0.10

Niel entrou no quarto junto com Gusta, sentindo-se exausto, tanto física quanto emocionalmente. Gusta olhou ao redor rapidamente, observando o ambiente simples, mas não comentou nada. Ele se virou para Niel, que ainda estava encharcado.

— Vá trocar de roupa — disse Gusta, com um tom mais suave do que de costume. — Você já comeu alguma coisa?

Niel balançou a cabeça negativamente, sem dizer nada.

— Certo. Me espera aqui. Vou pegar alguma coisa para nós comermos. Tem uma lojinha logo ali — respondeu Gusta, já caminhando em direção à porta como se estivesse completamente à vontade.

Niel apenas acenou com a cabeça, ainda absorvendo o momento. Gusta saiu pela porta, sem cerimônia, deixando Niel sozinho por alguns minutos.

Enquanto tirava as roupas molhadas e procurava algo seco para vestir, Niel se pegou pensando em Gusta. Mesmo com toda a confusão entre eles, com as brigas e provocações, ele percebeu que havia alguém que, de alguma forma, se preocupava com ele.

"Ele pode ser do jeito dele... mas está aqui," pensou Niel, olhando para a porta por onde Gusta havia saído. Pela primeira vez em muito tempo, sentiu que talvez não estivesse completamente sozinho.

Vestiu uma roupa seca e se sentou na cama, esperando. O silêncio do quarto parecia menos sufocante do que de costume. Mesmo que não soubesse exatamente o que Gusta representava em sua vida, naquele momento, apenas saber que alguém estava lá por ele era suficiente.

Depois de alguns minutos, a porta do quarto se abriu e Gusta entrou, carregando várias sacolas. Ele olhou para Niel, que estava sentado na cama, observando-o em silêncio.

— Não sei do que você gosta, então trouxe de tudo — disse Gusta, soltando as sacolas sobre a mesa. — Acho que aquele senhor da lojinha tem problema de vista. Ele demorou uma eternidade para passar os produtos.

Niel deixou escapar uma risada baixa, algo que nem percebeu que estava fazendo.

Gusta parou no meio do movimento, surpreso. Ele virou-se para Niel, os olhos brilhando com um sorriso no rosto.

— Você sorriu — comentou, com um tom de genuína alegria.

Ele colocou o restante das coisas sobre a mesa e foi até Niel, que continuava sentado. Gusta se aproximou devagar, olhando fixamente nos olhos de Niel, como se tentasse ler algo neles. O coração de Niel começou a acelerar, e ele sentiu o rosto ficar vermelho. Desviou o olhar, tentando esconder o nervosismo.

— Não fique envergonhado. Olhe para mim — pediu Gusta, com a voz baixa, mas firme.

— Eu... eu não consigo — murmurou Niel, a voz saindo fraca.

— Por que não? — insistiu Gusta, inclinando-se um pouco mais próximo.

Niel engoliu em seco antes de responder, quase sem fôlego. — Porque eu... eu me sinto estranho.

Gusta arqueou uma sobrancelha, curioso. — Estranho como?

— Estranho que me dá vontade de te beijar... e te querer por completo — confessou Niel, quase num sussurro, as palavras saindo antes que pudesse detê-las.

Gusta sorriu, aquele sorriso que era ao mesmo tempo charmoso e desarmante. — Acho que, nesse ponto, nós concordamos.

Ele se aproximou mais, inclinando-se para beijá-lo. Niel fechou os olhos, sentindo o coração bater tão forte que parecia que ia sair do peito. Gusta ficou parado por um momento, observando Niel de olhos fechados, e então começou a passar a mão suavemente pelas olheiras dele, depois deslizou os dedos pelos fios de cabelo.

Niel abriu os olhos, confuso e ansioso. — Por que você não me beijou?

Gusta deu um sorriso provocador. — Deixa para depois. Primeiro, vou tomar um banho. Já volto.

Antes que Niel pudesse protestar, Gusta foi em direção ao banheiro e fechou a porta atrás de si.

Niel ficou ali, sentado na cama, com um turbilhão de pensamentos e emoções passando por sua mente. Ele colocou as mãos sobre o rosto, tentando entender o que estava sentindo.

— O que é isso que está me deixando assim? — murmurou para si mesmo.

Olhou para baixo e notou seu corpo reagindo de uma maneira que o deixava ainda mais confuso e envergonhado. — Por que isso tá tão duro? O que ele fez comigo?

Então, como um flash, a lembrança do dia em que Gusta estava nu na sua casa invadiu sua mente. Niel ficou ainda mais vermelho, pressionando as mãos contra o rosto para tentar afastar o pensamento.

— Eu preciso de ajuda... — sussurrou para si mesmo, a confusão crescendo ainda mais dentro dele.

Assim que Gusta saiu do banheiro, com o cabelo ainda úmido e vestindo uma camiseta ajustada e shorts, Niel olhou diretamente para ele. O olhar era tão fixo que Gusta não conseguiu ignorar.

— O que foi? — perguntou Gusta, com um sorriso divertido. — Dessa vez não estou nu, tá?

Niel continuou o encarando, incapaz de desviar o olhar. Gusta se aproximou devagar, sentando-se ao lado dele na cama.

— O que foi que você viu que está te deixando assim? — perguntou Gusta, agora com o tom mais provocador.

Niel respirou fundo antes de responder, com a voz baixa. — Seu cabelo... depois do banho fica muito bonito. Você parece mais jovem, e... esses músculos... parecem que foram desenhados.

