Capítulo 10: O Corpo Cobra seu Preço

Dentro dos muros de Santa Helena, não havia espaço para fraquezas. Cada mulher ali lutava para manter o controle sobre si mesma, mesmo quando o corpo começava a falhar. Não importava o quanto a mente estivesse em frangalhos ou o quanto o cansaço tomasse conta do corpo: qualquer sinal de vulnerabilidade era uma sentença de morte. E eu, mais do que qualquer uma, precisava esconder o que estava acontecendo comigo.

Serpente me encarregava de pequenas tarefas: intermediar favores entre guardas e detentas, levar mensagens e garantir que nenhuma transação saísse do controle. Embora minha posição ao lado dela tivesse me dado alguma proteção, essa proteção não era gratuita. Cada tarefa bem-sucedida era uma corrente invisível que me prendia mais ao poder dela. Serpente era um vício perigoso: quanto mais você se aproximava, mais difícil era escapar.

Naquele dia, minha missão era garantir que Rato, da Ala Sul, pagasse suas dívidas a tempo. Andei pelos corredores abafados, o suor escorrendo pela pele, a cabeça rodando. Cada passo parecia mais pesado que o anterior. O calor fazia meu estômago revirar e a tontura aumentar, mas eu não podia parar. Fracassar em uma tarefa significava perder a confiança de Serpente — e, talvez, perder a vida.

Quando entreguei o recado, senti o primeiro sinal de que algo estava errado: uma onda de tontura que fez o chão parecer se mover sob meus pés. A parede fria foi minha única âncora. Respirei fundo e obriguei meu corpo a continuar.

O calor do pátio era insuportável naquela manhã. O sol batia no concreto, tornando-o um forno que fritava lentamente cada mulher ali. O banho de sol era uma das poucas oportunidades para as detentas se movimentarem fora das celas, mas também era um território perigoso — lugar de disputas silenciosas e ameaças veladas.

Eu estava encostada em um canto, tentando evitar o olhar de outras detentas. O enjoo estava pior do que nunca, e um zumbido irritante começou a se instalar nos meus ouvidos. A visão ficou turva, e as vozes ao redor se misturaram em uma cacofonia indistinta.

Então, tudo escureceu por um instante.

— Ei! Tá tudo bem? — ouvi alguém gritar ao longe, mas a voz parecia vir de outro mundo.

Senti meus joelhos falharem e caí de lado no chão quente. O cheiro de poeira e suor encheu minhas narinas. O barulho ao redor ficou distante, e, por um breve momento, meu corpo parecia desligar completamente.

As outras detentas não pararam para ajudar — ali, um corpo caído era apenas mais um obstáculo no caminho. Ouvi risos e passos pesados se aproximando. Alguém murmurou:

— Deixa a patricinha aí. Alguém vai pisar nela rapidinho.

Eu tentava me mover, mas meus músculos não respondiam. Foi quando uma sombra familiar se aproximou.

— Tá fraca, princesa? — a voz de Serpente soou baixa e divertida. Ela se agachou ao meu lado, seus olhos avaliando cada centímetro meu. — Se for cair, melhor cair onde eu possa ver.

Ela me puxou pelo braço, com força suficiente para me levantar. A pressão do toque dela era ao mesmo tempo um aviso e uma promessa: enquanto eu fosse útil, teria proteção. Mas se me mostrasse fraca demais, essa proteção sumiria como fumaça.

De volta à cela, meu corpo estava tremendo. O calor do pátio, o esforço e a fome acumulada estavam me levando ao limite. Mas a tontura e os enjoos eram mais do que cansaço. Eu sabia disso, mas não queria admitir o que estava diante dos meus olhos.

Eu me encolhi no colchão sujo, abraçando os joelhos contra o peito. Serpente começou a me observar mais de perto. Nada escapava aos olhos dela.

— Tá mais pálida do que o normal, princesa. Tá doente? — ela perguntou certa noite, acendendo um cigarro e soprando a fumaça devagar.

— Não é nada. — Eu menti, mas sabia que ela não acreditaria.

