Parados diante do imponente Palácio do Sol, Kiran e Munihr contemplavam sua estrutura ornamental erguida pelos habilidosos mestres, reunindo coragem para adentrá-lo.
— Não imaginei que o conselho tomaria uma decisão tão rápida. Esperava que nos chamassem em alguns dias. — comentou o solariano.
Munihr, por sua vez, estava calado e com o olhar distante. O que não passou despercebido pelos olhos negros de Kiran.
— Você está agindo de forma estranha desde que chegamos aqui. — comentou.
— Não é algo com que você precise se preocupar, meu sol. — respondeu sem encará-lo.
O ruivo ficou ainda mais irritado com a resposta vaga.
— É exatamente esse "nada" que me deixa perplexo. — reclamou.
Mais uma vez, Munihr olhou diretamente nos olhos do ruivo em silêncio, o que aumentou sua antipatia pelo lunar. Até que o próprio Munihr desviou sua atenção para a pessoa que vinha logo atrás.
— É você...
— Quem? — o ruivo virou-se, levantando uma sobrancelha.
Ali diante deles estava uma mulher de beleza arrebatadora, capaz de rivalizar com a mais deslumbrante visão que Kiran já tinha encontrado desde as suas aventuras pelo mundo humano. Ela era a personificação da Deusa das estrelas, se não a própria, com olhos que brilhavam como o nascer do sol e estrelas douradas delicadamente adornando seu nariz. Seu cabelo, cuidadosamente penteado em um rabo de cavalo, dançava suavemente com a brisa matinal, como se fosse tecido de pura luz. Seu corpo esbelto era envolto em um traje que abraçava suas curvas com elegância e sutileza, realçando sua graça celestial. No entanto, por mais magnífica que fosse sua aparência, havia um aspecto em sua presença que não podia ser ignorado. Com certeza, um de seus maiores defeitos.
— Olá, senhor centro do universo! — provocou ela, com um sorriso de lado.
— Não se atreva a falar comigo, maldita! — rosnou Kiran.
Ambos se encararam como arqui-inimigos. Até que Munihr interferiu com palavras simples.
— Isso é desnecessário.
— De fato. — concordou a mulher — Não vou perder meu tempo com esse indivíduo de conhecimento limitado.
— E eu não vou desperdiçar minhas palavras com você. Munihr, tome cuidado com essa mulher maldita! Se fosse você, ficaria longe dela.
Por algum motivo desconhecido, ela gargalhou enquanto balançava a cabeça em negação.
— Sim, mas eu sei com quem estou lidando. — disse o lunar.
Pela primeira vez naquele dia, Munihr sorriu de uma maneira que Kiran nunca tinha visto antes.
— Como vai, estrelinha? — cumprimentou ele, chamando-a carinhosamente pelo apelido.
— Melhor impossível. É muito bom vê-lo! — respondeu, abraçando-o. — Estava com saudades!
Kiran sentiu um leve desconforto com aquela cena. Suas orelhas queimavam e seu estômago se embrulhava. Se não estivesse em solo sagrado, teria vomitado ali mesmo.
— Astrea, que história é essa?! E você... — olhou para o jovem lunar — Como conhece ela?
Munihr sorriu.
— De tempos passados. Mas estamos atrasados, depois eu te conto mais sobre como nos conhecemos.
Embora achasse que Munihr estava mudando de assunto, o príncipe concordou revirando os olhos.
— E você, o que faz aqui, mulher insignificante? — perguntou Kiran com desprezo.
A mulher o encarou e suspirou em seguida.
— Vim fazer uma visita.
Então, solariano se lembrou de que Astrea costumava visitar o túmulo de Elijah, um guardião que havia sido morto pelos deuses há tempos atrás. Isso o acalmou um pouco.
— Mas e você, Munihr? Estou surpresa de vê-lo aqui, nessas terras. — comentou ela — Achei que... bom, você não fosse bem-vindo... — hesitou ao falar, considerando a rivalidade entre os lunares e solarianos.
— É uma longa história. — disse ele.
Após receber uma breve explicação de Munhir, a deusa ficou atônita diante de tantos acontecimentos. No entanto, ela decidiu acompanhá-los até o Conselho de Solaria, acreditando que pelo fato de ser quem era, poderia exercer alguma influência na aliança que estavam tentando estabelecer.
— Tem certeza? Não quero causar problemas. — questionou Munihr, preocupado.
— Já temos problemas suficientes. — foi a vez de Kiran — Esse cara já aqui, já está com a corda no pescoço. Não quero me arrepender de ver você ser morta também.
Astrea, lembrando corajosamente do sacrifício de seu amado Elijah em seu nome, respondeu:
— Eu não posso ser morta. Tenho uma dívida com este reino, e dúvido que me matariam. O povo solariano reconhece que minha vida foi salva por um cidadão de seu povo, e quando isso acontece, a honra de um guardião deve ser preservada.
Kiran suspirou, sentindo-se derrotado, embora acreditasse que ela estava cometendo a mesma loucura que Munihr ao se unir a ele.
