Belo Monte era um lugar de contrastes. Por um lado, a fazenda da minha família dominava a paisagem com seus campos vastos, cortados por cercas de arame farpado que pareciam se estender até o horizonte. Mas, além dos limites da nossa propriedade, havia um mundo que pulsava com sua própria vida – um mundo que, até então, eu conhecia apenas superficialmente.
As tardes em Belo Monte eram longas e douradas, com o sol pintando o céu em tons de laranja e rosa antes de desaparecer lentamente atrás das colinas distantes. Foi em uma dessas tardes, enquanto o crepúsculo ainda se derramava pela terra, que comecei a perceber o quanto minha vida estava prestes a mudar.
Heitor e eu nos conhecíamos desde crianças. Ele era filho do capataz da fazenda, Lá Rosa, cujo o proprietário era um homem severo e de poucas palavras. Crescemos juntos, mas com o passar dos anos, as diferenças sociais entre nossas famílias foram se tornando mais evidentes. Embora Heitor fosse apenas um ano mais velho que eu, seu papel na fazenda sempre foi mais ativo, acompanhando o pai nas tarefas diárias, enquanto eu e minhas irmãs éramos mantidas mais à distância.
No entanto, apesar dessas diferenças, havia algo em Heitor que sempre me intrigou. Talvez fosse a maneira como ele parecia enxergar além das aparências, ou o fato de que, mesmo sendo humilde, carregava consigo uma dignidade que poucos homens tinham. Em meio à rotina exaustiva e à pressão constante da fazenda, nossos encontros casuais começaram a se tornar menos frequentes – mais não deixando de ser significativos.
Naquele dia, após ajudar minha mãe no jardim, resolvi caminhar até o riacho que corria nos limites da nossa propriedade. Era meu lugar favorito em toda a fazenda, um refúgio onde eu podia escapar das preocupações que se amontoavam em minha mente. A água cristalina corria suavemente entre as pedras, e o som relaxante do riacho sempre me acalmava.
Cheguei lá e me sentei à beira da água, deixando meus dedos tocarem a superfície fria. Fechei os olhos, tentando afastar os pensamentos sobre as dívidas da fazenda, as brigas dos meus pais e o futuro incerto que nos espreitava. O vento soprou suavemente, trazendo consigo o perfume das flores silvestres que cresciam nas margens.
Foi então que ouvi passos suaves atrás de mim. Virei-me rapidamente e, para minha surpresa, encontrei Heitor se aproximando. Ele estava vestido com sua camisa de linho simples e calças gastas, o cabelo bagunçado pelo vento. Mas era o sorriso que ele me deu que realmente me desarmou – um sorriso que era ao mesmo tempo caloroso e tímido.
– Oi, Suraya – ele disse, parando a poucos metros de mim. – Posso me sentar?
Assenti, sentindo meu coração bater mais rápido do que o normal. Havia algo na presença dele que me deixava nervosa, mas de uma forma boa, como se uma parte de mim estivesse à espera desse momento havia muito tempo.
Heitor se sentou ao meu lado, e por alguns instantes, nenhum de nós falou. Apenas ficamos ali, ouvindo o som do riacho e o farfalhar das folhas nas árvores ao nosso redor. Era um silêncio confortável, mas carregado de uma tensão suave, como se algo estivesse prestes a ser dito, algo que nenhum de nós ousava verbalizar.
Finalmente, ele quebrou o silêncio.
– Eu estava pensando em você – ele disse, olhando para a água. – Desde a última vez que nos vimos.
Senti minhas bochechas corarem. Tentei manter minha voz firme quando respondi.
– Eu também pensei em você, Heitor. Na verdade, venho aqui com a esperança de te encontrar.
Ele virou-se para me encarar, seus olhos castanhos brilhando à luz suave do entardecer. Havia algo nos olhos dele que parecia compreender tudo o que eu estava sentindo – a confusão, a curiosidade, e aquela faísca de algo mais profundo que eu ainda não sabia como nomear.
– O que você pensa sobre nós, Suraya? – ele perguntou de repente, pegando-me de surpresa.
Eu respirei fundo, tentando organizar meus pensamentos.
– Eu... eu não sei, Heitor – admiti. – Tudo parece tão complicado. Nossas famílias, a fazenda, tudo. Mas ao mesmo tempo, quando estou com você, tudo isso parece desaparecer. Como se nada mais importasse.
