Sofia narrando
Meu peito ainda sobe e desce rápido de raiva. Minhas mãos tremem um pouco, mas eu não deixo transparecer. Lobo me olha como se quisesse me quebrar no meio, mas eu sustento o olhar. Não vou abaixar a cabeça pra ele, nem pra ninguém.
Marcela se coloca na minha frente, protegendo como sempre. Ela tá furiosa.
-- Já chega! Ela não vai mais trabalhar em canto nenhum! Se eu soubesse que era pra ser assim, eu nunca teria convidado a Sofia pra vir pra cá.
Eu respiro fundo. Sei que ela tá tentando me defender, mas não quero ser um peso pra ninguém.
Lobo dá um passo à frente, e a tensão entre eles cresce.
-- Você tá esquecendo de quem manda aqui, Marcela? -- a voz dele sai firme, controlada.
-- E você tá esquecendo que ela não é uma das suas funcionárias, nem uma das mulheres que você usa e descarta.
A troca de olhares entre os dois é intensa, mas eu fico em silêncio, observando. Não quero que Marcela brigue por mim.
Lobo passa a língua nos dentes, como se estivesse segurando a paciência por um fio. Ele me encara mais uma vez antes de virar as costas e subir as escadas.
Solto o ar que nem percebi que tava prendendo.
-- Você tá bem? -- Marcela pergunta, segurando meus braços.
-- Tô... -- minto.
Na verdade, tô uma bagunça. O tapa que dei nele não me arrependo, mas o jeito que ele me olhou depois... não sei explicar. Era ódio, mas tinha outra coisa ali. Algo que me fez sentir um frio na barriga.
E isso me incomoda mais do que eu gostaria.
Marcela me puxa pro sofá e segura minhas mãos.
— Sofia, você não precisa ficar aqui. Se quiser, eu te ajudo a encontrar outro lugar.
Eu solto uma risada sem humor e balanço a cabeça.
— Pra onde eu vou, Marcela? Eu não tenho ninguém. Minha vó era tudo que eu tinha.
Ela aperta minha mão, os olhos cheios de preocupação.
— Mas você não precisa passar por isso. O Lobo é...
— O Lobo é um babaca — corto. — Mas eu sei me virar. Não vou abaixar a cabeça pra ele.
Marcela suspira, parece que quer dizer mais alguma coisa, mas desiste.
— Você é teimosa, hein?
— Sempre fui.
Ficamos em silêncio por um tempo, até que ela levanta.
— Vou preparar algo pra gente comer, você não comeu nada o dia todo.
Ela sai pra cozinha, me deixando sozinha na sala.
Minha cabeça ainda tá a mil. Eu não devia ter dado aquele tapa no Lobo, mas foi no impulso. Ele me tirou do sério, falando daquele jeito arrogante. Mas o que me incomoda mais é que, por um segundo, depois do tapa, eu vi algo diferente no olhar dele.
Ódio? Com certeza. Mas também uma faísca de algo que eu não sei explicar.
Ajeito meu corpo no sofá e respiro fundo. Eu preciso ser forte. Aqui não tem espaço pra fraqueza, e eu não vou me permitir ser tratada como qualquer uma.
Se ele acha que pode mandar em mim, vai aprender que eu não sou fácil de dobrar.
Terminamos o jantar e ficamos conversando, o clima leve, descontraído. Marcela, como sempre, cheia de animação.
— Hoje tem pagode, a gente vai! — Ela diz rindo, empolgada.
Bebo um pouco da minha água e balanço a cabeça.
— Não sei se quero ir...
Marcela me olha indignada, cruzando os braços.
— Você vai sim! E eu mesma vou te arrumar. Quem sabe você não encontra um boy bem gostoso e lindo? — Ela solta, rindo, bem na hora que ele desce as escadas.
Meu corpo enrijece na mesma hora. Ele com certeza escutou, porque balançou a cabeça em negação e seguiu direto para a geladeira, pegando um suco sem dizer nada.
Engulo seco e desvio o olhar, me mexendo na cadeira.
— Vou tomar meu banho. — Digo, tentando ignorar a presença dele.
Marcela apenas concorda com um aceno, mas eu sei que ela percebeu a tensão no ar. Não olho para ele, mas sinto seus olhos cravados em mim enquanto saio da cozinha.
Subo as escadas e entro no banheiro, soltando o ar que nem percebi que estava segurando. Meu coração bate acelerado, e eu nem sei dizer se é raiva, nervoso ou aquela sensação estranha que ele sempre causa em mim.
Ligo o chuveiro, deixando a água quente cair sobre meu corpo, tentando lavar qualquer pensamento que insiste em ficar na minha mente.