— Elijah deve estar se revirando no túmulo agora. — comentou com desgosto.
Astrea sorriu.
— Você sabe que ele concordaria com minha decisão. Ele se juntaria a Munihr se estivesse vivo.
— Tenho certeza disso. — o lunar concordou com um aceno — Então, o que estamos esperando, Astrea? Vamos?
Ela assentiu assentiu, e Munihr seguiu adiante, deixando ambos para trás enquanto subia lentamente a imponente escadaria do palácio.
Observando o ruivo atentamente, Astrea comentou:
— É a primeira vez que o vejo agir assim.
— Assim como, você diz? — retrucou.
— Estar mais humilde, abaixando a cabeça quando alguém fala. Geralmente, você grita e mantém a postura arrogante.
— Não comece, Astrea — respondeu Kiran, cruzando os braços. — Hoje, estou sem paciência!
Astrea persistiu.
— Isso não é nenhuma novidade. O que é realmente surpreendente é vê-lo interagir com um lunar. Pensei que os odiasse.
— Ainda não gosto deles...
A deusa não se convenceu com suas palavras, desde tudo que já havia presenciado desde então, era difícil acreditar.
— Será mesmo? — questionou — Conte-me, o que aconteceu para você estar tão pacífico de repente, Rider?
— Ele ameaçou me matar. Embora eu acredite que seja incapaz de tal coisa. — admitiu.
— O que você fez para deixá-lo tão furioso?
— Às vezes penso que ele me odeia tanto quanto eu o odeio. — respondeu.
— Odiar, é? Se existe alguém capaz de despertar tais sentimentos no coração de Munihr, quero conhecê-lo! Ele é tão calmo que raramente perde a compostura. — contou.
— Então devo ser o primeiro a ter conseguido tal feito.
— Se você foi capaz de despertar tais sentimentos nele, deve ter cuidado. Não quero ser eu a testemunhar quando deixarem flores em seu túmulo.
— Ah, engraçadinha. — resmungou o solariano — Espero que queime no inferno.
Os três avançaram juntos em direção ao salão do conselho, adentrando o majestoso palácio com suas imponentes paredes de mármore branco e pilares dourados que se erguiam em direção ao teto adornado com afrescos estelares. Cada parede contava a história de uma era passada, uma narrativa eterna esculpida em pedra. O corredor, marcado pelas estátuas douradas dos guardiões que haviam servido a Solaria, guiavam seu caminho.
Ao entrarem no salão, uma atmosfera tensa os envolveu. Os anciãos, que antes haviam sido guardiões mas agora estavam aposentados, estavam reunidos no centro. Enquanto Astrea era recebida com cumprimentos calorosos pelos solarianos, Munihr era recebido com olhares desconfiados.
O guardião que havia estabelecido a ordem durante o depoimento de Kiran mais cedo no conselho, dirigiu seu olhar sério aos recém-chegados.
Kiran se ajoelhou em silêncio, sem dizer uma palavra. Não havia mais o que fazer quando o estrago já estava feito.
— Kiran Danwrider, você nos trouxe uma convidada inesperada — disse Aethon, o nome do guardião, referindo-se a Astrea.
A deusa fez uma reverência respeitosa ei homem.
— Saudações, sábio Aethon. Peço desculpas por minha presença inesperada, mas acredito que posso contribuir para a resolução dessa aliança proposta por Munihir.
Aethon assentiu com seriedade, olhando para o lunar, que antes havia sido ignorado por ele.
— Você é amiga desse... dessa criança lunar? — perguntou o ancião.
— Somos amigos há muito tempo. Tenho muito a dizer sobre como ele é uma pessoa boa. — disse com um sorriso, enquanto olhava para o lunar. — Estou ao lado dele, e se minhas palavras como deusa não forem suficientes para convencê-los, então é um erro persistir nessa aliança e permitir que seu povo sofra as consequências.
"Estou no meio de outra situação louca", pensou Kiran, com dor de cabeça. Ele já havia presenciado aquela cena antes.
— Estamos aqui em busca de uma solução pacífica, se possível. Não há necessidade de se irritar, Deusa das Estrelas. — pediu Aethon.
A mulher se acalmou, e todos os presentes tomaram seus lugares designados. Os três permaneciam no centro do salão, banhados pela luz do sol que entrava pela clarabóia.
— Danwrider, erga sua cabeça. — pediu a anciã chamada Aura, ao ver que o jovem ainda mantinha-se ajoelhado e de olhar baixo.
Kiran encontrava-se em um momento raro e solene. Diante dele, estavam reunidos os anciãos, figuras veneráveis que personificavam a sabedoria e o legado ancestral de seu povo. Sentimentos contraditórios atravessavam seu coração, mesclando-se em um turbilhão emocional de medo e admiração.
