Terceira Chance
Mais uma noite e Leandro caminha bêbado numa rua de Realengo, Zona Oeste do Rio de Janeiro, para manter as aparências, afinal, sabe como funcionam as regras do jogo.
Léo, como é chamado pela malandragem, é um belo rapaz, moreno jambo, de cabelos escuros e olhos castanhos claros, que escondem aventuras e experiências sujas, pervertidas e sem pudores. É um verdadeiro exemplo de cafajeste inescrupuloso.
Apesar de parecer viver uma vida maravilhosa aos que entendem-no como um bom vivant, sem profundidade, sua vida não é lá este mar de rosas.
Um exemplo de mulato, “da cor do pecado”.
Teve os melhores instrutores e instituições à sua disposição e, sim, muito dinheiro e influência devido ao seu sobrenome, porém, sempre fora indesejado por seus pais e maltratado por sua família. Como a escória, a mancha, que persiste no meio de uma honrada família tradicionalista e poderosa do país.
Tendo somente estes parâmetros para guiá-lo, Léo tornou-se o crápula bêbado, que você vê, agora, já abandonado e deserdado por seus algozes, caminhando a ermo.
Algo estava prestes a acontecer…
Sim…
Algo que, apesar de parecer um breve passo para a mudança de seu destino, será um divisor de águas surpreendente para sua história e convicção.
Agora, a sombra do mau augúrio esgueira-se, ardilosa, às costas do maltrapilho sem destino. Enquanto outra sombra recostada, imperceptível, numa encruzilhada, observa tudo.
Subitamente, o silêncio da noite é quebrado por tiros.
Léo tenta se abrigar de mais um tiroteio à luz do luar, mas ao se abaixar atrás da mureta de um bar, sente um forte ardor em suas costas.
Algo quente e úmido cola sua camisa em seu corpo.
Levando a mão, com certa dificuldade, na altura de sua terceira costela, perto da coluna, acha a origem da ardência.
Seu corpo parece mais lento e mais leve — ainda mais leve do que a embriaguez pode causá-lo.
Léo observa sua mão e nota sangue.
O jovem sorri, olhando para o céu.
“Até que enfim, chegou… Meus amados Orixás sabem que não procurei a morte. Vivi como soube, de coração aberto, em verdade.”, pensa, “Sim, fiz besteira, mas sou moleque novo. Não tinha com quem contar ou aprender e acabei criando vítimas… me perdoem! Perdoa-me, meu pai Ogum. Sou falho e perdi a batalha, mas fiz meu melhor. Que Zambi tenha piedade de mim. Ah! Rebeca… me perdoe… Não pude ser um bom marido. Você não merecia isso. Perdoe-me. A vida é assim, um eterno chorinho de viola e cuíca… com aquela flautinha doce, no meio do carnaval sem fim. Hahaha, agora, no final, acabei de descobrir que herdei o dom dos poetas da família Cardoso. Que surpresa! Hahahaha. Por que estou pensando nela, agora? Bem… tanto faz. Parece que, no fim, percebi amar alguém e perdi a chance de ser amado… ou será que fui!?”
Léo começa a sentir o afogamento pela hemorragia pulmonar do ferimento mortal. Entre golfos de sangue e lampejos de consciência, uma voz masculina, firme e forte, porém acolhedora, o diz:
— Realmente quer partir, menino?
— Deus!? — indaga.
— Longe disso! — Gargalha. — Porém, sou filho dele… temos pouco tempo… deve me responder…
— ‘Pra que viver? Ninguém me quer bem e sei que parte disso é culpa minha. Um círculo vicioso, sabe!? — lamenta.
— Entendo… e se eu disser haver chance de diferir? Digo tudo, incluindo você. Dar a volta por cima, chutar o pau da barraca e tascar uma rasteira no destino.
Léo atém-se e percebe que caíra.
Tenta se levantar, sem sucesso.
Era nítido seu desejo por querer fazer diferente, melhor… ser alguém que pudesse, ao menos, ter algum valor.
Tomado pela ânsia de viver, seus olhos transbordam em lágrimas e gaguejando, devido à fraqueza, ele pergunta:
— E q-quan… to… cus… t-tar… ia? É… p-pos… sível? Não… quero.. ac-acabar… assim. T-tenho.. me… do… Não… que… ro… ser… esqu- cido… ou… lembra- de… forma… tão… ruim… quan- creio… que… serei…
Após um esforço descomunal, Léo grita:
— NÃO SOU COVARDE. SEMPRE ENFRENTEI TUDO DE FRENTE!
— Isto é mentira, mas, sim, pode mudar e não cobrarei nada além de dedicação e determinação infinitas. De resto, basta colher os bons frutos que Zambi lhe oferecer.
— C-como devo f-fazer ‘pra aceitar?
Um homem surgiu na frente de Léo.
A visão dificultava enxergar seu rosto, porém ele trajava vestes africanas tribais, vermelha e preta.
O homem lhe estendeu a mão, dizendo:
— Venha, menino Léo. Festejemos neste Carnaval que está por vir!
Léo tomou a mão de seu salvador.
Uma forte luz mostrou-se antes de seus sentidos desaparecerem, anunciando sua morte.
A escuridão foi substituída por um negro céu, banhado por um luar prateado, e uma borboleta-vermelha bailava no ar.
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Atualizado até capítulo 97
Comments
preta nascimento
Laroye senhor dos caminhos .
patacori senhor das estradas .
2023-11-30
2
Caroline Almeida
gostei do livro assim que li
2023-08-31
0
YUKARI,-🦋
oooo
2023-07-29
0