Relaxante

⋅⋆⭑✧⭑⋆⋅

Aery emergiu do mergulho com um sorriso satisfeito, afastando os cabelos do rosto enquanto nadava até a margem rasa.

Ela não olhou para trás. Não precisava.

Sabia que Leo estava ali, que seus olhos dourados ainda estavam cravados nela com aquela intensidade sufocante.

Ela fingiu não notar.

Com calma, ergueu as mãos até os cabelos e retirou as pequenas flores brancas que havia colocado ali mais cedo. O peso da água as havia deixado pesadas, os delicados caules já curvados.

— Uma pena… — murmurou para si mesma, girando uma das flores entre os dedos.

Ela as soltou na água, observando-as flutuar por um momento antes de se virar em direção à margem, onde um pequeno amontoado de flores frescas crescia próximo às pedras.

Ainda dentro do lago, ela se esticou para alcançar algumas.

Leo não desviou o olhar nem por um segundo.

Ele observou cada detalhe: o modo como a pele do ombro dela brilhava sob o sol, como os fios molhados de seu cabelo escorriam em mechas coladas pelo pescoço e pelo colo, e a forma inocente com que ela se concentrava na tarefa de escolher novas flores, completamente alheia ao próprio impacto.

Ou talvez não tão alheia assim.

Leo estreitou os olhos.

— Está colhendo flores no meio de um lago.

Aery sorriu sem se virar.

— Percebeu rápido.

Leo soltou um suspiro curto, arrastado.

— Por que você faz isso?

Ela pegou mais uma flor e então se virou lentamente, encontrando o olhar dele.

— Isso o incomoda, Leo?

Leo não respondeu de imediato. Mas o músculo em sua mandíbula saltou.

Aery sorriu, nadando para trás devagar, brincando com as flores entre os dedos,antes de colocar de volta à cabeça.

Leo acompanhou cada movimento, sem perceber que seus próprios pés o guiavam mais para perto.

— Achei que um guerreiro experiente como você não se distrairia tão fácil — ela provocou, os olhos cintilando.

Leo sorriu de canto.

— Quem disse que estou distraído?

Aery sentiu o impacto da água ao redor quando Leo avançou, rápido como sempre.

Mas dessa vez, ela estava atenta.

No exato momento em que os dedos dele tocaram sua cintura, Aery se torceu para o lado, escapando por um fio e nadando para longe como uma sereia.

— Tsc… — Leo parou, estreitando os olhos.

O sorriso de Aery se alargou.

— Quase, grandão.

Ela girou na água, nadando de costas, sem tirar os olhos dele.

Leo inclinou a cabeça.

— Quer mesmo me provocar, branquinha?

— Achei que você gostasse de desafios.

Leo passou a língua pelos dentes, avaliando-a. Então, sem aviso, mergulhou completamente.

Aery arregalou os olhos.

"Ah, não."

Ela girou e nadou mais rápido, tentando adivinhar por onde ele viria.

A água estava silenciosa. Perigosa.

Então, algo a puxou por baixo.

— Ah! — Aery se debateu, sentindo um aperto rápido em seu tornozelo antes de ser solta.

Ela emergiu tossindo e rindo, os cabelos grudando no rosto molhado.

— Isso foi golpe baixo, Leo!

Leo emergiu logo depois, sacudindo a cabeça para afastar a água dos olhos.

— Você pediu por isso.

Aery tentou nadar para longe, mas ele já estava em sua frente.

— Como você faz isso?! — exclamou, indignada.

Leo ergueu uma sobrancelha, fingindo inocência.

— Eu sou bom no que faço.

Aery riu alto.

Ela nadou de costas novamente, aproveitando a sensação da água fresca ao redor.

Leo não avançou.

Apenas ficou ali, a observando. Mas sem a tensão anterior.

— Você está relaxando — ela disse, sorrindo suavemente.

Leo bufou.

— Não estou.

— Está sim. — Aery parou de nadar e inclinou a cabeça para o lado. — Eu nunca tinha visto você assim.

Leo sustentou o olhar dela por um longo momento.

Aery percebeu algo diferente ali.

Não era apenas diversão.

Era algo mais suave. Mais raro.

Ela abriu um sorriso travesso.

— Isso quer dizer que eu venço essa rodada?

Leo cruzou os braços, a água batendo em seu peito.

— Nem ferrando.

Aery riu e girou na água mais uma vez, deixando-se levar pela corrente suave. Seu corpo flutuava com leveza, os olhos fechados enquanto sentia o sol aquecer sua pele.

Ela nunca tinha experimentado algo assim.

Nunca tinha tido liberdade para simplesmente brincar, sem pressa, sem medo.

E o mais incrível de tudo… Leo estava ali.

Sem brigas, sem ameaças, sem desconfiança.

Apenas ele.

Quando abriu os olhos, encontrou Leo observando-a perto da margem, com os braços cruzados e um olhar analítico demais para alguém que estava, claramente, se divertindo.

Aery nadou até mais perto, piscando para ele.

— O que foi? Está tentando entender como é possível alguém se divertir?

Leo bufou.

