capítulo 5

Era o primeiro dia que Edgar realizava a audiência como o novo rei de Lindore. Não era de seu feitio estar sempre acompanhado de homens de armaduras, nobres correndo atrás de seus favores e, principalmente, usar um item tão luxuoso e pesado como aquela maldita coroa de ouro maciço. De todo modo, mostrou-se insustentável agir como tirano logo no segundo dia quando assuntos burocráticos tomavam o seu tempo. Não poderia deixar o reino à própria sorte.

Ele se detestava por isso. Seria tão mais fácil ignorar tais questões como todos os outros duques do norte.

Por eras, raramente ou quase nunca os lordes que governaram o norte se entrosaram com as outras famílias do reino. Sua presença só era vista em eventos grandes e especiais, como a coroação de um monarca ou a morte deste. Afora isso, optaram por se isolar em suas terras e se manterem ocupados em suas próprias questões, como as guerras constantes com bárbaros que ora ou outra tentavam adentrar no território e instaurar caos.

Edgar se viu sentado no trono estofado, escutando entediadamente o arauto anunciar as questões que deveria tratar no dia. Todas eram insignificantes ao seu ver, mas ainda assim tentou resolvê-las com justiça.

— Você roubou a minha vaca.

— Como pode dizer isso se não há provas?

— Há tempos venho pedindo para que construa uma cerca para delimitar o nosso território, mas você nunca o fez….

— Já chega — Edgar interrompeu a briga massageando a têmpora. Não podia acreditar que perdia tempo com aquilo — lhe darei uma nova vaca e os dois devem construir a cerca juntos. Podem se retirar — os homens se curvaram, agradecendo pela decisão justa e sábia do rei, despejando elogios e mais elogios. Edgar os dispensou com a mão para que se retirassem rapidamente, em seguida virou-se para o arauto — quantos mais tem na fila?

— Cinquenta, majestade.

— Existe algum problema de fato relevante? Ou trataremos apenas sobre galinhas e vaquinhas? — o homem pareceu envergonhado e olhou na sua lista. Passou-se alguns minutos e então ele se voltou timidamente para o rei:

— Não, majestade. São situações similares a essa — Edgar soltou um suspiro profundo.

— Isso toma muito de meu tempo. Não há ninguém nomeado pelo antigo rei que trata desse assunto?

— O falecido rei sempre preferiu atender a população mantendo um contato direto…

— Com qual frequência? — interrompeu impacientemente. Detestava enrolações

— Sempre que os procurassem, majestade.

— Faremos uma mudança a partir de agora. Irei nomear um juiz local que tratará dessas questões pequenas e a cada quinzena poderão contestar a decisão do juiz diretamente comigo. O reino é grande e não posso dispor metade de um dia para tratar de questões triviais — Edgar se levantou de seu trono e virou-se uma última vez para o arauto — mudança valerá a partir de hoje. O ministro da justiça será responsável por nomear o juiz local — e sem delongas ele deixou o salão do trono para trás.

Edgar entrou em seu escritório e de imediato se deparou com a presença de Elise recostada em uma poltrona entretida com uma leitura qualquer. Ela não pareceu notar sua presença e ele não se preocupou em anunciar sua entrada. O rei ocupou o seu assento na escrivaninha e procurou pelos pergaminhos e relatórios. Ele remexeu algumas gavetas até ouvir a voz suave de Elise:

— Os relatórios estão guardados no armário à sua esquerda. Deixei separado por assunto e relevância — Edgar a encarou com espanto. Não imaginava que teria o escutado entrar e muito menos que o ajudaria com os documentos — gostaria de um chá? — indagou, abaixando o livro para encará-lo com seus olhos grandes e curiosos.

— Eu prefiro um vinho. Tinto — especificou, indo de encontro aos documentos — a propósito, obrigado por me ajudar com os documentos — acrescentou, quase se esquecendo de agradecer o favor. Elise lhe lançou um sorriso caloroso e então saiu da sala em busca do vinho solicitado.

