VENDIDO COMO MERCADORIA

A noite anterior foi o ponto de ruptura.

Nik estava em seu quarto, o corpo ainda tenso depois de mais uma das visitas noturnas de Loki. Mas algo dentro dele finalmente estourou. Talvez fosse a exaustão. Talvez fosse o ódio acumulado. Ou talvez fosse só o fato de que, pela primeira vez, Nik sabia que não tinha mais nada a perder.

Loki entrou como sempre — sem bater, sem pedir permissão, como se aquele quarto fosse dele.

— Pronto para mais uma lição, príncipe? — Loki murmurou em português, já fechando a porta.

Mas antes que ele pudesse avançar, Nik reagiu.

Com a mão aberta, ele deu um tapa firme no rosto de Loki. O som ecoou pelo quarto silencioso, cortando o ar como uma lâmina.

Foi rápido.

Foi instintivo.

Mas foi libertador.

Loki virou o rosto com o impacto, a bochecha ficando vermelha instantaneamente. Por um segundo, o silêncio pairou entre eles.

E então, Loki riu.

Baixo, quase rouco, aquele riso que vinha direto do fundo de sua alma doentia.

— Finalmente… você me diverte de novo. — Loki passou a língua pelo canto da boca, como se saboreasse o momento. — Mas se prepara, Nik. Porque cada ação tem suas consequências.

Nik não recuou. Pela primeira vez, não se encolheu.

— Eu não tenho mais medo de você. — Nik disse, a voz trêmula, mas firme.

Loki deu um passo para trás, o sorriso nunca deixando seus lábios.

— A gente vai ver.

Ele saiu do quarto, deixando Nik sozinho.

Mas Nik não sabia que o pior ainda estava por vir.

Na manhã seguinte, Nik foi chamado ao escritório do pai.

Victor Laurent estava sentado atrás da imensa mesa de mogno, uma xícara de café ao lado, e aquele olhar frio e impaciente no rosto. Ele não pediu para Nik sentar.

— Vou direto ao ponto. — Victor disse, cruzando os dedos sobre a mesa. — Loki conversou comigo hoje cedo. Pediu sua mão em casamento.

Nik congelou.

O chão pareceu sumir debaixo dele.

— O quê?

— E eu aceitei. — Victor continuou como se fosse uma simples transação comercial.

Nik sentiu o estômago revirar.

— Você… você me vendeu?

Victor soltou um suspiro de impaciência.

— É um ótimo acordo. A fusão entre nossas famílias será sólida, e o patrimônio da Laurent Enterprises vai dobrar. Você deveria se sentir honrado.

— Honrado?! — Nik deu um passo à frente, os olhos brilhando de raiva. — Você me jogou nos braços de um psicopata e tá agindo como se eu fosse um pedaço de carne!

Victor se levantou com força, a cadeira arrastando-se para trás com um rangido alto. Antes que Nik pudesse reagir, a mão de Victor estalou contra o seu rosto com um tapa tão forte que o fez cambalear para trás.

— Dobre a língua quando falar comigo! — Victor gritou, o rosto vermelho de fúria. — Você nunca foi meu filho! Você é um fardo, uma vergonha. A única coisa útil que você fez foi nascer com o sobrenome certo.

Nik segurou a bochecha ardendo, os olhos marejados de raiva e dor.

— Eu nunca signifiquei nada pra você, né? — A voz de Nik saiu fraca, mas carregada de desprezo. — Nunca fui mais que uma moeda de troca.

Victor apontou o dedo diretamente no rosto de Nik.

— A partir de hoje, você não é mais da família Laurent. Sua família agora é o Loki. Ele é seu marido, seu dono, seu futuro. Você vai obedecer a ele em tudo — e vai sorrir enquanto faz isso.

Nik sentiu o peito apertar, o ar faltando. Por um segundo, ele sentiu como se estivesse de volta àquela mesa cirúrgica no porão de Loki.

— Amanhã cedo vocês vão se mudar. — Victor disse, voltando à sua postura fria e distante. — Loki já preparou a casa nova de vocês. Esteja pronto.

Nik ficou parado no meio do escritório, as mãos tremendo ao lado do corpo, os olhos fixos no pai — aquele homem que deveria protegê-lo, mas que o vendia sem hesitação.

E o pior?

Loki venceu.

Nik virou-se e saiu do escritório sem dizer mais nada.

Cada passo pelos corredores da mansão parecia o som de uma corrente sendo arrastada pelo mármore.

A prisão só havia mudado de endereço.

E amanhã, ele seria oficialmente prisioneiro de novo.

Mas dessa vez, algo era diferente.

Dessa vez, Nik ia levar seu ódio com ele.

E se Loki achava que estava no controle…

Ele estava prestes a aprender que brinquedos quebrados ainda podem cortar.

A casa era enorme.

Moderna, com paredes de concreto aparente, janelas de vidro do chão ao teto e uma decoração minimalista — exatamente o tipo de casa que uma família bilionária compraria para um herdeiro perfeito e seu novo marido.

Mas para Nik, a casa era só uma nova versão do inferno.

