Capítulo 10: O Evento da Firma

Eu tava olhando pro espelho do meu quarto chique, tentando me convencer que a mulher ali refletida era eu mesma. A Fernanda, a estilista mágica do Rafael, tinha voltado naquela manhã com mais uma arara de roupas, e dessa vez eu tava vestindo um vestido preto longo que abraçava meu corpo como se tivesse sido feito pra mim — o que, pensando bem, provavelmente foi mesmo. O decote era discreto, mas elegante, e o tecido tinha um caimento que me fazia parecer mais alta e menos desajeitada. O cabelo tava solto, com umas ondas que a assistente dela fez com um babyliss. Eu tava bonita, admito, mas ainda me sentia uma impostora naquele look de gala.

O evento da empresa era naquela noite, quinta-feira, e o Rafael tinha deixado claro que era mais um teste de fogo. “É uma festa pra acionistas e diretores da rede de hotéis”, ele disse na véspera, enquanto tomava o uísque de sempre. “Meu pai vai estar lá, e ele vai querer te ver em ação de novo. Só sorria, fala pouco e me deixa conduzir.” Tá, fácil falar, né? Mas eu sabia que era mais do que isso — eu tinha que convencer um salão cheio de ricos que eu era a esposa perfeita do herdeiro Albuquerque, tudo isso enquanto tentava não tropeçar no salto ou derrubar champanhe na cara de alguém.

Desci pra sala com o coração na boca, segurando uma clutch minúscula que a Fernanda me deu — um trocinho que mal cabia o celular. O Rafael já tava me esperando, impecável como sempre, de smoking preto e gravata borboleta. Ele me olhou de cima a baixo quando me viu, e dessa vez não teve franzir de sobrancelha nem comentário seco. Só um “Você tá bem” que saiu quase como um elogio. Quase.

— Valeu, querido — respondi, com um sorrisinho irônico que já tava virando minha marca registrada com ele. — Vamos logo com isso antes que eu desista e volte pro meu pijama.

Ele nem riu, só fez sinal pra eu ir com ele pro carro. O motorista — o mesmo cara sério de sempre — abriu a porta pra mim, e lá fomos nós, rumo ao tal evento no Hotel Albuquerque, o carro-chefe da rede da família dele, um prédio de vidro e mármore no Jardins que eu só conhecia de foto.

Chegando lá, eu quase engasguei com o ar que tava respirando. O salão era gigante, com lustres que pareciam joias penduradas no teto, mesas cobertas de toalhas brancas impecáveis e garçons circulando com bandejas de taças e uns canapés minúsculos que eu não sabia nem como comer direito. A música vinha de um quarteto de cordas num canto, e o lugar tava lotado de gente chique — mulheres com vestidos caros, homens de terno que pareciam custar meu aluguel de um ano, e todos com aquele ar de quem nasceu sabendo segurar uma taça de champanhe sem parecer ridículo.

O Rafael pegou minha mão assim que entramos, e eu senti um choque que não esperava. Não era nada romântico, claro — era só pra manter as aparências —, mas o calor da mão dele na minha me pegou desprevenida. Ele me guiou pelo salão, cumprimentando um ou outro com aquele sorriso calculado que ele dominava tão bem, e eu só ia atrás, tentando não parecer um peixe fora d’água. “Senhora Albuquerque, que prazer”, disse um cara de meia-idade com cara de quem manda em alguma coisa, apertando minha mão com força demais. Eu sorri e murmurei um “Obrigada”, rezando pra não ter que falar mais que isso.

Aí o senhor Albuquerque apareceu. Ele surgiu do meio da multidão como um predador saindo das sombras, com o mesmo terno impecável do jantar e aquele olhar de tubarão que me dava calafrios. — Rafael, Clara — disse ele, com a voz grave que parecia ecoar mesmo num salão barulhento. — Que bom ver vocês dois juntos de novo.

— Pai — respondeu Rafael, com um aceno curto, enquanto apertava minha mão de leve, como quem diz “entra no modo esposa agora”. Eu respirei fundo e soltei meu melhor sorriso.

— Senhor Albuquerque, é um prazer estar aqui — falei, tentando soar natural. — O hotel tá incrível, dá pra ver o quanto o senhor e o Rafael se dedicam a tudo isso.

