11 • Event

"Compre um vestido novo", foram as palavras de Eleanor naquela manhã.

Eu segui a risca seu conselho, pois precisava sair de casa.

Pedi ao taxista que me deixasse uma esquina antes do restaurante que seria inaugurado e segui caminhando com meus saltos desconfortáveis.

Não foi difícil descobrir o endereço do local, afinal a internet estava cheia de matérias sobre o assunto. Aquela rua era repleta de outros pequenos negócios, mas logo avistei a fachada bonita e chamativa. Pensei que seria aquele tipo de lugar que apenas pessoas com muito dinheiro podiam frequentar, mas não era nada disso.

Paro do outro lado da rua, retiro o óculos escuro e observo o prédio me perguntando o que posso fazer para impedir a inauguração que será no dia seguinte.

Nada Hanna, você não pode fazer nada. Penso comigo mesma.

— É bonito — diz uma senhora parando a meu lado e confirmo voltando a colocar o óculos no rosto. — A empresa dona disso aí está retirando todos os restaurantes menores aqui da redondeza. São gananciosos. — Encaro a mulher baixinha enrugada, cabelos grisalhos e roupas simples. — Já tentamos negociar, mas eles não se importam que esse seja o nosso sustento. — Faz uma careta movendo a cabeça negativamente e caminha em direção a porta de seu pequeno restaurante.

Observo que um homem de terno entra no mesmo lugar que ela e tenho a impressão de já tê-lo visto antes, mas não me recordo, então decido voltar a caminhar enquanto penso no que fazer, quando escuto a senhora gritando e colocando para fora o mesmo homem que avistei minutos antes.

— Mande esse recado ao seu chefe! — diz ela antes de jogar uma bacia d'água no engravatado.

Ele molhado atravessa a rua e observo atentamente quando faz sinal para um outro carro de onde saem alguns homens que seguem para o restaurante da senhora. Eu poderia ter ido embora a muito tempo, mas fico parada observando tudo e ao mesmo tempo sem ver claramente nada, então curiosa decido ir lá.

Quando abro a porta do lugar eles estão quebrando tudo e ao me ver chegando saem rapidamente, passando por mim feito um furacão. O local está vazio e naquela altura todo revirado. Escuto o choramingo da senhora vindo da cozinha onde a encontro segurando uma panela em meio a bagunça que deixaram o local.

— A senhora está bem? — Deixo a bolsa de lado e me aproximo dela inclinando para me certificar que não foi agredida.

— Não, minha filha — responde com a voz trêmula. — É a segunda vez que eles fazem isso.

— Precisamos chamar a polícia! — Já vou em direção a minha bolsa, mas ela me detém segurando em minha mão.

— Não adianta, são pessoas de poder, tem os políticos e até mesmo a polícia do lado deles. O prédio aqui é alugado...

Uma voz masculina vindo da entrada do restaurante chamou nossa atenção. É o filho dela que descubro chamar-se Anastácia.

Me ofereço para ajudar a arrumar o restaurante, mas eles decidem fechar, para no dia seguinte retirar tudo, afinal uma luta contra o grupo Vival seria em vão. Eu que o diga.

Era triste ver nos olhos daquela mulher a dor enquanto observava seu negócio destruído. Aquela imagem não saiu de minha mente enquanto estava no táxi indo até a empresa, no intuito de falar com Alexa.

A secretária acanhada me cumprimenta e informa sobre minha presença. Assim abro a porta da sala vejo ela que mantém a cabeça baixa com alguns papéis em mãos, me olha por cima da armação do óculos de grau e o retira rapidamente.

— A que devo essa repentina visita? Devo alertar aos seguranças para revista-la antes de sair? — Estreito os olhos encarando-a enquanto me aproximo.

Coloco minha bolsa sobre a cadeira ao lado e sento na outra diante dela que apoia os cotovelos na mesa, juntando as mãos a espera que comece a falar.

— É mesmo necessário que os donos de estabelecimentos próximos ao novo restaurante, além de despejados sejam intimidados de forma agressiva?

— Do quê está falando?

— Como assim do quê? Você não tem conhecimento do que o grupo Vival faz para conseguir poder?

— Eu sei do quê está falando, mas qual o objetivo de estar me dizendo isso?

