SIMON FRANZIU A TESTA ao reconhecer o homem que outro dia havia comprado um lanche no drive thru.
SIMON — Oi.
Ele ouviu o barulho da porta destrancando.
IVAN — Entra aí! Te dou uma carona.
Como não tinha muita escolha, Simon sentou-se no banco da frente. O homem subiu o vidro fumê de volta. O carro estava em baixa temperatura, bem refrescante até.
E o cheiro que vinha de Ivan Lafayette era bastante amadeirado. Um amadeirado bom, exuberante. Exalando luxo e perigo. Simon reparou no decote V que a camisa social azul marinho fazia, com dois botões pra fora. Não sabia se aquilo era proposital.
Se fosse, estava quase funcionando.
IVAN — Onde você mora?
Simon deu o endereço. Ivan já tinha dado partida no carro, um pouco abaixo do limite da velocidade. Ele não queria que aquele momento passasse tão rápido.
IVAN — Nem me apresentei primeiro, me desculpe. Meu nome é Carlo.
Ivan preferiu não dizer o nome dele. Não soube dizer o porquê.
SIMON — Prazer, Carlo. Meu nome é Simon.
Ivan sorriu.
IVAN — Simon…
E apertaram as mãos.
IVAN — Você ainda trabalha naquele drive thru?
SIMON — Não. Fui demitido.
IVAN — Sério?
SIMON — Sim. Isso foi hoje.
IVAN — Caramba… Sinto muito.
SIMON — Não sinta.
Houve um momento de silêncio.
IVAN — Por quê?
SIMON — Eu queria sair de lá mesmo. Ele me fez um favor de me colocar pra fora.
IVAN — Tava tão ruim assim?
Simon começou a se simpatizar com aquele estranho — muito bonito — que só viu uma vez na vida, que estava dando-lhe uma carona, praticamente ajudando no pior momento da sua vida. Então, decidiu se abrir mais. Começou a contar sobre a forma como Gordon agia e explorava os funcionários.
Ivan ouvia tudo, atentamente. Era uma forma de conhecer Simon. Notou que o rapaz era bem diferente de Manfred, o que era um milagre. Notou também, através das histórias dele, que o rapaz não pretendia seguir o exemplo do pai.
Simon era o tipo de rapaz perfeito que ele queria: com ar de ingenuidade, inocência… mas que já viu muito da vida, mesmo faltando meia década para chegar aos trinta.
Aquilo era atraente demais pra ele. Foi a gota d’água para investir de vez.
IVAN — Seu patrão é um tremendo babaca.
SIMON — Ex.
IVAN — Ex-patrão. Desculpe.
Simon deu um sorriso fraco, acompanhado de uma risadinha.
SIMON — Relaxa.
Ivan gostou de ver aquilo.
SIMON — Agora é a sua vez.
Eles chegaram no endereço de Simon. Ivan parou o carro, mas manteve o ar ligado. Os vidros fechados, a rua envolta numa penumbra. Somente os dois ali.
IVAN — Minha vez?
SIMON — Sim, sua vez. O que você viu em mim que te chamou atenção?
Simon foi certeiro na pergunta.
...*** ...
AMÉLIE ENCONTROU FRITZ no hospital, cumprimentando-o apenas com um aperto de mão cordial.
AMÉLIE — Você ficou aqui o tempo todo?
FRITZ — Não, não. Cheguei agora há pouco. Simon foi no trabalho resolver umas coisas e vim até aqui pra saber mais notícias.
Amélie assentiu com a cabeça.
AMÉLIE — Então ele saiu da UTI.
FRITZ — Saiu. Daqui a pouco o enfermeiro vem até aqui pra saber se pode ver ele.
A mulher cruzou os braços.
AMÉLIE — Só vim aqui pelo Karl. O garoto não para de perguntar pelo pai. Sabe como é.
FRITZ — Sei sim. É uma pena. O garoto é quem sofre mais, né.
AMÉLIE — É.
Houve um breve momento de silêncio.
AMÉLIE — Posso te perguntar uma coisa?
Fritz deu de ombros.
FRITZ — Pergunte.
AMÉLIE — Você parece ser um rapaz tão gente boa, tão do bem… Por que você ainda tem amizade e ajuda o canalha do Manfred?
Fritz comprimiu os lábios, como quem pensa na resposta.
FRITZ — Bem, eu faço isso pelo Simon. E pelo garoto, também.
AMÉLIE — É. Pensando por esse lado, até ajuda. Manfred merece quebrar a cara por fazer tanta coisa errada, sem pensar nos filhos… Acho que você poderia largar a mão dele de vez e seguir a vida.
Fritz ficou em silêncio. O enfermeiro chegou logo depois.
ENFERMEIRO — Você é…?
AMÉLIE — Irmã do paciente. Amélie.
FRITZ — Ela quer ver ele, doutor. Será que pode agora?
ENFERMEIRO — Pode. Pode sim. Vem comigo.
Amélie olha pra Fritz.
AMÉLIE — Vou lá ver ele.