Ela inclinou a cabeça, como uma cobra analisando sua presa, avaliando se valia a pena atacar ou esperar o momento certo. Havia algo quase gentil no modo como ela me estudava, mas essa gentileza era venenosa.

— Se precisar de alguma coisa, sabe onde me achar. — disse ela, antes de desaparecer na escuridão do corredor. Era uma oferta que eu não podia recusar por muito tempo.

Sozinha naquela cela abafada, a solidão e o medo me apertavam o peito como um vício que eu não conseguia largar. Não havia ninguém para quem eu pudesse contar a verdade. Nem Rosa, nem Janaína, nem Serpente — todas eram ameaças, de um jeito ou de outro.

O pensamento da gravidez era uma faca de dois gumes. Ter um bebê seria uma bênção e uma maldição ao mesmo tempo. Eu a imaginava crescendo longe de mim, nas mãos frias do sistema ou usada como moeda de troca por outras detentas. Mas, ao mesmo tempo, a ideia de Laila — sim, eu já começava a chamá-la assim, silenciosamente —, me dava uma força que eu nunca soube que tinha.

Se eu sobrevivesse, seria por ela.

Com o tempo, comecei a entender que o corpo cobra um preço, mas a mente pode ser mais forte.

Na manhã seguinte ao desmaio, fui até Marília, a detenta viciada que sempre me pedia favores. Ela me olhou com o olhar vazio de quem já desistiu de tudo. Eu não seria como ela. Não podia ser.

— Se você cair, ninguém te levanta. — Marília disse, com um sorriso triste. — Aqui, cada uma por si. Sorte sua por ter a Serpente.

Ela não estava tão certa. Se eu caísse, ninguém viria me salvar. E por isso, não havia outra escolha a não ser lutar. Mesmo com meu corpo se rebelando, eu sobreviveria. Por Laila. Por mim.

Deitada no colchão naquela noite, enquanto acariciava a barriga, prometi a mim mesma:

— Eu vou sair daqui. Nem que eu tenha que destruir tudo pelo caminho.

Mas eu preciso aprender a jogar o jogo delas direito e, um dia, ser melhor que todas elas.

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Comments

Socorro Melo

Socorro Melo

Nossa só quero saber da família dela que não sabe como está nem oque acontece com ela todo esse tempo e o rapaz o primeiro beijo será que ainda vão aparecer. asim como o advogado o chefe da segurança Esther (Estela) somiram todos aff

2025-01-29

1

Angela S Silva

Angela S Silva

cadê a Ester o segurança e até mesmo a família dela que não vai visitar ela

2025-02-03

1

Socorro Melo

Socorro Melo

Nossa só quero saber da família dela que não sabe como está nem oque acontece com ela todo esse tempo e o rapaz o primeiro beijo será que ainda vão aparecer. asim como o advogado o chefe da segurança Esther (Estela) somiram todos aff

