A leve ardência da luz do sol, em seus pés, desperta Léo.
Fora uma extensa e ótima noite de descanso.
O jovem espreguiça-se em sua esteira.
A casa está bastante silenciosa.
Ao levantar, nota Exu diante da entrada da casa, sentado, absorto enquanto fita o nascer do sol no horizonte.
Léo segue à cozinha e nota que Thaís não acordou ainda.
Para tentar ajudar o responsável pela refeição do dia, move-se para explorar a cozinha e conhecer onde tudo se posiciona.
Apesar de inexperiente na cozinha, Léo se esforça para preparar algo. Ao notar que seu café está ruim, opta por fazer sucos e servir leite.
Serve alguns laticínios, pães e frutos, junto a única coisa que conseguia preparar: ovos, muitos ovos. Para incrementar tudo que fritou, usa algumas das sobras do jantar.
Ao fim, a mesa está muito bem servida.
Léo ainda a encara, com pessimistas pensamentos sobre a receptividade de seus companheiros quanto ao café da manhã.
Vira-se e nota Exu observando-o com atenção, na porta.
— Estou fazendo uma bagunça enorme! — O jovem ri.
Exu apenas sorri.
— Só queria saber porque fizeram tudo aquilo com você… Uma alma tão boa… — Diz, indo à sala. — Acabou sendo ferida demais… é realmente uma pena.
Léo não entende a atitude de Exu.
Dá de ombros e volta ao seu trabalho.
Não tarda para Thaís e Cláudio chegarem à cozinha.
— Obrigado por preparar o café. — Cláudio diz. — Não precisava. Hoje, era a minha responsabilidade… e você ainda nem entrou nessa lista… Deveria aproveitar!
— Só queria ajudar. Desculpa! — Léo diz.
— Não se desculpe. Só não faça de novo. Não estamos aqui para sermos amigos, mas, sim, para sermos soldados de Exu!
— Quê!? — Léo franze o cenho.
— Isso mesmo que ouviu! Sou gentil com a Thaís e com Exu, mas não espere que faça o mesmo por você. Não acredito que mereça estar aqui. Sei bem que tipinho de pessoa você é, então, não tenta, ok? — responde, arrogantemente.
— Okay… só uma dúvida… você me conhece?
— Não preciso! Tenho experiência em distinguir quem são as pessoas e como são, mas isso é outra história e não estou a fim de explicar. Lembre-se: tirando as coisas que te tornarão um soldado melhor para Exu, não conte comigo para nada!
— Tudo bem. — Léo assente, sentindo sua carne tremer. — ‘Cê pode contar comigo… Quero ser diferente dessa vez, então não darei ouvidos a mim mesmo, agora, mesmo que você esteja sendo um “pela saco”!
— Como ousa, moleque!? — hostiliza, serrando o punho.
— Caguei ‘pra sua opinião, mas, sim, estarei aqui sempre que puder ajudar. Goste ou não! Se ajudo, adianto vocês, assim podem me ajudar com o treino. Se quer que seja assim, então, me paga pela ajuda… talvez se sinta melhor alimentando esse balão gigante de ego e orgulho besta, que me aconselhou a evitar!
— Mas eu disse que-
Léo dá as costas, deixando Cláudio falando só.
— Que abusado! Se fosse em outro tempo, ‘taria de perna quebrada!
— Não fiz nada elaborado ‘pro café! — Léo grita para Cláudio, sentando à mesa. — Sou péssimo na cozinha. Se quiser melhor, precisa fazer.
— Eu te ensino na próxima… — diz Thaís. — Não fica chateado com ele… Sabe!? Ele viveu em outros tempos e foi policial paulista, além disso, se sente ameaçado por você… está bastante enciumado, logo passa!
— Acho que entendo ele… mais esse papo de paulista e carioca… além disso, me julgar assim, é ‘mó feião!
— Quê!? — Thaís franze o cenho, não entendendo.
— É horrível.
— Ah! Claro… — Ela gargalha.
— E aí, pombinhos!? — Exu diz, se aproximando. — Teremos treinamento para os dois hoje. De dia e de noite.
— E à tarde? — pergunta Léo, olhando-o.
— Estudo e exercício para desenvolver o emi.