FRITZ — Vá.
Assim que Amélie dobrou para o outro corredor, Fritz recostou-se na parede. Pensou em Simon.
...*** ...
SIMON ESPERAVA UMA RESPOSTA de Ivan, que olhava pensativo para o horizonte já escuro.
IVAN — Bom… Você é um rapaz bem interessante e senti vontade de falar contigo. Sem segundas intenções, claro.
Simon deu um meio sorriso.
SIMON — Sei. Agora me fale um pouco mais de você. Quem é Carlo?
IVAN — Sou diretor de uma companhia global, levo uma vida reservada… E gosto de pessoas interessantes.
Ivan recostou-se no banco, com a sombra de um sorriso no rosto.
SIMON — Você deve ter uma memória de elefante.
IVAN — Você acha?
SIMON — Acho.
Simon ajeitou-se no banco, e continuou:
SIMON — Acho que não faz uma semana que você foi naquele drive thru, me viu pela primeira vez, e hoje me deu uma carona com base na primeira impressão…
Ivan soltou o ar pelo nariz. Sentiu vontade de acender um charuto, mas não tinha um no carro.
IVAN — Você tá certo. Eu tenho uma memória de elefante.
Os dois deram uma risadinha curta. Não foi combinado.
SIMON — Você mora longe daqui?
IVAN — Na zona nobre.
Simon assentiu com a cabeça.
SIMON — É… Bem longe.
Houve um momento de silêncio. O celular de Simon tocou. Era Amélie.
SIMON — Alô, tia? Acabei de chegar em casa. Aconteceu alguma coisa?
...*** ...
AMÉLIE ESTAVA FORA DO quarto onde Manfred foi transferido.
AMÉLIE — Simon, meu filho. Teu pai acordou. Acordou chamando por ti e pelo teu irmão. Eu deixei Karl na casa de Margot… Isso… Traz ele pra cá, por favor.
***
SIMON ENCERROU A LIGAÇÃO, soltando o ar. E tirou o cinto de segurança.
SIMON — Vou precisar ir. Aconteceu um problema de família.
IVAN — Tranquilo. Quando a gente se vê de novo?
SIMON — Não sei, honestamente falando.
Ivan pegou um papel e caneta, escrevendo seu número de telefone. Simon pegou.
IVAN — Qualquer coisa, só falar comigo.
SIMON — Tá bom.
Simon sorriu, saindo do carro.
...*** ...
SIMON AGUARDAVA DO LADO de fora, na sala de espera. Karl estava com o pai no quarto, com Amélie acompanhando. Fritz estava ali perto dele.
FRITZ — Por que você não entrou junto com o garoto?
SIMON — Melhor não. Deixa Karl ficar mais à vontade com o pai.
FRITZ — Ele vai querer falar com você.
Simon deu de ombros.
SIMON — Eu não tenho nada de importante pra falar com ele.
Momentos depois, Amélie sai do quarto conversando com Karl.
KARL — Meu pai vai melhorar. Não vai, tia?
AMÉLIE — Vai sim, meu amor. Vai sim.
Ela se aproxima de Simon.
AMÉLIE — Manfred quer falar com você, filho. Ele disse que é importante.
Simon soltou o ar.
...*** ...
MANFRED ESPERAVA SIMON COM um papel dobrado na mão. Assim que viu o rapaz passar pela porta, deu uma sombra de um sorriso.
MANFRED — Eu sei que você não queria falar comigo. Mas eu precisava falar. Se não fosse importante…
Ele ainda parecia um pouco fraco, mas era bom o suficiente para manter o esforço. Simon sentou-se na beira da cama, sustentando o olhar dele.
SIMON — Fala.
MANFRED — Primeiro não quer saber se o seu pai está bem…?
SIMON — Tô vendo que você tá vivo, pai. Karl te viu? Viu, não é? Então. Eu já me acostumei com o fato de você sumir do nada e reaparecer também do nada. Mas o garoto não. Sabe o que é ter que aguentar vinte e quatro horas por dia e sete dias por semana ouvindo a mesma pergunta de um garoto de quase nove anos de idade? “Cadê meu pai…?” Não. Você não faz a porra de uma ideia. Tô me virando nos trinta pra colocar comida na mesa, sobreviver naquele casarão quase caindo aos pedaços…
Manfred ergueu a mão com o papel dobrado.
MANFRED — Pegue.
Simon franziu a testa.
SIMON — O que é isso aí?
MANFRED — Isso vai resolver os seus problemas por um tempo.
Simon desdobrou o papel.
SIMON — Um mapa?
MANFRED — Isso. São as coordenadas que vão te levar para a solução dos problemas.
SIMON — E o que tem nesse mapa?
MANFRED — Dinheiro.
Simon fixou o olhar no papel.
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Atualizado até capítulo 49
Comments
Sofi ♥️
Cê não me engana não viu "Carlo" kskssksks
2024-05-26
4
Anilda Alves da Cruz
pega o dinheiro pelo menos mudar de vida vom o irmão de preferência longe daí
2024-05-14
1