhum problema com os negócios de meu pai. A América lhe rende mais a cada dia — respondeu.

— Então?

— O problema sou eu — disse tristemente, enquanto olhava para as flores do jardim. — Meus pais acreditam que se eu passar uma temporada com a nobreza inglesa, serviria para que eu voltasse a me portar com uma dama. Como se isso fosse algo de estremo desejo para mim. Além de que a temporada inglesa serve exclusivamente para jovens como eu arrumarem um marido — disse chateada.

— Acredito que as coisas sejam diferentes na América — comentei.

— Com toda certeza! — concordou. — Meu lar é o oposto daqui. Lá não há frio, não há nobreza e não há julgamentos. Venho do Sul, onde o sol castiga quem ousa encara-lo por muito tempo, onde as pessoas são simples e trabalham como cavalos. Onde todos gostam de mim por ter este modo de vestir e agir. Melhor dizendo... Todos exceto meus pais. Que me chamam de camponesa.

— Se você é feliz agindo de sua maneira, não vejo problemas — falei.

— Ao menos minha antiga melhor amiga me entende e lembra de mim— disse sorrindo.

— Como hei de esquecer, prometemos apoiar uma a outra até o fim dos dias.

— Até o fim dos dias — concordou ela.

A partir daquele dia, eu não era mais uma garota solitária. Finalmente teria alguém para me trazer felicidade naquele lugar. Isso foi o que eu ousei pensar, pois meu tempo com Kate Watson não foi integral como pensei que seria.

Mamãe sempre foi uma mulher imensamente ocupada, porém assim que Kate chegou. Ela dirigiu à garota tamanha atenção que me deixou até mesmo supressa. Creio que mamãe gostaria de transformar Kate em uma dama da sociedade o mais brevemente possível para que pudesse retornar aos seus afazeres, o quanto antes.

Com apenas uma semana, Kate Watson já se vestia como uma dama. Entretanto, isso não a agradava. Eu sinceramente a achava exuberante com aqueles vestidos, mesmo que ela os adiasse.

— Como vou correr usando essa cortina? — disse ela aos risos em uma tarde que andávamos pelo jardim.

— Fiquei tranquila — falei. — Creio que mamãe em breve irá desistir de você e voltar a planejar suas reuniões.

— Espero ansiosamente — disse ela, sorrindo maldosamente.

A companhia de Kate Watson se tornou meu maior motivo de alegria. Eu torcia para que ela agisse como uma camponesa para sempre, pois só assim ela ficaria ao meu lado. Falando desde modo passo parecer uma pessoa egoísta, mas acredito que Kate quisesse o mesmo.

Depois de mais um dia nublado de outono. A noite um temporal dominou o céu estrelado da propriedade. Os raios e trovões lembravam as mais tenebrosas histórias de terror. Deitada em minha cama, eu olhava pela janela a chuva caindo violentamente.

Meu temor só foi maior quando ouvi a porta de meu assento sendo aberta e em seguida fechada. Pensei que fosse um monstro ou um assassino. A escuridão não me deixava destingir quem era o invasor. Até que ouvi sua voz.

— Eu odeio tempestades — Kate disse se aproximando da minha cama.

— Pensei que você fosse mais corajosa — comentei risonha.

— Todos temos um medo. Posso domar o mais teimoso dos cavalos. Porém, ainda posso ter medo de uma noite assustadora de temporal em uma casa grande e antiga. E como se não bastasse, sozinha em um quarto afastado.

— Gostaria dormir ao meu lado esta noite? — perguntei me arrastando para o lado, assim oferecendo parte da cama a ela.

— Se não for um incômodo? — Ouvi o receio em sua voz.

— Claro que não — respondi batendo minha mão na parte da cama que havia cedido a ela.

Rapidamente Kate deitou-se ao meu lado e virou-se para mim. Através da iluminação que um raio proporcionou quando caiu próximo a janela de meu quarto, por um segundo pude olhar nos olhos verdes exuberantes de Kate. Eles me olhavam profundamente como se eu fosse algo de estremo valor em um museu. A breve luz destacou o verde intenso e hipnótico que só os olhos de Kate possuíam. E por um momento, senti que algo novo nasceu dentro de mim.

Eu já podia esperar que aquilo acontecesse com Penélope. Era óbvio que Kate Watson era Kety e que Penélope sentiria algo pela garota. E no momento em que ela olhou fixamente naqueles olhos verdes, ela sentiu o que ambas as minhas encarnações sentiram. O amor mais violento e intenso de todos.

Quando tudo se escureceu, senti o dorso da mão de Kate acariciando suavemente meu rosto. Senti minhas bochechas corarem, porém com a escuridão não me preocupava com o que ela fosse pensar.

— Você é muito bonita — murmurou ela.

— Como pode afirmar isso se não está me vendo agora?

— Por já havia notado isso antes — respondeu. — Mas se a escuridão é um problema. Creio que possa resolve-lo. Onde fica o candelabro?

— Bem ao seu lado, no cômodo — respondi. — Como pensa em acende-lo?

— Acho que não precisamos mais de uma vela. Olhe pela janela — disse Kate.

