O tempo passou, e com ele veio o alívio.
Belinda foi encontrada. Ela está a salvo, cercada por amor e finalmente vivendo a vida que sempre mereceu, ela ficou em Portugal com o marido e nossa menina está apaixonada. Como se isso não bastasse, o destino a presenteou com três pequenos milagres—seus trigêmeos. Saber que ela está bem e que, em breve, passaremos o Natal juntos, em família, aquece meu coração de uma forma que há tempos eu não sentia.
Agora, a vida pode voltar ao normal.
Ou pelo menos, é o que tento me convencer.
Matheu continua ao meu lado, mas é como se ele não estivesse ali. Falamos apenas o necessário, e mesmo isso soa estranho. Evito seu olhar sempre que posso, evito qualquer proximidade, e ele parece fazer o mesmo. Talvez seja melhor assim, vivo com uma única lembrança, o beijo que demos, a única ligação que manterei com ele.
Hoje, estou concentrada na minha aula. Ensinar dança para as meninas da comunidade tem sido uma das minhas maiores alegrias, um lembrete de que, apesar de tudo, ainda há beleza no mundo.
Convencer Noah e meu pai foi difícil, mas ter Alana ao lado dele tem feito meu irmão amolecer um pouco e o futuro casamento com Aylla e o Russo diminuiu nossos inimigos, então como aqui é um lugar que sempre ajudamos acabou se tornando menos perigoso.
— A dança do ventre é muito mais do que técnica. — Explico, deslizando os quadris suavemente para demonstrar. — É uma arte de contar histórias sem palavras. Cada movimento tem um significado, e quero que vocês sintam isso enquanto dançam.
As meninas observam com atenção, algumas já se arriscando nos primeiros passos, outras rindo quando erram, mas sem desistir. O ambiente é leve, cheio de energia boa, e eu me entrego completamente ao momento, me permitindo esquecer... esquecer dele.
Mas Matheu está ali.
Sempre está.
Com seu olhar vigilante, braços cruzados e a expressão séria de sempre. Ele não interfere, não diz nada além do estritamente necessário, mas sua presença pesa ao meu redor de um jeito que me irrita.
Eu me recuso a olhar para ele.
Me recuso a lembrar do beijo que ainda me assombra.
Porque hoje, tudo que importa é que estou dançando, ensinando e colocando em prática algo que amo fazer.
E que, por mais que meu coração insista em se enganar, Matheu e eu não somos nada além de dois estranhos dividindo o mesmo espaço.
A aula logo acabou e as meninas se despediam saindo uma a uma, as mães agradeciam e lançavam palavras de carinho.
A música ainda pairava no ar, mesmo depois que os últimos acordes silenciaram. O espaço ficou vazio—exceto por mim e Matheu.
Fazia meses que evitávamos qualquer proximidade, qualquer troca de palavras que não fosse estritamente necessária. E agora, pela primeira vez em tanto tempo, estávamos sozinhos.
Eu virei para sair, disposta a manter o mesmo jogo de distância que sustentávamos há tanto tempo, mas então senti.
Uma presença forte, intensa, esmagadora.
— Rafaela. — A voz dele soou grave, carregada de algo que fez minha pele arrepiar.
Fechei os olhos por um instante, reunindo forças para não me virar. Mas era inútil.
Ele se aproximou, e o calor de seu corpo se misturou ao meu sem sequer me tocar. Quando sua mão forte pousou suavemente em meu pulso, não como um comando, mas um pedido, senti meu coração errar uma batida.
O perfume amadeirado e másculo dele invadiu meus sentidos, e por um momento, eu me odiei por querer me perder naquilo.
Abri os olhos devagar encontrando os dele.
Matheu parecia à beira do abismo.
— Fala comigo. — Sua voz não era uma ordem, era quase uma súplica.
Engoli em seco, odiando o quanto aquilo me enfraquecia.
— Falar o quê, Matheu? — Minha voz saiu mais baixa do que eu queria. — Que estou cansada de fingir que você não mexe comigo? Que eu sonhei com aquele maldito beijo durante todas essas noites?
Os olhos dele faiscaram, e seu maxilar travou.
— Rafaela…
— Não. — O interrompi. — Se você sente o mesmo, se gosta de mim como eu gosto de você, então tenha coragem de dizer isso ao Noah.
Ele desviou o olhar, apertando os punhos ao lado do corpo.
— Você sabe que Noah e Lorenzo nunca aceitariam.
Soltei uma risada amarga, cruzando os braços.
— E você ao menos tentou?
O silêncio dele me deu a resposta.
— Você se acovardou antes mesmo de tentar, Matheu. — Sussurrei, sentindo meu peito se apertar. — Se ao menos tentasse, se lutasse por isso, por nós...
Ele passou as mãos pelos cabelos, irritado, como se estivesse brigando consigo mesmo.
— Você não entende. Minha lealdade aos Mansur vem antes de tudo.
Antes de tudo.
Inclinei a cabeça, sentindo um peso insuportável tomar conta de mim.
— E eu? — Minha voz saiu baixa, quase um sussurro. — Onde eu fico nisso?
Ele me olhou, e por um segundo, vi tudo o que ele não dizia.
E então, como sempre, ele se fechou.
Eu respirei fundo e desviei o olhar.
— Não vou te esperar para sempre, Matheu. — Afirmei, mesmo sabendo que, no fundo, eu esperaria.
Mesmo sabendo que ele nunca viria.
Virei-me e saí, deixando para trás um homem dividido entre a fidelidade cega e o sentimento que o consumia.
A viagem de volta para casa foi silenciosa. O carro deslizou pelas ruas escuras, apenas o som do motor preenchendo o vazio entre mim e Matheu. Ele manteve o olhar fixo na estrada, a expressão fechada, como sempre.
Eu, por outro lado, lutava contra o peso em meu peito.
Quando chegamos, desci sem dizer nada e caminhei em direção à escada. Mas antes que eu pudesse subir, meu pai surgiu no corredor.
Lorenzo Mansur, o homem que muitos temiam, me olhou com ternura. Seu olhar escuro analisou meu rosto e, sem precisar de palavras, ele sabia.
— Minha princesinha está bem? — Sua voz era suave, cheia de carinho.
Foi o suficiente para quebrar minha resistência.
Sem hesitar, avancei para ele, me encolhendo em seu abraço forte. Fechei os olhos com força, tentando impedir as lágrimas, mas falhei. A abertura quente de seus braços me envolve, e solucei baixinho contra seu peito.
Ele passou a mão pelos meus cabelos, seu toque protetor e seguro.
— Está tudo bem, minha filha. – Murmurou. — Eu faria qualquer coisa para você ser feliz.
Me afastei um pouco, negando com a cabeça enquanto limpava as lágrimas teimosas.
— Isso ninguém pode fazer, papai.
Meu pai franziu a testa, visivelmente preocupado, mas não insistiu.
Peguei sua mão e beijei com carinho, sentindo o conforto que só ele me conseguiu dar. Depois, sem mais uma palavra, subi as escadas, deixando para trás um pai que daria o mundo por mim — mas que, dessa vez, não poderia fazer nada para restaurar meu coração partido.
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Atualizado até capítulo 43
Comments
Renata
assim não dá me Mateus
2025-03-06
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