Capítulo 10: Montanha-Russa.

Ivan narrando...

O expediente começou, e eu fui direto para a sala de Clara, sentindo um peso em minha consciência que só aumentava a cada passo dado. A lembrança da investida de Cristine ainda ecoava em minha mente, enchendo-me de desconforto e repulsa. Era uma situação complicada, e mesmo que eu soubesse que não havia sido eu quem procurara por aquilo, não conseguia evitar a sensação de culpa que me consumia.

Enquanto andava pelos corredores, as palavras de Cristine ressoavam em meus ouvidos, fazendo-me reviver o momento em que ela tentara me beijar à força. Um arrepio percorreu minha espinha enquanto eu me lembrava da sensação de repulsa que senti naquele instante. Muitos poderiam interpretar minha recusa como fraqueza ou até mesmo questionar minha sexualidade, mas a verdade era que eu simplesmente não estava disposto a trair Clara, alguém que eu estimava e respeitava profundamente.

Enquanto enfrentava aquele dilema interno, o peso em meu peito só aumentava, misturando-se com a incerteza sobre como proceder dali para frente. Eu sabia que precisava encontrar uma maneira de lidar com a situação sem prejudicar Clara, mas a ideia de confrontar Cristine ou expor seus avanços indesejados me deixava nervoso. No fundo, eu só queria que tudo aquilo fosse um terrível mal-entendido, mas infelizmente, as palavras e gestos de Cristine eram claros demais para serem ignorados.

Decidi conversar com Clara a respeito da situação, e esperava que ela me entendesse, por mais imprevisível que fosse. Esperava encontrar nela compreensão, e que ela não se ofendesse.

Ao entrar na sua sala, vi ela conversando no telefone. Seus gestos eram rápidos e suas expressões mudavam constantemente, indicando uma conversa animada e agitada. 

—Sim, sim, claro que entendo, mas você precisa entender que isso simplesmente não é aceitável! Não, não me venha com desculpas esfarrapadas, eu quero uma solução imediata para esse problema. Está me ouvindo?!— ela exclamou, sua voz carregada de frustração e indignação.

Esperei pacientemente enquanto ela terminava a ligação, observando-a com curiosidade e uma pitada de apreensão. Clara sempre fora imprevisível, e eu nunca sabia ao certo como ela reagiria a determinadas situações. Por um lado, sua determinação e firmeza eram admiráveis, mas por outro, sua impulsividade podia ser um desafio para lidar.

Finalmente, Clara desligou o telefone com um movimento brusco, fazendo-o bater com força sobre a base. O barulho ressoou no ar, ecoando pelo escritório e chamando a atenção de alguns colegas próximos.

— Ahhh! Esse fornecedor é tão, tão, tão... sem noção! — ela exclamou, sua voz carregada de frustração. Sua expressão facial era de puro desagrado, os olhos faiscando com raiva reprimida.

Observei-a com uma mistura de surpresa e preocupação. Embora estivesse acostumado com os arroubos temperamentais de Clara, ainda me surpreendia com a intensidade de suas reações às vezes. Era como se ela se deixasse levar completamente pelas emoções do momento, sem se importar com as consequências.

— Esse fornecedor precisa aprender a respeitar nossos prazos e nossas exigências! Não posso acreditar que ainda estamos lidando com esses problemas depois de tantos anos de parceria! — ela continuou, sua voz elevando-se com cada palavra, como se estivesse à beira de uma birra infantil.

Respirei fundo, tentando manter a calma diante da explosão de temperamento de Clara. Sabia que precisava abordar o assunto delicado que me trouxera até ali, mas também sabia que precisava escolher minhas palavras com cuidado. Afinal, não queria ser alvo da próxima explosão de raiva dela.

Assim que entrei na sala, os olhos de Clara se iluminaram ao me ver, mas logo sua expressão mudou para uma mistura de surpresa e decepção infantil.

— Amorzinho, pensei que você fosse a Samira! — ela disse, fazendo um bico e cruzando os braços com um ar de desânimo.

Percebi imediatamente que ela esperava outra pessoa, e uma onda de frustração me atingiu. Era como se minha presença não fosse suficiente para animá-la, e isso me deixou desapontado.

— Desculpe, Clara. Achei que você estivesse disponível para uma conversa rápida. Não queria atrapalhar. — respondi, tentando esconder a decepção em minha voz.

Clara suspirou, parecendo arrependida por sua reação inicial.

— Ah, não, não é isso, amorzinho. Desculpe pelo mal-entendido. Mas sabe, desde que a Samira começou a nos ajudar, tenho me sentido muito mais à vontade. Ela é autêntica, sabe? Gosto da forma como ela encara as situações de frente, sem rodeios.  — ela disse, suavizando seu tom e estendendo a mão em um gesto de reconciliação.

— Bem, que bom que estão se dando bem. — respondi, sorrindo, e aceitando seu gesto.

