O Peso das Escolhas

O sol da tarde banhava a pequena praça de Queluzito, trazendo uma calma ilusória ao caos interno que tomava conta de Renan. Ele estava sentado em um banco sob uma árvore antiga, observando o movimento ao redor, mas seu foco estava distante. Desde o encontro com Júlia no festival, algo havia mudado. O controle que ele tanto prezava sobre sua vida, sobre suas emoções, começava a escapar de suas mãos.

A voz de Júlia ecoava em sua mente. A frieza com que ele a tratou não apenas a afastou, como ele esperava, mas também deixou uma marca nele mesmo. Renan nunca fora um homem de se deixar levar por sentimentos. Tudo em sua vida foi cuidadosamente planejado, desde seus negócios até seu retorno discreto à cidade. Mas reencontrar Júlia reacendeu antigas feridas, emoções que ele lutava para manter adormecidas.

Enquanto observava o vai e vem das pessoas na praça, sentiu seu celular vibrar. Uma mensagem de André, seu assistente fiel, trazia atualizações sobre a empresa. Renan suspirou, lendo rapidamente os detalhes sobre um possível acordo que estava em andamento. Mesmo distante, sua vida corporativa exigia atenção, e era um lembrete constante de que ele não poderia se esconder para sempre.

No entanto, havia algo mais importante que precisava ser resolvido antes de encarar o mundo dos negócios novamente: seu passado.

Ele sabia que não poderia continuar evitando Júlia, muito menos manter essa fachada de Lucas Ferreira por muito mais tempo. A cidade pequena começava a mostrar seus sinais de desgaste. As pessoas, naturalmente curiosas, estavam se aproximando demais. Não apenas Júlia, mas também Ana e os olhares cada vez mais curiosos de Isabela.

— Lucas? — uma voz feminina suave o tirou de seus pensamentos.

Ele olhou para cima e viu Ana, com um sorriso amistoso. O brilho de curiosidade em seus olhos era inegável. Ana era diferente. Havia algo nela que o fazia baixar a guarda, mesmo que involuntariamente. Talvez fosse a simplicidade com que ela o tratava, sem grandes expectativas, sem desconfianças.

— Ana, oi — respondeu Renan, esboçando um sorriso contido. — Como está?

Ela se sentou ao lado dele no banco, ainda com o sorriso amigável, mas seus olhos revelavam que tinha algo em mente.

— Estou bem... Mas você parece distante. Tudo certo?

Renan ponderou por um instante. Ele não era o tipo de pessoa que compartilhava suas preocupações, ainda mais com alguém que mal conhecia. Mas Ana havia se tornado uma presença frequente em sua vida nas últimas semanas, alguém com quem ele se sentia estranhamente à vontade.

— Só... pensando na vida — respondeu, vagamente. — Algumas coisas que eu deixei para trás estão voltando.

Ana assentiu, sem pressioná-lo a continuar. Ela respeitava seu espaço, algo que Renan apreciava profundamente. No entanto, a presença dela ali o fez perceber que ele estava cercado por uma rede de pessoas que, cedo ou tarde, poderiam descobrir a verdade sobre ele.

— Às vezes, o passado faz isso. Volta sem pedir licença — disse Ana, seu tom suave, mas cheio de compreensão.

Renan a observou por um momento, absorvendo suas palavras. Ele sabia que Ana não fazia ideia do peso do passado que ele carregava. Mas, de alguma forma, suas palavras pareciam atingir exatamente onde doía.

— Você está certa — respondeu ele, com um leve suspiro. — E não dá para continuar fugindo disso para sempre.

Ana olhou para ele com curiosidade, mas não perguntou mais nada. Havia uma quietude entre os dois, como se ambos estivessem confortáveis no silêncio que compartilhavam.

Mas enquanto Renan refletia sobre suas escolhas, Júlia estava longe de encontrar qualquer tranquilidade.

---

Do outro lado da cidade, Júlia caminhava pela trilha que levava à casa de seus pais, sua mente um turbilhão de perguntas sem respostas. O encontro com Renan, ou melhor, com Lucas, continuava a assombrá-la. Algo naquele homem a deixava inquieta. Não era apenas o comportamento frio, mas havia uma sensação incômoda de que ela o conhecia de alguma forma, como se o passado estivesse tentando se conectar ao presente de maneiras que ela não conseguia compreender.

"Quem é você de verdade?" A pergunta ecoava em sua mente enquanto ela seguia pelo caminho de terra, distraída com suas próprias dúvidas.

Quando chegou à casa, sua mãe estava no jardim, cuidando das flores como sempre fazia. Ao ver a filha se aproximar, sorriu calorosamente.

— Júlia, querida! Como você está?

— Estou bem, mãe — respondeu Júlia, forçando um sorriso que não alcançou seus olhos. — Só... pensando demais.

— Tem algo acontecendo, não tem? — perguntou a mãe, notando a inquietude na filha.

Júlia hesitou por um momento, antes de se sentar ao lado da mãe no banco de madeira que havia no jardim.

— Eu conheci alguém. Ele diz se chamar Lucas, mas... sinto que não é verdade. Algo nele me parece... familiar, mas ele é tão fechado. Não consigo entender.

A mãe de Júlia a observou com atenção, ouvindo cada palavra com paciência. Ela sempre foi uma mulher sábia, que raramente julgava as situações de imediato.

— Às vezes, o que sentimos nos diz mais do que o que ouvimos — disse ela suavemente. — Se você sente que há algo errado, talvez seja verdade. Mas você tem que estar preparada para o que essa verdade pode significar.

Júlia permaneceu em silêncio, refletindo sobre as palavras da mãe. O mistério que cercava Lucas a consumia, e ela sabia que, mais cedo ou mais tarde, teria que confrontá-lo novamente.

---

Enquanto isso, Renan, sentado na praça ao lado de Ana, sentia o peso das escolhas que estava prestes a fazer. A mentira que o sustentava por tanto tempo estava começando a desmoronar. E ele sabia que, eventualmente, precisaria enfrentar a verdade. Seja com Júlia, com Ana, ou com todos aqueles que ele tentava manter à distância.

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!