HANNA

HANNA

01 • Proposal

Talvez eu seja mais forte do que imagino. Ou talvez só saiba mascarar bem as coisas e seguir em frente como se nada estivesse acontecendo.

Naquele fim de tarde em que ela surgiu em meu caminho, eu não tinha a menor idéia do que viria a seguir, mas no fundo sentia que nada mais séria como antes.

O dia está congelante. Meu sobretudo marrom surrado não é mais suficiente para aplacar o frio que abraça meu corpo e o faz estremecer enquanto estou a caminho do trabalho. Quanto mais me aproximou do prédio, mais sinto que estou prestes a pegar um resfriado. Me pergunto como suportar esse dia de trabalho, mas a resposta é óbvia; preciso do dinheiro.

Angela, minha colega de trabalho que senta logo atrás, desliza com a cadeira até meu lado.

— Tenho algo para mostrar e você vai cair dura — avisa ela passando o dedo no visor do celular enquanto espero o sistema iniciar. —  Olha essa mulher, filha de um político ricaço que ficou noiva de uma das herdeiras do império Vielmont. —  Coloca o celular diante do meu rosto. — É a sua cópia, só que loira.

— E rica, muito rica — afirmo passando o dedo na tela lendo o artigo onde diz que a mulher viveu na França e voltou ao país recentemente.

— Tem certeza que não é sua irmã gêmea?

Dou uma risada anasalada. Não tenho tanta sorte assim, meus pais são muito humildes, vivem numa cidade pequena e desde que vim morar em Nova York passo o ano juntando dinheiro para ter condições de ir vê-los para dar-lhes ao menos uma pequena quantia.

— Como é linda essa Alexa Vielmont, olha. — Mostra Angela depois que devolvi o celular.

Viro para olhar a mulher que usa um de terninho azul escuro.

— É bonitinha. — Angela fica horrorizada com minha resposta e logo em seguida mostra a foto das outras duas irmãs Vielmont, Emily e Eloise, que são bem diferentes da primeira.

Emily é uma morena tatuada com cara de rebelde e safada, afinal vive aparecendo em revistas ao lado de uma modelo diferente a cada semana.

Eloise, como a mais velha e atual presidente do grupo Vival, está sempre séria com postura de empresária, bem vestida e linda ao ponto de parecer um pecado. É muito bem casada com um cara que dizem não fazer nada da vida, mas vem de uma família rica e está sempre posando ao lado da esposa. Eles parecem felizes.

— Pare de me mostrar pessoas ricas logo cedo, assim perco a vontade de viver. — Minha colega gargalha ao me ouvir e após um suspiro pego o headphone para começar o trabalho.

...***...

No fim do dia, da estação 34 St-Penn Station para a estação Crown Hts-Utica Av A, levo quase 50 minutos. Preciso caminhar algumas quadras até finalmente chegar ao prédio caindo aos pedaços onde ficava o cubículo que chamo de apartamento.

É exatamente nesse trajeto, maçante — até então previsível — que a vejo pela primeira vez.

Enquanto atravesso a rua, de maneira inesperada o carro para a pouquíssima distância de mim. Meus olhos encontraram os dela que retira o óculos do rosto. É a mesma mulher da revista, a loira que de algum jeito parece comigo. Ela abri a porta do veículo e observo os saltos de cor prata que tocaram o asfalto. A mulher fecha a porta sem desviar o olhar de mim e caminha de forma elegante me olhando de cima a baixo, enquanto também analiso cada peça de roupa de marca que usa.

Um vestido na cor preta cai por suas curvas até a altura das coxas, por cima há um casaco que parece um daqueles tapetes felpudos, mas que claro, nada tem haver realmente com a peça decorativa, provavelmente vale uma pequena fortuna. Seus cabelos loiros caem pelo ombro direito tão bem arrumados e hidratados que me faz sentir vergonha dos meus que estão a mais de três dias sem ver shampoo.

— Quem é você?

— Eu? Bem, eu moro aqui. — Aponto para o prédio do outro lado da rua e ela faz a mesma cara que qualquer pessoa em sã consciência faria ao ver aquele lugar.

— Quero saber seu nome, não seu endereço, minha querida.

— Hanna — respondo levantando o queixo, tentando ignorar que meu sobretudo está desgastado, mas que pelo menos cobre a roupa que uso por baixo. — Hanna Coleman.

— Interessante. — A mulher leva a perna do óculo aos lábios vermelhos e novamente me analisa. — Tome mais cuidado ao atravessar a rua, Hanna. — Ela volta para o carro e eu saio da frente para que o veículo se vá.

Em frente a meu prédio, naquele horário está a minha espera ele, o embuste que me persegue desde que terminamos. Mesmo recusando suas ligações, bloqueando nas redes sociais, ainda tenho que conseguir meios de evitar um encontro pelo bairro.

— O que você quer, Leo?

— Você está doente? — Ele trás a mão até minha testa, mas bato antes, impedido que me toque. — Hanna, até quando vai me evitar?

