Um evento anual na cidade estava acontecendo naquela noite. A festividade era algo que fazia parte de sua infância, um reflexo da cultura acolhedora e comunitária de Queluzito, mas, por anos, ele evitou essa parte de sua vida. Hoje, no entanto, algo o puxava para o centro do evento — talvez fosse a curiosidade de ver como as coisas haviam mudado, ou, quem sabe, o desejo inconsciente de confrontar seus fantasmas.
O festival estava em pleno andamento quando ele chegou. As ruas estavam decoradas com bandeiras coloridas, e as barracas vendiam de tudo, desde comida até artesanato local. Famílias inteiras caminhavam por ali, e os sorrisos eram abundantes. Renan olhou ao redor, tentando manter a sensação de anonimato que ele tanto prezava.
Ele caminhou pela multidão com passos leves, observando as barracas de comida e evitando qualquer contato que pudesse gerar perguntas. Mesmo com seu nome falso, ele sabia que um encontro com alguém do seu passado era inevitável, especialmente em uma cidade pequena onde todos, de alguma forma, se conheciam.
Quando chegou ao coração da festa, onde a praça central se encontrava com o coreto antigo, Renan parou. De longe, ele avistou um grupo que o fez hesitar. Ali, perto de uma das barracas de bebidas, estavam seus irmãos e irmãs — Clara, Matheus, Davi e Helena. O grupo estava reunido, conversando de maneira descontraída, rindo de uma piada que só eles pareciam entender. O som das risadas chegou aos ouvidos de Renan, e uma onda de nostalgia o atingiu com força.
Clara, sua irmã mais nova, estava liderando a conversa, gesticulando com entusiasmo enquanto os outros a observavam com atenção. Caio, sempre sério e pragmático, parecia ouvir tudo com uma expressão calma, enquanto Davi, o mais brincalhão, soltava gargalhadas ocasionais. Helena, a mais velha, mantinha um olhar protetor sobre todos, como se sempre estivesse pronta para mediar qualquer discussão que surgisse.
Renan se afastou ligeiramente, sem querer ser visto. Ele ainda não estava pronto para confrontá-los, não sem revelar quem ele realmente era. Mas vê-los ali, juntos, felizes, trouxe à tona sentimentos que ele havia suprimido por muito tempo. A última vez que ele os vira havia sido marcada por uma briga amarga, e depois disso, ele havia desaparecido de suas vidas. Agora, como um estranho, ele observava de longe, tentando conciliar o que sentia com a realidade à sua frente.
Enquanto ele se aproximava mais, mantendo uma certa distância, ouviu fragmentos da conversa.
— Clara, você sempre foi a mais teimosa — disse Matheus, com um sorriso leve. — Ainda lembro quando você insistiu em ir naquela viagem sozinha.
— E voltei sã e salva, não voltei? — Clara rebateu, rindo. — Vocês são tão protetores. Eu sabia me virar.
Davi entrou na conversa com uma piada sobre como Clara sempre conseguia o que queria, e o grupo caiu em risos mais uma vez.
Renan observou essa cena com um sentimento estranho de pertencimento e exclusão ao mesmo tempo. Era como se ele estivesse assistindo a um momento de sua própria vida, mas sem poder fazer parte dele. Eles pareciam felizes, unidos, e por um momento, Renan se perguntou se eles realmente precisavam dele de volta.
Mas, ao mesmo tempo, ele sabia que não podia evitar esse reencontro para sempre. Mais cedo ou mais tarde, ele teria que confrontar seu passado, explicar seu desaparecimento e lidar com as emoções não resolvidas que estavam ali, esperando para serem trazidas à tona.
Enquanto ele ponderava sobre suas opções, Clara olhou ao redor e, por um breve segundo, seus olhos se encontraram com os de Renan. Ela não o reconheceu, é claro — ele não esperava que ela o fizesse. Mas, por um momento, ele sentiu que estava sendo puxado de volta para o círculo familiar, mesmo que involuntariamente.
Antes que a situação pudesse se prolongar, Renan virou-se e saiu rapidamente da praça, sentindo o peso de suas decisões pressionando seus ombros. Ele ainda não estava pronto.
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Atualizado até capítulo 29
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