A porta se fechou atrás dele assim que cruzaram a entrada. O motorista foi embora sem dizer uma palavra, e Nik ficou parado no meio do imenso hall, o coração acelerado, sentindo o ar frio bater em sua pele.

Loki entrou logo atrás, ajustando as abotoaduras de seu terno de grife, como se aquele fosse o dia mais comum do mundo. Ele largou as malas no canto, suspirou e sorriu.

— Bem-vindo ao seu novo lar, príncipe.

Nik não respondeu. Seus olhos vasculhavam a casa — cada canto, cada saída possível, cada espaço onde pudesse se esconder se fosse necessário.

Porque ele sabia.

Ser "casado" com Loki significava ser propriedade.

Loki trancou a porta. A chave girando na fechadura soou como uma sentença.

— Está tão quieto… Achei que você fosse me receber como um bom marido. — A voz de Loki era baixa, quase divertida.

Nik deu um passo para trás, sem perceber.

Loki apenas observou.

— Sabe… eu gosto de casa nova. — Loki disse, caminhando lentamente pela sala, os sapatos ecoando contra o piso polido. — Mas sabe o que falta?

Ele parou em frente à lareira da sala principal. Sobre a parede ao lado, um espanta-brasa de ferro repousava pendurado — uma peça rústica e pesada, usada para mexer as brasas.

Loki o pegou.

Com um giro de pulso, Loki bateu o ferro contra a lareira, o som metálico ecoando pela casa toda. Nik deu um pulo, o coração quase saindo pela boca.

— Falta vida! — Loki gritou, batendo o ferro contra a mesa de centro de vidro, que trincou com o impacto.

Nik virou-se e correu.

Seu coração martelava no peito enquanto ele subia as escadas o mais rápido que conseguia, mesmo com a perna ainda fraca. Ele tropeçou ao chegar no andar de cima, mas não parou.

— Corre, corre, meu pequeno príncipe! — Loki gritou lá de baixo, a voz ecoando com uma mistura de risada e loucura.

Nik entrou no primeiro quarto que encontrou, fechou a porta e procurou desesperadamente um lugar para se esconder. O guarda-roupa no canto parecia sua única opção. Ele abriu a porta e, no fundo, atrás das roupas de grife ainda com etiquetas, havia um espaço estreito.

Ele entrou.

Se encolheu, tentando respirar o mais baixo possível, o corpo inteiro tremendo. Ele puxou as roupas para a frente, cobrindo-se com os casacos e ternos, até que ficou invisível no fundo escuro do guarda-roupa.

A porta do quarto se abriu com um estrondo.

— Niiik… — A voz de Loki era cantada, como uma música macabra. — Cadê você, meu docinho de lua de mel?

O som do espanta-brasa arrastando-se contra o chão de madeira do quarto fez Nik prender a respiração. Ele mordeu o próprio punho para não fazer nenhum barulho.

— Ah, meu amor, já começamos com joguinhos? — Loki bateu o ferro contra a parede, depois contra a cabeceira da cama.

Nik conseguia ver, pelas frestas entre os casacos, as pernas de Loki passando pelo quarto.

— Eu adoro quando você me dá motivos pra procurar.

Loki abriu a porta do banheiro. Depois olhou embaixo da cama.

— Você sempre foi bom em se esconder. Mas eu sempre fui melhor em encontrar.

Nik fechou os olhos com força, o corpo pressionado contra a parede fria no fundo do guarda-roupa. Cada músculo tremia, cada batida do coração parecia ensurdecedora.

Loki parou diante do guarda-roupa.

Nik viu a sombra dos pés dele, imóveis, diante da porta de madeira.

O tempo parou.

— Hm… talvez mais tarde. — Loki disse, afastando-se. — Vou deixar você brincar um pouco mais.

O som dos passos de Loki voltando pelo corredor foi a única coisa que Nik conseguiu ouvir.

Ele ficou ali, no escuro, o corpo todo suando frio, os dentes cerrados para não chorar.

Mas era só o primeiro dia.

E Nik sabia…

Aquela casa era dele e de Loki.

E não havia para onde fugir.

As horas passaram lentamente, o som de passos ecoando pelos corredores da nova casa. O espanta-brasa arranhava o chão de madeira a cada movimento de Loki, como se fosse uma extensão de sua própria mão.

Ele procurou em cada cômodo, cada armário, cada espaço pequeno onde Nik pudesse se enfiar.

Mas quando a noite já havia tomado conta da casa, Loki finalmente o encontrou.

Encolhido no fundo do guarda-roupa, entre casacos de grife e sombras densas, Nik dormia.

Seu corpo magro e cansado estava torto, dobrado de forma desconfortável, como se o próprio sono tivesse sido uma fuga involuntária da realidade.

Loki ficou parado por alguns segundos, observando-o.

Havia algo estranho naquela visão — a presa adormecida, vulnerável, entregue sem resistência.

Por um instante, não havia o desafio, nem a provocação nos olhos de Nik. Só respirações lentas e o corpo frágil.

