Capítulo 19: Pega no Pulo!

Meus olhos seguiram Ivan através da multidão, meu corpo instintivamente o seguindo. Esgueirei-me entre as pessoas, rastreando seu caminho como um cão farejador. Encontrei-o em um local isolado no fundo do salão, onde um banco decrépito quase desabava em uma área que até então me era desconhecida. Era improvável que ele escolhesse aquele lugar por vontade própria, algo o empurrava naquela direção.

Logo compreendi o motivo. Ivan estava com o rosto entre as mãos, curvado sobre o banco. Um longo suspiro escapou de seus lábios, como se carregasse o peso do mundo sobre seus ombros. Seus ombros pareciam curvados sob o fardo invisível, e seus dedos apertavam o rosto com firmeza, como se buscasse apoio em meio à tormenta interna.

No âmago, eu sabia que havia algo relacionado a Clara. Eles não haviam chegado juntos e a atmosfera entre eles não estava nada tranquila; caso contrário, estariam grudados um no outro.

Eu tinha certeza de que era algo relacionado com a sementinha que eu plantei. Não podia ser outra coisa. Essa convicção pulsava em mim como um coração acelerado, ecoando a certeza de que minhas ações estavam dando frutos.

Confrontei meu próprio dilema interno, debatendo se deveria ou não interromper a solidão de Ivan. Mas então, uma convicção fria se apoderou de mim, sugerindo que não deveria me aproximar, que minha missão era apenas observar os resultados sombrios de minhas ações.

Eu me contentei em permanecer à distância, observando como minha estratégia começava a desgastar Ivan por dentro. Era isso que eu queria, destruí-lo silenciosamente, minando sua confiança e enfraquecendo sua determinação. O eco distante das vozes na sala principal parecia apenas uma trilha sonora para o colapso iminente que eu testemunhava.

Não ousaria tentar consolá-lo, pois eu era a arquiteta de sua ruína. Quem dispara uma flecha e depois tenta desviar seu curso? Quem empunha uma arma e depois tenta impedir o tiro de atingir o alvo? Eu era a autora dessa tragédia, e não tinha intenção de interferir no desenrolar dos eventos que eu mesma havia desencadeado.

Ao me virar para sair, um tropeço involuntário fez com que o som dos meus saltos ecoasse pelo ambiente. Antes mesmo de me dar por conta, as palavras de Ivan cortaram o ar com uma mistura de angústia e exasperação.

— Não é possível que nem ao meu sofrimento eu possa escapar, Cristine. Por favor, me deixe em paz!

Então, ao virar-se para mim, Ivan deparou-se com uma figura inesperada: uma Carmilla, vestida em um longo vestido vermelho e uma peruca loira platina, olhando-o com expressão assustada. Num instante, minha mente se apressou em encontrar a melhor forma de reagir.

— Ah, me desculpe. Eu pensei que fosse Cristine vindo mais uma vez me infernizar. Me perdoe, moça — ele estendeu a mão, em um gesto de cortesia.

— Não se preocupe, Ivan. Eu não sou Cristine. É apenas um mal-entendido — disse rapidamente, movendo minhas mãos como se buscasse criar distância entre nós, ignorando seu gesto de cortesia. — Eu só vim aqui para respirar um pouco de ar puro.

Ivan se levantou, ficando frente a frente comigo. Uma onda de nervosismo tomou conta de mim diante da proximidade, e dei um passo para trás, um erro grotesco da minha parte. Sem perceber, pisei na barra do meu vestido e me desequilibrei, quase caindo no chão.

Ivan foi rápido em me segurar, mantendo seu corpo próximo ao meu, aumentando ainda mais o nervosismo que me consumia. O toque dele ardia como fogo, e seus olhos... oh, seus olhos eram tão intensos, tão... atraentes. Céus, o que eu estava pensando?

