Lester estacionou a Ducati no grande estacionamento da White Flag; dando uma boa olhada naquela enorme construção. Diferente da catedral de Blackvalley onde ele havia passado as últimas duas semanas se adequando, a arquitetura ali era moderna, mas não era das mais impressionantes. Toda a construção se assemelhava a um cubo gigante e claustrofóbico, era forrada de painéis metálicos do lado de fora, com uma led pra lá de ultrapassada, onde havia a imagem brilhante de uma bandeira branca e o letreiro passando em vermelho. Logo no estacionamento, duas palmeiras mais altas que a própria White Flag davam as boas vindas aos seus clientes, e a música elétrica e pulsante já era audível lá de fora. Aquela não era definitivamente a praia de Lester, que sempre preferiu um barzinho com sinuca e um bom rock clássico.
— Tá legal, vamo entrar no ninho da cobra — ele murmurou pra si mesmo, em um reflexo das conversas pouco ortodoxas que tinha com o seu parceiro antes de começar seus trabalhos. Saindo da moto e ajustando a camisa preta que usava, Lester caminhou em direção da música, para o que provavelmente havia sido um grande portão antes em algum momento do passado e, agora, havia sido reduzido a portas de vidro a prova de balas, onde um brutamontes de terno e óculos escuros controlava o tráfego de entrada de pessoas. Lester, obviamente, teve de deixar as armas no apartamento, já que todas as casas noturnas atuais, possuíam detectores de metais em suas entradas, sendo aquela uma missão de investigação e não de combate, ao menos, era o que ele esperava.
Acontece que haviam rumores sobre uma família que havia comprado recentemente um casarão na área residencial que estava em expansão de Blackvalley, pertencente a uma empreiteira a qual estava faturando rios de dinheiro com os lotes de terras. Alguns compradores ganharam débitos que durariam para toda a vida, e teriam que vender até às suas almas para conseguir quitar as dívidas, mas não foi o caso da família Thierry, que havia pago tudo em espécie, segundo suas fontes. Não muito espertos em esconder suas identidades (ao menos, não de um caçador como ele), os tais Thierrys haviam usado diferentes sobrenomes para adquirir propriedades em todos os lugares onde ocorreram os massacres, tais propriedades tendo sido vendidas pouco depois das datas onde se encerraram as notícias de pessoas sendo atacadas por "animais selvagens misteriosos".
Lester não precisava ter tantos neurônios funcionando para juntar A mais B e entender que aquela família, assim como os Karsteins a quem ele estava investigando através do seu disfarçe como reverendo, era uma família de monstros. O melhor de tudo, já sabia como fazer contato...
— Espera, reverendo Jacob?! — uma mulher o abordou logo que ele entrou na casa noturna, sob as luzes que piscavam frenéticas e a música que era quase ensurdecedora, atraindo a sua atenção e quase fazendo o coração de Lester sair pela boca.
— Q-quem? — ele perguntou, um tanto sem graça.
Era uma universitária que frequentava a igreja com o pai e a avó; uma garota jovem, que sempre lhe lançava olhares sugestivos durante a missa, mas parecia ser bem comportada, usando saia longa jeans e blusas sociais. Nesse momento, a moça usava um baby Doll com a palavra "love" escrita com glitter e uma saia preta que, se olhasse de longe, parecia uma calcinha.
— Ah, o senhor por aqui?! Como isso é possível?! Está desviando do caminho?! — ela gritava com uma animação quase histérica, claramente embriagada ou pior.
— Bom... Os... Os caminhos de Deus são misteriosos! — ele respondeu a ela com um sorriso meio sem graça, tentando ver se aquilo havia funcionado, já que apenas repetiu uma das frases de efeito de Constantine com convicção. Lester se espremia entre as pessoas para passar.
— São, é?! Eu posso imaginar — disse a moça com um sorriso um tanto sugestivo no rosto, deixando de lado toda a pinta de boa garota que ela mostrava na igreja — Então isso aqui vai ser tipo o nosso segredinho?! eu posso gostar disso, com todo o respeito!! — ela gritava enquanto se colocava em seu caminho.
