Rei das flores

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A estrada serpenteava por campos vastos e bosques tranquilos, o vento carregando consigo o cheiro fresco da terra e o canto dos pássaros. O sol filtrava-se por entre as folhas das árvores, projetando sombras dançantes no caminho de terra batida.

Aery caminhava à frente, passos leves e despreocupados, enquanto Leo a seguia a uma distância segura, braços cruzados e expressão impassível.

— Você sabe que estamos andando em círculos, certo? — Leo resmungou, ajustando a espada pesada nas costas.

Aery nem olhou para trás, simplesmente ergueu a mão e balançou os dedos de maneira despreocupada.

— Não estamos, não! — declarou com convicção. — Estamos seguindo o caminho do vento.

Leo arqueou uma sobrancelha.

— O caminho do vento? — repetiu, descrente.

— Sim! Ele nos guia para onde precisamos ir.

Ele bufou, cansado demais para discutir.

— Isso não é um plano, Aery.

Ela finalmente se virou para encará-lo, seus olhos azul-esverdeados brilhando com um entusiasmo quase infantil.

— Claro que é! Você precisa confiar mais no destino.

Leo soltou uma risada seca, sem humor.

— O destino nunca foi gentil comigo.

Aery inclinou a cabeça, como se estivesse tentando entender a melancolia oculta nas palavras dele. Mas, em vez de insistir no assunto, apenas sorriu e voltou a caminhar.

Ela tinha os braços cheios de flores recém-colhidas e, enquanto andava, seus dedos habilidosos trançavam as hastes em uma guirlanda delicada.

Leo observou por um momento antes de soltar um suspiro exasperado.

— Você vai carregar esse jardim inteiro até onde?

— Até terminar minha obra-prima! — respondeu ela, franzindo a testa em concentração.

Leo revirou os olhos, mas não comentou mais nada. No fundo, ele gostava do som da voz dela preenchendo o silêncio, mesmo que não admitisse.

Depois de alguns minutos, Aery parou abruptamente e virou-se para ele, segurando algo atrás das costas.

— Feche os olhos.

Leo estreitou os olhos.

— Não.

— Oh, vamos lá, Leo! Só por um segundo.

Ele cruzou os braços.

— Se isso envolver mais flores, estou fora.

— Tarde demais.

Antes que ele pudesse reagir, Aery deu um passo à frente e colocou a guirlanda em sua cabeça, um sorriso vitorioso nos lábios. Leo congelou, expressão se fechando em uma mistura de descrença e irritação.

— Aery...

— Perfeito! Minha magnum opus! — ela se afastou, dando risadinhas. — Agora o mundo pode ser tão sombrio quanto quiser, porque você acabou de ganhar mais cor!

Ele ergueu uma mão, tocando a coroa de flores como se fosse um objeto amaldiçoado.

— Tire isso.

— Nem pensar! Ficou ótimo.

Ela recuou mais, admirando a cena como uma artista observando sua obra finalizada.

Leo inspirou fundo, tentando manter a paciência. Depois de alguns segundos, arrancou a guirlanda da cabeça com um suspiro. Mas, em vez de jogá-la fora, fez algo que pegou Aery de surpresa.

Com um movimento suave, ele colocou a guirlanda sobre a cabeça dela.

Aery piscou, surpresa.

— O quê? Agora sou a rainha das flores?

— Mais adequado do que eu. — Ele deu de ombros. — Além disso, não combina com minha estética sombria.

Ela riu, ajeitando a coroa sobre os cabelos.

— Admito que ficou perfeito em mim. Obrigada, meu cavaleiro das sombras.

Leo lançou-lhe um olhar de advertência, mas não respondeu. Apenas voltou a caminhar, e Aery correu para acompanhá-lo, ainda sorrindo.

⋅⋆⭑✧⭑⋆⋅

O humor leve da viagem mudou quando avistaram algo incomum na estrada adiante. Uma carroça parada no meio do caminho, ladeada por três homens, despertou imediatamente o alerta de Leo. Seu olhar afiado analisou a cena com desconfiança.