Loki se ajoelhou diante do guarda-roupa, afastou as roupas com cuidado e deslizou os braços por baixo de Nik. Ele o ergueu com facilidade, como se Nik não pesasse nada.

— Você sempre volta pra mim, príncipe. — Murmurou baixinho.

Nik se remexeu um pouco nos braços de Loki, mas não acordou.

Com passos lentos e silenciosos, Loki o levou até o quarto principal. As janelas do cômodo eram enormes, o luar invadia o espaço, iluminando a cama king-size com lençóis de linho impecáveis.

Loki deitou Nik sobre a cama, ajeitando-o com um cuidado que beirava o terno. Seus dedos passaram brevemente pelo rosto machucado de Nik, seguindo a linha da mandíbula até a clavícula.

Era uma mistura doentia de posse e afeto torto — como alguém que cuida daquilo que destruiu com as próprias mãos.

Loki suspirou, tirou a própria camisa e deitou-se ao lado de Nik. Ele virou-se de lado, observando o rosto do garoto por longos minutos, cada respiração suave ecoando no silêncio absoluto da casa.

Seu dedo deslizou levemente pelo braço de Nik, sentindo os ossos sob a pele fina.

— Você é meu. — Sussurrou. — Com ou sem casamento.

Loki fechou os olhos, o corpo relaxando, como se, por um breve momento, ter Nik ali, dormindo ao seu lado, fosse o suficiente.

Mas Nik…

Mesmo dormindo, seu corpo sabia.

Mesmo inconsciente, sua mente estava presa entre o terror e o cansaço.

Porque acordar ao lado de Loki nunca significava segurança.

A escuridão do quarto era quase absoluta, quebrada apenas pelo brilho suave da lua atravessando a cortina semiaberta. O silêncio era tão profundo que Nik conseguia ouvir o próprio coração batendo dentro de seus ouvidos.

Foi esse som — o martelar irregular do próprio medo — que o despertou.

Seus olhos abriram lentamente, e por um breve segundo, Nik não sabia onde estava. O teto era diferente. A cama era macia demais. O cheiro não era o da sua antiga casa.

Mas então ele sentiu.

Um braço forte ao redor de sua cintura.

O toque quente e firme o segurava contra um corpo maior, o peito nu de Loki pressionado contra suas costas. A respiração de Loki era lenta, tranquila, roçando a nuca de Nik a cada expiração.

Nik congelou.

Seu corpo inteiro ficou rígido, os músculos tensos como cordas prestes a se arrebentar.

Loki estava deitado ao seu lado. Semi nu. Abraçando-o como se fossem amantes há anos.

Nik sentiu um arrepio gelado subir por sua espinha. Ele tentou deslizar o corpo para longe, mas o braço de Loki apertou, trazendo-o de volta.

— Shhh… — A voz rouca de Loki cortou o silêncio, baixa e preguiçosa, como se ele estivesse apenas meio acordado. — Tá tarde… dorme, príncipe.

Nik sentiu o queixo de Loki encostar levemente em seu ombro, o calor da pele dele contrastando com o frio da noite.

Seu coração batia tão rápido que doía.

Medo.

Esse era o instinto natural. Correr. Fugir. Gritar.

Mas algo pior estava enterrado bem lá no fundo.

Um sentimento que Nik não queria admitir nem para si mesmo.

Segurança.

A força daquele braço o segurando. A respiração constante contra seu pescoço. O calor de outro corpo ao seu lado.

Era doentio.

Era errado.

Mas uma parte distorcida dele… sentia-se protegido.

Protegido pelo mesmo homem que o quebrou.

Protegido pelo mesmo monstro que o torturou.

Ele fechou os olhos por um momento, a mente uma bagunça caótica de sensações contraditórias.

Por que ele me faz sentir assim?

Por que a presença de Loki, mesmo com todo o terror e a dor, trazia também essa sensação de ser… cuidado?

Era como um animal selvagem sendo mantido numa gaiola dourada.

Cativo, apavorado — mas alimentado e aquecido.

Nik respirou fundo, tentando acalmar o próprio coração, mas a mão de Loki deslizou lentamente por sua barriga, um toque quase carinhoso, como se Loki fosse capaz de ler seus pensamentos e estivesse reforçando:

Você é meu.

Nik sentiu o estômago se revirar.

Odeio ele. Odeio ele. Odeio ele.

Mas, mesmo assim, não se moveu.

Permaneceu deitado, preso nos braços de Loki.

Preso entre o medo e a segurança.

E, pela primeira vez, ele se perguntou:

Quem eu sou, se tudo o que me resta é essa confusão?

Ele fechou os olhos, fingindo dormir.

Mas dentro dele, a batalha era brutal.

E Loki?

Loki sabia.

Loki sempre soube.

Porque o maior truque de Loki não era só machucar Nik.

Era fazê-lo questionar se queria mesmo fugir.

CONTINUA...

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Comments

Mikaela Agostinho dos Santos

Mikaela Agostinho dos Santos

amei essa fanfic,por favor,continue postando capítulos,desejo uma boa noite a vc,bjs.😘😘😘😘

2025-03-08

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