Ele sorriu novamente, dessa vez com uma tristeza nos lábios.
– Eu sinto o mesmo – disse ele. – Mas você sabe que isso não vai ser fácil, não é? Minha posição aqui, sua família... eles nunca aceitariam.
Minhas palavras saíram antes que eu pudesse pensar.
– Eu não me importo – eu disse, surpreendendo até a mim mesma com a intensidade da minha voz. – Eu não me importo com o que eles pensam. Só quero estar com você.
Houve um longo momento de silêncio, durante o qual Heitor parecia estar pesando cada palavra. Finalmente, ele estendeu a mão e segurou a minha. O toque dele era quente e reconfortante, e pela primeira vez em muito tempo, senti que estava exatamente onde deveria estar.
– Então, vamos encontrar uma maneira – ele disse, sua voz suave, mas firme. – Não sei como, mas vamos encontrar. Assim que você fizer 18 anos.
A partir daquele dia, nossos encontros ao entardecer se tornaram mais frequentes, e nosso vínculo cresceu. Sabíamos que o que estávamos fazendo era arriscado, que nossas famílias nunca aceitariam nosso relacionamento, mas era impossível ignorar o que sentíamos.
Além do riacho, havia outros lugares em Belo Monte que começaram a ter um significado especial para nós. O velho moinho, por exemplo, ficava a uma boa caminhada da fazenda, mas era um dos lugares mais isolados que conhecíamos. Ali, escondidos das vistas dos outros, compartilhávamos nossos sonhos e medos, imaginando um futuro que parecia tão distante da realidade.
Nesses momentos, eu contava a Heitor sobre os problemas que minha família enfrentava, as dívidas e a constante tensão entre meus pais. Ele ouvia com atenção, oferecendo palavras de consolo e prometendo que, de alguma forma, tudo ficaria bem. Havia uma bondade nele que me fazia acreditar que, talvez, houvesse uma saída para todo aquele caos.
No entanto, por mais que tentássemos manter nosso relacionamento em segredo, Belo Monte era um lugar pequeno, e as fofocas corriam rápido. Alguns dos trabalhadores da fazenda começaram a notar nossas ausências frequentes e os olhares trocados de longe. Eu sabia que era apenas uma questão de tempo até que alguém começasse a falar.
Mas, apesar desse medo constante, não conseguia resistir à tentação de estar com Heitor. Cada momento que passávamos juntos era uma fuga da realidade opressiva que me cercava, um alívio que eu precisava desesperadamente.
Foi durante um desses encontros secretos que percebi o quanto estava me apaixonando por ele. Estávamos no topo da colina que dava vista para toda a fazenda, o sol já se pondo no horizonte, quando Heitor me olhou nos olhos e disse:
– Eu te amo, Suraya.
As palavras dele me pegaram de surpresa, mas antes que eu pudesse responder, ele continuou:
– Eu sei que é complicado, que o futuro é incerto. Mas o que sinto por você é real, e é o que me dá forças para continuar. Não sei o que vai acontecer, mas estou disposto a lutar por nós, por esse amor.
Senti meus olhos se encherem de lágrimas. Tudo o que ele estava dizendo ressoava dentro de mim de uma forma que eu não sabia descrever. Apesar de todas as incertezas, havia uma verdade inegável naquele momento: eu também o amava.
– Eu te amo, Heitor – sussurrei, minha voz embargada pela emoção. – E estou disposta a enfrentar tudo, contanto que você esteja ao meu lado.
Nos braços dele, com o vento suave soprando ao nosso redor, senti que nada mais importava. Éramos apenas nós dois, em um mundo onde nossas preocupações não tinham lugar. Mas, no fundo, eu sabia que esse momento de paz não duraria para sempre.
O sol se pôs, mergulhando Belo Monte na escuridão, e enquanto eu me preparava para voltar à realidade, uma inquietação começou a crescer dentro de mim. Sabia que não poderíamos esconder nosso amor por muito mais tempo. E quando o segredo viesse à tona, as consequências seriam inevitáveis.
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Atualizado até capítulo 47
Comments
Fatima Vieira
o q será q vai acontecer
2025-01-31
1
S.Kalks
aí amiga vamos ser realista, vc já estava apaixonada a muito mais tempo
2025-04-02
1
S.Kalks
oh meu Deus que fofo 🩷🩷🩷
2025-04-02
1