— Eu quero saber qual a necessidade! Como vocês podem fazer algo tão cruel? — questiono, não escondendo minha total indignação.

Alexa suspira como se estivesse exausta. Não estressada ou chateada como de costume, diante de minha presença.

— Entenda, meu pai deixou a presidência devido alguns problemas que teve com a justiça e para não trazer prejuízo a empresa fingiu se aposentar colocando Eloise em seu lugar, mas a realidade é que ele quem administra tudo de longe. E essa é a forma dele lidar com as coisas. Não adianta você vir aqui me questionar sobre isso.

— Isso é um absurdo! Ele por acaso deseja dominar todo o dinheiro do mundo deixando as pessoas com menos condições para morrer de fome toda vez que inaugurar um novo estabelecimento? Praticamente todos os meses o grupo vival começa a explorar um ramo diferente...

— Katherine, por que você acha que nos casamos? Seu pai deseja os votos dessas pessoas e finge ajudá-los antes das eleições, mas é o primeiro a dividir seu poder com nossa empresa e agir contra elas. Parte do seu dote, digamos assim, é um terreno próximo a uma extensa área onde se concentram diversas lojas, restaurantes, entre outros estabelecimentos que serão descartados para construirmos um Shopping Center.

— Isso... Isso não é justo — murmuro para mim mesma.

— Nada na vida é justo. Não é o que dizem?  — Ela volta a pegar os papéis sobre a mesa. — Agora, se me der licença...

— Alexa? — chamo e ela volta a me olhar. — Nós temos mesmo que estar presente amanhã?

— Por mim você ficaria em casa, mas estamos casadas e o normal é que esteja a meu lado nesse tipo de evento. — Fico encarando ela um tanto desconfiada, observando que a forma de falar comigo havia mudado, parece menos grossa. — O que foi?

Movo a cabeça de forma negativa, dizendo que não é nada.

Saio da empresa ainda pensando naquela senhora que eu não poderia ajudar, até porque não estava em condições de ajudar nem a mim mesma, pois não tinha idéia do que poderia fazer para cancelar aquele evento.

Acabo voltando para casa de mãos vazias. Não estou com vontade de ir ao shopping depois de tudo aquilo. Quando chego encontro Emily que nem me permite entrar em casa, abre a porta do carro me convidando a dar uma volta e aceito porque desejo conversar com ela.

Minutos depois estamos no Central Park. Após estacionar o carro seguimos caminhando. O silêncio não é mais incômodo que o frio. O fraco vento que circula faz meu corpo arrepiar devido ao fato de minhas pernas estarem expostas, mas nada que me intimide e interrompa nossa caminhada até um banco onde sentamos.

— Sugiro que comece a falar antes que fique tarde e você congele — diz ela sem me olhar. — Sei que deseja perguntar alguma coisa.

— Por que você fez aquilo? — Vou direto ao ponto.

— Quem mandou você pegar o pendrive? Foi o Steve? — rebate me fazendo estreitar os olhos.

— Se você fez aquilo para conseguir tirar de mim a mesma resposta que sua irmã tentou ouvir a força, saiba que perdeu seu tempo. — Viro o rosto para outro lado.

Não vou me entregar.

— Me prejudiquei para salvar sua pele e assim que você me agradece? — Sorrio ainda com o rosto virado em outra direção.

— Eu não pedi nada, tampouco tenho algo a dizer. Não entendo porque fez algo tão estúpido.

— Estúpido? Eu não acredito que estou ouvindo isso depois do que fiz. Você é mesmo idêntica a Katherine.

Fico em silêncio remoendo aquelas palavras que soam como ofensa.

— Eu sei que não confia em mim e eu também não confio completamente em você — continua ela ao notar que não direi mais nada. — Mas não fiz aquilo apenas para saber a verdade. Eu queria tirar você daquela situação. Conheci o Leo, seu ex...

— O quê?  — pergunto rapidamente. — Você está me investigando?

— Óbvio. Ele me contou sobre você e não consigo imaginar que aquela pessoa que descreveu seja alguém capaz de tramar algo contra uma empresa. Você está fingindo ser outra pessoa, não seria tão idiota ao ponto de fazer aquela bobagem. Foi o Steve, não foi? Katherine tramou colocá-la em seu lugar e ele está se aproveitando disso para te usar a favor de seus interesses, não é?

