Capítulo 1: Vida em Belo Monte

Belo Monte. Só de pronunciar o nome já sinto o cheiro do campo, o aroma de terra molhada depois da chuva, e ouço o canto dos pássaros que habitam a fazenda onde cresci. Meu nome é Suraya Lemos Monteiro, e esta é a minha história.

Desde pequena, minha vida foi moldada por essas paisagens rurais que cercam a nossa fazenda. Um lugar de beleza singular, onde o sol parece brilhar mais forte, e as estrelas iluminam o céu como se fossem joias preciosas espalhadas por uma tela negra. A vida aqui é simples, mas tem seu próprio encanto, algo que muitos não entenderiam.

A fazenda dos Lemos Monteiro é herança de gerações. Meus avós a construíram do zero, transformando esse pedaço de terra em um lugar próspero, com plantações de café que pareciam não ter fim. Era um lugar onde se respirava trabalho duro, mas também orgulho. Meu pai, Gustavo, herdou essa responsabilidade, mas o peso que ela carrega, com o tempo, tornou-se um fardo que ele não consegue mais sustentar.

Ainda me lembro das manhãs em que acordávamos com o cantar do galo, e minha mãe, Bianca, já estava na cozinha preparando o café da manhã. O cheiro do café fresco misturava-se com o do pão que ela assava, criando uma atmosfera acolhedora, apesar das dificuldades que começavam a se acumular ao nosso redor.

– Suraya, venha ajudar com as galinhas – ela chamava, sua voz sempre calma, mas com uma firmeza que me fazia correr para atendê-la.

Era uma rotina simples: alimentar as galinhas, cuidar do jardim e ajudar na colheita quando era necessário. Minhas irmãs, Anaya e Ayana, também tinham suas tarefas, mas sempre encontrávamos tempo para brincar no campo, correndo atrás umas das outras, rindo como se não houvesse amanhã.

Entretanto, as risadas começaram a desaparecer, substituídas pelas preocupações que, aos poucos, tomaram conta de nossa casa. A colheita não era mais tão abundante, e as dívidas começaram a se acumular como uma sombra crescente que ameaçava engolir tudo que conhecíamos. Meu pai, antes um homem forte e orgulhoso, começou a mudar.

No início, ele ainda sorria, ainda tentava manter o espírito da fazenda vivo. Mas com o tempo, esse sorriso foi desaparecendo, substituído por uma expressão de cansaço e desespero. O trabalho na fazenda tornou-se mais árduo, e a cobrança dos credores mais frequente. Eu era jovem demais para entender plenamente o que estava acontecendo, mas sentia que algo estava errado. Algo estava mudando.

Foi também nessa época que os primeiros sinais do alcoolismo de meu pai começaram a aparecer. Antes, ele costumava tomar um gole ou outro de cachaça nas festas, mas agora, parecia que a bebida era sua única companhia constante. Quando ele estava sóbrio, era um pai amoroso, mas cada vez mais, esses momentos se tornavam raros.

Lembro-me de uma tarde específica, quando o sol começava a se pôr e a luz dourada banhava a fazenda. Meu pai estava sentado na varanda, uma garrafa de cachaça na mão. Seus olhos, antes brilhantes e cheios de vida, agora estavam turvos, como se ele estivesse em algum lugar distante.

– Papai, está tudo bem? – perguntei, me aproximando devagar, com medo de sua reação.

Ele demorou a responder, parecia não ter me ouvido. Quando finalmente falou, sua voz era rouca e pesada.

– Está tudo bem, Suraya. Só estou... cansado.

Mas eu sabia que não era só cansaço. Havia algo mais, algo que ele não queria ou não podia me contar. E naquela noite, ouvi pela primeira vez uma discussão entre meus pais. Era um som estranho, algo que nunca tinha acontecido antes.

– Gustavo, você precisa parar com isso! Está nos destruindo! – a voz de minha mãe era firme, mas cheia de dor.

– Bianca, não é tão simples. Eu... eu não sei o que fazer. A fazenda está afundando e eu... – ele não conseguiu terminar a frase, sua voz quebrada pela tristeza e pelo álcool.

Essas discussões tornaram-se cada vez mais frequentes, como uma tempestade que se aproxima lenta, mas inexoravelmente. Minha mãe tentava de tudo para manter a família unida, mas a cada dia parecia que algo dentro de meu pai estava morrendo. E, sem saber como lidar com isso, ele se afundava ainda mais na bebida.

Enquanto isso, nós, as crianças, tentávamos seguir com nossas vidas o melhor que podíamos. Anaya e Ayana, minhas irmãs, ainda brincavam comigo nos campos, mas havia uma tristeza nos olhos delas que não existia antes. Nós éramos jovens demais para entender a profundidade dos problemas que nossa família enfrentava, mas sentíamos o peso deles em nossos corações.

A rotina simples e bucólica que antes definia nossas vidas estava se desintegrando, e eu não sabia como consertá-la. Só sabia que algo precioso estava escapando por entre os dedos, e eu não conseguia segurá-lo.

Naquela época, eu não tinha como prever o quanto nossas vidas mudariam, o quanto sofreríamos e o quanto lutaríamos para sobreviver. Mas, de alguma forma, sabia que nada mais seria como antes. E, talvez, essa fosse a verdade mais dolorosa de todas.

Enquanto a noite caía sobre Belo Monte, eu me perguntava se algum dia voltaríamos a sorrir como antes. Mas uma parte de mim já sabia que aquela inocência havia sido perdida para sempre. E o que viria a seguir, só o tempo poderia revelar.

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Comments

S.Kalks

S.Kalks

que nomes!!!