— Você não cansa? Acabou! Você me traiu depois de três anos de relacionamento, me deixe em paz. — A última palavra quase não sai, mas viro para entrar.

Na semana seguinte, caminhando para casa avisto o mesmo carro que quase me atropelou antes, estacionado em frente a meu prédio. Quando me aproximo um homem sai do banco do motorista olhando em minha direção.

— Hanna? — pergunta, e mesmo incerta confirmo, então ele abri a porta traseira do veículo. — A senhorita Volkmer deseja uma conversa.

Franzo o cenho me perguntando se é aquela perua do outro dia e quando me aproximo da porta, tenho certeza. Entro no veículo e o homem fecha a porta me assustando. A mulher está com óculos escuro e não se dá ao trabalho de retirá-lo quando vira o rosto em minha direção.

— Nos encontramos novamente. — Sorriu e apenas confirmo. — Serei direta. — Retira o óculos e me encara friamente. — Quero que se passe por mim e case com Alexa Vielmont. — Arregalo os olhos e ela novamente sorri. — Sei que sua situação financeira não é das melhores.

— E-eu não entendi. — Até mesmo gaguejo tamanha surpresa diante de tal proposta absurda. — Por que faria isso?

A mulher pega um envelope ao lado e me entrega.

— Essa é a dívida dos seus pais, que poderá líquidae caso aceite minha proposta. Nós duas só temos a ganhar. — Sem entender e nem saber sobre meus pais terem dívida, retiro as folhas de dentro do envelope e meus olhos saltam ao ver a quantidade de dinheiro que eles devem tanto ao banco quanto a agiotas.

— Isso é falso — afirmo.

— Realmente acha que perderia tempo fabricando isso? — A vejo revirar os olhos. — Sugiro que aceite o mais rápido possível. Não sei se sabe, mas agiotas não costumam esperar muito tempo. A primeira parte do dinheiro você recebe depois que noivar, a segunda quando casar e a terceira que é a mais importante e vai garantir que viva confortávelmente pelo resto da vida, será bem depois de estar casada.

— Isso é absurdo, não posso fingir ser outra pessoa.

— Não seja boba. É algo fácil, afinal ninguém naquela casa me conhece pessoalmente. Além do mais é um casamento de fachada, tudo um jogo de interesse entre famílias, não haverá necessidade de se envolver fisicamente com ela.

— Suas fotos estão em vários sites, você é muito conhecida. — Ela sorri parecendo se achar grande coisa diante de minhas palavras.

— São apenas fotos, ninguém de fato conhece minha personalidade. — Puxa o envelope da minha mão e volta a colocar o óculos. — Todo homem e mulher desse país deseja casar com uma herdeira Vielmont, sabia? Pense bem e rápido, nunca se sabe o que pode acontecer a seus pais devido às dividas. Agora pode sair.

Fico encarando ela que mantém o rosto virado para frente, em seguida saio do carro.

Do lado de fora o homem me entrega um cartão com o endereço de uma galeria na França e atrás escrito com caneta está o número de Katherine Volkmer.

Assim que entro em casa ligo para minha mãe e sem rodeios pergunto sobre as dividas. Surpresa, por eu ter descoberto, mamãe começa a chorar pedindo que não me preocupe. Sinto o chão se abrir sob meus pés. Meu coração parti ao saber que estão passando necessidade e não me contaram.

Por fim, afirmo que vou mandar o suficiente para pagar tudo, em meio a mentira de que consegui um bom emprego.

Me pergunto o que fazer diante de tal situação. Se devo aceitar a proposta absurda ou tentar fazer um empréstimo, mas a segunda opção é descartada quando lembro que ainda estou pagando o último que fiz para comprar alguns eletrodomésticos. Não existe a possibilidade de conseguir aquela quantia de outra forma, só me resta ceder a aquela loucura.

...***...

Viajamos em um jatinho particular e em pouco mais de duas horas chegamos a nosso destino que fica numa propriedade privada. Logo de cara vejo que na mansão há vários profissionais contratados por Katherine para fazer absolutamente tudo comigo.

Passo um dia inteiro, até a noite, pintando cabelos, cuidando da pele e unhas. Um verdadeiro dia de princesa, mas estou tão assustada com o que vem depois que não consigo usufruir de nada.

Quando mulher finaliza meu cabelo e maquiagem, coloca um espelho diante dos meus olhos e quase não me reconheço. É como se estivesse olhando para Katherine, não meu próprio reflexo.

— Venha, temos muito o que fazer.

Treinamos sua assinatura umas mil vezes durante horas. Ela me ensina a caminhar em salto sem tropeçar em meus próprios pés e a usar talheres. Fala bastante sobre combinações de roupas, mas bem pouco sobre os pais. Por fim e mais importante, me dá um cartão de créditos sem limite.

A todo momento eu penso estar num filme, pois nada parece real, nem mesmo ela a meu lado, toda elegante, intimidadora e tão obstinada a me ensinar tudo. Em momento algum demonstrou simpatia. Sua indiferença e frieza são como um escudo que me deixa ciente de nossas diferenças, me fazendo questionar se serei capaz de seguir com isso.