Clara não era fácil de lidar, e por isso, muitas pessoas passaram por esse cargo. Fico feliz que a nova assistente não tenha pulado do barco. Isso só reforça o peso da indicação de James.

— Bem, na verdade, eu queria falar sobre um assunto um pouco delicado... — comecei, tentando abordar o tema sobre o acontecimento com Cristine, mas Clara me cortou rapidamente.

— Ah, não me fale sobre assuntos delicados agora, querido! Estou cansada demais para isso. Sabe quem está me irritando muito esses dias? A minha melhor amiga, Cristine. Ela tem sido tão chata ultimamente! — Clara disse, fazendo uma careta de desagrado.

— Sério? O que ela anda aprontando? — perguntei, tentando disfarçar minha frustração diante da perspectiva de ter que lidar com o mesmo assunto que estava tentando evitar, mas a curiosidade ainda persistia em ouvir as reclamações de Clara sobre Cristine. Por mais que quisesse abordar o assunto delicado que me trouxera até ali, sabia que não podia simplesmente ignorar as preocupações de Clara, mesmo que elas fossem sobre algo menos grave.

— Ah, você não faz ideia! Ela fica me mandando mensagens o tempo todo, querendo saber todos os detalhes da minha vida. É como se eu não pudesse ter um momento de paz! E ainda por cima, ela insiste em me chamar de apelidos bobos, tipo "meu amor" ou "querida". Como se eu fosse um cachorrinho de estimação! — Clara resmungou, balançando a cabeça em desaprovação.

Ao ouvir as queixas de Clara sobre Cristine, uma onda de frustração tomou conta de mim. Era como se minha tentativa de abordar um assunto sério fosse completamente ignorada, e isso me deixou incomodado. No entanto, decidi não expressar minha frustração naquele momento e continuei ouvindo as reclamações de Clara, tentando disfarçar minha decepção.

Compreendi que era simplesmente impossível me abrir com minha noiva. Percebendo suas reclamações sobre Cristine, entendi que não haveria maturidade em lidar com esse assunto em nosso relacionamento. A sensação de frustração se intensificou, pois enquanto eu lutava para encontrar coragem para abordar um assunto sério, Clara parecia envolvida em trivialidades.

Para me livrar dos assuntos triviais de Clara, alguém bateu na porta, e abriu logo em seguida.

Era a nova assistente.

Samira entrou na sala com uma aparência magra e baixa, seus olhos azuis destacando-se em seu rosto delicado. Minha primeira impressão foi de que ela parecia mais uma adolescente do que uma profissional adulta. Se minha avó estivesse ali, certamente comentaria que a moça não se alimentou bem na infância, e expressaria preocupação pela sua aparência frágil. Era muito doloroso saber que ela não podia estar na empresa, naquele momento.

— Bom dia, desculpe a demora. — Samira entregou o café à minha noiva, mal olhando para o meu rosto. Eu me sentia praticamente invisível diante dela, o que era um comportamento diferente, já que todos me reconheciam, me cumprimentavam e até mesmo bajulavam.

— Nossa, achei que você estava fazendo o café, Samira. — Clara disse impaciente, enquanto abria o pacote que a jovem trouxe.

— Bem, então da próxima vez vá você buscar! — Samira respondeu, sua voz carregada de autenticidade. Suas palavras foram diretas e até mesmo um pouco grossas.

A resposta direta e até um tanto ríspida de Samira me pegou de surpresa. Eu não esperava que ela fosse tão franca diante de Clara, especialmente considerando a hierarquia da situação.

Clara riu, o que me surpreendeu ainda mais. Não era comum vê-la reagir positivamente a uma resposta tão franca como a de Samira. Clara sempre detestou falsidade e valorizava a autenticidade nas interações. Parecia que a sinceridade de Samira a agradava de alguma forma, como se ela admirasse a postura firme da jovem em expressar sua opinião. Observando a reação de Clara, percebi que talvez houvesse mais afinidade entre elas do que eu inicialmente imaginava.

— Nossa, Ivan, você viu só como a Samira é direta? Eu adorei! — Clara exclamou, com um brilho nos olhos que denotava genuína empolgação.

— Sim, foi bem surpreendente, não foi? — respondi, ainda um pouco perplexo com a reação de Clara.

— É, tipo, ela não fica enrolando, sabe? Eu gosto disso. É tipo... bam! Direto ao ponto! — Clara disse, fazendo gestos animados com as mãos para enfatizar sua observação.

Balancei a cabeça, perplexo. Era incrível como Clara era imprevisível. Às vezes, isso me causava certo desconforto.

Decidi deixar as duas sozinhas e sair para minha sala. Já estava ficando saturado daquela interação. O que me preocupava era que, quando nos casássemos, não teria para onde fugir. A imprevisibilidade de Clara parecia uma constante em nossas vidas, e eu não sabia ao certo como lidar com isso no longo prazo.

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