Que tipo de assassina desengonçada eu era, deixando-me envolver por sensações tão absurdas? Normalmente, eu não me permitia ser afetada dessa maneira. Eu era silenciosa, quase invisível, deslizando pelas sombras sem ser notada. Mas agora, aqui, nos braços de Ivan, eu me sentia como se estivesse em plena luz do dia, exposta e vulnerável. Era um erro que não podia se repetir.

Ivan me segurava com firmeza, e eu me sentia como uma menina indefesa em seus braços. A discrepância em nossa estatura era evidente, e seu toque parecia inflamar a pele do meu braço. Em um impulso instintivo, afastei-me bruscamente, pegando-o de surpresa com meu movimento súbito. Seus olhos mostravam uma mistura de confusão e surpresa, enquanto eu lutava para recuperar minha compostura.

— Desculpe se te assustei. Você está bem? — Ivan perguntou, sua voz suave tentando dissipar a estranheza do momento.

— É óbvio que estou bem, não está vendo? — Respondi irritada, percebendo meu tom, fiz uma pausa para limpar a garganta. — Er... Quero dizer, estou bem sim, obrigada pela ajuda, Ivan.

Seu rosto parecia um tanto quanto confuso enquanto ele tentava encontrar palavras para aquele encontro desengonçado.

— Parece que tivemos a mesma ideia, eu também vim tomar um pouco de ar. A noite de hoje está sufocante, e eu só queria encontrar um pouco de paz.

Assenti, demonstrando compreensão, mas no fundo, eu queria pular de alegria por saber da sua desgraça. Engoli minha vontade e foquei em seu rosto. Foi então que percebi sua fantasia de Sr. Smith. Ele era o par de Clara.

— Fantasia legal. É o que? — perguntei fingindo curiosidade.

— Ah, isso foi ideia de Clara. Era para sermos Sra. e Sr. Smith, mas cá estou eu, sem a senhora e sendo apenas um senhor solitário — disse, com um leve sorriso melancólico, como se reconhecesse ironicamente a situação— E a sua? É algum tipo de vampiro, não é? Dá para imaginar pelo vestido — ele continuou a conversa.

— Sim, estou vestida de Carmilla. Você sabe, aquela personagem misteriosa e sedutora, tanto do romance clássico quanto da série Castlevania.

— Espera aí... — ele se aproximou e verificou algo em meus olhos — Você é a Samira, não é? Ah, imaginei pelos cor dos olhos. Senti que já os tinha visto em algum lugar. É que você fica muito diferente nessa roupa.

Senti uma onda de irritação me invadir. Como ele não me reconheceu? Eu não estava tão diferente do meu dia-a-dia! Parecia que eu sabia quem ele era, mas ele não fazia ideia de quem eu era. 

— Olha, como temos um objetivo comum, acho que não faz mal compartilharmos a solidão um do outro, não é? — ele apontou para o banco, e sorriu — Que tal tomarmos um ar juntos?

De forma alguma! Não me aproximaria o suficiente dele para compartilhar ou sentir suas frustrações. Isso só complicaria as coisas. Manter distância era crucial para evitar qualquer possibilidade de remorso pelas minhas ações.

— Acho que seria melhor para você ficar sozinho, Ivan. Às vezes, enfrentar as coisas sozinho pode fortalecer mais do que ter alguém ao seu lado. A solidão pode ser uma aliada poderosa em momentos difíceis.

 — Mas... Eu só queria ter alguém para conversar nesta noite, para dividir um pouco do peso que carrego. Não precisa ser nada profundo, apenas uma conversa para aliviar um pouco a tensão. E além disso, eu não mordo Samira, por mais que agora seja um fera ferida. Um pouco de conversa não faz mal.

"Que tal procurar uma psicóloga?" quase falei, enquanto sustentava um sorriso falso. Talvez, mas só talvez, conversar com ele me trouxesse alguma informação útil para continuar meu plano. Eu sabia que deveria suprimir os sentimentos de misericórdia e empatia, e simplesmente focar no que me beneficiaria.

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