— Certo!
— Se conseguir ter tempo hoje, deixo ir.
— Obrigado. — Léo sorri, empolgado.
— Filho de Oxossi ou Ossaim… alguém da mata? — Thaís sonda, investigando Léo com o olhar.
— Não… — Exu gargalha. — Não descobrirá, então, desista! Ele só mostrará sua natureza daqui há um bom tempo.
— Sim, senhor. — Assente, inflando as bochechas. — Estou tão curiosa… me responde, Léo. Por favorzinho!
— Se Exu não quer, não posso desobedecer.
— ‘Tá bom. — Ela se rende.
Não demora para Cláudio terminar de servir a mesa e todos começarem sua refeição.
O clima entre Cláudio e Léo está tenso, porém, bem mais suave do que esteve anteriormente.
Assim que Exu termina, o trio o cumprimenta e segue: Cláudio vai aos cuidados diários enquanto Léo e Thaís seguem Exu até o pagode para terem seu treinamento.
— Você, menino Léo! — Exu diz, ao chegarem. — Tente observar e repetir os nossos movimentos. Se tiver dúvidas, ajudo. A ideia é fazê-lo conhecer seu corpo, além de conhecer os nomes dos movimentos. Depois, ensino técnica. Depois, uma roda.
— Sim, senhor. — Assente, com olhar bem sério.
— Já disse… — Exu repreende.
— Desculpe… Sempre quis dizer assim para um professor, mestre ou, sei lá, tipo nos filmes. — Léo gargalha.
— Por que não buscou aprender?
— Sei lá! — Léo dá de ombros. — Preferi não aprender… Já era um problema sem saber brigar… se soubesse eu, com certeza, seria muito mais violento.
— Entendo… Bom… comecemos!
Eles começam o aquecimento, alongando o corpo.
Léo já começa a sofrer nessa parte! Não está habituado à rotina, mas se esforça para não ficar muito para trás.
Exu brada um movimento e o aplica com ajuda de Thaís.
Movimentos simples e comuns.
Léo tem maior dificuldades com movimentos rasteiros, mas lentamente consegue repetir todos eles.
Quando terminam, Exu manda Thaís aplicar alguns movimentos aprimorados saltados, como martelo cruzado saltado, e oferecer ajuda para Léo com suas dificuldades.
Demora, afinal é difícil prestar atenção no que Exu tenta explicar, estando tão fascinado com Thaís e seus movimentos.
Um olhar tão atento a si, torna Thaís mais aplicada no que executa, mostrando movimentos melhores elaborados.
Ao entender que o jovem observava somente a beleza da capoeira, os olhos de Exu inflamam e ele lhe diz:
— Desisto de ser professor assim! Vamos do jeito que gosto!
Léo assusta-se, assente com a cabeça e se aproxima de Exu.
Este se abaixa e brada:
— Laroiê!
Ambos os alunos, até mesmo Cláudio, respondem:
— Exu é mojubá!
Assim a roda se iniciar.
A evolução de Léo, quanto aos passos mais básicos, é notável.
Exu inicia os comandos, dizendo quais movimentos o jovem deve aplicar. Léo, de boa memória, triunfa em aplicar os movimentos previamente ensinados.
Exu impressiona-se com o desempenho de Léo.
Para a dança e retorna a base do círculo, abaixando.
— Vem cá! — Exu chama.
Léo se aproxima e abaixa.
— Fiz algo de errado? — Preocupa-se.
— Não, mas quero testar algo! Thaís, busque uma venda!
Thaís sai. Cláudio, curioso ao vê-la, a questiona:
— ‘Pra que esse pano? Alguém se feriu? De certo, o novato.
— Não… Exu está querendo testar algo novo com Léo. Ele evoluiu rápido. ‘Tô impressionada, menos de um dia e ele já sabe fazer algumas coisas impressionantes!
— Até parece! Essa eu quero ver — diz, desdenhoso.
— Então, vem, ‘ué!?
Cláudio segue Thaís, incrédulo.
Exu toma o pano e venda Léo, dizendo:
— Não pegarei leve… se não ouvir seu sangue, apanhará. Lembra que não brincamos com isso, ‘né!?
