Capítulo 9

Isso me deu a confirmação: eles precisavam de mim. Isso ia ser interessante.

Fui até a janela e percebi que havia grades nela. Coloquei minha mão sobre as barras, sentindo-as frias e firmes, mas com a convicção de que esse jogo mudaria minha sorte. Eles achavam que estavam no controle, mas eu sabia que tinha a oportunidade de virar o jogo a meu favor.

Depois de um tempo ali, a porta se abriu e uma empregada entrou, acompanhada de um guarda, trazendo uma refeição. Olhei para o relógio e notei que o sol estava quase no meio do céu, ou seja, já era quase meio-dia. Estavam entregando meu almoço.

Mas tudo isso parecia pouco para uma prisioneira.

Logo em seguida, o príncipe Reagar apareceu, já falando:

— Não se acostume, lixo. O rei está te tratando assim por pura conveniência.

Ele cruzou os braços, olhando-me com desdém.

Eu quase dei um sorriso. Era óbvio que estavam precisando da minha ajuda, então não precisavam ser tão formais, não é?

Respondi, pegando o prato de sopa e o pão:

— Que conveniente para mim, não é?

Mastiguei o pão com calma, provocando-o de propósito. Já estava cansada de fingir para essa gente.

Eu precisava aproveitar cada oportunidade que surgisse, e aquela refeição, por mais simples que fosse, era um verdadeiro presente. O aroma quente e acolhedor do caldo subiu até meu rosto assim que aproximei a colher dos lábios. O sabor era suave, levemente salgado, e esquentava meu corpo de dentro para fora, trazendo uma sensação de conforto inesperada. O pão, crocante por fora e macio por dentro, desmanchava na boca, absorvendo o caldo e realçando seu gosto.

Cada mordida era uma pequena vitória, uma pausa no jogo perigoso que eu estava jogando. Por um instante, esqueci onde estava, apenas me entreguei ao prazer simples daquela refeição. Quando percebi, o prato já estava vazio, e uma sensação de satisfação preenchia meu peito. O quão irônico era saborear algo tão trivial depois de anos de privação?

Passei a língua pelos lábios, absorvendo os últimos resquícios do caldo, e então deixei o prato de lado. Eu não podia esquecer: cada momento contava, e até o prazer de uma refeição poderia ser parte da minha estratégia.

Derrepente a porta da sela abri bruscamente, um olho intenso me encara e o Primeiro príncipe Reagar, eu o enguinorei.

Já que a oportunidade estava batendo à minha porta, eu precisava aproveitar.

Encostei-me na cadeira, passando os dedos suavemente pelo tecido grosseiro da minha roupa, sentindo a textura áspera contra minha pele. Meu estômago estava aquecido pela refeição, e por um breve momento, permiti-me esse conforto. Mas logo a realidade me puxou de volta. Eu ainda era uma prisioneira, ainda estava à mercê do rei e seus planos.

Ergui os olhos para Reagar, que me encarava com aquele ar de superioridade irritante. Ele cruzava os braços, como se estivesse esperando que eu dissesse algo inadequado para ter um motivo para me ridicularizar. Quanta insegurança.

Abaixei o olhar para o prato vazio e então o empurrei levemente para frente, como se estivesse saciada não só de comida, mas também de sua presença.

— Então, príncipe, o que o traz aqui? Veio me lembrar novamente de como sou descartável? Ou está curioso para ver como um ‘lixo’ se alimenta?

Minha voz saiu suave, quase provocativa, e vi sua mandíbula se contrair. Reagar não gostava de ser desafiado, isso estava claro.

Ele se aproximou um pouco, inclinando-se para que sua sombra pairasse sobre mim.

— Você pode ser útil agora, mas não significa que será para sempre. O rei pode mudar de ideia a qualquer momento.

Inclinei a cabeça para o lado, fingindo considerar suas palavras.

— De fato, majestade, mas... isso não vale para todos nós?

O brilho de irritação em seus olhos me deu a certeza de que eu estava no caminho certo. Sim, eu era uma peça naquele jogo, mas isso não significava que eu não pudesse movimentar as peças ao meu favor.

Eu estava no caminho certo. O rei queria minha ajuda, e pelo visto, era um jogador nato, alguém que dominava o jogo da astúcia. Mas eu não podia deixar transparecer que, no fim das contas, minha única intenção era me livrar desse maldito colar e desaparecer desse reino para sempre.

O príncipe Reagar se aproximou lentamente. Se ele não fosse tão absurdamente bonito de perto, talvez eu o odiasse ainda mais. Seu olhar era afiado, analisando cada detalhe meu antes de dizer:

— Sei que a serpente espera pacientemente antes de dar seu bote.

Droga. Ele desconfiava de mim. Claro, todos ali desconfiavam, mas Reagar parecia saber exatamente o que eu planejava: fugir. Ainda assim, mantive a compostura e respondi com a mesma astúcia:

— Mas é claro que a serpente espera, príncipe. Ela analisa minuciosamente se sua presa vale o esforço. — Inclinei a cabeça, encarando-o diretamente. — Quando um animal como esse já é odiado por natureza, você acha que ele vai ter pena de suas vítimas?

Vi em seus olhos que ele entendeu a referência. Ótimo. Exatamente como eu imaginava. Eles me desprezavam, me viam como um monstro, mas se eu esfregasse isso na cara deles, logo se vitimizariam, se fazendo de injustiçados. Patético.

Meu mestre sempre dizia: "Pérola, no campo de batalha todos estão dispostos a matar com suas espadas, mas quando saem da guerra e alguém os confronta com isso, se fazem de vítimas, alegando que não tinham outra opção."

E ele estava certo. Guerreiros eram hipócritas.

Reagar me olhava fixamente, como se quisesse decifrar cada centímetro de mim. Então, de repente, ele se aproximou ainda mais.

Não esperava esse movimento. O ar entre nós ficou denso quando ele murmurou, cheio de raiva:

— Para uma assassina, você é bela demais.

Havia tanto ódio em sua voz que parecia que meu rosto era, de alguma forma, uma afronta para ele.

Ele se virou para sair, mas eu não deixaria isso passar.

— Pena que, no seu belo rosto, só vejo raiva e desdém.

Ele fez um ruído irritado com a boca e saiu sem olhar para trás.

Sorri de leve. O jogo estava apenas começando.

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