— Essa vida de padre é não é mole, não — ele murmurou consigo mesmo, então, tomou o copo de cerveja da mão dela — Me dá isso aqui, filha, cê já bebeu demais — disse resoluto, enquanto ia se afastando e deixando a garota pra trás, ouvindo-a dizer algo em um tom de brincadeira, mas não conseguindo entender ao certo por conta do barulho. Lester deu um pequeno gole na bebida, sentindo a mistura asquerosa de álcool com charope de frutas vermelhas e algo mais que era quase indistinguivel, fazendo uma careta e jogando-a com copo e tudo em uma lixeira por onde passou.
Lester foi se espremendo e empurrando pessoas pra fora do caminho. Primeiramente, ele foi até o bar, pedindo algumas doses de whisky e bebendo rapidamente, já deixando que o álcool circulasse pelas suas veias e fizesse o seu trabalho de descontração. Depois, ele foi em direção da escada do camarote, onde havia mais um guarda engravatado, com as mãos pra trás e o queixo erguido, quase como se fosse um sargento da polícia.
— E esse camarote aí, qual a taxa? — ele perguntou assim que se aproximou do homem, o qual apenas o olhou de soslaio, mostrando uma expressão arrogante.
— Não tem taxa, isso aqui não é cinema, amigão — disse o homem em um tom desdenhoso.
— Mas bem que podia ser, viu? — ele murmurou.
— Algo mais? — perguntou o guarda, apoiando as mãos na cintura.
— Tá legal, sargento, e como eu faço pra subir?
— Você não sobe, simples assim — disse o homem — O camarote é pros membros vips, pessoas que se destacam, sacou? E eu não tô vendo uma pulseira de vip com você.
— Pulseira de vip? — Lester arqueou uma sobrancelha, quando notou um casal se aproximando, um velhote com um suéter rosa e uma moça que tinha idade pra ser neta dele, ambos com pulseiras vermelhas fluorescentes em seus pulsos. O guarda recuou e lhes deu passagem.
— Se você não tem, e não foi convidado por ninguém do camarote, é melhor se afastar — disse o homem — Vai atrapalhar o fluxo.
— Tá, né? Viva à liberdade — Lester murmurou sarcasticamente, antes de se afastar dali. Ele pensou por alguns instantes, lançando um olhar para a sacada que dava vista do camarote lá encima, onde algumas pessoas dividiam uma mesa com leds roxos que piscavam no ritmo da música. Todos pareciam tão bagunçados e histéricos quanto os que estavam na pista, a única diferença, era que eles tinham mais dinheiro.
Ele foi se afastando, um pouco irritado pela forma como o brutamontes o tratou, mas já que aquelas pessoas apenas falavam a linguagem do dinheiro, ele iria lhes mostrar uma coisinha. Se aproximando do bar da pista, que via-se cheio de bartenders e garçons que circulavam pra lá e pra cá, preparando drinks e servindo as pessoas que gritavam e bagunçavam com seu trabalho, Lester tomou um lugar em um assento ali no balcão, puxando o cardápio e dando uma olhada nas opções de drinks disponíveis, descendo até o final.
— Amigão — ele fez um gesto para o bartender mais próximo, que se aproximou com uma expressão pacífica.
— Já sabe o que vai pedir?
— Esse aqui, ó — Lester disse, mostrando a opção da garrafa de whisky Macallan, avaliado em mais de dez mil dólares — Pode trazer todo o seu estoque e serve pro pessoal aí, hoje eu quero todo mundo feliz, que tal? — ele emendou, dando um dos seus sorrisos dissimulados que já haviam sido apelidados de "cara de cafajeste" pelos seus amores de uma noite.
— O... O senhor tem certeza?
— Ué, manda ver, eu até pago adiantado se for esse o problema — Ele disse em um dar de ombros. O cartão da irmandade era sem limites, mas é claro que ele iria levar uma bronca daquelas depois; mas isso não importava, Lester precisava subir ao camarote, precisava fazer contato com os Thierrys...
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Atualizado até capítulo 69
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