Ele me encarou por uns segundos, como se estivesse pesando cada palavra, e deu uma risadinha seca. — Obrigado, Clara. Mas me diga, como tá sendo se adaptar à vida de casada com meu filho? Ele não é exatamente um livro aberto, é?

Eu quase engasguei com a pergunta, mas o Rafael me salvou, falando antes que eu pudesse meter os pés pelas mãos. — Ela tá se saindo melhor do que eu esperava, pai. Clara tem um jeito de deixar as coisas mais… leves.

— Leves, é? — repetiu o senhor Albuquerque, com um brilho nos olhos que eu não sabia se era aprovação ou desconfiança. — Interessante. Bom, aproveitem a noite, vocês dois. E, Clara, espero que você dance com meu filho mais tarde. Quero ver esse “leve” em ação.

Ele se afastou pra falar com outra pessoa, e eu soltei o ar que nem sabia que tava segurando. — Meu Deus, Rafael, seu pai quer me ver dançando com você? Eu nem sei dançar direito! — sussurrei, puxando ele pra um canto.

— Relaxa, Clara. É só uma valsa básica. Eu te guio — disse ele, com aquele tom de quem já resolveu o problema antes de eu surtar de vez. — Só não pisa no meu pé e vai ficar tudo bem.

— Tá, mas se eu pisar, a culpa é sua por me jogar nisso — retruquei, cruzando os braços. Ele só deu aquele meio sorriso e me puxou de volta pro meio do salão.

O resto da noite foi cheia de conversas curtas, taças de champanhe que eu tomava devagar pra não fazer papel de idiota, e sorrisos forçados pra todo mundo que vinha me cumprimentar como “senhora Albuquerque”. Até que o quarteto mudou o ritmo, e uma valsa começou a tocar. O Rafael me olhou, estendeu a mão e disse: — Hora de dançar, querida.

Eu quis morrer por dentro, mas peguei a mão dele e deixei ele me levar pro meio do salão. Tinha outros casais dançando, mas eu sentia todos os olhos em mim — ou pelo menos os do senhor Albuquerque, que tava num canto, nos observando como um juiz implacável. O Rafael colocou uma mão na minha cintura e a outra segurando a minha, e começou a me guiar. Eu tava dura feito pedra no começo, mas ele sussurrou: — Relaxa, segue meu ritmo”, e eu tentei. Não pisei no pé dele — milagre! —, e aos poucos a coisa fluiu. Ele girava comigo como se soubesse o que tava fazendo, e por um segundo eu quase esqueci que era tudo de mentira.

Quando a música acabou, ele me soltou devagar, e eu vi o senhor Albuquerque batendo palma de leve, com um sorriso que não dava pra decifrar. — Nada mal, Clara — disse ele, se aproximando. — Talvez você seja mesmo boa pro meu filho.

— Obrigada, senhor Albuquerque — respondi, com o coração ainda disparado. Ele assentiu e se virou pra falar com outra pessoa, me deixando ali com o Rafael.

— Viu? Não foi tão ruim — disse ele, me entregando uma taça de champanhe.

— Não foi ruim porque você me carregou na dança, seu convencido — retruquei, dando um gole na bebida. — Mas, tá, sobrevivemos.

Ele riu — um riso baixo, quase imperceptível, mas que me pegou de surpresa. — Você tá aprendendo, Clara. Quem sabe até o fim do ano você vire uma Albuquerque de verdade.

— Nem vem, Rafael. Um milhão e tchau — respondi, mas não consegui não rir também.

