Capítulo 12

— Aí, Forrest Gump!

Fiquei sabendo que teve uma queda por uma garota ontem, em? Pena que ela não te

segurou antes! — escuto Mike e seus amigos gargalharem. — Dá próxima vez que

desmaiar tente não voltar como um idiota!

Alguns

outros alunos deixam suas risadas ecoarem em minha direção, enquanto poucos

olhares se mostram empáticos, exatamente como David e Helena, em minha frente.

Meus pensamentos estavam longe demais para notar palavras de um garoto idiota

em busca de atenção, mas não posso negar meu constrangimento, principalmente

por ter pessoas em minha volta, encarando-me.

Não ligue para ele — diz Helena, sem tanta animação assim. — É apenas um idiota.

Como

se tivesse lido minha mente.

Vocês sabiam que um grupo de orcas já fizeram bulling com uma baleia-azul? — pergunta David, encarando o prato em

sua mesa, vazio. — Agora sabemos quem representa o lado das orcas e baleias na

escola.

Helena

suspira, revirando os olhos.

— Tenho certeza que essa

informação mudará o mundo, senhor David — ironiza ela. — E eu jamais ficaria do

lado das baleias. Golfinhos sempre serão mais inteligentes.

David faz um som com a

garganta, como se achasse graça. Ergue a cabeça.

— Como se você pudesse

ser um golfinho — diz ele. — Está mais para um peixe-gota.

Helena franze o cenho,

desentendida.

— Não faço ideia do que

está falando, garoto. Mas sei que você seria um ótimo peixe-palhaço. Sua cara

diz tudo.

— Até que não seria ruim.

Quem sabe assim alguém me procuraria.

Não consigo permanecer

sério por muito tempo e deixo um sorriso surgir. Eu sei muito bem que eu não

deveria ter motivos para frustrações ou arrependimentos. Moro em uma bela casa,

com uma incrível mãe e tenho grandes amigos. Mas por alguma razão, sinto que

não é o suficiente. Durmo com vontade de viver uma aventura e acordo com

vontade de dormir para sempre. É um ciclo, que sempre se repete. Medo,

angústia, sofrimento e dor. Onde está o momento de felicidade? Por que não

consigo perceber em minha vida? Será que sou tão ingrato e egocêntrico ao ponto

de não notar o lado bom da vida?

— Segura essa, Forrest

Gump! — grita Mike. Antes que eu possa me virar, sinto algo atingir minhas

costas. Molhado e pegajoso. — Está vendo? Até a bolinha é mais firme que você!

Uma bolinha de papel, que

escorre em minhas costas e cai no chão. Muitas pessoas em volta se mostram

surpresas, curiosas até, encarando tanto minha expressão de nojo quanto o

sorriso aberto de Mike.

Helena se levanta

imediatamente, bufando como um touro. Bate com as duas mãos na mesa, quase

derrubando o prato de David. Penso em segurá-la, mas não tenho forças para

isso. Estou constrangido demais. Minha camisa está molhada, posso sentir.

Olhares me deixam apreensivo e envergonhado. Minhas pernas tremem.

Respire

fundo.

Não funciona.

Um.

Dois.

Três.

Inspiro e expiro. Helena

dá um primeiro passo. Todo o refeitório parece assistir a cena. Dois, três,

quatro passos. Aproxima-se do garoto rechonchudo, que já não está sorrindo.

— Veio defender seu

amiguinho problemático, é? — parece se divertir, olhando em volta, esperando

risos. O que não acontece.

Helena não o responde. Em

um rápido movimento, mantendo palma da mão aberta, acerta o rosto de Mike. Um

estalo repercute para todos os alunos presentes. Tenho certeza que aquelas

bochechas ficarão ainda mais vermelhas do que já são.

Sem dizer uma palavra,

Helena gira sobre os calcanhares e volta para o seu lugar, sentando-se. Coloca

uma mecha do cabelo atrás da orelha e suspira. Engulo em seco, sem saber o que

fazer. Por mais que seja uma garota de língua afiada, nunca pensei que poderia

bater em um garoto. Principalmente Mike.

Instantes depois, de

forma inesperada, palmas surgem, seguido por gritos e assobios. David e Helena

parecem não entender. Mike esfrega uma das bochechas, mantendo um olhar enraivecido

em minha direção.

