O aniversário do meu filho era também o dia do aniversário da morte da minha esposa, dois sentimentos opostos e que me consomem por dentro.
A aliança em meu dedo pesava como uma âncora, me puxando para um mar de lembranças que eu não queria reviver. Fuga premeditada. Inventei uma desculpa, uma viagem qualquer e passaria o dia fora, voltaria apenas quando tudo estivesse acabado.
Não teria que encarar ninguém. Era cruel. Eu sabia. Mas parecia ser a única forma de suportar, como dividir o que sinto sem ser fraco, um homem no meu posto não pode ser fraco.
Mas Matheu não merece isso, sozinho no seu primeiro ano de vida? Não posso fazer isso, então, voltei para casa.
Logo que cheguei não encontrei a rotina sendo seguida, encontrei uma pequena festa montada.
Parei na entrada, o ar preso nos pulmões. Um bolo, uma decoração singela, funcionários reunidos. No centro de tudo, Sofia usava um chapeuzinho de aniversário, um sorriso gentil nos lábios, enquanto Matheu, sentado em sua cadeirinha, olhava ao redor com curiosidade infantil. Meu estômago pesou. A cena parecia errada. Era para ser Bianca ali, o sentimento de felicidade com aquela cena parecia mais errado que a cena em si.
A dor me atravessou como uma lâmina afiada e assim que me viram ela se espantou:
— No meu escritório. Agora.
Ela hesitou, mas obedeceu. Seu corpo tenso, os passos incertos. Fechei a porta atrás dela e cruzei os braços, mantendo o olhar firme. Eu precisava manter distância. Precisava lembrá-la do lugar dela.
— Quem te deu autoridade para fazer isso? — Minha voz saiu mais fria do que eu pretendia, mas eu não podia ceder.
Sofia me olhou, os olhos piscando rápido, como se tentasse conter algo dentro de si.
— Eu só… Matheu não deveria passar seu aniversário sozinho — disse, tentando soar firme, mas sua voz falhou no final.
Minhas mãos se fecharam em punhos ao lado do corpo.
— Você não é mãe dele, Sofia. É apenas uma babá em teste. — Cuspi as palavras, sabendo que seriam um golpe. E foram, foram um golpe para ambos.
Ela ficou imóvel por um segundo. Depois assentiu e falei que ela podia ir.
Ela saiu triste, parecia desconcertada como se aceitasse o peso daquilo. Mas vi nos olhos dela a ferida aberta, a dor que tentei ignorar. Algo dentro de mim se retorceu.
Eu havia imposto uma muralha entre nós, e talvez fosse o certo. Bianca não podia ser esquecida. Eu não podia deixar que a presença de Sofia mudasse isso. Mas, ao vê-la sair do escritório com os ombros tensos e a expressão controlada, a culpa me atingiu em cheio.
Eu não sabia mais como viver com essa confusão, esse medo. Não sabia mais como seguir em frente sem destruir tudo ao meu redor.
Passei o dia inteiro trancado no escritório, ouvindo o distante som da casa seguindo seu ritmo sem mim. O canto abafado do 'Parabéns' ecoou pelo corredor, e por um instante, quase me levantei. Mas me obriguei a ficar. Minha presença ali destruiria tudo, como encararia o olhar dela e dos outros sobre mim?
Fechei os olhos e me vi naquela conversa com Bianca, meses antes de Matheu nascer. Ela falava com entusiasmo sobre como seria o primeiro aniversário do nosso filho:
“Vai ser lindo, Luigi. Quero algo grande, esplendoroso. Nada de economia, quero que todos conheçam o príncipe que geramos.”
Eu a observei naquela época, rindo do brilho nos olhos dela, enquanto dobrava as pequenas roupinhas que comprara.
“Você acha que ele vai gostar de bolo de chocolate ou baunilha?”, ela perguntou, e eu respondi que qualquer coisa estaria bom, desde que estivéssemos juntos.
Mas ela não estava. E nunca estaria.
