Capítulo 6 — A noite silenciosa e o pesadelo no porão.
O dia 31 de janeiro de 1990 seguiu de maneira estranhamente calma.
Dante e Ethan passaram a tarde juntos, tentando manter um clima leve dentro da casa. Brincaram um pouco, ouviram música no rádio e até ajudaram a mãe com pequenas tarefas. Isabelle, como sempre, fazia de tudo para que seus filhos se sentissem bem, apesar da tensão invisível que pairava no ar.
Alexander passou a maior parte do tempo em silêncio, sentado na sala, assistindo televisão com um olhar impassível. O som do jornal noturno preenchia a casa, criando um ruído de fundo que mascarava o verdadeiro clima daquele lar.
Quando o jantar chegou, foi uma refeição silenciosa. O barulho dos talheres batendo contra os pratos era o único som presente, além do tic-tac do relógio de parede.
E então, veio a hora de dormir.
Alexander apagou o cigarro no cinzeiro já cheio e olhou para Isabelle com um olhar frio e imperativo.
— fique com Dante no quarto.
A voz dele não deixava espaço para discussão.
Isabelle hesitou. Ela sabia oque aquilo significava. O silêncio inquietante, a ordem repentina, tudo indicava oque viria a seguir.
— Alex... — Ela tentou argumentar, mas ele cortou a fala dela com um olhar severo.
— Agora.
Isabelle fechou a boca. Seus olhos tremiam, mas ela sabia que insistir só pioraria a situação. Com um aperto no peito, pegou Dante no colo e o levou para o quarto.
Ethan não precisou de explicação. Ele sabia. Sempre soube.
Ficou parado no corredor, assisti do a porta do quarto se fechar lentamente com um rangido doloroso.
Seu destino estava Selado.
Alexander se virou para ele.
— Vamos.
Sem dizer uma palavra. Ethan obedeceu.
O porão ficava nos fundos da casa, uma porta simples que levava a uma escada estreita e úmida. O cheiro de mofo misturava ao frio do chão de cimento, criando um ambiente opressor e claustrofóbico.
As paredes eram de concreto puro, com manchas escuras de infiltração. Uma lâmpada fraca balançava no teto, piscando vez ou outra, como se não suportasse iluminar aquele lugar.
Ethan desceu os degraus lentamente, ouvindo os passos pesados do pai atrás de si.
Ao chegar ao chão de cimento, engoliu a seco e se virou.
Alexander fechou a porta atrás de si.
Então, tirou o cinto.
Ethan não reagiu. Não fugiu. Não implorou.
Apenas fechou os olhos e esperou.
A primeira cintada cortou o silêncio como uma lâmina afiada rasgando carne.
O impacto foi seco, cruel.
Ethan cerrou os dentes, sentindo o couro quente da conta arder contra sua pele.
Outra .
E mais outra.
O som do cinto chicoteando seu corpo ecoava pelo porão abafado, misturado aos grunhidos que ele tentava conter.
Mas era impossível.
A dor queimava.
Mais um golpe.
Ethan arfou, seu corpo encolhendo instintivamente, mas ele se recusava a gritar.
Outro golpe
Seus joelhos cederam ele ele caiu no chão áspero de cimento, as mãos apertando o próprio corpo, tentando se agarrar a qualquer resquício de força que ainda lhe restava.
mas Alexander não parava.
Os golpes eram aleatórios, atingindo suas costas, seu braço, sua perna. Ele não se importava onde acertava, desde que doesse.
E doía.
Muito.
Ethan mordia o lábio até sentir o gosto metálico do próprio sangue, tentando conter qualquer som que pudesse sair de sua boca.
Ele não daria esse prazer ao pai.
Mas então, um golpe atingiu seu rosto.
Seus olhos se arregalaram com o impacto.
Um som abafado escapou de seus lábios.
E então...
Ele gritou.
O grito ecoou pelo porão, abafado pela estrutura da casa. Mas não alto o suficiente para não ser ouvido.
Dante ouviu.
Ethan nunca gritava. Nunca.
Mas dessa vez, ele gritou.
No quarto, Dante tremia sob as cobertas. Seus pequenos punhos estavam cerrados, seu coração batia acelerado no peito.
Ele queria sair dali.
Ele queria ajudar o irmão.
Ele queria impedir tudo aquilo.
Mas Isabelle o segurava firme em seus braços, apertando-o contra o peito com força, lágrimas silenciosas escorrendo seu rosto.
Ela sabia que, se soltasse Dante, Alexander se voltaria contra ele também.
E isso...
Ela jamais permitiria.
Então, ela apenas chorou.
E ficou ali.
Aguardando.
Até que, enfim, tudo ficasse em silêncio.
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O silêncio que se seguiu foi pior do que a dor.
O corpo de Ethan tremia no chão frio do porão, seus músculos tensionados pelo impacto dos golpes. O gosto de sangue ainda estava em sua boca, misturado à saliva quente. Sua respiração era irregular, pesada, enquanto seu peito subia e descia com esforço.
Alexander permaneceu parado à sua frente, observando-o de cima com um olhar impassível. Seu rosto não demonstrava nenhum traço de culpa, apenas frieza e autoridade.
Ele ergueu a mão, apontando o cinto, para Ethan, como um carrasco diante de sua vítima.
— você vai me obedecer, Ethan.
Sua voz era grave, cortante como uma lâmina.
— isso foi só um aviso.
Ethan ainda ofegante, não respondeu. Seus olhos, escuros e intensos, encararam o pai sem vacilar.