— Toma essa, otário! — grita

alguém.

— Bem feito, babaca! —

outro grito surge no ar.

Helena tenta segurar o

riso, mas não consegue. David também entra no jogo e abre seu largo sorriso.

Batemos palmas e assobiamos. Mike parece ainda mais enfurecido. Em poucos

segundos ele sai do refeitório.

Helena está tão

envergonhada quanto eu. Provavelmente não esperava palmas, tampouco assobios.

David agita seu ombro, de um lado para o outro. Por mais que odeia quem toque

em seu corpo, parece não se importar com isso. Suas bochechas estão vermelhas,

como se ela tivesse levado um tapa.

— O que está acontecendo

aqui? — surge uma voz, interrompendo todo alvoroço.

Alguns cozinheiros e

zeladores entram no refeitório, para entender o que acabou de acontecer e o que

causou tanto barulho. Até mesmo o diretor aparece, curioso, com olhar franzido.

Ajeita o cinto em sua calça e coloca os óculos de volta na parte alta do nariz.

Ninguém diz absolutamente

nada.

O diretor olha de um lado

para o outro. Tudo está silencioso, como se nada tivesse acontecido. Sem

respostas, ele gira o corpo e caminha para fora do refeitório.

— Parece que alguém teve

seu momento de fama — sussurra David, que logo ganha um soco de Helena, acertando-o

no ombro.

— Cala boca, idiota —

rebate ela.

Logo o refeitório se

encontra vazio. Espero todo mundo deixar o local para eu possa me levantar e me

retirar; exatamente como estou acostumado. Eu deveria sentir alívio ou animação

por Mike ter levado um tapa de Helena, mas não é o caso. Já assisti filmes o

suficiente para saber que o valentão sempre volta para assombrar o garoto

amedrontado. E, conhecendo bem Mike e o quão enfurecido pode ficar, além de ter

o seu ego ferido, certamente virá atrás de mim em algum momento. Não me sinto

bem; se é que eu deveria me sentir. Tenho medo.

Na volta para sala tudo

seguiu de forma natural. Corredores vazios e alunos sentados em salas de aulas.

Sala A, sala B, sala C, sala de música...

Sala de música não está

tão vazia como costuma ficar. Recuo meus passos, admirado pelo som instrumental

que ecoa de forma abafada. De uma pequena janela eu observo, um violino, sendo

tocado por uma garota.

— Caio? — David me chama

Apesar de errar algumas notas,

parece saber tocar de forma convincente. O arco mantém uma trajetória, para

frente e para trás, em um ritmo lento. A garota está com os olhos fechados,

como se quisesse presenciar a melodia em seu coração.

— Essa não é... Qual o

nome dela?

— Maia, sim — respondo,

engolindo em seco.

— Uau — sussurra David.

“The

Scientist”, uma de minhas músicas favoritas. Sinto

vontade de fechar os olhos e me deixar levar, ainda que o som continue abafado

e distante. Mas também quero continuar encarando suas mãos delicadas, cabelo

colorido, gestos simples e expressão de prazer. Uma graciosidade jamais vista,

posso imaginar.

— Já estamos atrasados,

Caio — escuto Helena me alertar, em tom baixo.

— Só mais um pouco —

digo.

Por

que ninguém está por perto? Penso, percebendo que

nenhum professor está auxiliando Maia em seus erros e acertos. Provável que seja um prodígio.

A música está acabando. O

arco desliza de forma ainda mais suave do que minutos atrás. Maia por fim abre

os olhos. Está sorrindo. Satisfeita. Seu olhar percorre até onde estou, de

forma um tanto quanto involuntária, eu diria. Vejo espanto em seu rosto.

Me abaixo rapidamente.

Merda,

merda, merda.

— Será que ela me viu? —

pergunto. Meu coração bate forte.

— Eu disse para irmos

embora, idiota — sussurra Helena.

— Claro que te ela viu,

cabeça de tubarão — responde David.

Helena segura em meu

braço e me faz levantar. Caminhamos de volta para sala, mantendo passos

ligeiros. Escutou barulho de porta se abrindo. Dou uma última olhadela para

trás.

Maia me encara, ainda surpresa.

Helena me puxa ainda mais

forte e me obriga acompanhar seus passos.

Eu obedeço.

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