Jessie...
O sol da manhã atravessava as cortinas da sala de estar, espalhando feixes dourados pelo piso brilhante. Fechei a porta atrás de mim, ainda sentindo o calor residual da corrida matinal e da aula de boxe. Meus tênis deixavam marcas discretas no tapete enquanto eu cruzava a sala em direção à cozinha.
Enquanto bebia água, senti o líquido gelado percorrer meu corpo aquecido. Apoiei-me no balcão e fechei os olhos por um instante, tentando organizar os pensamentos. Na parede oposta, um quadro pequeno dizia: “Tudo o que você busca está ao seu alcance.” Soltei uma risada baixa e sem humor. Não era tão simples assim.
Com 23 anos, eu havia conquistado o que muitos sonhavam, uma carreira sólida como escritora de Livros de Thriller psicológico. Era admirada, e eu estava caminhando para um sucesso, que não foi nada fácil. Cada vitória parecia uma batalha ganha, mas sempre à custa de algo maior. Eu ainda estava fugindo de sombras do passado que se recusaram a me deixar.
Olhei para o relógio. Ainda havia muito a fazer antes do lançamento do meu novo livro. Fui para meu quarto ouvindo apenas o eco dos meus próprios passos. A casa estava silenciosa, mas meus pensamentos, não. Eles sempre voltavam para o mesmo lugar: as lembranças de minha mãe. Seus sorrisos breves, o vazio que deixou, e a sensação de que eu havia perdido mais do que um lar quando ela se foi.
No chuveiro, a água quente escorria pela minha pele, levando embora o suor. Fechei os olhos e permiti que minha mente vagasse. Por um instante, deixei as muralhas caírem. Havia sonhos, claro, mas eles pareciam tão distantes quanto estrelas em uma noite nublada.
Ao sair, ainda enrolada na toalha, encarei meu reflexo no espelho. A mulher que me olhava de volta parecia estranha em comparação com a garota que sobrevivera ao caos. Mas, de alguma forma, ambas existiam ali, compartilhando as cicatrizes invisíveis que carregavam.
— Você tem um propósito. — sussurrei para mim mesma. Era uma frase que eu repetia sempre que precisava de força, mesmo quando a solidão e as sombras tentavam me derrubar.
Fui até o closet e escolhi meu visual para o dia. Um vestido preto justo, até os joelhos, com uma fenda discreta. Por cima, um top de couro que marcava minha cintura e me fazia sentir no controle. Adorava como essa combinação transformava olhares subestimados em reconhecimento. Para completar, calcei saltos vermelhos. Vermelho sempre foi minha cor para dias de vitória.
Depois de me maquiar e ajeitar os cabelos, peguei minha bolsa. Estava tudo pronto. Hoje, eu lançaria minha nova obra, A Mente Desvendada. O livro era mais do que palavras impressas; era um pedaço de mim. Às vezes, desejava ser a protagonista de minhas histórias – tão forte, tão destemida, tão livre das correntes que ainda me prendiam.
No corredor, o som dos meus saltos ecoava enquanto eu caminhava em direção ao elevador. As portas de metal refletiam minha imagem impecável, do jeito que eu queria ser vista. Ao descer para o estacionamento, avistei meu carro e entrei.
No volante, ajustei o cinto de segurança e liguei o motor. A viagem até o shopping não era frequente. O pensamento de ver meu livro nas prateleiras, sentir o apoio dos leitores e ouvir suas impressões fazia meu coração bater levemente.
Estacionei com cuidado ao chegar, saindo do carro com determinação. Cada toque dos meus saltos contra o chão afirmava silenciosamente quem eu era, alguém que sobreviveu ao impossível e se recusava a ser definido pelo passado. Hoje, eu era invencível. Pensei.
A mesa estava posicionada estrategicamente no centro da livraria, cercada por prateleiras repletas de exemplares de A Mente Desvendada. As capas brilhavam sob a luz quente dos holofotes, e a fila de leitores parecia interminável. Sentei-me e comecei a assinar os livros, mantendo um sorriso discreto, mas genuíno, no rosto.
Cada pessoa que se aproximava trazia consigo uma energia única. Alguns seguravam o livro com reverência, enquanto outros o mantinham apertado contra o peito, como se fosse um tesouro. Quando me olhavam nos olhos e compartilhavam suas impressões ou histórias pessoais, meu coração se aquecia de forma indescritível.
— Jessie, você não imagina o quanto seu livro mudou minha vida! — disse uma mulher de meia-idade, com os olhos marejados.
— Fico muito feliz em ouvir isso. Obrigada por compartilhar isso comigo. — respondi, assinando seu exemplar com uma dedicatória especial.
Alguns pediam fotos, outros compartilhavam suas partes favoritas, citando trechos inteiros de memória. Cada interação me deixava mais ciente do impacto que minhas palavras, escritas em noites solitárias e cheias de dúvida, haviam causado no mundo lá fora.