2025-03-21

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Capítulos
1 Prólogo
2 Capítulo 1: Vida em Belo Monte
3 Capítulo 2: A Casa em Desarmonia
4 Capítulo 3: Laços de Sangue e Coração
5 Capítulo 4: O Peso da Dívida
6 Capítulo 5: Segredos à Luz do Entardecer
7 Capítulo 6: Sombras Sobre a Mesa
8 Capítulo 7: O Declínio Silencioso
9 Capítulo 8: O Clímax do Conflito
10 Capítulo 9: Sonhos em Meio ao Café Amargo
11 Capítulo 10: A Chegada do Senhor Fonseca Abreu
12 Capítulo 11: O Encontro que Mudou Tudo
13 Capítulo 12: O Erro Fatal - A Aposta Maldita
14 Capítulo 13: O Acordo Sombrio - Porquê eu?
15 Capítulo 14: O Peso da Escolha
16 Capítulo 15: A Última Carta
17 Capítulo 16: O Desespero da Impossibilidade
18 Capítulo 17: Preparativos para o Casamento
19 Capítulo 18: O Casamento
20 Capítulo 19: A Viagem para a Cidade Grande
21 Capítulo 20: Chegada à Cidade Grande
22 Capítulo 21: A Vida Luxuosa e Sufocante na Mansão de Fonseca
23 Capítulo 22: A Dama da Mansão
24 Capítulo 23: O Jantar dos Poderosos
25 Capítulo 24: No Silêncio da Mansão
26 Capítulo 25: O Despertar de um Monstro
27 Capítulo 26: A Revelação do Cativeiro
28 Capítulo 27: A Sombra da Liberdade
29 Capítulo 28: A Virada de uma Vida
30 Capítulo 29: No Limiar de Sentimentos
31 Capítulo 30: Sob o Véu do Desconhecido
32 Capítulo 31: Adeus, Dubai; Olá, Lagoas
33 Capítulo 32: A Casa Nova, O Novo Eu
34 Capítulo 33: As Correntes Invisíveis
35 Capítulo 34: Um Novo Horizonte
36 Capítulo 35: Sob o Peso da Ira e do Desejo
37 Capítulo 36: Um Conto de Fadas na Realidade
38 Capítulo 37: Duas Vidas, Um Amor: Entre a Realidade e o Disfarce
39 Capítulo 38: Entre Dois Mundos: O Agito do Campus e a Realidade do Poder
40 Capítulo 39: Suspiros à Meia-Luz
41 Capítulo 40: O Veneno do Silêncio
42 Capítulo 41: Desespero e Solidão
43 Capítulo 42: O Funeral da Esperança
44 Capítulo 43: Quando Tudo Estava Contra Mim?
45 Capítulo 44: Os Muros da Injustiça
46 Capítulo 45: O Veredito Final
47 Série Sombras de Um Amor Fatal
Capítulos

Atualizado até capítulo 47

1
Prólogo
2
Capítulo 1: Vida em Belo Monte
3
Capítulo 2: A Casa em Desarmonia
4
Capítulo 3: Laços de Sangue e Coração
5
Capítulo 4: O Peso da Dívida
6
Capítulo 5: Segredos à Luz do Entardecer
7
Capítulo 6: Sombras Sobre a Mesa
8
Capítulo 7: O Declínio Silencioso
9
Capítulo 8: O Clímax do Conflito
10
Capítulo 9: Sonhos em Meio ao Café Amargo
11
Capítulo 10: A Chegada do Senhor Fonseca Abreu
12
Capítulo 11: O Encontro que Mudou Tudo
13
Capítulo 12: O Erro Fatal - A Aposta Maldita
14
Capítulo 13: O Acordo Sombrio - Porquê eu?
15
Capítulo 14: O Peso da Escolha
16
Capítulo 15: A Última Carta
17
Capítulo 16: O Desespero da Impossibilidade
18
Capítulo 17: Preparativos para o Casamento
19
Capítulo 18: O Casamento
20
Capítulo 19: A Viagem para a Cidade Grande
21
Capítulo 20: Chegada à Cidade Grande
22
Capítulo 21: A Vida Luxuosa e Sufocante na Mansão de Fonseca
23
Capítulo 22: A Dama da Mansão
24
Capítulo 23: O Jantar dos Poderosos
25
Capítulo 24: No Silêncio da Mansão
26
Capítulo 25: O Despertar de um Monstro
27
Capítulo 26: A Revelação do Cativeiro
28
Capítulo 27: A Sombra da Liberdade
29
Capítulo 28: A Virada de uma Vida
30
Capítulo 29: No Limiar de Sentimentos
31
Capítulo 30: Sob o Véu do Desconhecido
32
Capítulo 31: Adeus, Dubai; Olá, Lagoas
33
Capítulo 32: A Casa Nova, O Novo Eu
34
Capítulo 33: As Correntes Invisíveis
35
Capítulo 34: Um Novo Horizonte
36
Capítulo 35: Sob o Peso da Ira e do Desejo
37
Capítulo 36: Um Conto de Fadas na Realidade
38
Capítulo 37: Duas Vidas, Um Amor: Entre a Realidade e o Disfarce
39
Capítulo 38: Entre Dois Mundos: O Agito do Campus e a Realidade do Poder
40
Capítulo 39: Suspiros à Meia-Luz
41
Capítulo 40: O Veneno do Silêncio
42
Capítulo 41: Desespero e Solidão
43
Capítulo 42: O Funeral da Esperança
44
Capítulo 43: Quando Tudo Estava Contra Mim?
45
Capítulo 44: Os Muros da Injustiça
46
Capítulo 45: O Veredito Final
47
Série Sombras de Um Amor Fatal

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