— Não seja tola — diz segurando em meus ombros. — Não há absolutamente nada que uma mulher não seja capaz de fazer. É apenas uma família rica concentrada nos próprios interesses. Se houver imprevistos, tenho certeza de que não será nada que seu charme não resolva.

Já é madrugada quando ela apenas informa o endereço do hotel que ficarei hospedada, junto a uma lista de compromissos e se vai.

Me vejo sozinha na casa imensa, só então percebendo o tamanho da loucura que estou fazendo, mas não tem volta, afinal quando entro no quarto percebo que tudo em minha bolsa está jogado sobre a cama, exceto meus documentos. A maldita levou como garantia.

Depois de uma noite em claro, quando o dia amanhece tento me arrumar o mais parecida possível com ela. Estou me acostumando com minha própria aparência depois de horas me olhando no espelho. Não vejo mais Katherine, mas sim a pessoa amedrontada que tenta fingir ser uma mulher nascida em berço de ouro.

De volta a Nova York, quando o carro para em frente do luxuoso hotel, engulo em seco e tento manter a calma.

Enquanto caminho pelo hall apertando entre meus dedos a pequena bolsa caríssima, usando um par de louboutin que apertam meus dedos, um vestido que vai até a altura dos joelhos e um sobretudo por cima, me sinto uma estrela de cinema. É como se estivesse em um filme. Mas sei que nos filmes, assim como na vida real, nem tudo são flores o tempo todo.

Paro diante das imensas portas do elevador ao lado de uma mulher que não presto atenção quem é, e assim que possível entro na frente, mas quando viro e ela levanta os olhos que antes estavam no celular em mãos, sinto o choque devido a surpresa. É ela, Alexa Vielmont, a noiva de Katherine.

— Quem você pensa que é para me fazer esperar durante quase duas horas? — Seu tom é extremamente grosso me fazendo arregalar os olhos sem saber como agir. — Vai ficar aí parada feito uma idiota? Meus pais estão esperando para o café. — Ela me dá as costas e quando as portas estão prestes a fechar, rapidamente impeço e saio.

Era de se esperar que aquele sorriso encantador nas fotos fosse tudo enganação. Me pergunto porquê a noiva tem que ser justo a herdeira que não faz meu tipo e ainda por cima é um grossa. Por outro lado, também não gostaria que fosse Emily, a pegadora. Para falar a verdade a única que me parece aceitável é Eloise.

— Concentre-se — murmuro para mim mesma, parando na frente do hotel ao lado de Alexa que recebe a chave do manobrista e vai para o lado do motorista.

Quando entro e fecho a porta do carro, o que antes era indignação por aquela riquinha ter sido grossa — dá lugar ao medo. A tensão se espalha no ar, a mulher mantém o olhar fixo na estrada e eu percebo apenas por minha visão periférica, afinal não me atrevo a olhar para ela.

Depois de longos minutos, enquanto sofro sentindo dor de barriga, atravessamos o portão principal da propriedade e avisto a bela mansão que me deixa de boca aberta. Alexa estaciona bem na frente e deixo que saia primeiro para que possa arrumar meus cabelos, mas uma batida no vidro me faz saltar pelo susto e rapidamente guardo o espelho de volta na bolsa, em seguida saio do carro.

— Nesse ritmo chegaremos para o jantar — resmunga ela impaciente me dando as costas.

A mansão é tão maravilhosa por fora quanto por dentro. Logo na entrada da sala principal umas cinco empregadas estão lado a lado, todas muito bem arrumadas com seus uniformes e cabelos bem presos. Uma delas informa que todos já estão na sala de jantar e enquanto isso a outra pega minha bolsa, já a terceira fica responsável por meu sobretudo.

Sentindo-me um pouco nua usando o vestido que não é curto ou decotado, mas fica extremamente justo nas curvas de meu corpo, sigo Alexa atravessando a luxuosa casa até chegarmos na outra sala.

Assim que coloco os pés no cômodo e todos os olhares se voltam contra mim, paro engolindo em seco. Parece que fui teletransportada para um site de fofocas sobre a família Vielmont.

Passo os olhos por seus rostos e ao avistar Eloise meu coração falha uma batida ao constatar que ela é tão linda quanto nas fotos, mas ao lado está o marido, sério e concentrado no próprio café.

Do outro lado da mesa está Eleanor, segunda esposa do senhor Sebastian Vielmont, este que me encara com seus olhos opacos e intimidadores.

A única ausente é Emily, mas não sinto falta dela, afinal já tem olhos demais em minha direção.

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Comments

Anne Jay

Anne Jay

Hmm cheirin de sequestro hein

2024-05-05

0

Anne Jay

Anne Jay

Nem um pouco ignorante, graças a Deus

2024-05-05

0

A.G

A.G

gentil como o coice de uma mula kkkk

2024-04-12

2

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