Após horas, com a pilha de livros quase esgotada, me despedi da última pessoa da fila e caminhei até a cafeteria no mesmo shopping. Ali aconteceria minha entrevista. Estava ansiosa, mas também curiosa para conhecer o entrevistador.
Assim que entrei, um homem alto e de cabelos levemente desalinhados levantou-se de uma das mesas. Ele vestia uma camisa azul-clara bem passada, e o sorriso que estampava o rosto era tão caloroso quanto as luzes da livraria.
— Olá, senhorita Jessie. Sou Spencer Wright. — disse ele, estendendo a mão para mim.
— É um prazer conhecê-lo! — respondi, apertando sua mão com firmeza.
— O prazer é todo meu! Confesso que estava ansioso para essa entrevista. Sou um grande admirador do seu trabalho. — Spencer parecia genuinamente entusiasmado, e seus olhos brilhavam de um jeito que me fez relaxar um pouco.
Uma equipe de gravação ajustava as câmeras e a iluminação ao fundo. Um dos assistentes trouxe duas xícaras de café e fatias de bolo de chocolate, colocando-as delicadamente sobre a mesa.
— Espero que você goste de café! — brincou Spencer, apontando para a xícara com um gesto simpático.
— Não vivo sem ele. — retruquei com um sorriso, sentando-me enquanto ajustava o microfone preso à minha roupa.
A conversa começou de forma simples, mas logo ganhou ritmo. Spencer tinha um jeito fácil de conduzir a entrevista, e suas perguntas mostravam que ele realmente havia lido meus livros.
— Em A Mente Desvendada, você explora os segredos mais sombrios da mente humana. De onde veio a inspiração para escrever algo tão profundo e, ao mesmo tempo, tão perturbador? — perguntou ele, inclinando-se levemente para frente, genuinamente interessado. Respirei fundo antes de responder, escolhendo minhas palavras com cuidado.
— A inspiração veio da vida real. Sempre fui fascinada por como as pessoas lidam com traumas, especialmente as coisas que tentam esconder de si mesmas. A mente humana é um labirinto. Escrever é minha forma de explorar esse labirinto sem me perder completamente.
— É fascinante. Você escreve com uma intensidade rara. Parece que suas palavras vêm de um lugar muito pessoal — disse Spencer e sorriu, satisfeito com a resposta.
A entrevista continuou por quase uma hora. Ele conseguiu me surpreender com algumas perguntas que desafiaram meu próprio entendimento sobre o que eu havia escrito. Era revigorante falar com alguém que realmente entendia o peso e a profundidade do meu trabalho. Quando terminamos, ele estendeu a mão mais uma vez.
— Jessie, foi uma honra. Você tem um talento incrível, e acredito que ainda vamos ouvir muito sobre você nos próximos anos.
— Obrigada, Spencer. Foi uma entrevista muito interessante, pela minha primeira entrevista.— eu disse, com um sorriso genuíno.
Despedimos, e ele entrou no elevador com sua equipe. Permaneci ali por alguns instantes, observando as portas se fecharem. Havia algo reconfortante naquela interação. Não era apenas sobre o sucesso ou o reconhecimento. Era sobre a conexão que minhas palavras criavam com as pessoas, até mesmo com alguém como Spencer.
Exausta, mas com o coração leve, saí da cafetaria. Pela primeira vez em muito tempo, senti que não estava apenas sobrevivendo. Será que estou realmente vivendo?
Olivia me encontrou no elevador. Andámos pelo estacionamento em direção ao meu carro. Olivia, sempre animada, tagarelava sobre a entrevista e as próximas etapas do meu contrato. Ela é minha agente na editora, a pessoa que escolhi para cuidar de tudo relacionado aos meus livros. Parecia uma boa ideia na época, mas, honestamente, estava começando a me arrepender. Olivia falava demais, sempre me ligava e insistia que éramos amigas. Mas eu não queria amigos, nunca quis. Estar sozinha era mais confortável.
— Você luta mesmo boxe? — perguntou ela, com um olhar curioso e uma sobrancelha arqueada. A pergunta pegou-me de surpresa. Eu havia mencionado na entrevista que fazia aulas de boxe, mais por impulso do que por estratégia.
— Você não precisa se preocupar com isso. Preciso me exercitar. — respondi, com um sorriso de canto.
—Pensei que você só ficasse em casa escrevendo. — disse ela, rindo de leve, como se a ideia de eu fazer algo além de trabalhar fosse quase cómica. Hesitou por um instante antes de perguntar.
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Atualizado até capítulo 44
Comments
Carla Santos
Mesmo com as dores ela precisa viver se sentir viva tem quer acontecer um avalanche na vida dela pra tentar aquecer o coração sofrido dela ela merece ser feliz
2024-12-15
1
Ester Sousa
Estou feliz que gostou, tenha uma ótima leitura!🥰
2024-12-11
0
Andréa Karlla Silva Farias
Pois não pense Olívia pq td penso é torto
2024-12-13
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