Sob o Domínio da Máfia
Preciso que vocês entendam alguns fatos antes mesmo de saber pelo que estou passando, pois muitas das coisas que na época pareciam irrelevantes hoje fazem total sentido na minha vida. Lembro da primeira vez que vi uma arma diante dos meus olhos, os falatórios e gritos ao meu redor, Ava chorava de modo desesperador, ela era dois anos mais nova que eu. Até hoje não entendi muito bem o que havia acontecido ali, parecia ser como tantos outros jantares da nossa família. No entanto, não foi como o esperado. Me chamo Emma Collins, sou filha mais velha do caçula do meu avô, o pilar da nossa família.
O dia em questão foi normal como todos os outros, no inverno dos meus oito anos de idade tinha plena convicção de tudo o que queria, fui criada assim, mesmo não sendo a neta mais nova fui criada como tal, rodeada por mimos e paparicos por quase todos da minha família.
Todas as manhãs, minha mãe sempre falava a mesma coisa ao entrar no meu quarto, quando o sol ainda se escondia por trás dos grandes salgueiros e carvalhos que rodeavam a propriedade.
— Vamos, minha princesa, o mundo precisa de você para se alegrar. — Ela beijava minha testa e afagava meus cabelos.
— Bom dia, mamãe! — Espreguiçando, procurava por seu abraço caloroso e reconfortante.
— Hoje você precisará ir a um jantar junto com seu pai — ela levantou, deslizando sua mão de modo suave pela minha perna — então preciso muito que somente hoje você seja uma boa menina. O que me diz, Emma?
Parada com a mão na cintura e o rosto levemente curvado, ela me encarava com seus olhos grandes e castanhos.
— Sim! — Revirei os olhos. — Mamãe, serei uma boa menina. — Levantei-me de forma rápida e corri até ela, envolvendo-a em meus braços. — A senhora também vai conosco?
— Sabe que não, princesinha... — acariciando meu rosto, ela ficou triste.
— Não entendo...
Antes mesmo de concluir minha fala, outra voz sobrepôs a minha.
— Sua mãe entende o lugar dela na família! — Com o timbre grave envolto pela sonolência, disse meu pai. — Bom dia, Bananinha! — Sorriu com os olhos fechados.
— Bom dia, papai! — lancei-me em seus braços — o que isso quer dizer?
— Quer dizer, minha boneca, que sua mãe entende como funciona a singularidade da nossa família, só assim poderemos ser uma estrutura sólida. — Ele se abaixou, ficando de joelhos na minha frente — Você passará a entender isso essa noite...
— Não fala desse jeito com ela, Sebastian! — minha mãe o puxou para cima — ela vai entender com o tempo.
Meu pai a abraçou segurando entre seus cabelos, eu comecei a rir e sair do quarto, odiava quando eles se beijavam, era muito estranho naquela época, acho que naquele período tudo era estranho, pois tudo à minha volta estava se moldando.
Passei o dia todo brincando com Maya, ela é minha melhor amiga depois do London, a cenoura ambulante e chata com quem sempre tive uma atração descomunal, o conheço a vida toda.
A noite caiu mais rápido do que o habitual, a neve se acumulou no parapeito da janela, tivemos um inverno rigoroso naquele ano.
Nunca soube do que esperar desses jantares, sempre alguém saía magoado. Essa parte da minha vida ainda era um completo mistério para mim.
Minha mãe me vestiu com um vestido azul-claro horrível, cheio de babados, uma meia-calça branca, bordada com várias estrelas, e um sapato igual ao de bonecas, da cor preta. Bem apresentável, com os cachos presos em duas tranças que faziam uma espécie de coroa na minha cabeça, estava parada ao pé da escada, sentindo o vestido pinicar.
Quando papai desceu trajando um terno cinza que combinava com a cor dos seus olhos, não entendia do que iriam tratar no jantar, mas todas as vezes que ele usava o color com o brasão da família sabia que passaria a maior parte do tempo ao lado dos meus primos do que de fato com ele. Não via problema nenhum nisso, eu amava meus primos.
