Voltando para a empresa, Clara foi a primeira a me abordar, seu rosto transbordando ansiedade pela realização do teste de gravidez. Eu me sentia exausta, a fome me consumia após uma manhã inteira de caminhada, e a atmosfera daquele hospital parecia drenar ainda mais minhas energias. Encarei Clara com um misto de desânimo e curiosidade enquanto ela se aproximava, gesticulando com entusiasmo.
— Samira, Samira, Samira! E aí?! Fez o que te pedi? — ela perguntou, sua voz ecoando com expectativa no corredor abafado do hospital.
— Sim, trouxe o que você pediu. Aqui está — entreguei o teste, enquanto começava a reunir minhas coisas para ir almoçar. O relógio já marcava meio-dia, e eu estava faminta. Era um alívio estar de volta à empresa após a atmosfera cansativa do hospital, e mal podia esperar para me deliciar com uma refeição satisfatória.
Peguei minha bolsa e me encaminhei em direção ao refeitório, mas as mãos macias de Clara me seguraram com firmeza.
— Aonde pensa que vai? — ela me encarou com seriedade.
— Comer? As pessoas precisam se alimentar, sabia? E estou morrendo de fome.
— Ah, não, Samira! — ela gesticulou os braços para cima e para baixo, como uma criança birrenta — Quero que você fique comigo, para ter apoio quando ver o resultado.
Elevei a sobrancelha ao ouvir aquela bobagem. A fome me consumia, e meu humor começava a ficar rabugento, mais do que já era. Eu não poderia segurar as palavras, mesmo diante dela.
— Eu não! Quem acha que está grávida é você, não eu! Estou com fome, quero comer.
— Ah, Samira, por favor!
— Não! Chame... Sei lá, Cristine? Acho que ela vai adorar saber disso — disse, imaginando a situação irônica.
— Você enlouqueceu de vez! Nunca chamaria aquela megera em um momento especial como esse.
Fiquei pensativa, imaginando o que teria acontecido para Clara ter um ranço tão forte da amiga. Não pude conter a curiosidade; afinal, estava com fome. E quando estou faminta, meus impulsos não são muito bem controlados.
— Ué, achei que vocês fossem melhores amigas? Você mesma disse no dia da minha integração. O que mudou? — perguntei, querendo entender melhor a situação.
Clara ficou em silêncio, como se estivesse guardando um grande segredo. Observando-a assim, com a boca fechada, ela parecia até mesmo sensata, e não uma explosão de imprevisibilidade.
— Bom, quem cala, consente. Já que ela é sua melhor amiga, vá fazer o teste junto com ela — disse, fingindo sair da sala.
— Não, espere, vou te contar. Mas você tem que jurar de dedinho que não vai contar para ninguém — Clara pediu, com um tom de urgência em sua voz.
Assenti com a cabeça, intrigada com o mistério que envolvia a situação.
— Prometo guardar segredo. Pode contar comigo — respondi, estendendo meu mindinho em um gesto de compromisso. Mal sabia ela que estava absorvendo informações que iria utilizar futuramente.
— O problema é que... Cristine, ela... — ela hesitou por um momento, como se procurasse as palavras certas para explicar a situação delicada.
— O que aconteceu com a Cristine? — perguntei, minha curiosidade aumentando a cada segundo.
— Cristine… — ela começou, mas minha paciência estava se esgotando rapidamente. Meus braços começaram a tremer, não sabia dizer se era de fome ou de raiva daquela situação trivial.
— Sim, Cristine o quê? — perguntei impaciente.
— Cristine está mandando fotos íntimas para meu noivo! — ela disse rapidamente, como se vomitasse palavras, e então cobriu a boca, como se tivesse dito algo proibido.
— Uau, a diretora de RH? Quem diria, hein? — eu disse, ironizando a situação.
— Como assim? Você já sabia que aquela mulher está tentando roubar o que é meu?
— Não, não! Longe de mim — menti — Mas sempre tive um pressentimento ruim sobre ela.
— Nossa, aquela vaca! Eu peguei o celular de Ivan ontem, e dei de cara com aquele show de horrores. Será que ela não percebeu ainda que é horrorosa? Ivan nunca iria olhar para ela.