Quando a casa mergulhou no silêncio da noite, finalmente saí do escritório. Subi as escadas, guiado por um impulso estranho. Abri a porta do quarto de Matheu e encontrei-o dormindo tranquilamente no berço, a respiração serena. O cheiro suave de Sofia ainda estava no travesseiro próximo à poltrona. Um vestígio da presença dela ali. Mas ela não estava.
Caminhei até a janela, e foi então que a vi no jardim. Sentada em um banco de pedra, abraçando as próprias pernas, perdida em pensamentos. De longe, dois seguranças observavam sua silhueta frágil sob a iluminação fraca. Algo dentro de mim gritou. Poderia ignorá-la, voltar para meu quarto e encerrar o dia, mas antes que percebesse, já estava descendo as escadas.
Aproximei-me devagar, e ela permaneceu imóvel, mantendo a distância exata que impus desde o início do dia. O peso da rejeição me atingiu de maneira inesperada, mas me repreendi imediatamente. Era isso que eu queria. Sempre foi.
— Por que deixou Matheu sozinho? — Minha voz saiu mais dura do que pretendia.
Sofia ergueu o rosto, piscando algumas vezes antes de responder. A tensão entre nós era palpável. Ela manteve a distância que eu mesmo impus, os olhos carregados de uma frieza que me atingiu mais do que deveria. Ela respirou fundo antes de responder, a voz controlada, mas afiada como uma lâmina.
— Matheu está dormindo, e até onde sei, uma babá cuida de uma criança acordada. Não há nada para mim lá agora e se percebe em minhas mãos está a babá eletrônica. — Ela cruzou os braços, sustentando meu olhar sem hesitação. — Estou apenas usufruindo do meu horário livre. Ou será que a ditadura da casa me impede disso também?
O veneno nas palavras dela se infiltrou em mim, e por um instante, senti algo que não queria admitir: um incômodo real, um peso no peito que não deveria estar ali. Reprimi qualquer reação e apenas endureci a expressão, desviando o olhar enquanto ela entrava em casa.
Antes de me afastar, lancei um olhar gélido para os soldados que a observavam de longe. Minha voz saiu baixa, mas carregada de ameaça.
— Se eu pegar qualquer um de vocês olhando para ela de novo, vão desejar nunca ter pisado nesta casa.
O silêncio que se seguiu foi pesado. Nenhum deles ousou responder, apenas desviaram o olhar imediatamente. Satisfeito, dei as costas e voltei para dentro, ignorando a sensação incômoda que me acompanhava.
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Atualizado até capítulo 62
Comments
Maria Helena Macedo e Silva
namorei um rapaz que tinha perdido o pai no dia que fazia aniversário, então em uma conversa que ouvi ele falando que iria terminar nosso relacionamento pois quando fosse meu aniversário ele sentiria dor não comemoraria comigo. 🤦♂️
Minha mãe faleceu no dia do aniversário do meu pai, como eu os levava para um almoço ou jantar para comemorarmos tanto os dias das mães, pais ou aniversário, então continuei celebrando assim, pois no aniversário do meu pai após a morte da minha mãe " falava que estava celebrando a chegada dele aqui e a chegada dela Ao Jardim de Deus." Lembrando que a minha mãe falava-nos que não perdemos nada Pra Deus, mas sim devolviamos as joias Que Deus nos emprestava" pois dos 9 filhos que Deus a concedeu , ela teve 1 aborto e enterrou 5 dois 8 filhos.
2025-04-06
5
Kellyla Nunes
O Luigi desconta as frustrações dele na babá achando que assim vai afastar o que ele está começando a sentir por ela, mas no fundo está arrependido de tê-la tratado tão mal. Esse livro me lembra a história "O VIÚVO IMPIEDOSO E A BABÁ," o protagonista Lorenzo também era viúvo e muito apaixonado pela esposa, até que se encantou com a babá do seu filho Théo, chorei horrores lendo esse livro.
2025-03-10
6
Vilma Alice
A dor ao perder a pessoa que se ama é difícil de superar,quando o amor é verdadeiro pois,a falta fica cada vez mais forte com o passar dos dias.Só o tempo para fazer a falta ir diminuindo até não doer mais.É o que sinto desde que meu marido faleceu,são quase 8 anos.
2025-03-03
3