MANFRED CONSEGUIU SAIR pelos fundos do casebre sem ser visto. Usava o boné e óculos escuros. Carregava a mochila com o malote nas costas. Enquanto caminhava pela viela estreita, olhava para os lados, e para trás por cima do ombro. Queria se manter imperceptível até chegar na rodovia.
Assim que chegou na moita, pegou a sua bicicleta que estava ali escondida atrás de uma árvore. Saiu por dentro do matagal, num caminho estreito de areia, até achar outra saída na rodovia. Manfred notou que havia alcançado uma distância segura e pedalou mais rápido.
...***...
ELE CHEGOU NO CASEBRE de Fritz, onde morava de favor, e trancou a porta. Fechou janelas. Fritz apareceu da cozinha, sem entender. Deu de ombros.
FRITZ — Qual foi?
Manfred estava um pouco alvoroçado. Não conseguia processar na mente o que tinha acabado de fazer. Ele tinha matado um agiota — antes desse mesmo agiota dar cabo da vida dele, o colocou na cadeia com um simples telefonema anônimo pra polícia.
MANFRED — Você não vai acreditar no que eu acabei de conseguir, mané…
Ele tirou a mochila das costas, jogando-a em cima da mesa de madeira.
Abrindo o zíper, espalhou todos os bolos de dinheiro ali. Tudo em nota de cem. Fritz ficou boquiaberto.
FRITZ — Quanto é que tem aí?
Manfred foi conferindo bolo por bolo, frenético e atento. Na medida que ele conferia, guardava de volta dentro da bolsa.
FRITZ — Como foi que tu conseguiu tanto dinheiro, maluco?
Manfred soltou o ar.
MANFRED — Tem cigarro aí?
Fritz ofereceu um, que fora aceso. Manfred o colocou na boca, dando uma forte tragada. Soltou a fumaça densa pelas narinas.
MANFRED — Eu matei.
Fritz franziu a testa.
FRITZ — Matou quem?
Manfred pegou um shot e colocou uma dose de cachaça. Tomou tudo de uma vez, fazendo careta.
MANFRED — Heiko. Peguei ele de guarda baixa e pá. Dei cabo.
Houve um momento de silêncio.
FRITZ — Tá zoando, né?
Manfred voltou a contar os bolos de dinheiro, guardando de volta na mochila.
FRITZ — Não acredito que cê fez isso. Sério. Você brincou com fogo, mexeu num vespeiro. Com gente perigosa.
Manfred deu de ombros.
MANFRED — Não tenho mais nada a perder mesmo...
FRITZ — Puta que pariu, Manfred. Eles vão vir atrás da gente. Cacete!
Manfred fechou o zíper com força e colocou a mochila nos ombros.
MANFRED — Não, eles não vão pegar a gente. Eu não entrei pela porta da frente assim, simplesmente. Eu fui esperto. Eu sou esperto. Saí da mesma forma que entrei, sacou?
Fritz balançou a cabeça.
FRITZ — Na boa, Manfred, se você realmente fosse esperto pagaria a merda desse agiota na mesma hora que recebeu a bolada do Ivan…
Manfred fez “shhh…” com o indicador.
MANFRED — Fala baixo…
Fritz sibilou baixinho:
FRITZ — … do Ivan! Merda! Olha o que você fez!
Manfred coçou a nuca, como quem toma uma decisão. Olha para as portas e janelas que ele tinha fechado alguns minutos atrás.
FRITZ — Quanto foi que deu tudo aí?
MANFRED — Cem paus.
FRITZ — Cem mil? Caralho.
Fritz cruzou os braços.
FRITZ — Vai fazer o quê com esse dinheiro?
O olhar de Manfred era fixo na mesa.
MANFRED — Pagar uma parte da dívida.
...*** ...
SIMON CHEGOU NA PIZZARIA meia hora mais cedo. Apenas Trevor estava lá, recebendo o rapaz com um meio sorriso. Simon sorriu de volta.
TREVOR — Acho que chegou um pouquinho mais cedo…
SIMON — Eu tava com tempo sobrando, daí eu decidi vir logo pra cá.
TREVOR — Tranquilo. Até agora não apareceu nenhuma entrega. Pode ficar ali, esperando. O fluxo até agora tá tranquilo.
SIMON — Deve ser por conta do feriado.
Trevor se lembrou de algo.
TREVOR — Falando em feriado, amanhã você não precisa vir. Vamos fechar.
