17 • Escape

Alexa parece não acreditar que eu a trouxe até a pista de patinação do Rockfeller Center. Mesmo que tenha dirigido e seguido comigo até aqui, provavelmente achou que minha intenção era levá-la para jantar ou seja lá o que fosse, menos patinar no gelo.

A primeira coisa que ela disse ao parar olhando as pessoas alí foi "não vou fazer isso", mas eu não lhe dei ouvidos e arrastei ela para comprar os ingressos, mesmo não sendo fácil consegui-los sem encarar uma fila. Pedi então que ela desse um jeitinho usando a influência do nome das famílias, mesmo que naquele momento estivéssemos alí para esquecer, mas foi como se ela estivesse disposta a fazer tudo que eu pedisse, pois em poucos minutos já estávamos com os patins em nossos pés.

— Você realmente nunca fez isso? — pergunto ainda incrédula vendo ela segurar na lateral da pista com o medo estampado no rosto.

— Não tenho tempo e nem a coordenação necessária. — Ri dela que me olha feio e deslizo no gelo ficando a sua frente, também me apoiando na lateral.

— Como alguém que nasceu e criou-se em Nova York nunca saiu para patinar?  — Observo ela revirar os olhos. — Você conhece uma cidade chamada Thurmont? Ela fica localizada no Condado de Frederick e lá viveu uma velha amiga minha que sonhava vir morar em Nova York para aproveitar a magia do fim de ano que via nos filmes desde criança. Sabe qual foi a primeira coisa que ela fez quando chegou aqui? — Ela me encara ouvindo atentamente. — Pegar o suado dinheirinho que sobrou da passagem e do aluguel de seu apartamento e veio para essa pista de patinação onde caiu umas trinta vezes.

Alexa sorri e ri de mim mesma ao lembrar daquilo.

— E onde ela está agora? Tornou-se uma patinadora profissional para fazer valer o que gastou e todos os tombos?

— Ela vem caindo desde então, coitada, mas na pista de patinação é ótima, assim como eu. — Sinto que as cargas negativas ficaram para trás e me deram uma folga para aproveitar o tempo longe de preocupações

— Vem, eu te ajudo!

Seguro a mão dela.

— Cairemos juntas — alerta, mas reviro os olhos segurando sua outra mão, deslizando meus pés para trás devagar para que ela siga meu ritmo, mas a medrosa apenas se permite ser puxada.

— Confie em mim e mova seus pés, não me deixe puxá-la sozinha.

Ela me obedece, mas sempre olhando os próprios pés, amedrontada. Quando sinto que deve arriscar solto suas mãos e seu olhar me encontra.

Deixo Alexa para trás e deslizo pelo gelo.

Quando volto a me aproximar ela está parada exatamente onde deixei antes, me encarando. Seguro em sua mão e puxo, mas ela escorrega de repente e vai ao chão me levando junto. Caio sentada e ela de costas, ambas rimos, mas logo levanto estendendo a mão para ela que ao firmar os patins no gelo e ficar de pé me puxou pela cintura e meu coração vem na boca.

— Como posso esquecer aquilo se todas as vezes que você sorrir minha vontade é te beijar novamente? — Ela despeja a frase de repente.

— D-devo parar de sorrir? — Seus lábios se curvam em um sorriso contido, mas que logo abre iluminando todo o rosto.

— Sim, faça isso. — Acabo também sorrindo pela forma nada convincente que falou.

— Vamos tentar mais um pouco e depois jantar no restaurante? — Mudo de assunto me afastando um pouco mais e ela confirma.

Alexa leva jeito, por isso não demora a conseguir ficar sozinha, no entanto cai umas cinco vezes e em duas me leva junto. O clima ficou estranho depois de sua confissão. Eu sinto seu olhar diferente e consequentemente não sei mais como agir de maneira natural.

Lembro do dia de nosso noivado, mesmo que tenha reclamado de sua frase cafona e me envergonhado de toda aquela cena, eu não conseguia negar e só me restava assumir que naquele dia meu lado romântica falou bem alto e quase desejou que fosse real.

Aqui na pista enquanto sorrimos feito bobas, nossas mãos se mantendo juntas e as alianças em nossos dedos chamam minha atenção, desejo que seja real. Que eu fosse realmente a esposa daquela mulher e que ela tivesse me escolhido não por todos aqueles motivos absurdos que as pessoas em seu mundo costumavam casar, mas por sentimentos reais, pela vontade de compartilhar momentos como esse, a meu lado.

Sento-me uma adolescente boba, que sonha com histórias romanticas e acredita em finais felizes. Que acredita ser possível alguém como ela me perdoar e me aceitar sendo apenas eu, e juntas poderíamos construir uma relação.

