capítulo 19

— Me desculpe, eu não deveria… — gaguejou timidamente.

— Está tudo bem, não é sua culpa. Pelo que percebi, todos admiram Edgar, me pergunto se haveria essa mesma admiração ao meu irmão. 

— Certamente ele seria um ótimo rei.

— Ou talvez não. Diga com sinceridade, qual a opinião do povo sobre Edgar?  — era perceptível o receio da criada e não foi necessário que ela dissesse mais nada. Todos adoravam Edgar, bem como também tinham medo dele. Ela soube pelos rapazes que faziam entrega para os cozinheiros e sempre traziam novidades do populejo — um olhar diz mais que mil palavras. 

— Alteza, me desculpe, não deveria ter comentado nada sobre o seu irmão ou o rei.

— Não há razão para se desculpar. As coisas são como são — respondeu num sorriso suave — eu que lhe devo desculpas por dizer palavras tão duras, apenas me sinto desgostosa do rumo que as coisas tomaram. A propósito, ainda não sei o seu nome — comentou tentando suavizar a conversa.

 — Ah, meu nome Neri. Sempre que precisar de ajuda, pode contar comigo.

— Muito obrigada Neri, também me coloco à sua disposição.— Elise respondeu ternamente — há quanto tempo trabalha no palácio?

— Faz alguns anos. Lembro que entrei na época em que seu irmão completou quatorze anos, houve uma festa enorme e muito bonita — recordou com um olhar sonhador e distante. Embora houvesse se passado alguns anos, Neri recordava-se com clareza o grandioso baile em que reuniu uma quantidade numerosa de nobres de todo o reino, mas certamente não se comparava ao grande festejo de quando George atingiu a maioridade. Dias de festa e alegria preencheram o reino com uma sinfonia ruidosa de festividade e felicidade se alastrando por toda a capital.

— Georgina sempre organizou festas grandiosas. Ela sempre teve um cuidado especial quando se tratava das festas de George, ela dizia que podia ser em um desses bailes em que ele encontraria a mulher de sua vida. Pena que isso nunca aconteceu — apesar do comentário trivial, a princesa observou o semblante pálido de Neri — você está bem Neri? Parece pálida — observou, se aproximando mais da criada que recuou alguns centímetros e abriu um sorriso forçado para tranquilizá-la.

— Estou ótima, é apenas o calor.

— Então por que não sai um pouco? — Elise sugeriu gentilmente, mas a empregada apenas negou rapidamente.

— Não posso abandonar minha tarefa assim. Seria punida — Elise assentiu em silêncio, sentindo pena das criadas que eram severamente exploradas e punidas. Jamais imaginou que algo assim aconteceria no interior do palácio. E por que se preocuparia? Ela era uma nobre. As únicas coisas que precisava se preocupar era aprender etiqueta e diplomacia, se preparando para um casamento arranjado, isso se ela não se rebelasse para entregar o seu amor ao Godfrey. Enquanto ruminava tais pensamentos, uma ideia surgiu em sua mente. Ela se virou para Neri:

— Me recordo de que ainda não servi o desjejum do rei. Talvez poderíamos trocar de lugar e você servi-lo. O que acha?

— Servir o rei? — repetiu com os olhos esbugalhados e, em seguida, negou veemente — sou de um cargo muito inferior para servir a refeição real.  

— É apenas entregar um prato ao rei. Não é nada que exija alta habilidade. Eu mesma consigo fazer isso — disse num tom leve e descontraído, contudo Neri disse seriamente :

— Somente as empregadas de alto nível podem servir diretamente os nobres. Geralmente são filhas de casas menores ou de famílias com algum prestígio. Eu sou uma órfã e já fui pedinte, jamais serei digna de servir o rei — a voz de Neri estava baixa e trêmula. Enquanto explicava a situação, tinha os olhos voltados para a peça de roupa em suas mãos a qual esfregava diligentemente, uma tentativa de disfarçar o seu abalo ao relembrar o passado doloroso.

Elise comprimiu os lábios sentindo pena da empregada. Vivendo em uma bolha, jamais poderia se passar em sua mente o que acontecia além dos muros no palácio. Sua vida se resumia apenas nas intrigas da corte e nada mais. Era óbvio que havia miséria no mundo, mas ouvir alguém dizer sobre tais vivências, vivências essas da qual passou diretamente, lhe causava certo mal estar.

— Lady Charlote pediu que limpasse esse vestido enlameado e o deseja tal como novo — a criada ruiva surgiu interrompendo o seu momento de reflexão, lhe entregando um vestido branco enviado com terra esmagada na saia longa. Havia sido proposital.

Elise não se opôs às ordens recebidas. Ela era uma empregada, afinal. Certamente aquilo seria sussurrado aos ouvidos de sua mãe e de seu irmão e certamente Edgar ficaria mais do que satisfeito. Ainda assim, era difícil aceitar de bom grado aquela situação. Todos estavam se deleitando com sua queda.

Elise nunca foi muito bem quista pela corte, não pelos maus modos ou indiferença. Sua natureza tímida e sempre controlada a impedia de criar proximidade com qualquer um que não fosse sua família. O único que tinha conseguido acessar o seu coração e conquistar sua amizade havia sido Godfrey, o menino cavalariço de modos simples, mas de grande coração.

— Acho que precisará de algum produto para remover essa mancha, nenhum sabão conseguirá remover isso — Neri disse, observando o tecido atentamente — isso se existir algum produto. Por que Lady Charlotte não descarta o vestido e compra outro? Isso daqui não tem salvação.

— Não se intrometa nisso, Neri — a empregada ruiva sibilou para a rival.

— Por que dificultar o trabalho dela? Ela é nova aqui e nenhuma empregada experiente conseguirá salvar esse vestido, você sabe disso — argumentou desafiadoramente.

— Lady Charlote exigiu que ela limpasse o vestido com muito cuidado, sem usar qualquer produto para não danificar o tecido — respondeu atravessada.

Elise comprimiu os lábios, mas não respondeu ou interviu entre a conversa. Não tinha voz naquele antro de serpentes. Apenas colocou todo o seu esforço na saia manchada de terra.

— Se não conseguir tirar a mancha vai receber chicote nos dedos para aprender a limpar o vestido melhor.

— Eu aprenderia se recebesse instruções apropriadas e não chicote. E se minhas mãos forem danificadas, não poderei servir ao rei — respondeu suavemente, os olhos ainda voltados no vestido.

— Tem razão, nesse caso enfiarei o seu rosto nessa água suja — anunciou com um sorriso cruel em seu rosto.

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Comments

Paola

Paola

Essa mulher não sossega não?

2025-03-10

0

Paola

Paola

Tô achando meio suspeito

2025-03-10

0

Ver todos

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