SIMON — Beleza, então.
...*** ...
MANFRED PEDALAVA PELA AVENIDA depressa. Desenhou várias vezes na cabeça como chegaria no local pra pagar uma parte da dívida e de como conseguiria o restante dela. Ele se virava sempre. Agora, mais do que nunca, ele precisa dar um jeito para não deixar seus dois filhos sem teto.
Não importava se ele ia morrer, mas pelo menos possuía consciência de que Simon e Karl não têm nada a ver com a vida que ele leva agora. Seu filho mais velho o odiaria pra sempre se soubesse que ele colocou o casarão como garantia.
Olhou o relógio de pulso e estava quase anoitecendo. E também estava quase chegando no destino onde queria.
...*** ...
HEIDI VISITOU SIMON na pizzaria ainda com o movimento fraco. Ela pediu uma pequena, de calabresa. Serviu dois pedaços para o amigo.
HEIDI — Não sei como você engordou aqui dentro. Essa pizza é uma delícia.
SIMON — Não é porque eu trabalho aqui, mas sou suspeito pra concordar.
Heidi bebeu um gole de coca cola.
HEIDI — Eu não vim aqui só pra comer uma pizza contigo e jogar conversa fora.
Simon franziu a testa.
SIMON — Como assim?
Heidi pegou na mão dele, de forma dramática.
HEIDI — Preciso te contar uma coisa bombástica.
SIMON — Conta, garota.
HEIDI — Gordon me pediu pra passar direto na sala dele amanhã. Sem começar o turno.
Simon ficou boquiaberto.
SIMON — Você foi demitida…
HEIDI — Tomara! Mal posso esperar. Vou nem colocar o avental, nem nada.
Simon fingiu uma expressão triste.
SIMON — Aquela cozinha vai ficar uma bosta sem você.
HEIDI — Vou sentir sua falta, amigo. Você também quer sair?
Simon soltou o ar.
SIMON — Por mais que eu precise do dinheiro, mesmo sendo uma merreca, eu quero sair. Não aguento mais Gordon. É o pior chefe que já conheci em toda minha vida. Tomara que ele me chame depois, também.
HEIDI — Tomara, amigo.
Ela olhou pro relógio.
HEIDI — Acho que você precisa começar a fazer entrega, né? Senão vou te atrapalhar aqui…
Simon se levantou.
SIMON — Acho que a primeira vem aí.
Eles se abraçaram, como despedida.
HEIDI — Até amanhã, amigo.
SIMON — Até.
...*** ...
IVAN JOGAVA CARTEADO junto com Vladimir e Boris, numa mesa reservada no canto da enorme sala. Os três com charuto na boca.
VLADIMIR — Acabei de saber agora há pouco quem morreu.
Ivan franziu a testa para as próprias cartas.
IVAN — Quem?
VLADIMIR — Heiko.
Boris soltou a fumaça do próprio charuto.
BORIS — Morreu morreu mesmo?
Vladimir bebeu um gole de uísque sem gelo.
VLADIMIR — Na real, ele foi assassinado.
Ivan ficou pensativo. Jogou mais uma carta na mesa depois dos seus dois guarda-costas.
IVAN — Heiko é um agiota muito perigoso, não? Tem as costas quentes.
BORIS — Pois é. No mínimo alguém acima dele deve ter dado cabo. Senão…
Manfred apareceu de repente na sala, com a mochila na mão. Conseguiu o olhar dos três homens simultaneamente.
MANFRED — Precisamos trocar uma ideia. Urgente.
Ivan soltou a fumaça pelo nariz.
IVAN — Quem deixou você entrar aqui?
Greta apareceu correndo, com o olhar de quem se desculpava muito por aquilo.
GRETA — Ele já chegou invadindo, senhor. Não pude fazer muita coisa…
MANFRED — Não culpe a senhora, por favor. Ela tentou, mas você sabe como eu sou.
IVAN — Sei muito bem como você é. Agora, me explica, o que você veio fazer aqui invadindo a minha casa?
Manfred jogou a mochila no chão, no meio do espaço entre eles.
MANFRED — Aqui.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 49
Comments
Keu Sorella
É Manfred, vc vacilou agora, e , se usou a mochila 🎒 morto, deu bandeira..
2024-07-01
1
Anilda Alves da Cruz
Irão desconfiar que ele matou o agiota né?
2024-05-14
2