Voltando ao ponto de encontro, a neve caía levemente, cobrindo o ambiente com um silêncio frio e pesado. Rayka observava à distância, com uma expressão de curiosidade, enquanto Renan permanecia sentado em cima de um carro, o olhar fixo no horizonte, perdido em pensamentos sombrios. Sua postura estava tensa, os punhos cerrados sobre os joelhos, e o ar ao seu redor parecia vibrar com a raiva contida.
Rayka se aproximou cautelosamente, os passos quase inaudíveis no manto branco da neve. Sua voz saiu suave, quase quebrando o gelo da tensão no ar:
— Você tá legal? — perguntou, a voz baixa como se não quisesse quebrar a barreira de silêncio que cercava Renan.
Renan piscou, saindo de seu transe. Virou-se para ela, forçando um sorriso torto que mal disfarçava o turbilhão interno.
— Hã? Ah, sim, tô bem. Não se preocupe, senhorita Rayka. — Ele bateu no próprio peito, num gesto exagerado. — Tenho um corpo forte. — Tentou brincar, mas seu sorriso não alcançava os olhos.
Deslizando do capô do carro, Renan sacudiu a neve das calças, como se estivesse limpando não só o frio, mas também os pensamentos que o atormentavam. Ele deu um passo mais perto de Rayka, uma expressão curiosa surgindo em seu rosto.
— Posso te perguntar uma coisa? — Sua voz tinha um tom casual, mas os olhos traíam um certo desconforto.
Rayka o encarou, intrigada.
— Claro, o que foi?
Ele hesitou por um segundo, os olhos se desviando para Samuel, que estava um pouco mais à frente, com uma expressão patética e focada demais em... um galo de neve? Era isso mesmo? Ele ergueu uma sobrancelha, antes de finalmente soltar:
— Você e aquele idiota ali... Vocês têm algum tipo de... relação? São namorados ou algo assim? — perguntou, apontando com o queixo para Samuel, que agora estava ajustando a "crista" do galo de neve.
Rayka riu suavemente, surpresa pela pergunta. Ela observou Samuel por um momento, que agora estava praticamente louvando a obra de arte que tinha criado, e depois voltou os olhos para Renan.
— Se tivesse que definir, diria que somos... bem próximos. — Seu olhar voltou para Samuel, que agora estava dando uns toques finais em sua criação com a concentração de um escultor, totalmente alheio à conversa.
Renan se preparava para dizer algo mais, um sorriso malicioso começando a se formar, quando foi interrompido de repente por um baque.
— Ah, foi mal! Pensei que fosse um monstro tentando se aproximar da Rayka. — A voz brincalhona de Samuel cortou o ar, segurando uma bola de neve com uma expressão quase inocente, mas claramente provocadora.
Renan bufou, irritado. Ele se abaixou rapidamente, pegando neve do chão e moldando uma bola entre as mãos com força. Num impulso, arremessou a bola com tudo na direção de Samuel, mas o alvo foi mais rápido e desviou com facilidade.
— Hah! Melhor mirar da próxima vez, cegolas! — zombou Samuel, rindo enquanto observava a bola de neve voar longe.
O sorriso de Samuel desapareceu assim que ele notou o destino do projétil: seu precioso galo de neve. A obra-prima foi destruída num instante, e os olhos de Samuel se estreitaram em pura fúria.
— Desgraçado! Você vai pagar por isso! — gritou, enquanto uma aura de raiva parecia envolvê-lo, fazendo a neve ao redor de seus pés derreter.
— Vem pra cima, tampinha! — desafiou Renan, já moldando outra bola de neve, um sorriso de pura provocação nos lábios.
O confronto virou uma verdadeira guerra de bolas de neve, as mãos se movendo rápidas, lançando projéteis gelados como se estivessem no meio de uma batalha épica. Rayka observava, incrédula, enquanto os dois corriam ao redor, parecendo duas crianças em pleno campo de batalha.
— Parem com isso, sério! Vocês dois parecem... — Antes que pudesse terminar, uma bola de neve voou em sua direção e a acertou em cheio no rosto.
O silêncio que se seguiu foi devastador. Samuel e Renan congelaram no lugar, as mãos ainda erguidas, suas expressões transformadas instantaneamente de diversão para puro terror. Rayka abaixou lentamente a cabeça, os cabelos escorrendo para a frente e cobrindo seu rosto, como uma sombra sinistra.