Finalmente entramos no carro e o motorista seguiu para a casa do meu avô, ele morava no centro da cidade em uma cobertura dona de uma vista invejável.
O caminho foi chato e sem graça, odiava andar no carro por muito tempo, e papai foi todo o percurso de cabeça baixa, antecipando a tragédia que viria a seguir, deixando o clima mais sufocante que aquele vestido ridículo.
Dei graças quando entramos na garagem do prédio onde meu avô residia, descemos do veículo, o motorista ficou no carro, enquanto meu pai segurava firme a minha mão e andávamos em direção ao elevador.
Papai apertou o botão, as portas se abriram revelando dois homens com ternos pretos, umas cordinhas encaracoladas nas orelhas que lembravam muito o fio do telefone, seguiam de olhar fixo e apático.
— Boa noite, senhor Sebastian — os dois rapazes disseram em uma sincronia perfeita.
Meu pai apenas entrou e permaneceu em silêncio, o que me incomodou um pouco, pois eles sempre me diziam para ser educada com as pessoas, independente de quem fosse.
— Papai, eles disseram boa noite, o senhor não vai responder nada? — puxei a manga do seu paletó.
— Bananinha! — Ele sorriu, com as sobrancelhas erguidas. — Boa noite, senhores. — Olhando de relance para os dois, papai sorriu outra vez para mim. — Satisfeita?
— Sim! — Balançando para frente e para trás, movia sua mão no mesmo ritmo.
Alguns minutos depois, as portas se abriram diante de uma enorme sala, onde havia mais alguns homens espalhados, olhavam para o meu pai e apenas acenavam com leveza a cabeça. Passamos pela primeira porta dupla de cor marfim. Dessa forma surgiram os meus tios em pé conversando, com copos, charutos ou cigarros nas suas mãos.
— Meu amor, ali estão seus primos, procure o Ben ou James e fique com eles, entendeu?
Meu pai olhou para mim e soltou minha mão. Virei de costas para ele e corri em direção àqueles olhos azuis, que se retorciam igual à sua boca fazendo careta para mim, com os braços abertos, me joguei em seu colo.
— BEN! — O abracei fortemente. — Quando você voltou?
— Ontem, Bananinha, você está tão bonita, uma verdadeira princesa — Ben se afastou, olhando em meus olhos.
— Não estou não, esse vestido coça e é horroroso! — bufei, cruzando os braços. — E estou com dor de cabeça com o meu cabelo preso desse jeito!
— Se está dizendo — ele levantou e estalou os dedos — arrume outra roupa para ela e solte seu cabelo, a minha princesinha não está se sentindo bem assim.
A empregada que olhava apenas para o chão confirmou com a cabeça e saiu da sala.
— Benjamim precisa parar com isso! — Uma voz forte me fez estremecer. Olhando, vi tio Elliot.
— É mais forte que eu, e não se preocupe, Emma sempre será minha prioridade — Ben olhou para nosso tio e me segurou junto dele.
— Sabe muito bem que ela não é uma boneca de porcelana, não sabe, Benzinho?
Durante a minha infância inteira tive medo do tio Elliot, ele é alto, passa de dois metros de altura, tem a mesma cor de olhos que Ben, um azul profundo, mas que nunca transmitiu bondade, sempre que olhava para ele um enorme calafrio subia por todo o meu dorso.
Respirei aliviada quando ele se afastou lentamente para junto do meu pai e dos outros tios. Como pedido, a moça trouxe um vestido mais leve da cor rosa, com algumas flores em sua saia. Ela me levou para um quarto, onde me ajudou a trocar de roupa e desfez as tranças, permitindo que o alívio percorresse todo o meu corpo. Ao retornar, todos se encontravam sentados na grande mesa de jantar, ouvindo atentamente o que meu avô dizia.