Respiro fundo e termino o banho. Me seco devagar e coloco um short jeans e uma blusinha básica. Sei que Marcela vai querer mudar isso, mas pelo menos eu tentei.
Saio do banheiro, como previsto, ela já tá me esperando na porta com um olhar afiado.
— Tu não tem um vestido não? Ou uma roupa mais chamativa? — ela pergunta, me puxando pro quarto dela.
— Marcela, eu só vou porque você insistiu. Não quero chamar atenção.
— Mas vai! Pelo menos um pouquinho.
Ela me faz sentar na cama e começa a passar um pouco de maquiagem no meu rosto. Nada muito forte, só um toque pra realçar. Depois, pega uma blusa um pouco mais justa e me obriga a trocar.
— Agora sim! Pronta pra arrasar no pagode.
Reviro os olhos, mas dou um sorriso de canto. Ela tem esse jeito animado que, por mais que me irrite às vezes, me faz bem.
Descemos juntas e, assim que entro na sala, sinto aquele mesmo olhar pesado sobre mim. Lobo tá no sofá, segurando um copo, me encarando sem a menor cerimônia.
— Que foi? — solto de uma vez, cruzando os braços.
Ele dá um gole na bebida e encosta o copo na perna.
— nada -- ele diz com a voz grossa
Marcela ri e me puxa antes que eu tenha a chance de responder.
— Bora antes que ele resolva colocar um segurança atrás da gente.
Saímos de casa e seguimos pro pagode. Hoje a noite promete.
O pagode tá animado, a batida do pandeiro misturada com a conversa alta das pessoas dá um clima bom pro lugar. Eu, Marcela e Bárbara estamos sentadas, rindo e conversando, enquanto bebemos algo leve. Não sou muito de sair assim, mas admito que o clima descontraído até que tá me fazendo bem.
LK chega, trazendo com ele um parceiro, e logo depois o tal do Rato aparece também. Ele fica me olhando de um jeito estranho, e isso me incomoda. Tento ignorar, mas meu corpo fica tenso sempre que sinto o olhar dele em mim.
— Relaxa, amiga — Marcela diz, percebendo meu desconforto.
Forço um sorriso e concordo com a cabeça. Tô tentando aproveitar, mas parece que as coisas nunca podem ser simples.
No meio da conversa, sinto um movimento ao meu lado. Quando olho, é ele. Lobo chega sem aviso e simplesmente senta do meu lado, como se fosse dono da mesa.
— Chegou na boa hora — LK diz, erguendo o copo pra ele.
Lobo apenas concorda com a cabeça, sem muito interesse.
— Tão bebendo o quê?
— Coisa fraca, duvido que vá te agradar — LK responde rindo.
Lobo faz um sinal pro garçom e pede algo mais forte. O clima muda com a presença dele. Antes tava tudo leve, agora parece que todo mundo tá mais alerta. Ele tem esse efeito, né?
Finjo que não ligo, mas meu corpo inteiro sente a proximidade dele. O perfume amadeirado dele chega até mim, e isso me irrita. Não quero sentir nada, ainda mais por alguém como ele.
— Tá achando ruim? — ele solta de repente, me fazendo encará-lo.
— O quê?
— Tá me olhando torto.
Cruzo os braços e inclino a cabeça.
— E se tiver?
Ele solta um riso fraco, balançando a cabeça.
— Melhor parar.
— E se eu não quiser? — provoco.
Ele me encara firme, e por um momento sinto que tô brincando com fogo. Mas não abaixo a cabeça. Se tem uma coisa que aprendi, é que ninguém me manda abaixar a cabeça, nem mesmo ele.
Sofia narrando
Me levanto e caminho até o banheiro, sentindo um olhar pesado em mim. Sei que é ele. Desde que descemos para o pagode, sinto sua presença me cercando, mesmo sem trocar uma palavra. Lobo está sentado à mesa, bebendo e observando tudo ao redor como se estivesse no controle absoluto da situação.
Ao voltar, Marcela me chama para dançar.
— Vem, mulher! Quero ver se ainda tem rebolado! — Ela ri, puxando minha mão.
Sorrio e deixo que ela me leve para o meio da pista. O som contagiante do pagode toma conta do ambiente, e logo nos movemos no ritmo da música. Me permito relaxar um pouco, esquecer o peso do olhar dele.
Mas quando olho para a mesa, ele ainda está lá. Me observando. Os olhos fixos em cada movimento meu, a expressão fechada, e o copo parado na mão.
— Lobo nunca foi assim com mulher — Marcela diz, se aproximando de mim enquanto dançamos.
continuação
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Atualizado até capítulo 27
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