O sorriso de Gusta se alargou, e ele inclinou-se para dar um beijo suave em Niel. Quando se afastou, disse:

— Você gosta do meu cabelo e dos meus músculos, é? Tem mais alguma coisa que te deixa apaixonado por mim?

Sem esperar uma resposta, Gusta deitou-se por cima de Niel, encostando suas pernas nas dele. Ele o olhou diretamente nos olhos e, com um sorriso malicioso, perguntou:

— E isso aqui também? Você gosta?

Niel ficou vermelho na hora e tentou sair de debaixo dele, mas Gusta era rápido e segurou sua perna, puxando-o de volta para debaixo de si.

— Me solta, Gusta! — Niel exclamou, lutando contra o peso dele.

Gusta, no entanto, apenas sorriu e deitou-se completamente sobre Niel, segurando-o firmemente. Ele inclinou-se até o pescoço de Niel e começou a dar pequenos beijos próximos à sua orelha, fazendo Niel estremecer com o gesto inesperado.

De repente, um som alto invadiu o momento, interrompendo qualquer atmosfera que havia se formado.

— Que som é esse? — perguntou Gusta, parando para escutar novamente.

Quando o som ecoou pela segunda vez, ele riu. — É a sua barriga! Nossa, logo agora?

Gusta se afastou, finalmente deixando Niel livre, e sentou-se rindo na beira da cama. Niel, envergonhado, aproveitou a oportunidade e correu até as sacolas. Começou a abri-las rapidamente e a tirar as coisas, espalhando os alimentos sobre a mesa.

— Tá vendo? — disse Gusta, ainda rindo. — Não adianta lutar contra a fome, ela sempre vence.

Niel bufou, tentando ignorar o calor que ainda sentia no rosto, e concentrou-se em organizar a comida.

Niel colocou os alimentos sobre a mesa e começou a comer rapidamente, quase como se quisesse esquecer tudo o que tinha acontecido naquele dia. Gusta sentou-se do outro lado da mesa, observando-o em silêncio, até que, com um tom divertido, disse:

— Coma devagar, você está se sujando todo.

Antes que Niel pudesse reagir, Gusta estendeu a mão e limpou delicadamente o canto da boca dele, deixando Niel ainda mais sem jeito.

Enquanto Niel continuava comendo, Gusta o olhava fixamente, um misto de curiosidade e preocupação em seus olhos.

— Você não vai comer nada? — perguntou Niel, percebendo o silêncio dele.

— Eu não como comida industrial — respondeu Gusta com naturalidade.

Niel levantou as sobrancelhas. — Se não come, por que comprou tanto?

Gusta deu um leve sorriso e, olhando diretamente nos olhos de Niel, disse: — Tudo isso é pra você.

Niel parou de comer por um momento, surpreso. Ele olhou para Gusta com os olhos brilhando de gratidão e murmurou:

— Muito obrigado... pela comida.

Gusta riu suavemente. — Come primeiro, depois você agradece.

Alguns segundos se passaram em silêncio, mas então Gusta percebeu algo diferente.

— Por que você está chorando? — perguntou ele, inclinando-se levemente.

Niel hesitou, mas depois respondeu, com a voz baixa: — Depois que você brigou com Deymon... Lia, minha única amiga, veio me perguntar o que estava acontecendo. Ela ficou com muito medo... e eu acabei gritando com ela.

— E o que tem? É normal gritar de vez em quando — disse Gusta, tentando suavizar a culpa de Niel.

Niel balançou a cabeça. — Sim, mas... Lia perdeu a mãe assim que nasceu, e o pai dela sempre colocou a culpa disso nela. Ele bate nela, grita com ela... e eu sabia disso. Eu sabia o que ela está passando, mas mesmo assim gritei com ela.

Gusta ficou em silêncio por um momento antes de perguntar: — E você? Suas emoções?

Niel voltou a comer, tentando evitar a conversa. — Eu não ligo para mim. Já me acostumei com a dor.

Gusta ficou visivelmente irritado, a mandíbula cerrada. — Percebi isso quando cheguei aqui.

Niel levantou os olhos, encarando Gusta com curiosidade. — Por que você está com essa expressão? Não é sobre você.

— Não, não é sobre mim — admitiu Gusta, o tom mais intenso. — Mas é sobre você, e isso me incomoda.

— Por que isso te incomodaria? — perguntou Niel, com um tom quase desafiador.

Gusta olhou diretamente nos olhos dele e disse, sem hesitar: — Porque eu gosto de você.

Niel engoliu em seco, a frase pegando-o de surpresa. Ele desviou o olhar, o rosto levemente corado. — Por que você gostaria de mim? Eu não tenho nada de especial.

— Não sei. Eu só gosto — respondeu Gusta, com um pequeno sorriso.

— Não faz sentido gostar de mim — insistiu Niel, a voz baixa. — Já, já você para de gostar. Você vai ver que eu não tenho nada de especial.

Gusta inclinou-se levemente, o olhar sério. — E se eu não parar de gostar?

Niel encarou Gusta por um momento, seu coração disparado. Depois murmurou: — Aí, sim, eu vou me permitir gostar de você. E vou me entregar por inteiro a você.

Gusta sorriu de canto, satisfeito. — Então tá. Se prepara, porque eu vou te provar isso.

Niel, ainda tentando processar tudo, deixou escapar um pequeno sorriso. — Hum... estarei esperando.

Os dois ficaram em silêncio por um momento, mas havia algo diferente no ar. Era como se, finalmente, uma barreira tivesse sido quebrada entre eles.

CONTINUA...

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