Kiran deixou a câmara do conselho com o coração pesado, seu semblante abaixado refletia a conversa turbulenta que acabara de ter com os guardiões. Cada palavra ainda ecoava em sua mente, enchendo-o de dúvidas e incertezas. Enquanto caminhava pelo corredor deserto, perdido em seus pensamentos, se deparou com uma figura solitária sentada no chão. Era Munihr, como sempre, fazendo questão de desrespeitar as regras do palácio ao ocupar uma área sagrada.
"Ele sempre age com tanta arrogância", pensou o príncipe consigo mesmo.
Enquanto se aproximava cautelosamente do lunar, cujos olhos permaneciam fechados. No momento em que sua presença foi percebida, Munihr abriu os olhos e seus olhares se encontraram. Kiran sentiu-se vulnerável sob o olhar penetrante do lunar e rapidamente desviou o olhar incomodado, evitando o confronto silencioso. Havia algo naquele olhar que parecia penetrar sua alma, era evidente que Munihr estava tentando descobrir algo sobre ele.
— Onde está aquela mulher maldita? — perguntou Kiran desviando a atenção do lunar de si mesmo.
Munihr, sem perder o ar contemplativo, respondeu com calma:
— Astrea já foi embora. Ela estava profundamente abalada.
A preocupação tomou conta de Kiran. Ele sabia que Astrea nunca superara completamente a perda de Elijah, mesmo depois de tanto tempo. A dor da ausência ainda a assombrava, como uma ferida que nunca cicatrizava.
— Ela viu a estátua dele, não é? —deduziu, lembrando-se dos monumentos que honravam os guardiões, alinhados ao longo do corredor.
Munihir assentiu, com olhos brilhando em uma tristeza compartilhada. Era como se ele soubesse, em um nível profundo, o peso que carregava a memória de Elijah na vida de Astrea.
— Como você conhece Elijah? — o solariano perguntou, curioso para desvendar mais um dos mistérios que envolviam aquela presença lunar.
— Através de Astrea... mas não vou me intrometer em assuntos que não me dizem respeito. — respondeu.
Ele olhou para Munihr, frustrado.
— Você e seus mistérios... Como você sempre sabe tanto?
O lunar apenas sorriu, como se soubesse algo que Kiran ainda não entendia.
— Descobri algo interessante enquanto estava aqui — Munihr disse.
O solariano seguiu o olhar do lunar e viu, para sua surpresa, uma estátua dourada que capturava sua própria imagem. Era uma representação impecável de sua figura, com todos os detalhes meticulosamente trabalhados em ouro reluzente.
— Você encontrou minha estátua...—Kiran murmurou, incapaz de esconder sua surpresa. Ele se perguntou como Munihr havia descoberto sua estátua entre tantas outras, já que até mesmo ele teria dificuldade em identificá-la ali.
O líder dos lunares assentiu, com olhos ainda fixos na estátua.
— Não foi difícil. Com esse rosto arrogante, eu poderia te encontrar em qualquer lugar.
Um misto de irritação atravessou o rosto do príncipe. Ele nunca escondeu sua postura altiva e dominante, mas ouvir seu inimigo, agora aliado, falar tão abertamente fez com que ele se sentisse exposto, como se suas camadas protetoras estivessem se desgastando sob seu olhar atento.
— Eu nunca esqueço um rosto...— Munihr continuou, com uma expressão cativada pelos detalhes da imagem do guardião — Mesmo que houvesse infinitas estátuas aqui, eu ainda reconheceria você.
Aquelas palavras acertaram Kiran em cheio, fazendo com que uma mistura estranha de emoções surgisse dentro dele. A sua expressão, antes contida, ameaçava se transformar em um sorriso leve, enquanto seu coração começava a bater mais rápido. O simples fato de alguém reconhecer algo tão profundo e intrínseco nele era algo que não esperava.
No entanto, ao olhar para a estátua que o representava, um peso pesado se abateu sobre sobre ele, dissipando rapidamente a sensação agradável que começava a florescer. A estátua, tão imponente e majestosa quanto ele mesmo, parecia transmitir uma sensação de solidão e isolamento. Era como se a representação física de sua imagem estivesse repleta de todas as inseguranças e temores que ele mantinha escondidos atrás de sua fachada imponente.