Mais populares

Comments

Cicera Santos

Cicera Santos

vira uma Albuquerque e ganha mais de um milhão

2025-03-23

2

Ver todos
Capítulos
1 Capítulo 1: A Proposta que Muda Tudo
2 Capítulo 2: A Linha do Sim
3 Capítulo 3: O Escritório do Rei
4 Capítulo 4: O Dia do "Sim" de Mentirinha
5 Capítulo 5: A Primeira Noite no Castelo de Gelo
6 Capítulo 6: O Jantar do Tubarão
7 Capítulo 7: Meu Passado
8 Capítulo 8: As Amigas do Resgate
9 Capítulo 9: O Segredo do Iceberg
10 Capítulo 10: O Evento da Firma
11 Capítulo 11: O Fantasma do Passado
12 Capítulo 12: O Confronto no Castelo de Gelo
13 Capítulo 13: O Brunch dos Ricos
14 Capítulo 14: O Outro Lado do Iceberg
15 Capítulo 15: O Circo e o Skate
16 Capítulo 16: As Amigas e o Surto Coletivo
17 Capítulo 17: O Beijo que Não Era Pra Acontecer
18 Capítulo 18: O Fogo que Não Apaga
19 Capítulo 19: O Caos que Não Para
20 Capítulo 20: A Bomba Chamada Isabela
21 Capítulo 21: O Lado Leve do Iceberg
22 Capítulo 22: O Circo Pegando Fogo
23 Capítulo 23: O Ponto Sem Volta
24 Capítulo 24: A Jogada da Isabela e a Chegada das Salvadoras
25 Capítulo 25: O Contra-Ataque
26 Capítulo 26: O Dia do Tudo ou Nada
27 Capítulo 27: A Ressaca do Triunfo
28 Capítulo 28: O Tombo dos Vilões e a Chegada da Mãe
29 Capítulo 29: O Confronto com Dona Lúcia
30 Capítulo 30: O Café com a Mãe e o Novo Começo
31 Capítulo 31: O Jantar da Paz
32 Capítulo 32: O Chá de Atualização com as Meninas
33 Capítulo 33: O Rolê das Meninas e o Arroz da Redenção
34 Capítulo 34: A Carta Que Mudou Tudo
35 Capítulo 35: A Verdade na Cara do Monstro
36 Capítulo 36: Cruzando o Oceano pela Verdade
37 Capítulo 37: A Mãe Reencontrada
38 Capítulo 38: Libertando Ana
39 Capítulo 39: O Domingo do Recomeço
40 Capítulo 40: Epílogo
Capítulos

Atualizado até capítulo 40

1
Capítulo 1: A Proposta que Muda Tudo
2
Capítulo 2: A Linha do Sim
3
Capítulo 3: O Escritório do Rei
4
Capítulo 4: O Dia do "Sim" de Mentirinha
5
Capítulo 5: A Primeira Noite no Castelo de Gelo
6
Capítulo 6: O Jantar do Tubarão
7
Capítulo 7: Meu Passado
8
Capítulo 8: As Amigas do Resgate
9
Capítulo 9: O Segredo do Iceberg
10
Capítulo 10: O Evento da Firma
11
Capítulo 11: O Fantasma do Passado
12
Capítulo 12: O Confronto no Castelo de Gelo
13
Capítulo 13: O Brunch dos Ricos
14
Capítulo 14: O Outro Lado do Iceberg
15
Capítulo 15: O Circo e o Skate
16
Capítulo 16: As Amigas e o Surto Coletivo
17
Capítulo 17: O Beijo que Não Era Pra Acontecer
18
Capítulo 18: O Fogo que Não Apaga
19
Capítulo 19: O Caos que Não Para
20
Capítulo 20: A Bomba Chamada Isabela
21
Capítulo 21: O Lado Leve do Iceberg
22
Capítulo 22: O Circo Pegando Fogo
23
Capítulo 23: O Ponto Sem Volta
24
Capítulo 24: A Jogada da Isabela e a Chegada das Salvadoras
25
Capítulo 25: O Contra-Ataque
26
Capítulo 26: O Dia do Tudo ou Nada
27
Capítulo 27: A Ressaca do Triunfo
28
Capítulo 28: O Tombo dos Vilões e a Chegada da Mãe
29
Capítulo 29: O Confronto com Dona Lúcia
30
Capítulo 30: O Café com a Mãe e o Novo Começo
31
Capítulo 31: O Jantar da Paz
32
Capítulo 32: O Chá de Atualização com as Meninas
33
Capítulo 33: O Rolê das Meninas e o Arroz da Redenção
34
Capítulo 34: A Carta Que Mudou Tudo
35
Capítulo 35: A Verdade na Cara do Monstro
36
Capítulo 36: Cruzando o Oceano pela Verdade
37
Capítulo 37: A Mãe Reencontrada
38
Capítulo 38: Libertando Ana
39
Capítulo 39: O Domingo do Recomeço
40
Capítulo 40: Epílogo

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!