Olhei pela janela e a chuva havia dado lugar à uma noite de lua clara que iluminava parte do meu quarto.

— Agora vejo perfeito todos seus traços — disse ela aproximando seu corpo do meu.

— E eu os seus.

— Você parece um anjo. Sempre pensei que os anjos mereciam ser beijados.

— Eu nunca fui beijada — admiti timidamente.

Kate sorriu e acariciou meu rosto.

— Me permitiria a ser a primeira pessoa a ter a honra beijar a bela condessa?

Algo em mim sussurrou que aquilo era algo imoral a se fazer. Mas por outro lado, um fogo em minha alma ensaiava por beija-la.

— Tem meu consentimento — murmurei.

Lentamente, Kate aproximou ainda mais seu corpo do meu e delicadamente tocou seus lábios nos meus. Por um segundo aquilo me assustou de certa forma. Mas a medida que seus lábios se encaixam aos meus, senti meu corpo em chamas e quando me dei conta estávamos nos beijando apaixonadamente.

Eu tinha a consciência de que o que estávamos fazendo era algo profano e imoral. O que me fez questionar sobre o que era certo ou errado, pois como me sentia feliz naquele momento, aquele beijo não deveria ser algo digno de repulsa.

Enquanto eu a tinha sobre meu corpo, entre meus braços. Sentia que nada mais poderia nos separar. E que mesmo que o mundo fosse contra, eu nunca deixaria de ama-la. Sim, eu amava Kate Watson desde a primeira vez que a vi e amaria para sempre.

Os meses se passaram e Kate e eu jamais comentamos o que aconteceu naquela noite. Por um lado, tínhamos medo de um escândalo e por outro, não queríamos levantar suspeitas. A partir daquela noite, não houve uma sequer que não nos encontrávamos escondidas em meu quarto e passávamos a noite juntas em segredo. Haviam nos tornando amantes e planejávamos sermos amantes até o fim da vida. Nosso romance nunca poderia resultar em casamento.

Lembro-me de quando tudo começou, dos receios que tive, do medo que me consumiu. Até mesmo da carta que passei por baixo da porta do quarto de Kate, depois de discutimos se levaríamos ou não nosso romance para frente. O que causou nossa primeira briga, que resultou em uma semana de silêncio.

Querida Kate.

Oh, quão estável eu era antes de ti. Meus sentimentos eram como uma torrente de águas calmas e rasas, agora no entanto se assemelham ao mais profundo e tortuoso dos oceanos. O que queres tu de mim? Ao investir contra minha pessoa tamanho encantamento, onde somente seus gracejos me abalaram os pensamentos. Tudo há contra nós, todo o mundo nos julgará como seres profanos. O abismo entre nós se torna mais profundo a medida que tentamos lutar contra nossos desejos. Desejos nos quais não haveriam de existir jamais. Nossas semelhanças nós tornam pecadoras. Embora não veja pecado em amar. O que haveria de errado em amar?

Estou sucumbido ao desespero por sua causa, sua ausência se tornou algo insuportável. Não vejo mais beleza nas noites estreladas e nem mesmo nas manhãs de primeira. Seu sorriso quase maldoso mostrou-me o que há muito tempo não sentia. Somente ao pensar em você, meu coração bate de forma acelerada. Temo que isso se torne minha ruína. Já não tenho controle sobre minha mente, pois agora todos meus pensamentos se dirigem à você. Somente a você. Queria eu, poder arrancar este sentimento de meu peito e voltar a ter o controle que pensava ter sobre minha vida. Porém, creio que será inevitável esquecer tão facilmente tamanho encanto que possuo por você. Estou certa de que isto vá conta todos os dogmas que nos foram impostos assim que nascemos.

Por outro lado, creio que a vida deveria ser vivida e não jogada aos lobos. O que seria a vida sem amor? Mesmo que o amor seja algo imoral e profano. Ainda seria amor, eu diria. Sendo assim, não renunciaremos nosso direito de amar! Mesmo que para isso, ambas nos contentássemos com uma vida de segredos, mentiras e pecado. Irei feliz para o inferno, se neste mundo viver o paraíso nos seus braços. Jamais se esqueça disso, minha amada Kate.

De sua Penélope Holly.

Quando a temporada de Kate Watson estava quase no fim, e minha mãe havia conseguido transforma-la de certa forma em uma dama da sociedade e mesmo a garota não tendo conseguido nenhum marido, mamãe estava orgulhosa. Eu sabia que Kate não era aquela garota que mamãe havia transformado, eu a conhecia melhor do que ninguém. Éramos verdadeiras uma com a outra.

Nosso segredo era nosso martírio, nossa ruína, nosso inferno e céu na terra. Porém, em um dia de verão recebi a pior notícia de minha vida.

— Hoje a tarde o Lorde Holland virá fazer uma visita te cortejo à você, querida — disse mamãe durante o desjejum.

Kate e eu nos entreolhamos assustadas, sabíamos que aquele dia iria chegar, mas não tão rápido.

— E como ousa só me dizer isto agora? — resmunguei.

— Sou sua mãe, sei o que é melhor para você — disse seriamente.