Ele não diria uma única palavra.
Alexander deu um passo à frente, abaixando-se levemente, aproximando o rosto do filho.
— se me desafiar de novo, da próxima vez será pior.
O tom era frio sem espaço para questionamentos.
— você não é o homem desta casa.
Ele se ergueu novamente, guardando o cinto com um movimento lento, como se já estivesse encerrado sua tarefa.
— aprenda seu lugar.
Com essas palavras finais, Alexander virou as costas e subiu as escadas do porão sem olhar para trás.
O som da porta se abrindo e depois se fechando ecoou pelo espaço abafado.
Ethan ficou onde estava.
Seu corpo doía, cada batida pulsando em sua pele como um lembrete cruel. Mas, mais do que a dor física, era a humilhação que queimava dentro dele.
Ele não choraria.
Não daria essa satisfação ao pai.
Respirou fundo, forçando-se a se levantar. Suas pernas vacilaram, mas ele se apoiou na parede fria, arrastando-se para cima até ficar em pé.
Ele saiu do porão sozinho.
Como uma última lição.
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Alexander caminhou até o quarto que dividia com Isabelle.
Seus passos eram pesados, firmes. Ele abriu a porta com força e encarou a esposa, que estava sentada na cama, pálida, segurando um terço entre os dedos.
Ela ergueu os olhos para ele, e por um instante, a súplica brilhou em seu olhar.
Mas ele foi mais rápido.
— Não se meta.
A ordem veio seca, dura.
Isabelle engoliu em seco apertando o tecido do vestido entre os dedos trêmulos.
— Alex... Ele é só um menino...— sua voz saiu baixa, quase um sussurro, mas foi cortada imediatamente.
— já disse para não se meter.
Alexander se aproximou inclinando-se sobre ela.
— e faça aquele outro pirralho ficar quieto.
Ela fechou os olhos, sentindo a respiração quente dele contra sua pele.
— esse assunto acabou.
E então, sem esperar resposta, ele se afasto, tirando os sapatos e deitando-se na cama como se nada tivesse acontecido.
Como se não houvesse um filho ferido no porão.
Como se os gritos não tivessem ecoado pela casa minutos antes.
Como se nada tivesse importância.
Isabelle se levantou silenciosamente e saiu do quarto.
Ela não iria até Ethan. Não podia.
Mas ainda podia ir até Dante.
E era isso que faria.
...****************...
A casa estava mergulhada em um silêncio sepulcral.
Isabelle caminhava com passos leves, quase flutuando pelo corredor. O coração pesava no peito, mas ela mantinha o semblante sereno ao abrir a porta do quarto dos filhos.
Dante já estava deitado, encolhido debaixo das cobertas, os olhos ainda arregalados, incapaz de pegar no sono. Ele se assustava facilmente com o som da tempestade lá fora, mas naquela noite, o que o mantinha acordado não era a chuva.
Era o medo.
— Mamãe? — Sua voz saiu pequena, insegura.
Isabelle sorriu, embora seu coração estivesse partido.
— Estou aqui, meu amor.
Ela se deitou ao lado do filho, puxando-o para seu abraço, envolvendo-o como se pudesse protegê-lo de tudo que acontecia naquela casa. Suas mãos deslizaram suavemente pelos fios dourados dele, acalmando sua respiração acelerada.
— Quer ouvir uma canção?
Dante assentiu, fechando os olhos enquanto se aconchegava contra ela.
Então Isabelle começou a cantar, baixinho, quase como um sussurro.
— "Dorme, meu pequenino
Dorme, que a noite já vem
Sonha com anjos divinos
E esquece de todo o além..."
A melodia suave da canção de ninar flutuou pelo quarto, envolvendo-os em um manto de tranquilidade.
Dante suspirou, deixando o medo se dissipar aos poucos. Ele segurou a mão da mãe com força, sentindo-se seguro por estar ao lado dela.
Seus olhos foram se fechando lentamente, até que, embalado pela voz delicada de Isabelle, adormeceu.
Ela continuou a cantar por mais alguns minutos, mesmo depois de perceber que o filho já dormia.
Não era apenas por ele.
Era por Ethan também.
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Horas Depois – O Retorno de Ethan
A porta do quarto rangeu levemente ao ser aberta.
Ethan entrou devagar, fechando-a sem fazer barulho. Seu corpo ainda doía dos golpes, cada movimento lembrando-lhe da punição que recebera. Mas ele não deixou escapar um único som de dor.
Seus olhos pousaram na cena diante dele.
Dante dormia profundamente, abraçado à mãe, que parecia ter pegado no sono também. A mão dela ainda repousava sobre os cabelos do pequeno, como se quisesse protegê-lo até nos sonhos.
Ethan ficou ali por um momento, parado na escuridão, apenas observando.
Dante era tudo para ele.
Seu pequeno irmãozinho.
A única coisa pura dentro daquela casa.
E ele faria de tudo para protegê-lo.
Com cuidado, Ethan caminhou até a cama e se deitou ao lado deles, sentindo o calor do corpo de sua mãe e do irmão. Ele suspirou, finalmente permitindo que seus olhos pesassem.
Naquele momento, mesmo com toda a dor, mesmo com toda a escuridão que os cercava, Ethan sentiu um fragmento de paz.
Porque, pelo menos por essa noite, Dante estava seguro.
E isso era tudo o que importava.
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Atualizado até capítulo 65
Comments
valeria la gachatuber
Estou completamente viciada nessa história, atualize logo! 🤩
2025-02-05
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