De maneira furtiva, sentei ao lado do meu pai e de Ben. Ajeitando-me sobre a cadeira, ouvi os falatórios iniciarem como uma grande discussão.
— Isso é inadmissível, pai! — Tio Sean esmurrou a mesa ao falar.
— Calado! — ordenou tio Elliot.
— Calado? Todos os nossos filhos passaram por isso, o que ela tem de especial? Minha filha está sendo criada para ser herdeira como a Charlotte e a Sarah, isso não é justo, pai!
Tio Sean seguia alterado.
— Já tomei minha decisão — meu avô olhou em minha direção e me chamou com as mãos — Emma vai ser criada de uma forma diferente de todas as outras mulheres da nossa família.
Estava com medo, mesmo assim me aproximei, o vovô acariciou minhas bochechas.
— Está muito bonita hoje, minha princesa! — Ele afagava minha cabeça. — Não estou pedindo permissão, vocês estão sendo informados de que ela não vai saber de nada. — Ele retornou o olhar para a mesa. — Descobri algo hoje que me fez mudar de ideia, nem Emma nem Ava serão criadas para serem herdeiras de ninguém. Agora os meninos vão seguir com os seus treinamentos, nada vai ser alterado nessa parte, fui claro?
Era possível ouvir apenas os gelos se desfazendo nos copos.
— Isso é uma palhaçada do cão, não sou de acordo! — Bradou tio Oliver.
Ao dizer isso, fez tio Elliot se alterar, ele levantou do seu lugar tomado em fúria, ao se afastar da mesa, a cadeira caiu, fazendo todos olharem para tio Oliver. Tio Elliot então foi até o irmão e, de maneira fugaz, o vi puxar uma arma de dentro do paletó e enfiar na boca de tio Oliver. Levando todos a voltarem a discutir, Ava começou a chorar, algo me sufocava, apertei meu avô e escondi meu rosto sob o pescoço dele.
Os falatórios ficaram maiores, não conseguia mais distinguir quem falava, de uma forma repentina senti alguém me puxar de perto do meu avô, levou-me no colo até uma outra sala, quando abri os olhos vi Ben, deslizando sua mão nas minhas costas.
— Vai ficar tudo bem, Bananinha, eles só estão resolvendo alguns problemas, está tudo bem!
Não queria chorar, mas foi o que fiz depois de ouvir Ben, chorei por longos minutos, até esquecer por qual motivo estava chorando.
Após esse evento, voltamos para a sala de jantar onde todos comiam e bebiam como se nada tivesse acontecido, como se aquilo tivesse sido apenas fruto da minha imaginação. Mal sabia que aquilo era o habitual da família amorosa em que cresci.
Não consegui comer quase nada, apenas observava os presentes à mesa conversarem normalmente. A sobremesa foi servida, uma massa folheada com um creme delicioso de mirtilos.
A reunião terminou, meu pai se despediu de todos e voltamos para casa. Antes de entrarmos nos grandes portões trançados de ferro, papai pediu para o motorista parar o carro e sair.
— Emma, — ele olhou em meus olhos — não conte para sua mãe o que aconteceu, tudo bem? Se ela perguntar, diga apenas que o vovô decidiu que você será criada diferente.
— Diferente como papai? — funguei, olhando em seus olhos levemente vermelhos.
— Ela vai entender, mas só diga se ela perguntar algo a você. Pode fazer isso pelo papai?
Balancei a cabeça confirmando, desse modo ele mandou o motorista entrar e seguimos para dentro de casa.
Minha mãe fez mais questão de saber por qual razão eu havia trocado de roupa e soltado o cabelo do que aconteceu no jantar. Após alguns minutos, ela me pediu para tomar banho e vestir meu pijama. Terminando o banho com o meu pijama favorito da Cinderela fui até o quarto deles desejar boa noite, a porta encontrava-se entreaberta.