Eu me divertia com toda a situação. A metáfora da gasolina pronta para ser incendiada ecoava em minha mente, mas eu mantive o controle, não derramando uma gota sequer no chão. As circunstâncias haviam tomado um rumo próprio, e agora bastava uma faísca para incendiar a vida de Ivan. E eu estava disposta a ser aquela que riscaria o fósforo.
Aquele momento representava uma oportunidade perfeita para explorar as inseguranças de Clara, um ponto de partida para desmantelar a vida amorosa de Ivan até virar cinzas. E eu estava pronta para ser a arquiteta dessa destruição meticulosamente planejada.
— Espera, e por que Ivan deu essa liberdade toda?
Clara retrucou com firmeza, defendendo seu parceiro com convicção.
— Ivan não deu liberdade alguma! É ela quem é cara de pau, mandando essas coisas para homens comprometidos. Não podemos simplesmente culpar Ivan por algo que ele pode não ter controle.
Cruzei os braços e olhei séria para ela.
— E quem te disse isso? — questionei com um tom cético.
— Ivan, oras — respondeu Clara, como se fosse óbvio.
Levantei uma sobrancelha em incredulidade.
— E você acreditou nisso? — indaguei, destacando a necessidade de uma análise crítica da situação.
Clara permaneceu firme em sua defesa de Ivan, mesmo diante da minha incredulidade.
— Sim, claro que acreditei nele. Ivan não teria motivo para mentir sobre algo assim. Ele sempre foi honesto comigo — ela respondeu, sua expressão refletindo confiança em seu parceiro.
Balancei a cabeça em negação, mostrando que não concordava e expressando minha preocupação com sua relutância em questionar a versão de Ivan.
— Clara, sabia que eu fui criada apenas por homens? Eu não tive mãe presente, portanto, era a única menina da casa. E sabe o que eu percebia?
Clara olhou para mim, curiosa para saber onde eu estava indo com aquela revelação pessoal.
— O que você percebia? — ela perguntou, esperando que eu continuasse.
Respirei fundo antes de responder, deixando escapar um suspiro de nostalgia.
— Eu percebia que, mesmo os homens mais íntegros, podiam ser facilmente influenciados por uma mulher sedutora. Não importava o quão comprometidos ou leais eles fossem, a tentação muitas vezes era mais forte do que a razão. Cristine não daria um ponto sem nó, ela não é louca de enviar algo íntimo sem ter visto um retorno para as ações. Eu acho, Clara, que Ivan não é inocente e se eu fosse você, abriria meus olhos.
Ao ouvir minhas palavras, Clara franziu o cenho, processando a informação de maneira intensa. Sua expressão infantil e imprevisível mudou rapidamente, revelando uma mistura de surpresa e descrença.
— Mas... mas o Ivan sempre foi tão fiel a mim... — murmurou ela, tentando assimilar o que acabara de ouvir. Sua voz tremia ligeiramente, denotando a agitação interior que ela estava sentindo.
Ela olhou para mim, seus olhos grandes e cheios de dúvida, como se estivesse lutando para aceitar a possibilidade de que seu parceiro pudesse ser culpado de alguma forma. No entanto, uma faísca de desconfiança começou a brilhar em seu olhar, sugerindo que minhas palavras estavam começando a ecoar em sua mente, desencadeando uma avalanche de pensamentos e emoções contraditórias.
Enquanto observava a reação de Clara, uma sensação de satisfação se instalou dentro de mim. Era exatamente isso que eu queria: plantar a semente da dúvida em sua mente, fazendo-a questionar a integridade de Ivan e o papel de Cristine na situação.
Internamente, quase sorri diante do sucesso do meu plano, mas sabia que precisava manter a pose séria e compassada. Era crucial manter a fachada de seriedade para garantir que minha influência sobre Clara continuasse a crescer.
— Bom, você é adulta e deve saber o que é melhor para si. Mas pense no que disse. Agora, vamos fazer esse teste logo. Estou morta de fome — mudei de assunto, tentando desviar a atenção do momento tenso que acabávamos de vivenciar.
Após o teste ser feito, Clara saiu do banheiro com seus olhos cheios de decepção, revelando o resultado que ela não esperava.
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Atualizado até capítulo 35
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