Novamente não respondo, minha boca está lacrada quando se tratava daquele assunto.

— Como você conheceu a Katherine? — Mudo o assunto.

— Se eu contar você vai me dar ao menos uma resposta? — Ela arquea uma sobrancelha.

— Posso pensar sobre isso. — Por minha visão periférica noto ela sorrir.

— Nos conhecemos em uma festa de amigos em comum. Transamos e fiquei completamente apaixonada. Ainda eramos jovens, eu ingênua e ela já tinha uma personalidade assustadora. Katherine sempre preferiu ser livre, mas eu não sabia na época. Por algum motivo ela me escolheu para brincar, se aproveitando de meus sentimentos bobos, me mantendo presa a si por um tempo, mas me descartou como costuma descartar objetos. Satisfeita?

— Uau! — É tudo o que eu consigo dizer, surpresa ao saber que ela se envolveu daquela forma com a Volkmer.

— Agora me diga, Steve está se aproveitando de você? — Hesito, mas movo a cabeça confirmando. — Por que aceitou casar no lugar dela? Eu preciso entender isso.

— De que adianta saber? Não importa o motivo, agora eu sou a maior culpada.

— Até quando vai ficar permitindo que te usem? Sinceramente eu não me importo com o que aconteça com minha família ou a empresa, mas... Não destrua sua vida por pessoas que já tem tudo!

Suas palavras ficam rondando em minha mente, mas é tarde demais, não tem volta.

...***...

Passo a noite em claro pensando sobre a ameaça, Katherine com a garganta cortada e a possibilidade de eu ser a próxima.

Na manhã seguinte eu tenho olheiras e um medo absurdo do que pode acontecer, mesmo assim depois de muita maquiagem e um belo vestido, me acho bonita ao me olhar no espelho.

Caso morra estarei em meu melhor dia, ao menos no que diz respeito a aparência.

Alexa está tão bonita quanto no dia do nosso casamento, mas parece de mal humor, então mal trocamos algumas palavras e não tomamos café da manhã, saimos antes disso devido sua pressa.

No restaurante estão algumas pessoas importantes, a maioria políticos. Sou apresentada a todos enquanto aguardamos a imprensa chegar.

Estou nervosa, minhas mãos suam e estão geladas. Já tinha feito mais orações naquela manhã do quê durante toda a minha vida.

Quando já saimos em direção a frente do local para dar início a cerimônia em que Alexa cortaria a fita oficializando a abertura, ela segura minha mão e me olha surpresa ao sentir o quão fria está.

— Não ouse passar mal e estragar as coisas — diz em tom de ameaça.

— Obrigada por sua preocupação — falo entredentes.

Há uma considerável quantidade de pessoas, além dos vários repórteres. Nos posicionamos e começam os discursos. Alexa é a segunda a falar e enquanto estou a seu lado, incomodada pelos vários flashs das câmeras, algo reflete incomodando bem mais que elas. Estreito os olhos observando na direção em que veio o brilho, constatando que foi do alto de um pequeno prédio do outro lado da rua, onde o objeto volta a reluzir e meus olhos se estreitam desconfiando que há uma pessoa no terraço daquele edifício.

Imediatamente lembro da ameaça na mensagem e temo o que possa acontecer.

Aperto a mão de Alexa que me encara sem parar de falar. Aquelas ruguinhas surgem entre suas sobrancelhas. Volto a olhar para o prédio chegando a conclusão de que se realmente há alguém alí, não seria a troco de nada.

Sem me importar com o que as pessoas pensariam viro para sair segurando firme a mão de Alexa na intenção de levá-la comigo. Mas numa fracção de segundos Alexa aperta minha mão e quando viro, ela já está indo em direção ao chão. Ninguém entende o que está acontecendo até ver o sangue encharcando a blusa dela onde o tiro silencioso acertou.

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Comments

Silvia Galdino

Silvia Galdino

caramba

2022-11-01

2

Cleidiane Oliveira

Cleidiane Oliveira

A não cara ja a acabou agora que tava bom.

2022-10-04

2

Ver todos

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