Parada de cabeça baixa, ouvi os dois terem uma conversa mais acalorada.
— Me conta a verdade, eu não vou me chatear! — Papai apertava os braços da mamãe.
— Sebastian, eu juro a você, não sei de nada, depois de dez anos você ainda desconfia de mim? — Conseguia ver minha mãe chorar.
— Não é questão de confiar, Helena, mas me diga, ele fez alguma coisa com você?
A voz do meu pai era uma fusão de medo e raiva.
— Já disse que não! —Ela o empurrou.
— Não faça isso, não vê que esconder de mim só vai piorar a situação?!
Papai a seguiu e a segurou contra a parede, não me contive mais e abri a porta com rapidez.
— Pai? — Minha voz tremulava.
Ele virou-se em minha direção e forçou um sorriso.
— Oi, Bananinha — se aproximou — está tudo bem!
Ele ficou na minha frente, mesmo assim conseguia ver minha mãe enxugando as lágrimas.
— Vou colocar ela para dormir, — mamãe segurou na minha mão — diga boa noite ao seu pai.
Com os olhos perdidos, vi a fúria do meu pai dissipar-se aos poucos.
— Boa noite, papai.
— Boa noite, bonequinha, vejo você amanhã! — Ele beijou o topo da minha cabeça e se virou em direção ao closet.
Caminhando para o meu quarto, remoía o que estava realmente acontecendo, nunca vi meu pai falar alto com a minha mãe, quanto mais brigar, aquela era a primeira vez que presenciava algo daquele tipo.
Enquanto minha mãe me aninhava sob as cobertas, enrolava os dedos entre seus cachos.
— Mamãe? Você e o papai vão se separar? — olhava para os meus pés balançando sob as cobertas.
— De onde tirou isso, meu amor? — Ela alisava os lençóis.
— Vocês estavam brigando...
— É assim mesmo, minha vida, não se preocupe, amo você, e eu e seu pai nunca vamos nos deixar!
Mamãe me deu um beijo de boa noite e desligou as luzes. Mesmo depois dela ter tentado me confortar, eles não pararam de brigar. Meu quarto não era tão distante do deles e dava para ouvir meu pai gritando com ela.
Fiquei com um extremo medo, pois lembrei da arma do tio Elliot, e se meu pai tivesse uma também? Com os nervos exaltados, peguei a caderneta de anotações ao lado da mesinha de cabeceira, procurei o número de Benjamim e liguei no mesmo instante.
— Alô? — Sua voz era serena e grave, parecia que estava sussurrando.
— Ben? — cochichei.
— Bananinha, o que aconteceu? Está tarde, seus pais estão bem?
Ele ficou mais apreensivo.
— Eles não param de brigar...
— Quem? — Sua respiração ficou audível.
— Meus pais...
— Chego em cinco minutos, vai para fora da casa e me espera no jardim, você entendeu?
Murmurei um sim baixo e desliguei o telefone, olhando para o relógio ao lado do aparelho, contei os números até conseguir decifrar que eram 2h da madrugada e eles seguiam discutindo.
Nas pontas dos pés, deixei o quarto e corri para fora da casa. Quando um dos seguranças me viu, foi em minha direção.
— Senhorita, está frio, por qual motivo veio para fora uma hora dessas?
— Estou esperando o Ben! — disse, com os lábios tremendo.
— Fique do lado de dentro quando o segundo pilar chegar, eu lhe aviso.
— Quem? — espremi os olhos e curvei a cabeça.
— Quando o senhor Benjamim chegar, você vai saber! Entre.
Ele abriu a porta e inclinou a cabeça, fazendo um sinal para que eu entrasse.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 36
Comments
Jhay_Focas
Parece que todo mundo chama ela desse apelido doido
2025-04-04
1
Jhay_Focas
Agora me diz: como as outras são criadas?
2025-04-04
1
Lucas Cardoso
achei que ia rolar um baita tiroteio kk
2025-04-03
1