Matarei quem a fizer chorar.

Eu nunca tinha visto algo tão devastador quanto Rafaela no chão, despedaçada pelo luto.

Ela tremia nos meus braços, os soluços rasgando sua garganta como lâminas afiadas. Seus dedos se cravavam em minha camisa, e eu não podia fazer nada além de segurá-la, tentando juntar os pedaços que restavam dela.

Eu já tinha matado muitos homens. Já vi desespero nos olhos de quem sabia que ia morrer. Mas nada no mundo poderia me preparar para o olhar de Rafaela naquele momento.

Ela não chorava apenas pelas mães que tinham morrido. Ela chorava por si mesma. Pela culpa que carregava nos ombros frágeis. Pela dor de quem sente que falhou.

E isso partiu meu coração.

Fiquei ali, segurando-a, deixando-a chorar até que seus soluços virassem somente suspiros fracos contra meu peito.

Mas a guerra lá fora não esperava.

Os homens já estavam na caça dos Barcello, e eu deveria estar com eles. Mas não conseguia soltá-la, assim como seu irmão e seu pai, estávamos ali por ela deixando que ela chorasse o que precisasse.

Eu só a soltei quando ouvi passos pesados ecoando pelo corredor. Quando vi o rosto do homem que menos esperava ver ali.

O pai dos Barcello.

Filho da puta.

Rafaela também o viu. E antes que eu pudesse segurá-la, ela se desvencilhou de mim e avançou como uma tempestade.

— SEU DESGRAÇADO! — A voz dela ecoou, carregada de ódio e dor.

Ele ergueu as mãos, tentando se defender.

— Eu não sabia! Eu não sabia de quem era o ônibus!

— MENTIROSO! — Ela tentou acertá-lo, mas ele se afastou.

— Eu juro, menina! — Sua voz era tensa, os olhos correndo entre mim e Noah, que se aproximava. — Se fosse ordem minha, eu diria. Eu não sei…

— COVARDE! — Rafaela gritou, a raiva pulsando em cada sílaba. — Elas morreram! Você tem ideia do que isso significa?

— Cala a boca menina, se afasta e me deixe falar com meu Don! — ele retrucou com a voz áspera, achando que fez algo bom, não sabe ele que a ligação que Noah tem com ela é maior que tudo nesse mundo.

Foi o suficiente.

Meus instintos assumiram o controle antes mesmo que eu percebesse.

Em dois passos, eu o alcancei e o joguei contra a parede. Minha mão encontrou sua garganta, apertando com toda a fúria que crescia dentro de mim.

Ele tentou se debater, tentou me afastar, mas não havia mais volta.

A raiva que senti quando vi Rafaela aos prantos. O ódio por saber que ela carregaria essa dor pelo resto da vida. O desespero de querer protegê-la e perceber que já era tarde demais.

Tudo isso alimentou minha força.

Ele tentou respirar, mas eu não deixei.

A vida esvaiu-se dos olhos dele pouco a pouco, e quando finalmente soltei, seu corpo desabou no chão sem vida.

E então, um baque atrás de mim me trouxe de volta a realidade.

Rafaela caiu antes que eu pudesse pegá-la.

O choque a venceu.

Lorenzo correu até ela e a ergueu nos braços.

— Eu cuido dela — disse, me lançando um olhar de advertência antes de levá-la para cima.

Fiquei ali, respirando pesado, olhando para o corpo no chão.

Noah foi o primeiro a quebrar o silêncio.

— Vai se lavar, minha irmã precisará de você em breve, você é louco matar um homem assim na frente dela. — Sua voz era firme. — E vocês… — Ele olhou para os soldados. — Limpem essa merda.

Me virei e fui.

Cada passo que eu dava me lembrava do rosto de Rafaela, e matar ele ajudou a aliviar a raiva que eu guardaria para os Barcellos filhos.

Quando voltei para o quarto, ela estava acordada.

E chorava de novo.

— Eu preciso ir ao hospital, Matheu por favor, meu pai disse que é você quem vai decidir, me leve eu te imploro… — implorou com os olhos cheios de desespero.

Lorenzo me olhou, deixando a decisão para mim.

E eu deveria dizer não.

Mas eu não conseguia.

Eu não conseguia ver Rafaela daquele jeito.

Suspirei pesadamente.

— Vamos. — falei e ela logo levantou e foi ao banheiro.

— Matheu, você tem minha confiança a muitos anos, mas cuide dela com mais calma, se ceder a cada dor que ela tem vão sempre estar em perigo, e nesse momento guarde sua fúria para Vitto. — falou Lorenzo levantando e saindo do quarto.

