A noite estava calma, mas havia uma tensão no ar, como se algo estivesse prestes a acontecer. Souta estava sentado no pequeno café que frequentava sempre que precisava de um pouco de silêncio, longe da confusão cotidiana. O aroma do café recém-passado misturava-se com o calor da lareira, criando uma atmosfera acolhedora. A mesa onde ele se sentava era perto da janela, e ele podia ver as ruas vazias, iluminadas pela suave luz dos postes.
Ele estava absorto em seus pensamentos quando, de repente, a melodia suave de um shamisen tocou no ambiente. Era uma música suave, mas carregada de algo misterioso, como se cada nota carregasse consigo um pedaço de uma história esquecida. O som vinha de um canto distante, de um rádio antigo que estava em uma das prateleiras do café. Não era uma canção popular, mas algo antigo, tradicional, que parecia ter atravessado gerações para chegar até ele.
Assim que a música tocou, algo dentro de Souta se agitou. Ele fechou os olhos por um momento, tentando se concentrar na melodia, mas uma sensação estranha e desconfortável tomou conta de seu peito. Era como se a música estivesse falando com ele, evocando sentimentos que ele não conseguia compreender. Uma onda de nostalgia e tristeza o envolveu, como se ele tivesse vivido essa canção antes, em algum lugar, em algum momento distante.
A sensação de déjà vu foi tão forte que ele se levantou abruptamente da cadeira, seu coração batendo mais rápido. As notas da música pareciam se entrelaçar com algo dentro dele, algo enterrado no fundo de sua memória, uma lembrança que ele não podia acessar. Era como se a música estivesse tentando resgatar uma parte de sua alma que ele havia perdido, algo que ele não conseguia entender.
Ele olhou para o rádio, quase hipnotizado pela melodia, e foi quando viu algo estranho. A dona do café, uma senhora de cabelos prateados e expressão serena, estava observando-o com uma intensidade que o fez sentir uma leve inquietação. Seus olhos eram profundos, como se ela soubesse algo que ele não sabia. Ela parecia imperturbável, como se a música fosse parte de algo maior, algo que ele ainda não conseguia perceber.
Souta se aproximou dela, seu corpo ainda tremendo ligeiramente.
— Essa música... — ele começou, a voz embargada. — Onde eu já ouvi isso antes?
A senhora sorriu suavemente, como se soubesse exatamente o que ele estava sentindo, mas não disse uma palavra. Em vez disso, ela apontou para um pequeno livro encadernado em couro sobre o balcão. O livro estava desgastado, como se tivesse sido manuseado por gerações, suas páginas amareladas pelo tempo.
— Esse é um livro de canções tradicionais. Talvez isso ajude a entender o que você está sentindo — disse ela, sua voz suave e calma, mas com um tom de mistério.
Souta pegou o livro com as mãos trêmulas. Quando abriu a primeira página, uma onda de reconhecimento percorreu seu corpo. As palavras escritas ali estavam em um estilo que ele não conseguia identificar, mas algo dentro de si lhe dizia que ele já as conhecia, que ele já havia lido aquelas mesmas palavras há muito tempo. Seu olhar percorreu as páginas, até que encontrou a partitura da música que tocava no rádio. Ele sentiu um calafrio percorrer sua espinha, como se aquela melodia estivesse conectada a algo profundamente pessoal.
A dona do café observou-o em silêncio, como se aguardasse sua reação. Souta continuou a olhar para a partitura, suas mãos ainda tremendo. Ele sentia que algo estava prestes a se revelar, algo que ele não estava pronto para descobrir, mas que de alguma forma ele já sabia. A música... aquelas palavras... elas estavam ligadas a ele de maneira que ele não podia explicar.
Ele se lembrou de uma conversa que teve com Aoi algumas semanas antes, quando ela falou sobre as sensações estranhas que ambos sentiam, como se suas vidas estivessem entrelaçadas em outra época. Naquele momento, Souta soubera que havia algo mais entre eles, algo além do que os olhos podiam ver. Agora, com a melodia tocando em seus ouvidos e o livro em suas mãos, ele sentia que aquela sensação não era apenas uma coincidência. Era como se a música estivesse tentando revelar a verdade.
A senhora, ainda observando-o, disse:
— Às vezes, as canções trazem à tona coisas que preferiríamos esquecer. Mas também podem nos mostrar o caminho de volta para onde pertencemos.
Souta engoliu em seco, sentindo uma pressão em seu peito. Ele sabia que a música estava tentando lhe dizer algo, mas não conseguia compreender completamente. Ele se virou para a senhora, seus olhos buscando uma explicação, uma pista para o que estava acontecendo com ele.
— O que isso significa? — perguntou ele, quase com urgência. — Por que eu sinto que conheço essa música?
A senhora sorriu, mas não respondeu imediatamente. Ela olhou para o livro, como se estivesse refletindo sobre suas palavras.
— Alguns laços são mais fortes do que o tempo, mais profundos do que a razão — ela disse finalmente. — E às vezes, a música pode nos ajudar a nos lembrar do que esquecemos. Talvez você tenha vivido algo em outro momento, em outro lugar. A canção está apenas lhe mostrando uma parte desse caminho.
Souta não sabia se aquilo fazia sentido ou se a senhora estava apenas falando de maneira enigmática. Mas uma coisa ele sabia: a música havia despertado algo dentro dele, algo que ele não podia ignorar. As memórias vinham à tona, fragmentadas, como uma história esquecida, e ele sabia que a chave para entender o que estava acontecendo com ele estava naquelas canções antigas.
Com o livro ainda nas mãos, ele olhou para a senhora mais uma vez. Algo no fundo de seu olhar dizia-lhe que ela sabia muito mais do que estava disposta a revelar.
— O que devo fazer? — perguntou ele, sua voz mais suave agora, quase como se temesse a resposta.
A senhora olhou para ele por um momento, como se ponderasse a questão. Finalmente, ela disse:
— Às vezes, o que precisamos fazer é seguir o som. Deixe a música guiá-lo. Talvez você encontre o que está procurando, ou talvez o que você já soubesse. O caminho se revela quando estamos prontos para vê-lo.
Souta ficou ali por um tempo, absorvendo aquelas palavras. A música continuava a tocar suavemente no rádio, preenchendo o espaço com sua melodia melancólica, e ele sentiu, de alguma forma, que a música era mais do que apenas uma canção. Era uma ponte entre o passado e o presente, entre quem ele era e quem ele havia sido.
Ele sabia que tinha algo importante a descobrir, algo que estava escondido em algum lugar dentro dele, e que a música poderia ser a chave para desvelar esse mistério. E, talvez, ao seguir essa trilha, ele encontrasse o que o destino havia reservado para ele e para Aoi.
Com o livro ainda fechado em suas mãos, Souta se levantou da mesa. A dona do café não disse mais nada, mas o sorriso suave em seu rosto dizia-lhe que ela sabia que ele estava prestes a embarcar em uma jornada muito maior do que ele imaginava.
Ele saiu do café, a música ainda ressoando em sua mente, e a neve caindo suavemente ao seu redor.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 20
Comments