— Vocês dois... — Sua voz era baixa, quase um rosnado. — Conseguiram me irritar de verdade. — Ela ergueu o rosto devagar, os olhos faiscando de fúria, e deu um passo à frente, envolta por uma aura ameaçadora. Seus pés afundavam na neve com cada passo, e os dois só conseguiam assistir, paralisados,e cada movimento parecia sacudir o ar ao redor, os dois engoliram em seco, mas era tarde demais.
...----------------...
Dez minutos depois...
Zack chegou no local, acompanhado de Emi, que espiava de dentro de sua blusa. O ambiente parecia congelado no tempo, mas não por causa da neve. Rayka estava encostada na parede, braços cruzados, claramente furiosa, enquanto Samuel e Renan estavam sentados no chão, tremendo como folhas ao vento. Eles tinham galos enormes nas cabeças e estavam... levemente chamuscados?
Zack decidiu não perguntar o que tinha acontecido. Apenas suspirou e se dirigiu a Rayka.
— Encontraram o laboratório? — perguntou, observando-a com cuidado.
Rayka balançou a cabeça, ainda claramente irritada.
— Encontramos, fica no aeroporto da cidade. E, claro, cruzamos com aquele maníaco de novo.
— O Diretor TK... Entendi. — Zack olhou ao redor e notou Renan. — E quem é esse?
— Renan — respondeu Rayka, sem se virar. — Nos esbarramos enquanto procurávamos a entrada. Ele é esquisito, mas sabe lutar, então achei que poderia ser útil.
Zack assentiu. Agora, a prioridade era clara. Reunindo o grupo, ele explicou os perigos que esperavam no laboratório e os lembrou de que aquilo provavelmente era uma armadilha. Mas, apesar do risco, eles precisavam entrar e reunir o máximo de informações possíveis sobre os experimentos da organização.
Após se recomporem, o grupo seguiu em direção ao laboratório, ciente de que, com o TK envolvido, nada seria tão simples quanto parecia.
Chegando ao aeroporto, Zack parou no meio de uma área cercada por marcas de pouso. Ele fechou os olhos por um momento, sentindo o terreno abaixo de si, e então concentrou sua aura em um soco devastador que fez o chão tremer. Com um estrondo, a superfície se partiu, revelando um buraco enorme que levava diretamente ao laboratório subterrâneo.
Renan, espantado com a força bruta de Zack, quase hesitou antes de seguir os outros no salto para o buraco.
O interior do laboratório era opressor, com corredores largos e frios, feitos de aço pesado. O ambiente tinha um cheiro metálico, quase como sangue seco, e as luzes fracas projetavam sombras distorcidas nas paredes. Não demorou para que os homens azuis aparecessem no caminho, mas, com a habilidade de Zack, Rayka, Renan e Samuel, eles foram eliminados com relativa facilidade.
No entanto, a verdadeira ameaça os aguardava mais fundo.
Eles passaram por salas de experimentos, onde viram criaturas grotescas aprisionadas em tanques de vidro: humanos deformados, fundidos com monstros, suas feições torcidas em expressões de agonia eterna. A visão era sufocante, o tipo de horror que permanecia gravado na mente. Mesmo Renan, que raramente se impressionava, sentiu um arrepio na espinha.
No fim do corredor, uma porta maciça de aço bloqueava o caminho. Zack tentou forçá-la, mas antes que pudesse colocar toda sua força, a porta se abriu sozinha, rangendo como se convidasse o grupo para o que vinha a seguir.
Eles entraram em uma vasta área circular. Assim que cruzaram a soleira, a porta se fechou com um estrondo atrás deles. Um silêncio pesado caiu sobre o lugar, quebrado apenas pela voz que ecoou de um megafone no teto.
— Sejam bem-vindos, meus convidados. Gostaram da recepção? — A voz sádica e debochada era inconfundível. TK.
O silêncio que seguiu à provocação de TK era espesso, quase sufocante. Aquele ambiente metálico, com seu eco persistente, parecia amplificar a tensão. Nenhuma resposta do grupo, apenas olhares afiados e corpos tensos, prontos para o que viesse. A voz de TK ecoou novamente, agora com um tom de decepção exagerada.