— Estou tentando entender como você consegue agir como uma criança e uma tentação ao mesmo tempo.

Aery engasgou no riso.

— Isso foi um elogio?

Leo desviou o olhar, como se já tivesse se arrependido da frase.

— Esquece.

Aery deu um sorrisinho vitorioso.

— Leo, Leo… quem diria? Você é um guerreiro cheio de mistérios, mas no fundo tem um coração escondido em algum lugar...

Leo arqueou uma sobrancelha.

— Se eu tivesse um coração, você já teria arrancado ele e vendido na feira de Valdoria.

Aery gargalhou.

— Hmm… depende do preço!

Leo revirou os olhos, mas um canto de seus lábios tremeu, quase sorrindo.

Ela continuou nadando por perto, sentindo a água fria acariciar sua pele. Quando passou por cima de um ponto mais raso, sentiu algo estranho tocar seu pé.

Aery parou.

Ela abaixou-se lentamente e viu um brilho dourado emergindo da areia branca no fundo do lago.

— O que…?

Antes que pudesse pensar duas vezes, mergulhou.

Leo ergueu a cabeça no mesmo instante.

— Aery?

Ele olhou ao redor, mas ela já tinha sumido.

Aery emergiu alguns segundos depois, ofegante e segurando algo pequeno entre os dedos.

Leo estreitou os olhos.

— O que é isso?

Ela piscou a água dos cílios e abriu a palma da mão. Havia uma pequena pedra dourada, reluzindo ao sol.

— Achei no fundo — ela disse, girando a pedra entre os dedos. Seu brilho não era comum.

Leo aproximou-se, a água batendo contra sua cintura.

— Isso não parece uma pedra qualquer.

Aery franziu a testa.

— Eu sei. Mas não sinto nada estranho nela.

Leo pegou o objeto de sua mão e analisou com atenção.

O ouro polido era fosco em algumas partes, como se o tempo o tivesse desgastado. Na superfície, havia marcas que pareciam inscrições antigas, quase apagadas pela água.

— Pode ser um fragmento de um antigo artefato — ele murmurou, girando a pedra entre os dedos.

Aery inclinou a cabeça.

— Você acha que pertenceu a um mago?

Leo lançou-lhe um olhar.

— Ou a algo pior.

Aery cruzou os braços.

— Você vê perigo em tudo, não é?

Leo bufou.

— Cresci em Ark. Lá, até o chão pode te matar.

Aery riu.

— Já eu cresci ouvindo histórias sobre artefatos antigos e mágicos. Minha professora dizia que existem pedras encantadas escondidas pelo mundo, esquecidas de tempos antigos. Algumas guardam memórias, outras têm feitiços adormecidos, e outras…

Ela pegou a pedra de volta, segurando-a contra a luz.

— …podem ser apenas uma pedra bonita no fundo de um lago.

Leo arqueou uma sobrancelha.

— Você sempre foi assim?

Aery sorriu, inocente.

— Assim como?

— Essa mistura irritante de curiosidade e imprudência.

Ela fingiu pensar.

— Desde que nasci, acho.

Leo suspirou, mas não desviou o olhar dela.

— Um dia, isso ainda vai te colocar em apuros.

Aery brincou com a pedra nos dedos.

— E você ainda vai me tirar deles?

Leo não respondeu. Mas a forma como seus olhos a observaram disse tudo.

Aery girou a pedra dourada nos dedos mais uma vez antes de soltá-la sobre a superfície da água. O pequeno fragmento afundou lentamente, desaparecendo entre os reflexos dourados do sol no lago.

— Talvez seja só uma lembrança de outro tempo — ela disse, observando a água se acalmar. — Algo que já teve importância, mas foi esquecido.

Leo acompanhou o movimento da pedra afundando.

— Odeon está cheio dessas relíquias. Algumas são apenas pedaços de histórias perdidas. Outras… deveriam continuar enterradas.

Aery sorriu.

— Você diz isso como se já tivesse encontrado alguma.

Leo não respondeu de imediato. Sua expressão permaneceu neutra, mas houve um breve silêncio carregado.

— Eu já vi coisas que deveriam ter sido esquecidas — ele disse, por fim.

Aery inclinou a cabeça.

— Você nunca fala sobre você.

Leo desviou o olhar para o centro do lago.

— Porque algumas histórias não valem a pena ser contadas.

Aery estudou seu rosto, a tensão discreta na linha de sua mandíbula.

Ela já havia aprendido que Leo não entregava nada facilmente. Se quisesse mais respostas, precisava dar algo primeiro.

Então, sem pensar muito, nadou até ele.

Leo percebeu imediatamente. Seu olhar se voltou para ela com atenção, mas ele não se afastou.

Aery continuou até que a água batesse em seus ombros, perto o suficiente para vê-lo melhor. Então, ergueu os braços e trouxe os cabelos úmidos para frente, espalhando-os sobre os ombros de um jeito casual, mas que servia para cobrir melhor seu corpo exposto.

Leo notou. Claro que notou.

Por um breve instante, seu olhar desceu, depois voltou ao rosto dela.