As luzes dos flashes quase me cegavam quando o carro parou em frente ao hospital.

Fotógrafos se amontoavam diante da entrada, tentando capturar qualquer detalhe do nosso rosto, qualquer reação que vendesse manchetes. O nome Mansur sempre atraía atenção, mas agora, com o incidente da ação beneficente, todos queriam falar sobre a tragédia.

Ação beneficente termina em duas mortes.

A manchete já estava pronta, eu sabia disso.

Rafaela tremia ao meu lado, agarrada ao meu braço como se dependesse disso para se manter de pé. Sua respiração estava curta e instável, e a única coisa que me impediu de pegá-la no colo foi o orgulho que ela ainda insistia em manter.

— Vamos sair rápido — Noah avisou, a voz tensa.

Alana segurou a mão dele, os olhos firmes como se já estivesse preparada para enfrentar qualquer coisa.

Os seguranças abriram caminho, afastando os repórteres enquanto entrávamos no hospital.

No momento em que cruzamos as portas de vidro, uma calmaria forçada tomou conta do ambiente.

Rafaela apertou meu braço com mais força.

No andar reservado para as meninas, o silêncio era quase sepulcral. Algumas mães estavam sentadas em cadeiras de espera, olhos vermelhos, olhares vazios. Outras estavam nos quartos, cuidando das filhas feridas.

E então, vi as meninas mais desesperadas chamando pelas mães.

Duas pequenas camas lado a lado.

A menina de três anos tinha curativos pelo corpo, um bracinho enfaixado, os olhos inchados de tanto chorar. Ela parecia tão pequena, tão frágil, que me deu um nó no estômago.

A outra, de cinco anos, respirava com dificuldade. O rosto estava cheio de arranhões e hematomas, e seu cabelo escuro estava preso de qualquer jeito, como se tivessem tentado ajeitá-lo para que não caísse sobre os machucados.

Elas estavam sozinhas agora. Sem mãe.

O peso dessa realidade fez Rafaela soltar meu braço.

Ela deu dois passos hesitantes para dentro do quarto, como se não tivesse certeza se merecia estar ali.

— Eu sinto muito… — A voz dela saiu embargada. — Me perdoem…

Uma das mães se aproximou, o olhar cansado, mas determinado.

— Você não tem culpa, Rafaela, desde o dia que chegou na comunidade nossa vida mudou, você sempre foi um anjo.

— Tem razão — outra mulher interveio. — Se não fosse por você, estaríamos muito pior.

As palavras não pareciam alcançá-la.

Rafaela estava ali, encarando aquelas meninas machucadas, com a culpa estampada no rosto, e nada que dissessem poderia mudar isso.

Foi quando aconteceu.

A menina mais nova abriu os olhos inchados, viu Rafaela e estendeu os bracinhos.

E então a outra fez o mesmo.

Rafaela se ajoelhou no chão antes mesmo que eu pudesse reagir.

Ela sentou-se ali, cercada pelas crianças que ainda conseguiam se mover, e se permitiu chorar com elas.

Braços pequenos se enroscaram ao redor dela, buscando conforto.

E ela deu.

Ela deu tudo o que tinha, mesmo que estivesse despedaçada.

Noah e eu recuamos um pouco, deixando-a naquele momento acompanhada de Alana que abraçava uma menina pequena.

O médico se aproximou, dando as atualizações sobre os estados das feridas, as cirurgias necessárias, as medicações.

Noah o ouviu com atenção, e então decretou:

— Dê a elas o melhor tratamento. O melhor. Eu não quero ouvir sobre custos.

O médico assentiu rapidamente.

— Além disso… — Ele olhou para as mães no corredor, exaustas, destruídas. — Quero uma babá para cada criança. Elas precisam descansar para conseguirem melhorar.

A ordem estava dada.

Eu apenas observei enquanto Noah resolvia tudo, enquanto os seguranças garantiam que não haveria mais riscos e enquanto Rafaela continuava ali, no chão, com os pequenos braços apertando-a como se fosse a única coisa que ainda tinham no mundo.

E talvez fosse mesmo.

Mais populares

Comments

Marina lopes

Marina lopes

as crianças que ficaram sem mãe poderiam adota los

2025-03-07

2

bete 💗

bete 💗

muito triste ela não tem culpa
esse crápula precisa ser encontrado
❤️❤️❤️❤️❤️

2025-03-08

0

Cleise Moura

Cleise Moura

Rafaela e o Matheu poderiam adota-las

2025-03-24

0

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!