⋅⋆⭑✧⭑⋆⋅
O sol se pôs lentamente, mergulhando a floresta em sombras azuladas. Acima, o céu se tingia de tons violeta e dourado antes de ceder espaço às estrelas.
O ar estava carregado da eletricidade deixada pela batalha, mas a tensão entre Aery e Leo ainda parecia ser o elemento mais denso naquela clareira silenciosa.
Aery sentou-se sobre uma pedra coberta de musgo, tentando recuperar o fôlego. Seu coração ainda pulsava forte no peito, os dedos formigando com resquícios de magia.
Pequenas faíscas brilhavam entre suas mãos antes de se dissiparem no ar noturno.
O combate não tinha sido difícil para ela, mas a presença de Leo a deixava inquieta de um jeito diferente.
Do outro lado da clareira, Leo limpava sua espada com movimentos precisos. A lâmina escura refletia a luz fraca, mas seus olhos dourados eram ainda mais intensos na penumbra.
Ele a observava de soslaio, como um predador estudando uma presa, avaliando cada detalhe seu.
— Você sempre se mete em encrenca desse jeito? — sua voz cortou o silêncio, carregada de sarcasmo.
Aery ergueu o olhar e sorriu, brincalhona.
— Você tem sorte de eu me meter. Se não fosse por mim, talvez não estivesse inteiro agora.
Leo soltou um riso baixo e descrente.
— Se não fosse por você, eu nem teria perdido tempo com essa luta.
Ela estreitou os olhos, cruzando os braços.
— Então eu deveria estar te agradecendo por salvar minha pele?
— Não espero gratidão. Só estou dizendo que você é irritantemente imprudente.
Aery riu, balançando a cabeça.
— E você é irritantemente convencido. Acho que formamos uma boa dupla.
Leo bufou, mas não negou. Em vez disso, embainhou a espada e caminhou na direção dela. Aery sentiu o corpo enrijecer quando ele parou perto o suficiente para que a diferença de tamanho se tornasse ainda mais evidente.
Aery era alta, mas ele era uma sombra diante dela. Deveria ter quase 2 metros de altura, forte, com a presença esmagadora de um guerreiro que já vira batalhas demais.
— Você parece diferente das outras elfas brancas. — Ele falou, estudando-a com um olhar crítico. — Não sei dizer se isso é uma vantagem ou um problema.
Aery ergueu uma sobrancelha.
— Diferente como?
Leo inclinou a cabeça, como se estivesse tentando decidir se valia a pena responder.
— Seu cabelo. É raro. Nunca vi uma elfa branca ruiva antes.
Aery sorriu.
— Está me chamando de especial?
— Estou dizendo que você chama atenção. O que não é exatamente um ponto positivo.
Ela deu de ombros.
— Prefiro pensar que sou única.
Leo a observou por mais um momento antes de se afastar, pegando algumas pedras e galhos do chão.
— Vamos acender uma fogueira. Não gosto de ficar vulnerável no escuro.
Aery se acomodou perto do amontoado de lenha e conjurou uma pequena chama mágica em suas mãos, lançando-a sobre a madeira. O fogo se acendeu imediatamente, as chamas refletindo em seus olhos claros.
Leo arqueou uma sobrancelha.
— Prático.
Aery sorriu com orgulho.
— Vantagens de ser poderosa.
— Ou de ser mimada por nunca ter precisado usar uma lâmina de verdade.
Ela o encarou, fingindo indignação.
— Por que eu precisaria de armas se tenho magia?
— Porque, um dia, sua magia pode falhar.
Aery piscou algumas vezes, surpresa com o tom sério dele. Então, deu um sorriso travesso.
— Bem, nesse caso, ainda tenho você para me proteger.
Leo revirou os olhos, cruzando os braços.
— Eu? Proteger você? Que presunçosa.
— Ah, por favor. Você poderia ter me deixado para trás quando as criaturas atacaram. Mas não fez isso.
Leo desviou o olhar para o fogo, a mandíbula cerrada.
— Talvez eu só precise de você viva por enquanto.
Aery inclinou-se para frente, os olhos brilhando com provocação.
— Ou talvez você goste da minha companhia tanto quanto eu gosto da sua.
Leo soltou um riso baixo e rouco, que fez um arrepio percorrer a espinha de Aery.
— Você fala demais, branquinha.
— E você não fala nada.
Os dois se encararam através das chamas, a tensão entre eles tão densa quanto o calor do fogo.