— Nossa, que chatos... — reclamou ele, quase teatral. — Os jovens de hoje são todos mal educados... — Um som seco seguiu quando ele aparentemente desligou o sistema de áudio com força, encerrando seu show.
De repente, o chão no centro da sala se abriu com um estalo profundo. Duas criaturas emergiram de uma abertura oculta. Elas tinham a pele de um vermelho sangrento, músculos retorcidos e lâminas longas e afiadas que saíam de seus antebraços como espadas naturais. Seus rostos eram deformados, com presas à mostra e orelhas pontudas, e seus olhos eram vazios, famintos.
Samuel, sempre confiante, sacou suas duas espadas, o brilho frio das lâminas refletindo a luz pálida da sala. Ele deu um passo à frente, a determinação estampada em cada movimento.
— Deixa que eu cuido desses dois — disse ele, sem hesitar.
Mas antes que ele pudesse avançar, Renan, como uma sombra impetuosa, passou por ele, a lança em mãos. Num movimento ágil, ele desferiu um golpe horizontal, tentando cortar as criaturas ao meio. No entanto, com uma agilidade surpreendente, elas se esquivaram em perfeita sincronia, saltando para trás com graça predatória.
— Tsc... não consegui matá-los num golpe — Renan murmurou, irritado, voltando à posição de combate.
Samuel chegou ao lado dele, olhos semicerrados, claramente aborrecido.
— Você é surdo, desgraça? Não ouviu quando eu disse que iria cuidar deles? — resmungou Samuel, com a voz carregada de frustração.
Renan, impassível, limpou o ouvido com o dedo, como se não se importasse nem um pouco.
— Ah, andando com esses passinhos curtos de gnomo, fiquei com preguiça de esperar — provocou ele, o que fez Samuel ranger os dentes de raiva.
Rayka, observando a cena, suspirou profundamente, cruzando os braços.
— Ahhh... lá vão eles de novo... — murmurou para si mesma, sabendo que essa rivalidade infantil era inevitável.
Enquanto os dois trocavam farpas, as criaturas decidiram não esperar mais. Elas avançaram em um ataque fulminante, suas lâminas cortando o ar com uma velocidade mortal. Mas tanto Samuel quanto Renan bloquearam o ataque com habilidade, cada um usando suas armas com uma mão, repelindo as criaturas com uma força que fez o chão tremer sob seus pés.
Renan olhou para Samuel com um brilho competitivo nos olhos.
— Ei, tampinha, que tal uma aposta? Quem matar um deles primeiro pode pedir qualquer coisa ao outro. O que acha? — provocou, com um sorriso astuto.
Samuel, sem sequer hesitar, aceitou o desafio com um sorriso ferino.
— Você vai se arrepender dessa aposta, boca de bueiro.
Os dois partiram para o ataque com vigor renovado. As criaturas, no entanto, eram rápidas e coordenadas, desviando dos golpes em perfeita harmonia. Samuel e Renan, por outro lado, lutavam de forma desordenada, se atrapalhando mutuamente. Em um momento, Renan acertou sem querer o cabo de sua lança na cabeça de Samuel, e logo depois, a espada de Samuel cortou uma mecha de cabelo de Renan.
— Presta atenção, desgraçado! — gritou Samuel, irritado.
— É você que tá no meu caminho, tampinha! — retrucou Renan, igualmente frustrado.
As criaturas, vendo a confusão, atacaram de novo, agora com mais força. Uma delas desferiu um golpe brutal em Samuel, que conseguiu bloquear, mas foi lançado vários metros para trás, se estabilizando com dificuldade. A outra criatura aproveitou a brecha e atacou Renan em um movimento sincronizado, com um golpe vindo de cima e outro de baixo. Renan recuou, mas uma delas pegou impulso nas costas da outra, desferindo um ataque poderoso que o fez voar também, até ele cravar a lança no chão, impedindo uma queda mais desastrosa.
As criaturas riram de maneira grotesca, o som era zombeteiro, um eco do desprezo que sentiam pela luta desorganizada dos dois.
Renan limpou o suor da testa e, com relutância, olhou para Samuel.
— Odeio ter que dizer isso, mas... talvez devêssemos fazer uma trégua, pelo menos até matarmos essas pragas. — Sua voz estava cheia de frustração, mas também de reconhecimento.
