Tensão Sob as Luzes

O festival de Queluzito estava no auge. As luzes coloridas pendiam sobre as barracas e o som animado da música local enchia o ar com energia. Renan e Ana caminhavam lado a lado, imersos no clima festivo. Para Renan, os momentos ao lado de Ana proporcionavam uma sensação estranha de leveza, uma pausa necessária de seus pensamentos turbulentos.

— Eu sempre me pergunto o que há de especial em cidades pequenas assim — disse Ana, observando o movimento ao redor. — Parece que o tempo anda mais devagar.

Renan forçou um sorriso, mas por dentro, ele sabia que para ele, Queluzito era muito mais que isso. Enquanto Ana via o encanto de uma cidade pacata, Renan era constantemente assombrado pelas memórias e a dor associada a este lugar.

— Sim, é um tipo de paz diferente — respondeu ele, mantendo o tom leve, apesar da inquietação que começava a crescer em seu peito.

Enquanto eles caminhavam pelas barracas, Renan avistou uma figura familiar à distância. Seu corpo ficou tenso instantaneamente. Júlia estava próxima, circulando com alguns conhecidos. O coração dele disparou. Desde o encontro anterior, onde ele havia tratado Júlia com frieza, ele não parava de pensar no impacto que aquilo teve. Ela o rejeitara no passado, espalhara rumores que o machucaram profundamente, e agora, vê-la de novo trazia à tona tudo o que ele ainda tentava evitar.

Ana notou a mudança em seu comportamento, como sempre fazia.

— Está tudo bem? — perguntou ela suavemente, sem forçar uma resposta imediata.

Renan hesitou, olhando de relance para Ana. Ele não queria mentir, mas também não sabia como explicar o que estava prestes a acontecer. Ele sabia que a tensão entre ele e Júlia não havia desaparecido, e agora que ele estava investindo tempo com Ana, tudo parecia ainda mais complicado.

— Sim... só uma pessoa do passado — respondeu ele, a voz baixa, mas controlada.

Ana assentiu, sem pressionar por mais detalhes, respeitando os limites que ele colocava. Mas ela percebeu que havia algo mais naquela resposta, algo que Renan não estava pronto para compartilhar.

Antes que pudessem se afastar, Júlia os viu. Seus olhos se fixaram em Renan imediatamente, e ela começou a caminhar em sua direção. Renan sentiu o estômago revirar. O encontro era inevitável, e ele sabia que não podia evitar a conversa que viria. Ainda assim, o peso do passado tornou-se quase insuportável à medida que ela se aproximava.

Júlia parou diante deles, o olhar confuso, mas intrigado. Renan podia ver em seus olhos que ela ainda estava processando o tratamento frio que ele lhe dera no encontro anterior. Júlia, apesar de não reconhecer sua verdadeira identidade, claramente sentia que algo estava errado, algo fora do lugar.

— Oi... — começou Júlia, a voz hesitante, quase como se estivesse com medo de abrir a conversa novamente. Ela olhou para Renan primeiro, como se quisesse uma explicação que ele ainda não estava pronto para dar.

Ana, alheia à profundidade da conexão entre eles, sorriu educadamente e fez o que sempre fazia — tentou aliviar a tensão.

— Oi, tudo bem? — disse ela, sem perceber a tensão no ar. — Eu sou Ana. Estamos aproveitando o festival juntos.

Júlia assentiu, ainda com os olhos fixos em Renan, claramente tentando entender quem ele era, ou por que ele agia de maneira tão distante.

— Júlia — respondeu ela finalmente, apertando a mão de Ana brevemente, mas sua atenção logo voltou para Renan. — Nós já nos encontramos antes... na cidade.

Renan sabia que ela se referia ao encontro anterior, onde ele havia sido frio e distante. Ele queria manter a fachada, mas também sabia que a forma como havia tratado Júlia anteriormente a deixara desconfiada. Ela não sabia quem ele realmente era, mas sentia que havia algo a mais.

— Sim, nos vimos outro dia — disse Renan, com um tom controlado. Ele evitava olhar diretamente nos olhos de Júlia, mas sabia que isso só tornava as coisas mais óbvias.

O silêncio que se seguiu foi desconfortável, e Ana, perceptiva como sempre, notou que havia algo não resolvido ali.

— Vocês já se conheciam antes? — perguntou Ana, claramente tentando conectar os pontos.

Júlia soltou um leve riso, mas seu olhar permaneceu sério.

— Acho que conheci alguém... parecido com ele há muito tempo — disse ela, suas palavras carregadas de algo que Ana não poderia perceber, mas Renan sabia exatamente o que ela queria dizer.

Renan respirou fundo, sentindo que estava perdendo o controle da situação. Ele queria sair dali, evitar qualquer conversa mais profunda, mas sabia que a tensão entre ele e Júlia só estava aumentando. O passado estava cada vez mais perto de ser revelado, e Ana, sem saber, estava presa no meio desse turbilhão emocional.

— Bom... é sempre bom encontrar novas pessoas por aqui — disse Ana, ainda sorrindo, tentando dissipar o clima estranho.

Júlia forçou um sorriso de volta, mas Renan sabia que ela não estava satisfeita com as respostas que não estava recebendo.

— Sim, claro... — respondeu Júlia, olhando uma última vez para Renan antes de se despedir. — Aproveitem o festival.

Enquanto ela se afastava, Renan sentiu como se o ar ao seu redor tivesse ficado mais pesado. O encontro, embora breve, trouxera à tona mais do que ele estava preparado para lidar. Ana, por outro lado, parecia confusa, mas respeitosa quanto aos limites dele.

— Ela parecia um pouco... curiosa sobre você — comentou Ana, com um sorriso suave, mas claramente intrigada. — Você realmente não a conhecia antes?

Renan hesitou, sem saber como responder de forma que não complicasse mais as coisas.

— Não como ela pensa — respondeu ele finalmente, sabendo que suas palavras apenas levantariam mais dúvidas no futuro.

Ana assentiu, mais uma vez não pressionando por mais respostas, mas Renan sabia que aquela fachada não duraria para sempre. Júlia estava cada vez mais próxima de descobrir a verdade, e o tempo para manter sua identidade escondida estava se esgotando.

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