— Aery. — Ele murmurou, estendendo o braço para bloqueá-la.

— O que foi?

— Algo não está certo.

Ele a puxou para o lado da estrada, escondendo-os atrás de arbustos altos. Seu corpo tenso indicava que estava pronto para reagir a qualquer ameaça.

— Vamos apenas observar por enquanto.

Aery abaixou-se ao lado dele, e no instante em que se acomodou, percebeu que estavam incrivelmente próximos. Seus braços se tocavam, e o calor da pele dele era perceptível mesmo através do tecido das roupas.

Ela engoliu em seco.

— Acho que estamos um pouco... perto demais.

Leo permaneceu imóvel, olhos fixos na cena à frente.

— Só se concentre, branquinha.

Mas Aery, ao invés de se afastar, inclinou ligeiramente a cabeça, analisando o perfil sério dele.

— Você sempre fica tão focado assim? Ou é só quando estamos quase colados?

Leo virou o rosto, lançando-lhe um olhar de advertência.

— Aery...

Ela sorriu, satisfeita por tê-lo desconcertado, mas antes que pudesse provocá-lo mais, ouviram vozes.

— Eles estão discutindo algo. — Leo murmurou.

Aery franziu a testa, tentando distinguir as palavras.

— Parece que estão brigando.

Leo estreitou os olhos. Algo nas vestes dos homens lhe era familiar. Um símbolo bordado em seus cintos — discreto, mas reconhecível.

— Contrabandistas... Que preguiça.

— Como sabe disso?

— Experiência.

Ele deu um passo à frente, pronto para se mover. Mas, naquele instante, um dos homens olhou diretamente para onde estavam escondidos.

Aery prendeu a respiração.

Leo reagiu instintivamente, puxando-a contra si e pressionando um dedo contra os lábios dela, sinalizando silêncio absoluto.

Os olhos de Aery se arregalaram com a proximidade repentina. O calor do corpo dele a envolveu completamente, e por um instante, o perigo pareceu secundário diante da batida acelerada de seu coração.

Os contrabandistas conversaram mais um pouco, mas, aparentemente, não os notaram. Depois de alguns minutos, subiram na carroça e partiram.

Leo esperou até que o som das rodas desaparecesse antes de se afastar de Aery.

— Podemos seguir agora.

Aery piscou, tentando recuperar o fôlego.

— Acho que foi emocionante.

Ele lhe lançou um olhar irritado.

— Você tem uma ideia muito estranha de ‘emocionante’.

Ela ajeitou a guirlanda de flores, sorrindo.

— E você tem uma ideia muito rígida de ‘segurança’.

Leo bufou, mas, apesar do tom irritado, um pequeno sorriso ameaçou surgir em seus lábios.

Eles retomaram o caminho, mas a atmosfera entre eles havia mudado.

⋅⋆⭑✧⭑⋆⋅

Depois de algumas horas de caminhada, Aery sentiu o calor aumentar e começou a reclamar.

— Está tão quente... Acho que estou derretendo!

Leo, que andava alguns passos à frente, nem se deu ao trabalho de olhar para trás.

— Duvido. Você fala demais para alguém derretendo.

Aery revirou os olhos, mas antes que pudesse responder com uma provocação, ouviu um som ao longe. O murmúrio suave de água corrente.

— Espere! — Ela segurou no braço de Leo, fazendo-o parar abruptamente.

Ele olhou para a mão dela em seu braço e depois para seu rosto.

— O que foi agora?

— Água. Tem um riacho por perto!

Antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, Aery seguiu o som, afastando galhos e folhas até que encontrou o pequeno curso d’água escondido entre as árvores.

O riacho era cristalino, com águas rasas que refletiam o céu e as árvores ao redor. Pedras lisas e brilhantes espalhavam-se ao longo da margem, e pequenas borboletas azuladas flutuavam pelo ar.

Aery sorriu.

— Perfeito!

Sem hesitar, tirou os sapatos e colocou os pés na água gelada, soltando um suspiro de prazer.

Leo a observou de braços cruzados, descrente.

— Você realmente não tem instinto de sobrevivência.

