Capítulo 12

Munihr encontrava-se preso na delegacia de Solaria, uma estrutura simples que lembrava as prisões do Velho Oeste. Em vez de grades comuns, as celas eram feitas de ouro puro que brilhavam intensamente, como se estivessem em chamas, prontas para queimar qualquer um que tentasse escapar. Ao seu redor, outros solarianos faziam a guarda, sentados em uma mesa do lado de fora, entretidos em uma partida de cartas. As barras douradas refletiam a luz solar, causando desconforto nos olhos sensíveis do lunar. Imóvel, ele permanecia sentado no chão, observando atentamente a movimentação ao seu redor.

A prisão em si contrastava com as origens daquele reino. As paredes eram adornadas com gravuras intricadas retratando a história e as lendas de Solaria, exibindo o orgulho e a herança da cidade. O ar era impregnado com o cheiro de couro envelhecido e pólvora, lembrando o espírito áspero que permeava a região.

Enquanto Munihr observava o ambiente ao seu redor, não podia deixar de notar os guardas postados do lado de fora de sua cela. Suas aparências eram tão diversas quanto a paisagem do deserto, cada um sendo um testemunho de suas origens e experiências únicas. Alguns eram marcados pela idade, seus rostos enrugados contando histórias de batalhas travadas e dificuldades enfrentadas. Outros eram mais jovens, seus olhos cheios de determinação e senso de dever. Suas vestimentas refletiam seus papéis de guardiões, usando chapéus de caubói surrados, coletes de couro adornados com distintivos de honra e calças resistentes. Cada guarda carregava uma arma, seja uma reluzente pistola presa ao cinto ou um rifle confiável pendurado sobre o ombro.

A atmosfera dentro da prisão era tensa, o ar carregado com uma hostilidade latente. Os solarianos, embora mantendo uma fachada de indiferença, lançavam olhares ocasionais em direção a Munihr, com seus olhos cheios de suspeita e animosidade. Sua presença servia como um lembrete do perigo que o aguardava além das paredes de sua cela.

O lunar, apesar de estar aprisionado, mantinha-se calmo. Seu olhar vagava, absorvendo os detalhes da prisão, gravando-os em sua memória. A luz tremulante das lamparinas de óleo projetava sombras dançantes nas paredes, criando uma atmosfera sinistra que refletia a incerteza de sua situação. O som das cartas sendo embaralhadas e das conversas sussurradas pairavam no ar, interrompido apenas pelo rangido ocasional do couro enquanto os guardas se acomodavam em suas posições.

À medida que as horas passavam, a mente de Munihr era consumida por pensamentos sobre sua situação atual. Ele refletia sobre as consequências de suas ações, os riscos que havia assumido e as possíveis ramificações tanto para si mesmo quanto para aquele reino de luzes.

Nesse momento de solidão e reflexão, a herança lunar de Munihr parecia amplificar sua percepção do mundo. As nuances sutis de luz e sombra, os sussurros suaves carregados pelo vento lá fora e os ecos distantes dos passos no corredor - tudo se tornava ampliado, aguçando seus sentidos e aumentando sua consciência.

Apesar da atmosfera opressora, ele se mantinha calmo. Sabia que o caminho estava repleto de incertezas, mas se recusava a vacilar. Ele acreditava que suas ações eram necessárias.

Enquanto permanecia sentado em sua cela, com a mente concentrada e o espírito inabalável, aguardava seu destino. As barras douradas ao seu redor brilhavam com um brilho etéreo, lançando um reflexo sobrenatural em seu rosto. E no meio da incerteza, um lampejo de certeza pulsava dentro dele, uma luz que o guiaria através das noites mais escuras que estavam por vir.