2025-01-29

2

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Capítulos
1 Avisos
2 Prólogo
3 Capítulo 1: O começo do Fim
4 Capítulo 2: Primeira Noite na Cela 676
5 Capítulo 3: Tortura e Quebra Psicológica
6 Capítulo 4: Primeiras Lições na Cela
7 Capítulo 5: A Primeira Tentativa de Assassinato
8 Capítulo 6: Primeiras Suspeitas e Conflito Interno
9 Capítulo 7: Aliança com a Serpente
10 Capítulo 8: Confirmação Brutal
11 Capítulo 9: Alianças e Sobrevivência
12 Capítulo 10: O Corpo Cobra seu Preço
13 Capítulo 11: A Chegada de Valquíria
14 Capítulo 12: A Primeira Grande Tarefa
15 Capítulo 13: Mudanças no Poder
16 Capítulo 14: O Preço das Dívidas
17 Capítulo 15: A Manipulação das Guardas
18 Capítulo 16: Dúvidas sobre a Maternidade
19 Capítulo 17: Crescendo na Hierarquia
20 Capítulo 18: A Segunda Tentativa de Reabrir o Caso
21 Capítulo 19: O Jogo da Sobrevivência
22 Capítulo 20: O Último Trimestre
23 Palavra do Autor - Uma Pausa para conversamos
24 Capítulo 21: A Filha Arrancada
25 Capítulo 22: A Tortura Final
26 Capítulo 23: A Escuridão
27 Capítulo 24: O Grande Confronto
28 Capítulo 25: O que tem lá Fora?
29 Capítulo 26: Cada Um paga a sua dívida
30 Capítulo 27: O Passado de Sônia Vidal
31 Capítulo 28: O Controle Total
32 Capítulo 29: A História de Rato
33 Capítulo 30: Laila e o Futuro
34 Capítulo 31: A Revolta e Queda
35 Palavra do Autor: Vamos Conversar Sobre a Nossa Viúva?
36 Capítulo 32: O Retorno da Viúva
37 Capítulo 33: O Retorno da Viúva - Parte II
38 Capítulo 34: As Sombras se Movem
39 Capítulo 35: Lembranças de Belo Monte
40 Capítulo 36: O Preço da Dívida
41 Capítulo 37: O Novo Diretor
42 Capítulo 38: Reflexos de um Sistema Quebrado
43 Capítulo 39: O Estopim do Caos
44 Capítulo 40: Sementes de Rebelião
45 Capítulo 41: A Tempestade Se Aproxima
46 Capítulo 42: A Proposta de Aliança de Rato
47 Capítulo 43: Humilhação e Rebelião Sutil
48 Capítulo 44: A Traição e o Assassinato de Marília
49 Capítulo 45: O Estopim da Rebelião
50 Capítulo 46: O Diretor e a Viúva
51 Capítulo 47: A Negociação das Sombras
52 Capítulo 48: O Monopólio da Viúva
53 Capítulo 49: A Infiltração da Ordem
54 Capítulo 50: O Ataque na Sombra
55 Capítulo 51: A Reabertura do Caso
56 Capítulo 52: Confronto com o Passado
57 Capítulo 53: O Encontro com Ayana
58 Capítulo 54: O Declínio do Diretor
59 Capítulo 55: A Grande Batalha
60 Capítulo 56: A Tentativa de Assassinato
61 Capítulo 57: A Carta e a Despedida
62 Capítulo 58: O Coração de Santa Helena Parte
63 Capítulo 59: A Última Palavra
64 Epílogo: Liberdade
65 Nota de Agradecimento aos Leitores
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Atualizado até capítulo 65

1
Avisos
2
Prólogo
3
Capítulo 1: O começo do Fim
4
Capítulo 2: Primeira Noite na Cela 676
5
Capítulo 3: Tortura e Quebra Psicológica
6
Capítulo 4: Primeiras Lições na Cela
7
Capítulo 5: A Primeira Tentativa de Assassinato
8
Capítulo 6: Primeiras Suspeitas e Conflito Interno
9
Capítulo 7: Aliança com a Serpente
10
Capítulo 8: Confirmação Brutal
11
Capítulo 9: Alianças e Sobrevivência
12
Capítulo 10: O Corpo Cobra seu Preço
13
Capítulo 11: A Chegada de Valquíria
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Capítulo 12: A Primeira Grande Tarefa
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Capítulo 13: Mudanças no Poder
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Capítulo 14: O Preço das Dívidas
17
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19
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Capítulo 20: O Último Trimestre
23
Palavra do Autor - Uma Pausa para conversamos
24
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Capítulo 26: Cada Um paga a sua dívida
30
Capítulo 27: O Passado de Sônia Vidal
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Capítulo 28: O Controle Total
32
Capítulo 29: A História de Rato
33
Capítulo 30: Laila e o Futuro
34
Capítulo 31: A Revolta e Queda
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Palavra do Autor: Vamos Conversar Sobre a Nossa Viúva?
36
Capítulo 32: O Retorno da Viúva
37
Capítulo 33: O Retorno da Viúva - Parte II
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Capítulo 34: As Sombras se Movem
39
Capítulo 35: Lembranças de Belo Monte
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Capítulo 36: O Preço da Dívida
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Capítulo 37: O Novo Diretor
42
Capítulo 38: Reflexos de um Sistema Quebrado
43
Capítulo 39: O Estopim do Caos
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Capítulo 44: A Traição e o Assassinato de Marília
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