Quando a Chuva Cair

Quando a Chuva Cair

Até Onde a Felicidade Vai

A brisa da manhã adentrava o apartamento de Lucas pela janela entreaberta, balançando as cortinas brancas. Ele se levantou da cama lentamente, com o sol tocando seu rosto. Lá fora, a cidade acordava com o som distante dos carros e dos passarinhos que brincavam na varanda. Lucas observava aquela paisagem do alto, sentindo-se parte de algo maior, como se estivesse no auge de sua vida.

Ele não trocaria aquilo por nada. Aquele pequeno apartamento com paredes de tijolos aparentes, a mesa de café-da-manhã já posta — sempre com xícaras de porcelana que Marina insistia em usar — e o cheiro de café fresco, já pronto para servir, faziam o início de cada dia parecer uma promessa de algo novo. Ele sentia o cheiro do café antes mesmo de chegar à cozinha, e lá estava Marina, enrolada em seu roupão cinza, mexendo o açúcar no líquido escuro e quente.

— Bom dia, preguiçoso. — disse ela com um sorriso fácil, aquele que deixava os olhos dela quase fechados e mostrava a covinha do lado direito. Ela sempre fazia isso quando estava feliz. E Lucas sempre se derretia por aquela covinha.

— Bom dia... — ele respondeu, caminhando até ela e depositando um beijo suave em sua testa. Seus braços se entrelaçaram naturalmente ao redor dela, num abraço de um segundo que parecia durar uma eternidade. — Já ansiosa para hoje à noite?

Marina riu baixinho, de uma forma que Lucas sabia que era de puro nervosismo e alegria. — Só se eu estiver ansiosa todos os dias. A gente vai escolher o bolo hoje! — Ela disse, se afastando do abraço e erguendo as mãos para o alto como se fosse uma criança comemorando um presente de Natal.

— Se dependesse de você, já teríamos bolo no café da manhã todo dia até o casamento, né? — Ele provocou.

Ela fingiu pensar por um instante, colocando a mão no queixo e arqueando as sobrancelhas, antes de confirmar com um aceno exagerado de cabeça. — Absolutamente. Nada como começar o dia com uma fatia de bolo.

Aquele era o tipo de diálogo comum entre eles. Simples. Alegre. Lucas podia contar nos dedos os momentos de conflito, porque sempre haviam resolvido tudo rindo, com abraços e palavras doces. Marina era aquela pessoa que entrava numa sala e a preenchia de luz, e ele... ele era sortudo por tê-la ao seu lado.

Lucas tomou um gole do café e olhou ao redor. Na parede, fotos do casal em viagens, momentos espontâneos, como o dia em que foram a um parque aquático e ela o empurrou em um rio gelado. Havia uma foto antiga deles sentados num banquinho, Marina com um sorvete na mão, e Lucas roubando uma lambida. Era essa a vida que construíam juntos, cheia de momentos engraçados e planos.

— Falando nisso, já pensou nos sabores? — perguntou, enquanto ela cortava uma fatia de pão e passava manteiga distraidamente.

— Claro! Chocolate com brigadeiro, baunilha com morango... mas tem uma combinação de doce de leite que eu tô doida pra provar. Ah, e coco! Acho que coco seria ótimo para os convidados que não gostam de nada muito doce, sabe? — Marina falava com a paixão de alguém que planejava cada detalhe com cuidado. Ela era assim, tinha um olhar atento para todos os aspectos do casamento, e Lucas amava isso nela.

Enquanto ela falava sobre sabores e decorações, Lucas se perdeu por um instante na forma como os olhos dela brilhavam. Aqueles olhos castanhos profundos, que pareciam ter uma imensidão de sonhos e esperanças. Ele não conseguia deixar de pensar em como seria acordar todos os dias ao lado dela, compartilhar cada momento, rir, chorar, crescer juntos... O casamento, filhos, até envelhecerem juntos. A ideia o aquecia por dentro, como se um cobertor invisível o abraçasse.

Lucas piscou, voltando ao momento. — Vamos fazer desse casamento algo inesquecível. — Ele murmurou, com o coração cheio, enquanto terminava o café e ia até o quarto para se preparar para o trabalho.

A rotina dele era comum, mas confortável. Advogado de uma firma renomada, tinha uma boa carreira pela frente. Ele gostava da ideia de ser bem-sucedido, de ter estabilidade, mas nos últimos meses, todas as reuniões de trabalho e casos em que trabalhava pareciam ter uma importância menor do que sua vida ao lado de Marina. Ele fazia planos, pensava no apartamento que comprariam juntos, na viagem de lua de mel para as montanhas que Marina sempre mencionava, e em como o futuro parecia uma estrada ensolarada e sem obstáculos.

Ainda assim, havia momentos — pequenos e fáceis de ignorar — onde Lucas se sentia estranho. Talvez fosse o cansaço, talvez fossem as noites em que passava trabalhando até tarde, ou até mesmo o estresse do casamento, mas às vezes ele sentia uma dor sutil no estômago, como um peso que vinha do nada. Ele nunca falava sobre isso. Afinal, era só uma dor passageira, nada que não pudesse ser ignorado com uma boa xícara de café e uma conversa animada com Marina.

Naquela manhã, enquanto se arrumava para o trabalho, Lucas olhou para o espelho e sorriu. "Tudo vai dar certo," ele pensou, ajeitando a gravata. “Hoje vamos escolher o bolo.”

Ele fechou a porta do apartamento e entrou no elevador. A cidade estava desperta e viva lá fora, pronta para receber mais um dia. Enquanto descia, Lucas sentiu o peso da rotina e da felicidade que estava construindo. Ele tinha tudo o que sempre quis — um emprego que o satisfazia, uma mulher incrível que amava e o amava de volta, amigos que o apoiavam e uma vida cheia de sonhos.

Mas a vida é estranha. Pequenos detalhes, como uma dor discreta ou um pensamento incômodo, podem ser fáceis de ignorar. Lucas não sabia disso ainda, mas algo estava prestes a mudar, algo que viria como uma onda silenciosa que o puxaria para longe de todos esses planos e certezas.

Mas naquele momento, enquanto a porta do elevador se abria para mais um dia, ele estava feliz. E isso era tudo o que importava.

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Comments

Sandra Regina

Sandra Regina

Nossa que tristeza mais logo no começo com doença é dor misericórdia

2024-09-30

1

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