— Você já ouviu falar sobre as Lágrimas de Eywa? — Aery perguntou, como se nada tivesse acontecido.

Leo piscou, parecendo pego de surpresa pela mudança repentina de assunto.

— Histórias antigas. Uma lenda.

Aery sorriu.

— Ou uma verdade esquecida.

Leo estreitou os olhos.

— Você realmente acredita que existe um lago feito de prata líquida?

Aery deslizou a ponta dos dedos sobre a superfície da água, observando os pequenos círculos se formarem ao redor.

— E você acredita que um lago pode guardar memórias?

Leo não respondeu.

Mas Aery viu a hesitação nos olhos dourados.

Ele não desacreditava completamente.

Foi então que um som leve cortou o ar.

Um ruído agudo, seguido de pequenos respingos na água.

Aery e Leo se viraram ao mesmo tempo.

Lumy estava ali.

O pequeno animal flutuava sobre um tronco que boiava perto da margem, as orelhas baixas e os olhos brilhando com um brilho quase acusador.

Aery piscou.

— Lumy?

O bichinho balançou o rabo dourado, como se dissesse "até que enfim me notaram".

Leo soltou um suspiro curto.

— Ele vai reclamar por termos esquecido dele.

Aery riu, esticando o braço.

— Vem cá, Lumy.

O bichinho hesitou por um instante, mas então saltou da madeira e nadou até ela com pequenos movimentos rápidos. Aery o pegou, segurando-o junto ao peito enquanto ele balançava as patas, claramente descontente por estar molhado.

Leo observou a cena por um momento antes de soltar um som baixo que quase parecia um riso.

Aery arregalou os olhos.

— O quê?

Leo ergueu uma sobrancelha.

— Nada.

— Você fez um som estranho.

— Não fiz nada.

Aery estreitou os olhos.

— Você estava rindo?

Leo revirou os olhos, nadando para trás.

— Foi um espasmo involuntário.

— Leo… — Aery apertou os olhos.

Então, de repente, jogou água na direção dele.

Leo se esquivou por pouco.

— Aery…

— Você estava rindo.

— Não estava.

Aery sorriu.

— Estava, sim.

Leo a observou por um segundo.

Ele avançou na água.

— Ah, droga. — Aery girou no mesmo instante, rindo.

Aery nadou para trás, rindo enquanto Leo avançava.

O brilho dourado nos olhos dele denunciava o predador que estava se divertindo com a caça, e Aery sabia que, se não fosse mais rápida, ele a pegaria dessa vez.

Mas ela não estava sozinha.

Ela olhou para Lumy, ainda preso em seus braços, e sorriu de lado.

— Certo, Lumy — sussurrou. — É agora ou nunca.

O pequeno animal inclinou a cabeça, confuso, mas então Aery o ergueu acima da cabeça como se fosse um escudo.

— PARE!

Leo, que já estava perto, parou no mesmo instante, franzindo o cenho.

Aery tomou um fôlego dramático.

— Você não ousaria atacar alguém segurando um animal indefeso!

Leo piscou.

— Você está usando Lumy como refém?

Aery girou no lago, ainda segurando o bichinho acima da cabeça, como se fosse uma relíquia sagrada protegendo-a da destruição iminente.

— Exatamente! Agora, recue.

Leo cruzou os braços, sem interromper a aproximação.

— E o que acontece se eu simplesmente ignorar esse joguinho estúpido?

Aery suspirou teatralmente.

— Ah, Leo… Leo, Leo, Leo… — Ela fechou os olhos por um instante, como se estivesse prestes a dar um discurso inspirador. — Você realmente quer entrar para a história como o monstro que atacou uma donzela indefesa segurando uma criatura adorável?

Leo piscou lentamente.

— Primeiro: você não é indefesa. Segundo: esse bicho já me mordeu antes.

Lumy emitiu um som indignado, um protesto contra a acusação.

Aery olhou para o bichinho e depois para Leo, ainda fingindo pesar.

— Então é isso. Você não tem compaixão, nem um pingo de honra.

Leo soltou um suspiro cansado.

— Aery…

— Tudo bem, tudo bem. Eu aceito minha trágica derrota. — Ela abaixou Lumy devagar, colocando-o sobre sua cabeça como se fosse uma coroa de vitória. — Mas que fique registrado nos contos de Odeon que fui injustiçada por um guerreiro sem coração.

Leo estreitou os olhos, mas os cantos de sua boca tremiam, quase sorrindo.

— Você já terminou?

Aery abriu um único olho.

— Depende. Você vai me deixar escapar?

Leo fingiu pensar por um momento.

Então, de repente, jogou um jato de água nela.

Aery engasgou no ato.

— LEO!

Antes que pudesse reagir, ele avançou e passou por ela, nadando para longe, completamente indiferente à sua indignação.

Aery arregalou os olhos.

"Ah, não. Ele não fez isso."

Ela olhou para Lumy, que ainda estava apoiado em sua cabeça, e os dois trocaram um olhar cúmplice.

— Vamos acabar com ele.

Lumy balançou a cauda, concordando.

E então, a guerra começou.

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!