Por um instante, Aery se pegou reparando nos traços de Leo. A pele bronzeada, os cabelos lisos e negros que caíam sobre os ombros, os olhos dourados que pareciam sempre analisar tudo ao redor, as sobrancelhas grossas quase sempre franzidas.
Ele era intimidador, mas não da forma como sempre lhe ensinaram que os elfos negros seriam.
— O que foi? — Ele franziu o cenho, percebendo seu olhar fixo.
Aery sorriu, apoiando o queixo nas mãos.
— Você sempre parece tão sério... Nunca relaxa. Vai acabar envelhecendo antes do tempo.
Leo soltou um suspiro pesado.
— É fácil para você falar. Seu mundo é todo flores e risos. O meu é diferente.
— Diferente como?
Ele ficou em silêncio por um instante antes de responder.
— Você não entenderia.
Aery mordeu o lábio, pensativa. Então, inclinou-se para frente, os olhos encontrando os dele.
— Tente.
Leo sustentou seu olhar por um longo momento. Por alguma razão, sentiu vontade de responder. De contar alguma verdade. Mas, no último instante, desviou os olhos para o fogo.
— Não esta noite.
Aery não insistiu. Em vez disso, sorriu suavemente.
— Tudo bem. Mas, um dia, você vai me contar.
Leo não confirmou nem negou. Apenas a observou com uma expressão indecifrável, como se estivesse tentando decifrar por que ela era tão diferente das outras elfas que já conheceu.
O silêncio se instalou novamente, mas desta vez era confortável.
Aery se aconchegou perto da fogueira, o calor do fogo aquecendo sua pele. Leo permaneceu onde estava, mas seus olhos não deixaram de analisá-la, como se tentasse prever que tipo de problema ela ainda traria.
Ela era uma ameaça diferente.
E isso o incomodava mais do que qualquer batalha já enfrentada.
Leo bufou, frustrado, antes de se levantar bruscamente.
— Você fala demais, branquinha. Boa noite.
— Boa noite, Leo. Sonhe comigo! — Aery provocou, rindo enquanto ele se afastava.
Leo apenas balançou a cabeça, ignorando a última farpa dela. Sentou-se ao lado de sua espada, os olhos fixos na fogueira.
Aery o irritava de um jeito que ele não entendia. Ela não tinha medo dele, não se importava com sua origem, e isso o deixava inquieto.
— Você fala demais. — Resmungou, mais para si do que para ela.
Aery, já deitada, apenas sorriu de olhos fechados.
Leo sempre tomava precauções. Cada som na floresta podia ser uma ameaça, cada sombra, um possível inimigo.
Mas Aery parecia à vontade, como se aquele mundo hostil fosse apenas um grande cenário para sua próxima aventura.
Ela estava deitada do outro lado da fogueira, enrolada na capa, os cabelos espalhados ao redor como um rio flamejante sob as estrelas.
— Vai ficar aí a noite toda vigiando? — murmurou, virando-se para ele. Seus olhos brilhavam como duas jóias à luz das chamas.
— Alguém precisa garantir que nenhuma criatura esfomeada resolva te devorar enquanto você dorme tranquila.
Aery riu baixinho.
— Acha que eu não sei me defender? Não precisa se preocupar. Sou uma elfa branca poderosa, lembra?
Leo arqueou uma sobrancelha. Poderosa? Talvez. Mas ele já havia percebido que ela era ingênua.
E isso o incomodava.
Ela não parecia entender o que o mundo fazia com pessoas como ela. Com aqueles que não tinham medo, que acreditavam no melhor. O mundo esmagava esse tipo de gente.
Leo cerrou os dentes, desviando o olhar.
Ela não era sua responsabilidade. Não deveria ser.
Mas, de alguma forma, ele não conseguia ignorar aquela sensação incômoda dentro dele.
Algo nele dizia que, se ele desviasse os olhos por tempo demais, Aery poderia simplesmente desaparecer.
Como tudo o que ele já perdeu.
Suspirou, exausto, e se encostou contra uma árvore, mas não dormiu de imediato. Ficou ali, ouvindo a respiração tranquila dela, observando a maneira como se encolhia no próprio calor.
Só fechou os olhos quando teve certeza de que, pelo menos por aquela noite, nada chegaria perto dela.
⋅⋆⭑✧⭑⋆⋅
O amanhecer pintava a floresta com tons dourados quando Leo sentiu um leve incômodo nos olhos e despertou.
Aery já estava acordada, observando os pássaros coloridos saltarem de galho em galho.