Desde criança, ouvira histórias sobre os grandes feitos e ensinamentos daquelas pessoas. Eles eram os heróis do passado, cujos nomes eram reverenciados e cujas palavras carregavam um peso inquestionável. Era uma honra inédita estar em sua presença, mas também acarretava uma carga de responsabilidade e pressão que ele mal podia suportar.
Entretanto, a reunião daqueles antigos guardiões também trazia consigo uma inquietante verdade: a situação era séria e urgente. Era raro vê-los reunidos dessa forma, pois sabia que suas discussões e deliberações eram reservadas para momentos cruciais. A mera presença de todos eles indicava que algo de extrema importância estava em jogo, algo que poderia moldar o destino daquela aliança feita pelo lunar.
Kiran sentia-se como um grão de areia diante do vasto oceano. A magnitude da ocasião era avassaladora, e seus ombros curvavam-se sob o peso das expectativas depositadas nele. Os olhares dos anciãos perfuravam sua alma, e ele podia quase ouvir as vozes silenciosas questionando se ainda era capaz de manter seu título como guardião.
As lembranças daquele momento em que quebrara a confiança de todos ao defender o inimigo invadiram sua mente de forma implacável. O peso da traição pesava sobre ele como uma âncora, ameaçando arrastá-lo para as profundezas do desespero e da autodúvida.
— Desculpe, guardiã, mas me recuso. — disse por fim — Depois do meu fracasso e de todas as palavras que proferi anteriormente, tenho vergonha de encará-los.
— Você segue suas próprias leis e sua própria conduta, é verdadeiramente admirável. — disse Aura, sorrindo. — Você não deve nada a nós, pelo contrário, nós, os mais velhos aqui, — entreolhou para seus companheiros sentados ao seu lado em uma fileira — é que devemos reverência a vocês, os jovens. A autoridade está toda em suas mãos, vocês são o futuro desta nação e os pilares da luz.
— Está enganada, senhora. — finalmente Kiran ergueu a cabeça e encarou a anciã.
A mulher sorriu ao ver que o jovem havia encontrado coragem para olhá-la nos olhos, e então passou a palavra para seu companheiro, Aethon que apenas assentiu.
— Solarianos e lunares sempre foram inimigos naturais. Nossa natureza é oposta, e nossas habilidades também. Não podemos simplesmente ignorar as diferenças e agir como se fosse possível viver em harmonia — começou com a testa franzida.
Por sua vez, Aura adotou um tom mais conciliador.
— Embora nossos povos tenham suas diferenças, acredito que podemos encontrar um terreno comum. Solaria viveu em paz antes, e acredito que podemos alcançá-la novamente.
— Discutimos bastante e foi difícil tomar essa decisão — Aethon retomou a palavra. — E antes de tudo, presumo que a criança lunar tenha suas cartas na mesa. Afinal, um lunar de sua magnitude não viria de mãos vazias — olhou para Munihir.
Naquele momento, todos os olhares se voltaram para Munihir, que agora era o centro das atenções. Kiran e Astrea, ao seu lado, também o encararam, aguardando o que ele diria em seguida.
Com um sorriso astuto, semelhante ao de uma raposa, o lunar olhou para os anciãos com olhos brilhando, deixando Kiran atônito.
— Percebo sua preocupação comigo, velho. E está certo. Obviamente, não concordaria com os benefícios dessa decisão sem exigir algo em troca. Embora tenha sugerido essa aliança, só concordarei se seguirem meus termos.
De repente, o salão reverberava com a fúria dos presentes. Gritos indignados ressoavam por todos os cantos, misturados a xingamentos e murmúrios de descontentamento. A atmosfera estava carregada de tensão, e a discussão acalorada ameaçava romper os limites da civilidade.
Munihir permaneceu imóvel no centro do salão, seu rosto exibia uma expressão serena, quase enigmática, enquanto aguardava pacientemente que a calma retornasse. Mantendo sua compostura diante da tempestade de vozes contrárias.
Os anciãos, em suas vestes solenes, trocavam olhares perplexos e consternados. Alguns tentavam acalmar os ânimos exaltados, pedindo silêncio e ordem. Outros se mantinham em silêncio, observando atentamente os desdobramentos da situação.
Astrea e Kiran, ao lado do líder dos lunares, compartilhavam uma tensão palpável. Seus olhares se entrelaçavam, buscando apoio mútuo diante da adversidade que se instalara. Kiran sentia o peso dos olhares acusadores e desconfiados sobre si, enquanto Astrea parecia um pouco assustada.
Aos poucos, a tempestade de vozes começou a arrefecer. Os murmúrios subsistiram, mas a ordem gradualmente se restabeleceu no salão. Os anciãos se sentaram em seus assentos, aguardando com expectativa a continuação da conversa.
Munhir, aproveitando o momento de relativa calma, tomou a palavra novamente. Com a voz firme e resoluta, que ecoou pelo salão com uma intensidade que silenciou os últimos resquícios de descontentamento.
— Para que essa aliança seja firmada, eu quero que deixem a Cidade Lunar em paz — declarou.
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Atualizado até capítulo 182
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