Desde a conversa em que firmaram a aliança, a princesa se mostrou muito mais compreensiva e até mesmo gentil. Edgar se sentia curioso a respeito da mudança brusca do tratamento recebido, mas era inegável o seu apreço pelo tratamento suave e doce. Era um verdadeiro alívio momentos como aquele em que recebia um pouco de gentileza e amistosidade sem se preocupar com as segundas intenções.

Sua mente com divagações rapidamente ficou entretida com os documentos que lia e assinava. Novamente, notou que eram questões triviais, sempre voltadas à administração do palácio, distribuição de recursos e nada mais. Havia tantas coisas mais importantes a fazer, como negociações comerciais, inspeções da guarda real, terras a serem administradas. Não podia crer que o rei anterior se ocupava apenas de assuntos tão básicos como aqueles.

Elise adentrou no cômodo interrompendo suas divagações. Ela lhe serviu o vinho e o entregou em suas mãos. Aproveitando-se do momento, Edgar indagou, embora não esperasse uma resposta capaz de lhe atender:

— Elise, alguma vez se inteirou dos assuntos de seu pai? — a princesa o olhou surpresa.

— Que assuntos?

— Referente ao governo. Pensei que me depararia com relatórios mais extensos envolvendo economia, políticas, relações exteriores, mas não há nada, nem mesmo sobre a guarda real — Elise olhou para o lado mostrando um leve desconforto — sabe de alguma coisa? — insistiu.

— Confesso que meu pai nunca teve mão de ferro para cobrar de seus subordinados relatórios…

— E como ele sabia que estava tudo bem?

— Ele adotava a política de que notícias más correm mais do que as boas, então…

— É pior do que imaginei. Talvez seja por isso que George tenha estado tão receoso — murmurou mais para si mesmo do que para Elise, contudo ela havia escutado.

— Concordo que os métodos do meu pai podem ter sido… Perigosos, mas ele foi um grande rei — disse num tom defensivo.

— Não contesto isso, o reino está em paz, mas receio que não esteja tão próspero quanto poderia estar — retorquiu, colocando os papeis de lado. Ele não perderia tempo com aquilo — vou convocar uma reunião nesse instante…

— Isso pode ser difícil — ela o advertiu, atraindo sua atenção.

— E por qual motivo?

— Muitos não se encontram na capital e sim em suas terras. Podem demorar dias até chegarem.

— Isso é um absurdo! Deveriam estar aqui, especialmente quando tem um novo governante para se informar das questões do reino — exclamou exaltado, passando a mão em seus cabelos, despenteando-os — tratarei deles depois, terei que investigar o que está acontecendo por minha própria conta. Aproveite a tarde para si, mas tente não aparentar felicidade e, se possível, converse com o seu irmão.

— Sim, majestade — disse num tom divertido observando a figura do rei sumir entre os corredores — para alguém que não queria ser rei, parece estar bastante dedicado — murmurou para si mesma.

Ver a agitação de Edgar em relação ao reino mostrava muito mais de seu caráter idôneo do que Elise esperava. Afinal, ele poderia se mostrar descuidado e despreocupado, ignorando os problemas gritantes que ameaçavam o reino, mas ainda assim… Ele estava se esforçando. Talvez, seria melhor tê-lo como rei do que George.

Com tais pensamentos, Elise caminhou para fora do escritório, buscando a tranquilidade do ar livre. Estava cansada de ficar presa num local fechado. Durante sua curta jornada, um homem de armadura reluzente e uma capa vermelha lhe chamou a atenção. Os cabelos reluziam como o sol no verão. Mesmo de costas, conseguia distingui-lo. Ele era único, ele era o Godfrey, o seu amado.

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Comments

Paola

Paola

até porque uma coisa não tem nada haver com a outra 😊

2025-03-10

0

Paola

Paola

KKKKKK tá tudo bem, eu também adoto essa política

2025-03-10

0

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