Os sons de passos silenciosos ecoaram pelos corredor próximo. Uma figura curiosa emergiu e se aproximou lentamente de onde Munihr estava confinado. Ele se posicionou diante das grades da cela, segurando-as com as mãos, que estranhamente não pareciam se machucar nem causar danos quando entravam em contato o metal brilhante. Metal esse, que poderia ferir qualquer outro, não pareciam causar nem o menor desconforto ao tocar sua pele. Era como se ele fosse protegido por uma camada invisível, imune às adversidades da prisão.

Kiran olhou para o lunar, sua presença envolta em um ar enigmático que parecia preencher a cela. A iluminação fraca realçava os contornos do seu rosto, revelando traços angulares e uma expressão enigmática. Seus olhos, profundos e intensos, mantinham um brilho incomum, como se guardassem segredos insondáveis. Kiran sentiu um arrepio percorrer sua espinha ao encontrar aquele olhar penetrante, que parecia sondar as profundezas de sua alma.

Após um longo suspiro, ele sentou-se de costas para Munihir encostando as costas na grade como apoio. Um misto de curiosidade e compaixão preenchia seu coração, enquanto tentava decifrar os segredos ocultos por trás daquela figura enigmática. Ele queria compreender as motivações que levaram o lunar a invadir o conselho em Solaria, pois algo em seu íntimo lhe dizia que havia mais naquela história do que aparentava.

— Sinto muito por isso. — disse Kiran, com sinceridade.

No entanto, Munihr permaneceu em silêncio, como se as palavras do príncipe se perdessem no vazio. A ausência de resposta o incomodou profundamente, e um sentimento de inquietação se apoderou de Kiran. Uma mistura de frustração e raiva começou a borbulhar dentro dele, e ele não conseguiu conter uma risada amarga.

— Você não está chateado comigo porque não fui capaz de fazer nada, está? — disse com a voz carregada de ressentimento. — Eu juro que tentei, mas fui incapaz diante dos acontecimentos...

O olhar de Munihr permanecia fixo em Kiran, como se buscasse desvendar seus pensamentos mais profundos. Aquele silêncio perturbador só aumentava a tensão no ambiente, deixando o ruivo ainda mais desconcertado diante da impenetrabilidade do prisioneiro.

De repente, o lunar quebrou o silêncio com uma pergunta inesperada, desafiando a compreensão de Kiran e desestabilizando suas certezas.

— Como você conseguiu entrar na Cidade Lunar lunar? — questionou Munihr.

Kiran ficou boquiaberto, com olhos arregalados de espanto. A pergunta reverberou em sua mente, lançando-o em um turbilhão de pensamentos confusos. Como poderia explicar algo que nem mesmo ele compreendia? No entanto, em vez de demonstrar sua perplexidade, decidiu aproveitar a oportunidade para brincar com o momento, adiando sua resposta.

— Então, é só por isso que você veio a Solaria? — indagou, buscando ganhar tempo para processar suas próprias emoções.

— Sim.

Munihr respondeu com uma simplicidade desconcertante, que deixou o príncipe sem palavras e com uma sensação de desconforto crescente. Ele se virou novamente para encarar o lunar, e, pela primeira vez, pôde vislumbrar parte de seu rosto antes oculto pelo capuz. A pele morena contrastava com as sombras, enquanto seus olhos pareciam brilhar com uma intensidade incomum. Aquele olhar penetrante transmitia uma determinação que deixou Kiran sem jeito, como se o prisioneiro pudesse ler seus pensamentos mais íntimos, desvendando segredos ocultos em seu coração. Em meio àquele momento de conexão silenciosa, o ruivo se viu confrontado com a noção de que o lunar diante dele continha muito mais mistérios do que ele poderia imaginar.

— Pra ser sincero...— começou Kiran, coçando a nuca — Como solariano, sei que minhas palavras podem não ser convincentes para você, mas é a mais pura verdade: não tenho a menor ideia de como acabei na Cidade Lunar lunar. Até o conselho está intrigado e quer saber como cheguei aqui, mas simplesmente não tenho respostas. Minha última lembrança é de atravessar nuvens negras que se formaram após o ataque em Solaria, e depois disso, tudo é um vazio.