— Está cedo demais para tanto entusiasmo. — murmurou, a voz ainda rouca de sono.
— Bom dia pra você também, mal-humorado. — Aery riu.
Ele se levantou, pegou sua espada e a prendeu nas costas sem dar resposta.
— Precisamos comer. Vamos procurar algo.
— Eu conheço algumas plantas comestíveis. — sugeriu Aery, se espreguiçando.
Leo arqueou uma sobrancelha.
— Plantas? Você acha que vou sobreviver com folhas?
— Ah, claro. O grande guerreiro precisa de carne. — Aery revirou os olhos, divertida. — Então vá caçar e eu busco frutas e raízes. Dividimos o que encontrarmos.
Leo deu de ombros e desapareceu entre as árvores.
Enquanto ele caçava, Aery recolhia frutas e ervas que conhecia. Gostava do silêncio tranquilo da floresta pela manhã. Bem, quase silêncio...
Ela não conseguiu conter um sorriso ao ouvir o barulho de passos pesados se aproximando.
Leo surgiu da mata com um coelho selvagem pendurado na mão, os olhos dourados avaliando sua colheita.
Aery ergueu as frutas, orgulhosa.
— Eu disse que daríamos um bom time.
Leo olhou para as frutas na mão dela e depois para o coelho ensanguentado.
— Sim. Um equilíbrio perfeito entre "comida de verdade" e "passar fome".
Aery soltou uma risadinha, e Leo se sentou ao lado dela, começando a preparar a fogueira.
— Ainda acho que você fala demais.
— E você fala de menos. Mas já estou acostumada.
Ela estendeu algumas frutas para ele. Leo as pegou sem protestar, mas lançou um olhar desconfiado.
— Por que está tão feliz?
Aery deu de ombros.
— Porque, por mais que sejamos diferentes, estamos aqui. Juntos. E… o lugar é lindo.
Leo desviou o olhar para as chamas.
— Você é irritantemente otimista.
— E você, irritantemente adorável.
Ele bufou, mas Aery percebeu um pequeno sorriso de canto.
Enquanto o fogo crepitava, Leo trabalhou em silêncio, assando o coelho. Aery comia algumas frutas, observando-o de soslaio.
Ela se perguntou há quanto tempo ele vivia sozinho. A forma como se fechava, a maneira como evitava contato... Tudo nele parecia gritar que não estava acostumado com companhia.
— Você sempre foi tão carrancudo? — perguntou, casualmente.
Leo lançou-lhe um olhar preguiçoso.
— Sempre fui realista.
— Realista ou pessimista? Há uma diferença.
— Realista. O mundo é duro, branquinha. Quanto mais cedo você entender isso, melhor.
Aery cruzou os braços, desafiadora.
— O mundo pode ser duro, mas também pode ser bonito. Você só precisa saber onde olhar.
Leo suspirou.
— Bonito como?
Aery olhou ao redor, como se procurasse as palavras certas.
— Como o céu pela manhã. Como as flores que brotam mesmo em solo seco. Como... — Ela hesitou por um instante e depois sorriu. — Como encontrar alguém inesperado que faz você querer ver o mundo de um jeito diferente.
Leo ficou em silêncio, os olhos fixos nela.
Ele sabia o que ela queria dizer. E não gostava disso.
Não gostava do jeito fácil com ela falava sobre sentimentos. Como se isso não fosse um problema. Como se não fosse perigoso.
— Você fala de mim? — Ele perguntou, num tom seco, tentando disfarçar a sensação incômoda que as palavras dela lhe causavam.
— Talvez.
Leo soltou uma risada baixa, quase inaudível, enquanto virava o coelho na fogueira.
— Você é uma encrenca, sabia?
— Você já disse isso. Mas eu acho que você gosta de encrenca.
— Não gosto.
— Tem certeza?
Dessa vez, ele não desviou o olhar.
— Tenho certeza de que você me irrita.
Aery riu.
— Mas continua aqui. E isso diz muito, Leo.
Leo a fitou novamente, e dessa vez não desviou. Aery o encarava com um brilho provocador nos olhos, desafiadora e serena ao mesmo tempo.
E ele se perguntou o que exatamente estava fazendo ali.
Se soubesse a resposta, talvez tivesse ido embora naquela manhã.
Mas ele ficou.
E isso dizia tudo.
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Atualizado até capítulo 45
Comments
tuktuk
meu sonho
2025-04-14
0
Aline C
/Chuckle/
2025-03-24
0
Silvia Helena
estou gostando muito
2025-01-26
2