Mais uma semana passou, o dia estava calmo, a mansão seguia seu ritmo normal, mas eu não me sentia parte dele. Minha folga me dava a oportunidade de sair, de respirar outros ares, mas, por algum motivo, eu não quis. Permaneci ali, como se uma força invisível me prendesse a este lugar.
Luigi passaria o dia com Matheu, e essa era minha deixa para aproveitar meu tempo livre, então segui até o jardim buscando um ar que me faltava nos pulmões.
Caminhei lentamente entre as árvores, sentindo a brisa tocar meu rosto, mas nada parecia aliviar o peso no meu peito. Me aproximei do lago, observando o reflexo das nuvens na água cristalina, e, sem conseguir evitar, deixei que meus pensamentos me dominassem.
O vazio tomou conta de mim. Eu sabia que estava me apegando. Desde o primeiro instante em que segurei Matheu em meus braços, algo dentro de mim se moldou para protegê-lo, para amá-lo de um jeito que ia além da minha função. E isso era um erro. Luigi deixou isso claro no dia do aniversário. Não era mãe dele. Não passava de uma babá em teste, se ele resolvesse não me contratar de fato? Como lidaria com essa dor? Eu não saberia o que fazer, o certo é manter uma distância segura mesmo, mesmo sem querer Luigi me ajudou a entender algo que talvez ainda não tinha percebido.
Ele apenas disse a verdade, e eu não o culpava por isso. A culpa era minha por esquecer as barreiras. Eu nunca deveria ter cruzado essa linha. Quando ele impôs aquele limite com tanta frieza, no momento, doeu, mas agora… agora eu entendia. Foi necessário. Aquilo me fez enxergar a realidade antes que fosse tarde demais.
Meus olhos arderam e, sem que eu pudesse evitar, as lágrimas começaram a escorrer. Eu precisava me lembrar de quem eu era aqui. Matheu era apenas uma criança e eu não o trataria diferente, mas esse distanciamento não era por ele… era por mim. Eu não poderia permitir que esse amor criasse raízes mais profundas dentro de mim, porque se um dia precisasse ir embora, sabia que isso me destruiria.
Apertei os olhos, tentando conter o choro, quando uma voz forte soou atrás de mim.
— Me perdoa por tudo que te disse.
Minha respiração vacilou. O peito apertou de surpresa. Fechei os punhos, sentindo meu coração disparar ao reconhecer aquela voz.
Luigi, ele estava ali.
— Senhor Luigi — falo limpando as lágrimas — Como posso ajudar?
Ele me olhou com algo nos olhos que parecia culpa, mas do quê?
— Me perdoa pelo que te falei, você é — ele parou por um instante como quem busca força — você é importante para nós, quando veio para cá a casa ganhou luz, mas percebi que ela se apagou, não posso permitir que minha dor apague a sua luz, não posso permitir que meu sofrimento afete outras pessoas, aquele dia foi o aniversário de um ano dele, mas foi o aniversário de um ano da morte dela — claro, eu não me atentei a isso, foi a lembrança que o tomou, como pude não perceber, não era comigo seu problema e sim a falta do saber lidar com a dor.
— Eu que sinto muito por trazer a tona essa dor, me desculpe por ultrapassar minhas barreiras, mas me atentei ao meu lugar e farei isso se for aprovada e continuar aqui. — falei ainda triste, porém mais aliviada.
— você está aprovada, não quero que se afaste, quero que a luz volte para nossa casa e para mim — falou e assenti incapaz de responder e me afastei buscando soltar a respiração que prendia sem nem ver.
Mais tarde, enquanto tentava encontrar algo para me ocupar, a governanta se aproximou, segurando um envelope. Seu olhar era neutro, mas seu gesto me surpreendeu.
— Aqui está o restante do seu salário — disse ela, estendendo-me o pagamento.
Segurei o envelope e sorri, um calor inesperado percorrendo meu peito. Aquele dinheiro significava muito mais do que eu gostaria de admitir.
— Obrigada. Posso pedir para um dos seguranças me levar até lá para entregar parte desse dinheiro?
Ela assentiu sem hesitar, e minha gratidão cresceu ainda mais. Antes de sair, acrescentei:
— Hoje quero fazer um bolo de chocolate… Aprendi uma receita nova.
A governanta me observou por um instante e, para minha surpresa, um sorriso sutil cruzou seu rosto.
— Boa ideia.
Fui para a cozinha e comecei a preparar o bolo. Misturar os ingredientes, sentir o cheiro do chocolate se espalhar pelo ar… aquilo trouxe uma sensação diferente, quase acolhedora. Como se, por um instante, eu fizesse parte de algo. Quando o bolo finalmente ficou pronto, o aroma de amor e família tomou conta da casa.
Mas não fiquei para ver quem o provaria. Peguei meu casaco e voltei ao jardim. Precisava de ar. Precisava lembrar a mim mesma do que era real.
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Atualizado até capítulo 62
Comments
Flavia Felix
A história é linda. As palavras são suaves, consigo entrar dentro da história. Parabéns autora.
2025-03-03
18
Maria Helena Macedo e Silva
só podemos dar o que temos...
se estamos machucados, machucamos.
se temos amor, amamos.
se estamos bem, felizes, satisfeitos, transmitimos para os outros e os queremos do mesmo jeito que estamos.
2025-04-06
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Vó Ném
Maravilhosamente linda e emocionante sua história!!
Parabéns autora você é perfeita!!!
2025-03-14
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