Samuel, embora igualmente contrariado, concordou.
— Não queria concordar com você, mas também estou louco pra acabar com esses monstros.
Com um plano em mente, os dois decidiram combinar seus estilos de luta. Samuel ficaria encarregado dos ataques corpo a corpo, enquanto Renan usaria o alcance da lança para cobrir os ataques de longe e repelir qualquer investida surpresa. Eles avançaram em sincronia, como uma nova unidade de combate. A primeira criatura atacou Samuel, que esquivou com agilidade, enquanto Renan usou a lança para bloquear o segundo golpe que vinha em direção ao parceiro. As criaturas recuaram, surpresas com a repentina eficiência dos dois.
Agora, em perfeita harmonia, Samuel desferia golpes rápidos com suas espadas, enquanto Renan interceptava os ataques com precisão. Aos poucos, conseguiram quebrar o ritmo das criaturas. Com um movimento ágil, Renan encontrou uma abertura e, com um golpe rápido e preciso, decapitou uma delas. O corpo da criatura caiu, mas a batalha estava longe de acabar.
A segunda criatura, tomada pela raiva, agarrou o corpo sem vida de sua companheira e, com um movimento grotesco, abriu o peito do cadáver e retirou seu núcleo brilhante. O monstro consumiu o núcleo, e imediatamente começou a se transformar, crescendo, seus músculos se expandindo até se tornar uma criatura ainda mais aterrorizante.
Sem perder tempo, Samuel atacou, mas suas espadas não cortaram a pele endurecida da criatura. Ele esquivou por pouco de uma lâmina afiada que cortou o ar e, em seguida, o chão abaixo. Renan tentou um ataque vertical, saltando nas costas da criatura, mas também não conseguiu penetrar sua defesa.
— Essa coisa é impenetrável! — gritou Renan, recuando ao lado de Samuel.
— Vamos ter que acabar com ela de uma vez só! — respondeu Samuel, os dois já ofegantes, mas com determinação brilhando nos olhos.
O monstro avançou em uma velocidade assustadora, desferindo uma saraivada de golpes com suas lâminas. Samuel e Renan se defenderam como podiam, mas ambos receberam cortes profundos nos braços e nas pernas. Quando o monstro desferiu um soco que afundou o chão, os dois aproveitaram o momento para saltar, usando o próprio braço da criatura como impulso.
No ar, suas auras explodiram em chamas intensas. Eles usaram suas técnicas mais poderosas ao mesmo tempo. Samuel liberou o "Dragões Gêmeos", um ataque de energia em forma de dois dragões flamejantes, enquanto Renan desferiu o "Golpe Divergente", um corte tão preciso e destrutivo que parecia rasgar o próprio espaço. As duas técnicas colidiram com o monstro, gerando uma explosão avassaladora. Um rugido ensurdecedor ecoou pela sala quando metade do corpo da criatura foi destruída.
Ambos aterrissaram no chão, ofegantes e ensanguentados. Antes que pudessem sequer comemorar a vitória, a voz de TK ressoou novamente, com um tom sarcástico.
— Meus parabéns... Sabia que vocês conseguiriam. Agora, sem mais delongas, vamos para o segundo teste.
De repente, o teto se abriu, e uma figura desceu com tudo, aterrissando em meio a uma nuvem de poeira. A energia no ar mudou instantaneamente, pesada e densa. Zack franziu o cenho, sentindo a força sinistra que emanava da figura. Rayka, ao seu lado, empalideceu, os olhos arregalados.
— Eu... vou cuidar disso. — disse Rayka. Sua voz era baixa, séria, e o choque em sua expressão era inconfundível.
Zack hesitou, mas, ao ver o olhar determinado de Rayka, deu um passo para trás, permitindo que ela passasse. Enquanto ela caminhava à frente, retirando seu casaco grosso e se posicionando, Renan e Samuel, ambos exaustos, recuaram sem questionar.
Rayka parou de frente para a figura misteriosa, a poeira finalmente baixando, revelando a pessoa por completo.
Quem seria essa figura com uma energia tão sombria? E qual a conexão entre Rayka e essa nova ameaça? O verdadeiro perigo estava apenas começando...
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Atualizado até capítulo 26
Comments
Alin3
essa história ta cada vez melhor
2023-02-20
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