Pai e Filho: Parte 2

O sangue de Joaquim gelou quando viu os olhos do filho reluzirem como os de uma fera no escuro. Seu instinto gritava para correr, mas suas pernas estavam presas ao chão, como se seu corpo se recusasse a acreditar no que via. O silêncio foi rompido por um som grotesco—o estalo de ossos se deslocando.

Zeca arqueou as costas, seus dedos cravando na mesa enquanto um grito de dor escapava de seus lábios, transformando-se no ser inumano. Seu corpo tremia, estremecia como se algo dentro dele tentasse se libertar. De repente, um estalo seco ecoou pelo cômodo—seus braços se alongaram de forma antinatural, os ossos esticando e dobrando em ângulos errados, enquanto as unhas se projetavam para fora, tornando-se garras negras e encurvadas.

Joaquim recuou um passo quando os dentes do filho começaram a se projetar, perfurando as gengivas, pingando sangue fresco de sua boca aberta. Seu rosto começou a se deformar, o maxilar se alongando, os olhos ficando cada vez mais bestiais. A cada segundo, ele se tornava menos humano. Então, em meio aos estalos de ossos e à dor que torcia seu corpo, Zeca ergueu a cabeça, os olhos brilhando como brasas e a voz saiu misturada a um rosnado gutural:

— Eu avisei para você ir embora!

O grito rasgou o ar junto com sua última transformação, enquanto um uivo sobrenatural emergia de sua garganta. A fera estava solta.

O coração de Joaquim martelava em seu peito enquanto ele se lançava para trás, derrubando a cadeira no processo. O monstro que um dia fora seu filho ergueu a cabeça e soltou um uivo animalesco, fazendo as janelas vibrarem. A boca escorria baba misturada ao próprio sangue, os olhos chamejavam na penumbra. Joaquim correu, os pés escorregando no assoalho sujo de sangue seco.

Ele arrombou um armário velho na cozinha, revirando caixas, jogando utensílios ao chão até encontrar o que procurava: uma espingarda de cano duplo, enferrujada pelo tempo. Com mãos trêmulas, abriu o cano e enfiou dois cartuchos. Antes que pudesse terminar, o estrondo de madeira estilhaçada fez seu corpo congelar. A fera acabara de atravessar a porta da cozinha como se fosse feita de papel, os olhos cravados nele.

Joaquim prendeu a respiração e se jogou para trás, deslizando pelo chão até cair atrás de uma bancada. O silêncio tomou conta do cômodo. Apenas a respiração ofegante dele e o gotejar do sangue da criatura podiam ser ouvidos. Por um instante, nada aconteceu. Ele se esgueirou para fora, tentando fugir pela lateral da casa.

Um baque ensurdecedor.

A madeira acima dele se rompeu, poeira e lascas caindo sobre sua cabeça. A fera aterrissou com um estrondo, suas garras cravadas no teto. Joaquim engoliu seco e correu como nunca antes, passando pelos destroços da sala. O monstro saltou atrás dele, esmagando móveis e arrancando pedaços de parede como se fossem feitas de papel.

Ele girou nos calcanhares e disparou. O primeiro tiro acertou o peito da criatura, mas só a fez hesitar. O segundo explodiu sua clavícula, lançando pedaços de carne no ar. Mas a besta apenas rugiu, furiosa, e se lançou contra ele.

Joaquim se virou e disparou pela porta dos fundos, mergulhando na escuridão da floresta. Galhos arranhavam seu rosto, raízes quase o faziam tropeçar, mas ele não parava. Atrás dele, um barulho ensurdecedor: árvores se partindo, passos pesados esmagando o solo. O monstro o caçava.

Ele se escondeu atrás de uma árvore tombada, prendendo a respiração. A fera passou perto, farejando o ar. Por um instante, parecia que iria embora. Joaquim soltou o ar devagar e se moveu, tentando sair dali.

Então, um bafo quente atingiu sua nuca.

Seu corpo congelou. Um grunhido gorgolejante encheu seus ouvidos, e antes que pudesse reagir, as garras da fera perfuraram suas costas, atravessando suas costelas. O sangue jorrou de sua boca, quente e espesso, enquanto o monstro o erguia do chão. Seus pulmões pareciam colapsar, a dor era insuportável.

Seu olhar começou a ficar turvo, e em meio à morte que o envolvia, flashes do passado invadiram sua mente. Ele se viu em sua antiga casa, segurando o facão, sua esposa caída no chão, os olhos arregalados e o peito perfurado.

Agora entendia.

O monstro rugiu e puxou suas garras para os lados, rasgando Joaquim ao meio. Seu corpo caiu com um baque surdo, suas entranhas escorrendo pelo solo encharcado de sangue. O último pensamento que passou por sua mente antes da escuridão tomar conta foi o rosto de sua esposa sorrindo. Não um sorriso de amor. Mas de vingança.

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