A noite caía sobre a estrada, e o acampamento improvisado estava finalmente pronto. A fogueira crepitava suavemente, lançando sombras dançantes sobre os viajantes cansados. O cheiro do ensopado preparado por Tobias—ou pelo menos de algo que tentava ser um ensopado—espalhava-se pelo ar, desafiando as leis do olfato e da culinária.
No entanto, apesar do clima aconchegante, um peso invisível pairava sobre o grupo.
Lyra estava estranhamente silenciosa, os olhos fixos no vazio, como se estivesse vendo um drama trágico e intrincado que só existia dentro de sua mente.
E, como sempre, Felix não sabia lidar com o silêncio.
— Esse tipo de semblante não combina com você! — exclamou, espetando a lenha da fogueira com um graveto, como se isso fosse resolver o problema.
Lyra não respondeu. Apenas se levantou, pegou um balde e murmurou que iria buscar água.
Felix piscou, confuso.
— Tá, alguém pode me explicar por que ela está com essa cara de quem tomou uma poção estragada e só percebeu depois de engolir?
Grindor suspirou pesadamente, no clássico tom de quem estava prestes a revelar uma história sombria e cheia de sofrimento.
— Ah… conheço Lyra há cem anos.
— CEM?! — Magnus se engasgou com um pedaço do que deveria ser carne. — Isso significa que ela é mais velha que minha avó!
— Considerando que sua avó acredita que cobras são minhocas musculosas, talvez ela não seja a melhor referência. — Grindor revirou os olhos. — Mas o que importa é que quandona encontrei, ela era só uma menina solitária e perdida… porque não conseguiu invocar nem mesmo um espírito inferior.
Ele fez uma pausa dramática, olhando para as chamas.
O grupo ficou em silêncio.
— Isso é ruim? — Tobias perguntou inocentemente.
Vaelion bufou, cruzando os braços.
— Isso é o mesmo que nascer amaldiçoado.
Grindor assentiu.
— Ainda mais considerando o status da família dela.
Felix franziu a testa.
— O que tem a família dela?
Grindor ergueu os olhos, aumentando ainda mais a dramaticidade do momento.
— Eles são a realeza do Reino dos Elfos.
Seguiu-se mais um de silêncio absoluto.
Então, Felix, Magnus e Tobias gritaram ao mesmo tempo:
— O QUÊ?!
— Então Lyra é uma princesa?! — Felix arregalou os olhos.
— Não mais. — A voz cortante de Lyra interrompeu qualquer outra reação.
Ela havia retornado, carregando um balde cheio de água e com a expressão impassível. Mas seus olhos traíam um brilho de irritação.
Felix coçou a nuca, sem jeito.
— Lyra… desculpe, não queríamos…
Ela suspirou.
— Tudo bem. Uma hora vocês acabariam descobrindo. Afinal, estamos indo para aquele lugar de novo…
O grupo trocou olhares desconfortáveis.
Foi quando Vaelion, sempre um mestre da diplomacia, decidiu que aquele momento precisava de seu toque especial de idiotice.
— Bom, eu sempre soube que havia algo estranho em você, Lyra. Mas eu imaginava que fosse pelo seu péssimo humor e sua falta de classe, não porque você é da realeza.
Houve um instante de silêncio tenso.
E então…
PAF!
O balde de água voou direto na cara de Vaelion, encharcando-o da cabeça aos pés.
— MAS QUE DIABOS?! — ele berrou, cuspindo água e piscando freneticamente.
Lyra, com a serenidade de uma deusa vingativa, cruzou os braços.
— Ah, me desculpe. Minha mão escorregou.
O grupo explodiu em gargalhadas. Até mesmo Tobias, sempre contido, estava se segurando para não cair no chão de tanto rir.
Vaelion, por outro lado, estava furioso, tentando espremer a água de sua túnica.
— EU JURO QUE VOCÊ ME PAGA, SUA ELFETE!
Lyra apenas sorriu, vitoriosa.
E assim, a tensão da noite se dissipou—substituída por resmungos de Vaelion e um agradável ar de normalidade.
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Na manhã seguinte…
O sol mal havia nascido quando o grupo desmontou o acampamento e retomou sua jornada rumo ao Reino dos Elfos.
Felix, ainda meio sonolento, esticou os braços e soltou um longo bocejo.
— Então… alguma teoria sobre o que pode ter acontecido para os elfos pedirem ajuda da Guilda?
Lyra ajeitou a capa e olhou para o horizonte.
— Se minha irmã realmente pediu auxílio externo… algo muito grave deve estar acontecendo. Elfos são orgulhosos e não costumam pedir ajuda de humanos.
Felix assentiu, pensativo.
— Então é algo grande o bastante para precisar de nós?
Vaelion, ainda emburrado e ligeiramente úmido, resmungou:
— A única coisa que eu sei é que "Asas de Couve-Flor" não combina nem um pouco com uma missão diplomática no Reino dos Elfos.
Lyra sorriu, fingindo inocência.
— Melhor do que Asas de Vaelion Molhado. Ou talvez Vaelion, o Fedorento.
Felix segurou o riso enquanto Vaelion bufava, ainda irritado.
E assim, entre piadas e suspeitas, o grupo continuou sua jornada.
Felix não sabia exatamente o que os esperava no Reino dos Elfos.
Mas uma coisa era certa:
Seria um desastre glorioso.
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Atualizado até capítulo 44
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