— Relaxa, Leo. É só um riacho.

Ela abaixou-se e jogou um punhado de água no rosto, os cabelos ruivos brilhando sob o sol. Leo desviou o olhar, tentando ignorar o quão bonita ela parecia.

— Você deveria entrar também — sugeriu Aery, chutando a água levemente, fazendo pequenas gotas voarem.

— Nem pensar.

Ela sorriu maliciosamente.

— Sabe o que acontece com elfos negros se ficarem muito tempo no sol?

— O quê?

— Eles ficam mal-humorados. Ah, espere... Você já está assim o tempo todo.

Leo estreitou os olhos, sem paciência.

— Branquinha, se você jogar essa água em mim, vai se arrepender.

Aery inclinou a cabeça, desafiadora.

— Será?

Antes que ele pudesse reagir, ela jogou um punhado de água diretamente no peito dele.

O silêncio que se seguiu foi carregado de tensão.

Leo olhou para a mancha escura em sua camisa. Depois, levantou os olhos dourados para Aery.

Ela arregalou os próprios olhos.

— Uh-oh.

Leo deu um passo à frente.

— Eu avisei.

Aery se virou para correr, mas antes que pudesse dar dois passos, ele a agarrou pela cintura e a puxou para trás.

— Leo! — ela gritou, rindo e se debatendo.

— Você pediu por isso.

Em um movimento rápido, ele a ergueu sem esforço e a jogou dentro do riacho.

Aery caiu com um grande splash, a água fria envolvendo seu corpo. Ela emergiu ofegante, os cabelos grudando no rosto.

Leo a observava da margem, de braços cruzados, satisfeito.

— Melhorou o calor?

Aery limpou a água dos olhos e olhou para ele com um brilho travesso.

— Você realmente não deveria ter feito isso.

Antes que ele percebesse, Aery puxou suas pernas com um movimento súbito. Leo perdeu o equilíbrio e caiu na água ao lado dela com um estrondo.

Agora foi a vez de Aery gargalhar.

— Viu? Tão refrescante!

Leo emergiu devagar, os cabelos pretos escorrendo e os olhos brilhando com uma mistura de irritação e diversão.

— Você está jogando um jogo muito perigoso.

Aery nadou um pouco para trás, ainda rindo.

— O que você vai fazer?

Ele avançou sem hesitação.

Aery tentou escapar, mas Leo era mais rápido. Em segundos, ele a agarrou pelos pulsos e a puxou contra si.

O riso dela morreu quando percebeu o quão perto estavam. O corpo molhado de Leo pressionava o dela, quente apesar da água fria.

A respiração de Aery vacilou.

Ele não disse nada. Apenas a fitou intensamente, os olhos dourados hipnotizantes, a mandíbula tensa.

O silêncio entre eles foi quebrado apenas pelo som da água correndo e dos corações acelerados.

Leo soltou os pulsos dela lentamente, mas suas mãos permaneceram próximas. Aery sentia a pele arrepiada, e não pelo frio.

— Você brinca demais com o perigo — ele murmurou, a voz mais rouca do que o normal.

Aery umedeceu os lábios, sentindo-se tonta.

— Talvez eu goste do perigo.

Os olhos de Leo brilharam, e por um instante, pareceu que ele ia fazer algo inesperado. Mas, então, ele soltou um suspiro pesado e afastou-se.

Aery sentiu a frustração e a confusão tomando conta de si.

— Você é tão chato... — resmungou, nadando para longe.

Leo passou as mãos pelos cabelos molhados, enquanto torcia as roupas no corpo.

Aery fez o mesmo, mas sem parar de olhar para ele.

Os dois voltaram para o caminho, sentindo o calor do sol começar a secar suas roupas.

Aery tagarelava sobre as formas das nuvens, enquanto Leo fingia não ouvir. Mas, em seu íntimo, sabia que ela o estava mudando — pouco a pouco, com cada palavra, cada gesto espontâneo.

E talvez... ele não se importasse tanto assim.

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Comments

Kami

Kami

bom

2025-01-07

1

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