Munihr continuou a encará-lo, como se buscasse desvendar os segredos mais profundos de sua alma. Em vez de responder, porém, ele se virou para a pequena janela que havia na cela e contemplou o cenário lá fora. O céu estava tingido com tons avermelhados, como uma aquarela em progresso. A noite se aproximava lentamente ao leste, trazendo com ela uma brisa fresca.

— Parece que está anoitecendo...— comentou ele, com um sorriso sutil nos lábios.

Kiran seguiu o olhar do lunar e concordou, observando o céu na mesma direção. No entanto, percebeu que Munihr não tinha a intenção de responder às suas perguntas anteriores. Sentindo-se frustrado, decidiu ele questioná-lo novamente.

— Agora que já contei o que aconteceu, o que você pretende fazer...? — perguntou.

Munihr permaneceu imóvel, sem mover um músculo, enquanto continuava a apreciar a vista lá fora com uma expressão que lembrava a de uma criança encantada.

— Diga aos seus amigos guardiões que estão do lado de fora me vigiando que não podem me prender agora que a noite está se aproximando. — disse — Se eu permanecer aqui por mais tempo, coisas ruins podem acontecer...

A raiva de Kiran aumentou ainda mais. Não apenas pelas palavras dele, mas também pela sua atitude calma e despreocupada, que o deixava extremamente irritado sempre que podia. Em um rompante de fúria, o ruivo se levantou e berrou:

— Espero que você morra! — disse, ficando de pé.

O lunar observou o guardião explodindo em uma raiva que ele não conseguia compreender. Balançou a cabeça e voltou a contemplar a vista além das grades.

O sol começava a se pôr no horizonte, tingindo o céu com tons de laranja e vermelho. A luz suave e dourada iluminava o ambiente, criando uma atmosfera serena e ao mesmo tempo melancólica. Os últimos raios solares atravessavam a pequena janela da cela, projetando uma sombra fraca e alongada no chão de pedra.

Seus olhos fixavam-se no horizonte distante, como se buscasse encontrar respostas nos últimos raios de sol que se dissipavam lentamente. O vento suave soprava de fora, trazendo consigo um aroma fresco e revigorante.

Enquanto isso, Kiran, ainda tomado pela raiva, saiu da cela com passos pesados. O eco dos seus passos ressoava pelos corredores vazios da delegacia, misturando-se com a atmosfera tensa que pairava no ar. Seu rosto estava contorcido pela frustração e pela impotência, suas mãos cerradas em punhos devido à intensidade das emoções que o dominavam.

O crepúsculo continuava a se desenrolar lá fora, pintando o céu com cores cada vez mais escuras. A transição do dia para a noite era gradual, e as primeiras estrelas começavam a pontilhar o firmamento, adicionando um brilho sutil à escuridão que se aproximava.

Munihr, ainda voltado para a janela, observava o mundo exterior com uma serenidade enigmática. Seus pensamentos pareciam distantes, imersos em reflexões que somente ele poderia compreender. O olhar profundo e penetrante transmitia uma sensação de sabedoria milenar, como se ele carregasse consigo segredos ancestrais e uma compreensão além do alcance comum.

O ambiente ao redor pulsava com uma energia tensa, como se o destino estivesse em suspenso, aguardando o desenrolar dos próximos eventos. O silêncio predominava, interrompido apenas pelo sussurro do vento. Enquanto o mundo mergulhava na escuridão da noite, o lunar permaneceu imóvel, como se fosse uma parte indissociável daquela cela sombria. Seu semblante, agora iluminado apenas pela luz fraca das estrelas, era enigmático e impenetrável, escondendo segredos que talvez jamais seriam revelados, ou talvez fossem. O destino agora, estava entrelaçado em um jogo de sombras e mistérios, que somente o tempo poderia desvendar.

— Essa noite vai ser longa. — comentou Munihr, com um sorriso.

...

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