Os dias se arrastavam como uma corrente pesada, cada um mais cansativo que o anterior. Esperança e frustração se misturavam dentro de mim, e a linha entre elas ficava cada vez mais tênue. Quando Esther e o Dr. Montenegro conseguiram marcar uma nova audiência, uma centelha de esperança reacendeu em mim — pequena, mas suficiente para que eu continuasse lutando.
Essa audiência era crucial. Se tudo desse certo, haveria uma chance de reabrir meu caso e, talvez, ver uma luz no fim desse pesadelo. Eu sabia que o sistema era podre, mas mesmo assim, me agarrei à esperança com todas as forças que restavam.
Na manhã do grande dia, fui chamada para a sala de visitas, onde Esther e Montenegro esperavam por mim. O advogado parecia desconfortável, os dedos tamborilando na mesa de metal. Esther segurava a mesma expressão determinada de sempre, mas havia algo quebrado nos olhos dela — um brilho de decepção que me preparou para o que eu já temia.
— A audiência foi cancelada. De novo. — Montenegro anunciou, a voz pesada de frustração.
Por um momento, eu não senti nada. Era como se a informação não tivesse atravessado minha mente, como se eu fosse feita de pedra. Então, a raiva veio, rápida e cruel. O chão parecia sumir sob meus pés.
— Por quê? — perguntei, a voz baixa e fria. — Por que diabos cancelaram de novo?
Montenegro deu de ombros, derrotado.
— Burocracia. Alegaram mais uma vez “problemas administrativos”.
Esther pegou minha mão por cima da mesa, mas eu a puxei de volta. Minha esperança havia desaparecido completamente.
— Eu não vou fazer isso de novo. — murmurei, quase para mim mesma. — Acabou. Eu não vou mais esperar.
Minha garganta queimava com a mistura de raiva e desespero. Toda vez que eu começava a acreditar que a liberdade era possível, o sistema me mostrava que a prisão era a única certeza.
— Você não pode desistir agora, Suraya. — Esther insistiu, mas suas palavras soavam distantes, como se não tivessem peso algum.
De volta à cela, Marília percebeu de imediato que algo havia dado errado. Ela se aproximou silenciosamente e se sentou ao meu lado no colchão. Não disse nada a princípio, apenas dividiu o silêncio comigo.
— Cancelaram de novo. — soltei, sem olhar para ela.
Marília suspirou, mas não parecia surpresa.
— Você precisa continuar, Suraya. — disse, com um tom gentil. — Você é forte demais para deixar eles te quebrar.
Eu soltei uma risada curta, amarga.
— Forte? Não parece.
Ela tocou minha mão, e algo em mim relaxou. Eu não queria precisar de ninguém, mas a presença de Marília era um consolo inesperado. Por um momento, não me senti tão sozinha.
Nos dias seguintes, passamos mais tempo juntas. Cada conversa, cada olhar trocado, aprofundava o laço entre nós. Havia algo ali que me assustava e confortava ao mesmo tempo — um vínculo que eu nunca quis, mas que agora parecia inevitável. Mesmo em um lugar tão escuro, a conexão humana ainda era possível.
Era tarde da noite quando acordei com um ruído estranho no corredor. Levantei-me silenciosamente e olhei através das grades da cela. No corredor mal iluminado, três figuras caminhavam devagar, como sombras deslizando pelo escuro. Duas guardas que eu nunca tinha visto acompanhavam a terceira mulher, que estava com o rosto coberto. Mesmo assim, eu soube imediatamente quem era: Serpente.
O choque correu pelo meu corpo. Ela não estava vestida com o uniforme das detentas, parecia alguém que pertencia a outro mundo. A mulher que eu via ali não era uma prisioneira — era alguém livre, poderosa.
O sangue pulsava em meus ouvidos. O que estava acontecendo? Por que Serpente sairia assim? E para onde ela estava indo?
Bati de leve na parede ao lado, acordando Marília. Ela se mexeu preguiçosamente, até que minha urgência a despertou completamente. Sentei-me no colchão, tentando manter a voz baixa.
— Você viu? Quem eram aquelas mulheres?
Marília sorriu, preguiçosa, como alguém que sabia mais do que deveria.
— Te conto se você me ajudar com uma coisa pequena.
Eu a encarei, frustrada. O que Marília sabia? E por que agora queria negociar?
— O que você quer? — perguntei, irritada.
— Me ajuda a me livrar da Sheila.
Sheila, a guarda corrupta, havia transformado Marília em sua propriedade pessoal. Ela a usava para favores sexuais e como mula para entregar drogas, e a situação estava cada vez mais insuportável para Marília. Eu sabia que Marília precisava sair desse ciclo, mas ajudar significava me envolver em mais riscos do que eu queria.
Por um momento, hesitei. Mas o olhar de Marília estava cheio de desespero. Eu não podia mais vê-la ser humilhada daquele jeito.
— Tá. Eu ajudo. — cedi, mais por não suportar vê-la naquela situação do que pelo que ela prometia me contar.
Marília sorriu, satisfeita, e se inclinou para mais perto.
— A mulher atrás da máscara era Serpente. — sussurrou. — Ela sai uma vez por mês.
Franzi o cenho.
— Sai? Como assim? Pra onde?
Marília riu baixinho, como se eu fosse ingênua por não saber.
— Ela vai para as ruas. Quando chegam carregamentos de navios com drogas, é ela quem supervisiona tudo. O que entra aqui e o que vai circular lá fora, passa pelas mãos dela.
O ar pareceu desaparecer dos meus pulmões.
— Quer dizer que... Serpente não estava ali apenas cumprindo uma sentença. Ela estava controlando tudo.
Marília assentiu.
— Todo mundo sabe disso, pelo menos os que estão aqui há mais tempo. Serpente não tá aqui só pela pena de morte que vivem adiando. Ela tá presa pra evitar um escândalo maior lá fora.
As peças começaram a se encaixar. Serpente não era apenas uma criminosa comum — ela era a mente por trás da maior organização de tráfico do país. Sua prisão era uma farsa, um esconderijo para que pudesse operar nas sombras sem levantar suspeitas.
A Serpente era o coração do submundo, e mesmo dentro da prisão, ela ainda tinha controle sobre tudo.
Voltei para a minha cama com a mente girando. A revelação sobre Serpente e suas operações mudava tudo. Minha aliança com ela agora parecia ainda mais perigosa.
E se um dia ela decidisse que eu não era mais útil? E se as pessoas lá fora que queriam me apagar fizessem uma oferta irresistível para Serpente? Afinal, ela já havia deixado claro que não me eliminou por consideração a alguém — mas quem?
Laila chutou suavemente na minha barriga, e eu passei a mão pela pele esticada. Precisava sobreviver, por ela. Mas agora, mais do que nunca, sabia que precisava andar com cuidado.
Dentro dessas paredes, nada era o que parecia. E a maior ameaça não era a prisão em si, mas as pessoas que eu considerava minhas aliadas.
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Atualizado até capítulo 65
Comments
Simone Teles
eu acho que quem protege ela é Heitor
2025-02-03
0
♡Pyetra♡
Eles estão fazendo pq querem, já tô achando q foi eles q mandou o marido dela
2024-12-28
1