— Eu deveria escolher com quem me casar. Lorde Holland não me agrada! — disse em voz alta, me levantei e sai caminhando para fora da sala de jantar.

— Você é da nobreza, querida. Você sabe como as coisas funcionam — disse ela enquanto eu me afastava.

Revoltada com a notícia que um nobre que eu mal conhecia viria me cortejar, andei a passos largos e furiosos. Quando adentrei o jardim percebi que não estava sozinha.

— Você precisa se acalmar — disse Kate atrás de mim.

Me virei com os olhos cheios de lágrimas e me lamentei.

— Como pode me pedir isso quando me conhece mais do que ninguém? — choraminguei.

— Eu sei, meu amor. Eu sei — lamentou ela, em seguida me abraçou. — Nós sabíamos que este dia chegaria.

— Não pensei que seria tão cedo — disse nos braços dela.

— Isso não mudará nada entre nós — afirmou ela. — Isso posso garantir a você, querida.

— Eu te amo tanto. Queria poder passar o resto da minha vida com você, somente com você.

Kate se afastou e olhou em meus olhos, sorriu e disse:

— Não me importo com títulos, e acordos escritos. Acredito no que o coração sente. Sei que mesmo em segredo, ainda viveremos nosso romance por toda a vida. Sei que logo meus pais encontrarão um pretendente digno para uma garota rica. Quero que você acredite assim como eu que esses homens serão apenas de fachada. Lamento por eles jamais serem armados de verdade. Porém, não abdicarei do meu amor por você. Mesmo que o mundo seja contra, mesmo depois da morte.

O dia do meu casamento foi um dia que amaldiçoarei por toda a eternidade. E com toda minha vida tentarei esquecer minha noite de núpcias, pois já não era uma donzela devido ao meu romance proibido. Meu casamento aconteceu mais rápido do que deveria, pois o Lorde Holland queria que sua mãe estivesse na cerimônia, e meus pais, por educação aceitaram. Nem sequer me consultaram. Eu não era nada mais do que um objeto que passaria para o poder de outra família. Lorde Holland era poucos anos mais velho do que eu, e sem dúvidas um homem bonito e gentil. Mas mesmo que sua gentileza pudesse encantar qualquer dama. Meu coração já tinha uma dona, sendo assim, sentia que nunca poderia ama-lo.

Kate permaneceu o restante da sua temporada na residência de meus pais, enquanto eu, fui morar no casarão de Lorde Holland. Isso não impediu que Kate fosse me visitar diariamente. Lorde Holland tentava ser um marido atencioso, embora entendesse que eu precisava da companhia de minha amiga. Por esse motivo sempre que ela chegava, ele saia da residência. O que era um alívio para nós duas. Nosso acordo estava em prática, seríamos amantes para sempre.

Nada na vida tente a perfeição, nem mesmo a eternidade. O tempo de Kate estava se esgotando na Inglaterra, e o desespero começou a nos consumir. Não queríamos viver a um oceano de distância. Sendo assim, Kate enviou diversas cartas aos seus pais, implorando que pudesse ficar na Inglaterra morando na residência de sua família em Londres. Um mês depois ela recebeu a resposta. Seus pais lamentaram a distância de sua filha, ao mesmo tempo que aceitaram sua permanência na Inglaterra.

Assim, Kate Watson mudou-se para sua residência em Londres. Antes disso, meus pais decidiram fazer um baile no casarão para apresentar Kate mais uma vez à sociedade.

Ao meu ver, seria somente mais algum baile magnífico organizado por mamãe. Onde ela convidaria as pessoas mais importantes do país e ofereceria um banquete espetacular.

Naquela noite, meu marido estava exausto por ter passado o dia visitando suas providências. E não queria sair de casa. Por isso, tive de ir sozinha até a casa de meus pais. Lorde Holland deu seu consentimento assim que me viu vestindo um exuberante vestido verde.

Assim que me vi livre, o nosso cocheiro me levou até a residência de meus pais. Seria óbvio que haveria falatórios sobre a ausência de meu marido e eu teria que dar explicações durante toda a noite.

Pensei que minha noite seria um desastre assim como minha vida de casada seria. Porém, posso afirmar que Kate tornou ambas as coisas melhores impossíveis. Naquela noite sorrimos, bebemos e até mesmo dançamos juntas, sem dar importância para os olhares críticos. Kate estava exuberante de vestido azul turquesa. E como aquela noite, fomos felizes por toda a vida.

Minha última visão como Penélope apareceu como cenas avulsas das duas dançando aquela noite, as duas andado juntas pelo jardim. De Penélope e Kate felizes com bebês no colo e por último as duas mais velhas em uma sala de lareira. E enquanto tudo ia desaparecendo, me senti bem por finalmente presenciar uma vida onde ouve um final feliz.

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Comments

Maria Do Carmo Andrade

Maria Do Carmo Andrade

ufa, até que enfim um final feliz, eu já estava apreensiva achando que elas iam morrer

2024-05-05

2

Jérsica Santos

Jérsica Santos

até quem fim um final feliz ☺️

2024-04-30

2

Ver todos

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