Olhando para seu rosto, observando o sorriso e até mesmo a carranca de vez em quando, chego a conclusão de que corro o risco de me deixar envolver cada vez mais.

— Você não vai dizer nada sobre o que falei? — Quase engasgo com a comida ao ouvir aquela pergunta.

Estamos no Rainbow Room, o restaurante mais incrível que vi na vida e que tive o prazer de colocar meus miseráveis pés.

Como se não bastasse a vista à nossa esquerda ser de tirar o fôlego, Alexa também me tira do sério.

— O quê exatamente? — Meu primeiro pensamento foi que se referia a aquela frase na pista de patinação, mas não tenho certeza.

Ela baixa a cabeça segurando garfo e faca em mãos olhando o prato quase intocado.

— O fato de que não tenho coragem suficiente para contar o que sei sobre a mãe de minhas irmãs — diz.

Tomo um pouco de vinho, em seguida suspiro. Nossos olhos se encontram e sinto como se os dela buscassem algo em mim.

— Seria como jogar uma bomba naquela casa  — afirmo. Durante todo percurso até aqui, eu estive pensando sobre aquilo, tentando me colocar no lugar de todos, tanto dela quanto de suas irmãs e até mesmo Sebastian. — Entendo que não tenha coragem de entregar sua mãe Não vou julga-la.

Acredito que podemos guardar muito bem nossos segredos e os de outras pessoas, mas apenas durante um certo tempo. Uma hora eles vão escapar por entre as brechas e machucar todos os envolvidos.

— Você não acha que sou uma covarde egoísta e completa idiota? — questiona.

— Quem sou eu para apontar o dedo para você?

Quero dizer que sou uma idiota egoísta também, mas não sou capaz.

Terminamos o jantar conversando sobre o fato dela não costumar sair e não manter contato com os amigos da época de faculdade. Ficamos durante algum tempo apenas tomando vinho enquanto eu insisto em saber como foi sua vida universitária e tudo que ouço parece que está se referindo a outra pessoa, pois segundo sua descrição de si mesma, naquela época era uma jovem louca, muito animada que frequentava boates ao invés de estudar para provas.

— E quando você ficou assim, uma chata rabugenta? — pergunto brincando.

— Acredito que o trabalho na empresa e a pressão de minha mãe me modificaram bastante, mas eu não sou uma chata completa. Pare de me provocar. — Sorrio tomando um gole da bebida vendo ela olhar o relógio no pulso me fazendo lembrar de seu celular e o relógio em minha bolsa. — Vamos subir até o Top of the Rock?

Largo a taça com um sorriso de orelha a orelha.

— Você não imagina o quanto quero fazer isso — confessei não conseguindo conter minha alegria, afinal nunca havia ido além da pista de patinação do Rockefeller.

Alexa me surpreende por já ter as entradas e seguimos para o observatório que fica entre o 67° e o 70° andar do GE Building, um dos 19 edifícios comerciais que fazem parte do complexo Rockefeller Center. Onde somos agraciados pela exuberante vista de Nova York.

Retiro o celular da bolsa e agarro o braço de Alexa, nos virando de costas para a cidade. Ela ainda tenta recusar, mas insisto que precisamos registar aquele momento, então tiro duas selfies.

— A segunda ficou bem melhor porque você sorriu — comento. — Você tem um sorriso lindo.

Volto a colocar o celular na bolsa e quando levanto a cabeça Alexa me encara de um jeito estranho e temo que tenha visto suas coisas em minha bolsa quando abri antes. Um frio percorre minha espinha e não é devido ao clima.

— Não quero ir para casa hoje — fala retirando um peso de meu peito devido o medo que se apossou de mim apenas por aquele olhar indecifrável.

Quem deve teme a todo momento.

— Aah... — Sorrio meio boba, não entendendo o real significado daquela frase, mas fico séria quando ela pega uma de minhas mãos. — Então não vamos voltar.

Ela dá um sorriso enquanto puxa em meu braço me fazendo dar um passo a frente, ficando mais perto sem quebrar aquele olhar. Sinto sua outra mão na lateral de meu rosto e ela une nossas bocas, nossos corpos e talvez até nossas almas apenas ao mover seus lábios junto aos meus.

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Comments

Anne Jay

Anne Jay

Para desse jeito eu vou chorar

2024-05-05

0

Adriana Gomes

Adriana Gomes

bom demais

2023-07-21

1

Silvia Galdino

Silvia Galdino

aiiii que tudooooo

2022-11-01

1

Ver todos

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