Kiran desviou o olhar da estátua e voltou sua atenção para Munihr, que permanecia cativado pelos detalhes da escultura. Em um breve instante, seus olhares se encontraram em um silencioso entendimento. Era como se o lunar pudesse ver além das camadas exteriores de Kiran, alcançando a essência de quem ele realmente era.
Sua mente se encheu de pensamentos tumultuados. Ele se perguntava se o homem lunar, com toda a sua perspicácia, seria capaz de decifrar a verdade por trás da estátua e perceber a vulnerabilidade que Kiran tentava tão desesperadamente esconder. Uma parte dele ansiava por isso, por ser compreendido e aceito em sua totalidade. No entanto, outra parte de temia o julgamento e a rejeição que poderiam acompanhar essa revelação.
Enquanto lutava contra esses pensamentos conflitantes, Kiran sentiu a necessidade de se desculpar, de alguma forma, por quem ele era agora e pelas muralhas que estava construindo ao seu redor. Ele sussurrou um simples "Desculpe", esperando fervorosamente que a boa intuição Munihr não captasse sua admissão e não desvendasse suas fraquezas.
O silêncio pairou no ar, e o príncipe olhou para o lunar em busca de qualquer sinal. Os olhos profundos de Munihir pareciam refletir uma série de emoções, mas não havia um olhar de reprovação ou condenação. Apenas um mistério a ser desvendado a qual Kiran queria se aprofundar, e se encontrar naquele abismo.
Munihr começou cambalear repentinamente, suas pernas cediam sob seu próprio peso. Seus olhos se fecharam lentamente, enquanto sua visão escurecia. O príncipe entrou em pânico e correu em direção a ele, ajoelhando-se ao seu lado com preocupação evidente em seu rosto.
— Ei! Não é hora para brincadeiras! — exclamou, cutucando suavemente o rosto adormecido de Munihr. — Acorde!
Enquanto Kiran tentava despertá-lo, a Estrela do Dia, Ut, surgiu no corredor, observando a cena perplexa.
— O que aconteceu aqui? — perguntou, aproximando-se cautelosamente. — Este é o lunar do qual andam falando?
O ruivo assentiu, enquanto seus olhos ainda estava em Munihr, preocupado com seu estado.
— Eu não faço idéia. Ele simplesmente desmaiou de repente.
A guardiã se aproximou para analisar o lunar, examinando-o com atenção.
— Ele está apenas dormindo — concluiu Ut, com um leve sorriso nos lábios.
— "Dormindo"? — Kiran franziu a testa, confuso e surpreso com a explicação.
Ut confirmou com um gesto compreensivo.
— Sim, ele é um lunar. Todos os lunares dormem durante o dia, quando o sol está presente. E o fuso horário de Solaria é um pouco diferente de onde ele vem. Você não sabia?
Kiran revirou os olhos e fez bico, sentindo-se um tanto bobo por não ter prestado atenção a esses detalhes importantes.
— Talvez eu soubesse, mas não prestei atenção suficiente. — disse ele, com um tom de desdém em sua voz. — E agora?
— Bem, agora ele vai dormir. Enquanto o sol estiver no céu, ele não vai acordar tão cedo. É provável que esteja sobrecarregado e precisando descansar.
— O quê?! Acorde! — exclamou o príncipe, dando alguns tapas leves no rosto de Munihr, mas sem obter resposta.
Ut colocou uma mão reconfortante no ombro de Kiran, tentando tranquilizá-lo mais uma vez.
— Príncipe, eu já disse. Ele não vai acordar mesmo que o mundo acabe. Agora, a melhor coisa que você pode fazer é encontrar um lugar adequado para que ele possa descansar.
Kiran suspirou, olhando para o rosto adormecido de lunar, com uma mistura de frustração e raiva.
— Não posso deixá-lo aqui no meio do corredor. Tenho mais o que fazer! — disse, já irritado com a situação.
— A Estrela da Noite também está descansando. Por que você não o coloca para dormir em um local apropriado? — sugeriu a guardiã.
Kiran considerou a idéia, percebendo que era a melhor opção e única diante daquela situação. Ele se levantou do chão e começou a traçar um plano em sua mente, pensando em várias maneiras de carregar Munihr, já que o lunar era imponente e possuía um porte físico considerável.
— É o que resta. — bufou ele, ainda frustrado.
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Atualizado até capítulo 182
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