— S-sim, eu sei… mas, logo meu sangue… como faço?
— Gosta de samba, menino Léo?
— Sim, muito! — diz, vibrando.
— Sinta o samba nas cantigas da capoeira… talvez ajude!
Léo não entende muito, mas assente, concentrando-se.
Lembra-se das músicas dos mestres do samba, buscando focas naquelas que referiam diretamente a capoeira.
Exu observa o jovem se concentrar e desvencilha-se do toque no rapaz. O jovem entra em prontidão, crendo que isto marcava o início do treinamento. Mantém-se atento, buscando as sensações que bons sambas sempre lhe invocaram.
Vê-se em meio a Marquês de Sapucaí, sentindo a excitação e empolgação, acesas pelo Carnaval.
Acesas pelo festejo de tantas pessoas alegres.
Exu se aproxima lentamente de Léo, buscando distraí-lo apenas toca em seu peito.
O instinto do jovem o conduz a dar um salto mortal para trás.
Exu já estava esperando algo similar, experiente, apenas esquivou. Tornando a aproximar-se e iniciando a dança.
O corpo do jovem move-se cumprindo com movimentos de grandes mestres de capoeira. Tão perfeitos quanto únicos, dado o estilo da ginga, um pouco diferente da capoeira.
Exu sorri, apontando para os passos de Léo.
Ambos engajam na dança, como se Léo soubesse o que fazia.
Um largo sorriso estampa o rosto de Thaís e ela torce, empolgada. Mesmo não entendendo o que ocorre, é divertido e simplesmente lindo como ele se move.
Exu diverte-se! Afinal, não precisa se segurar, pode somente jogar capoeira, sem todos os muitos receios de ensinar.
O jovem torna-se estranho, mais agressivo, com ar desdenhoso, ou arrogante, mas Exu ainda consegue se divertir.
Léo não se permite cair, recebe um ou outro golpe, mas confia em seus instintos e continua se entregando, como a vida no mais tradicional candomblé lhe ensinou a praticar.
Justamente tal vida religiosa, agora, lhe serve como explicação para tudo. A essência do eje correndo em suas veias é muito natural, intensamente imersiva, parece tragá-lo mais e mais…
Cláudio emburra a cara, incapaz de crer no que vê. Cruza os braços por todo o tempo em que assiste e, ao fim, é incapaz de ficar e sai batendo os pés, sem sequer ser notado.
— Acorda, menino Léo! — Exu chama, gargalhando verdadeiramente, empolgado, livre.
Ouvindo a risada de Exu, exatamente como sabia ser, Léo estremece e tira as vendas apressadamente, dizendo:
— Err… então… eu ‘tô bem… eu acho… — Perdido, olha para Exu. — Como foi seu teste?
— Se o menino Léo fosse de outra banda e morresse… estaria na falange de um conhecido meu… como dizem por aí… Parabéns, malandragem! — diz, com um sorriso ladino. — Linda demonstração de habilidade. Que maravilha!
— Quê! — Thaís ainda está pasma. Aproxima-se e questiona. — Exu, o que foi aquilo tudo!? Léo! Parecia que eu ‘tava assistindo um desafio de malandro… só que amistoso, claro! Estou certa!?
— Sim, menina Thaís! — Exu assente. — Ele tem sangue de malandro… logo, a capoeira de malandro ‘tá no seu sangue… a raiz do samba e da capoeira estão encravados em sua alma.
Léo se surpreende, acanhado.
— Não entendi nada, mas, obrigado — diz, desconcertado, coçando a cabeça.
— Vamos! Agora, posso pegar mais pesado no treino. — Exu diz, empolgado, com ar determinado. — Léo, busque sentir de novo o que te levou ao transe, mas, sem vendas. Apenas feche os olhos. A ideia é trazer esse conhecimento para o consciente. Vamos. Os dois de uma vez! — Ele volta a gargalhar, bem alto. — UM BOM DIA HOJE!
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Atualizado até capítulo 97
Comments
Cacaco B.S. Nogueira
kkkkkkk
2022-06-29
1
Raquel Souza
ksksksks, eita, o negócio tá esquentando
2022-06-12
1
Raquel Souza
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2022-06-12
1