CAP-08 " UM CORAÇÃO EM FRAGMENTOS"

A noite estava fria e silenciosa. Mirella não conseguia dormir, mesmo depois de se deitar inúmeras vezes e tentar fechar os olhos. O peso em seu coração era insuportável. Cansada de lutar contra os pensamentos, ela se sentou na cama e pegou o celular. A tela iluminou o quarto escuro enquanto ela procurava algo para distrair a mente.

Passou a rolar pela galeria, vendo fotos e vídeos antigos. Eram memórias preciosas com sua mãe e suas irmãs. Cada risada gravada em vídeo parecia um eco distante, trazendo uma pontada de saudade. Ela se lembrou do calor do abraço de sua mãe e das conversas intermináveis com sua irmã, aquela que costumavam ser sua confidente.

Por um momento, um sorriso sincero surgiu em seus lábios. Apesar da distância, sabia que sua família estava bem. Mirella tinha certeza que a sua tia estava cumprindo sua promessa de cuidar delas, mas ainda assim, a ausência delas era um vazio que nada conseguia preencher.

Enquanto Mirella continuava a olhar as imagens, tropeçou em uma foto que quase a fez largar o celular. Era uma foto dela e de Pedro, juntos, sorrindo como se fossem as únicas pessoas no mundo. Ele foi seu primeiro amor, o garoto que fez seu coração bater mais rápido. Pedro era o motivo pelo qual, um dia, ela acreditou no amor puro.

As lágrimas começaram a cair. No início, silenciosas, mas logo se tornaram soluços altos. Mirella não podia evitar. A dor de lembrar-se dele era como um punhal em seu peito. Ela segurava o celular com força, encarando a imagem como se pudesse trazer Pedro de volta, como se pudesse reviver aqueles dias em que acreditava que o amor era suficiente para superar tudo.

— Por que... por que ainda dói tanto? — murmurou para si mesma.

A noite parecia interminável. As horas passavam, mas Mirella continuava chorando, até que finalmente o cansaço a trouxe de volta à realidade.

Ela levantou a cabeça, enxugou as lágrimas e encarou o reflexo no espelho. Seus olhos estavam vermelhos e inchados, mas havia uma chama de determinação em seu olhar.

— Por que estou chorando por ele? Por quê? — perguntou, quase gritando para si mesma. — Ele não merece minhas lágrimas!

Ela respirou fundo, tentando se recompor.

— Eu tenho coisas mais importantes para me preocupar... Preciso ser forte. Preciso encontrar um emprego e garantir minha independência. Quando esse contrato de casamento acabar, estarei pronta para reunir minha família novamente.

Mirella se levantou, foi até o banheiro e lavou o rosto. A água fria ajudou a acalmar sua mente, mas o aperto em seu peito ainda estava lá, mesmo que agora escondido sob uma camada de força.

O Café da Manhã

O amanhecer trouxe consigo um silêncio estranho, mas reconfortante. Mirella acordou com batidas suaves na porta.

— Toc-toc.

— Pode entrar! — respondeu Mirella, com a voz um pouco rouca da noite anterior.

Luna entrou no quarto com uma bandeja cuidadosamente preparada. Com delicadeza, ela colocou o café da manhã na mesa próxima à janela.

— Senhorita, seu café da manhã está servido.

— Já estou indo — respondeu Mirella, lavando as mãos antes de se sentar à mesa.

Enquanto ela observava a bandeja, um pensamento lhe ocorreu.

— Luna, eu não gosto de tomar café sozinha. Sente-se comigo!

Luna hesitou, arregalando os olhos.

— Senhorita, eu não posso. Se alguém nos vir, estarei desobedecendo as regras.

Mirella se levantou, caminhou até a porta e a trancou.

— Agora ninguém pode nos ver. Venha, sente-se comigo.

Luna riu discretamente e se sentou em frente a Mirella.

— Onde estão as outras meninas? — perguntou Mirella, partindo um pedaço de pão.

— Estão organizando sua festa de casamento, senhorita — respondeu Luna, com um tom melancólico.

Mirella percebeu a mudança na expressão de Luna e arqueou as sobrancelhas.

— O que foi, Luna?

— É que... daqui a pouco será hora do almoço e o patrão ainda não apareceu.

— E isso te deixou triste? — Mirella perguntou, tentando aliviar a tensão.

— Ele será seu marido, senhorita. Como ele não te deu nem uma aliança de noivado, o mínimo que poderia ter feito era acompanhar você na escolha do vestido de noiva.

— Está tudo bem, Luna. Eu posso escolher sozinha. Não preciso de ninguém para isso.

Mesmo com o sorriso, havia uma sombra em seu olhar. Mirella estava determinada a enfrentar tudo com dignidade, mas por dentro, a solidão parecia gritar.

Luna percebeu o esforço da jovem para parecer forte e segurou sua mão por um breve momento.

— A senhorita é mais forte do que pensa.

Mirella apertou a mão de Luna e sorriu de volta, mas uma parte dela se perguntava por quanto tempo ainda conseguiria carregar o peso daquela vida que não escolheu viver.

...☆☆☆☆☆☆☆☆☆☆☆☆☆☆☆...

Lojas após lojas, vestidos após vestidos, Mirella simplesmente não conseguia encontrar algo que a fizesse suspirar. A cada nova tentativa, Luna suspirava mais alto.

— Srta., eu não aguento mais — Luna resmungou, apoiando-se em uma pilha de vestidos . — Já experimentamos vestidos o suficiente para montar um desfile.

Mirella olhou para Luna, notando o cansaço nos olhos da empregada, mas não queria desistir.

— Só mais uma loja, prometo!

Elas entraram em uma nova boutique de luxo, que exalava exclusividade em cada canto. Mirella observava os vestidos pendurados com certa descrença, achando que seria mais uma tentativa frustrada. A estilista da loja se aproximou com um sorriso confiante.

— Posso sugerir algo? — disse ela, puxando um vestido que estava escondido atrás de um painel de vidro.

Quando Mirella viu o vestido, seus olhos brilharam. Era uma peça única, feita com camadas de tecido delicado que pareciam flutuar, bordados com gemas raríssimas e um corte que parecia feito para um conto de fadas. Mas o que realmente chamou sua atenção foi a simplicidade encantadora. Apesar das gemas preciosas, o design era sutil e elegante, exatamente como Mirella gostava.

Ela entrou no provador e, ao vestir o vestido, sentiu algo diferente. Observando seu reflexo no espelho, teve a sensação de que aquele vestido carregava uma espécie de magia, como se fosse feito para ela. Mirella saiu do provador, e Luna, que tentava cochilar em uma poltrona, quase caiu ao ouvir um grito.

— Eu encontrei!

— Encontrou o quê? — Luna perguntou, assustada.

— O vestido! — Mirella respondeu, com os olhos brilhando.

Luna se levantou, ajeitando os cabelos que estavam completamente despenteados, e encarou Mirella.

— Senhorita, você está deslumbrante. Esse vestido... parece que foi feito para você.

Mirella riu, puxando Luna para perto e ajeitando seus cabelos.

— E agora, podemos ir para casa? — Luna perguntou, esperançosa.

— Sim, missão cumprida!

Uma Pequena Reviravolta

Antes de voltarem, Mirella notou algo curioso na loja, uma foto antiga presa a uma moldura discreta na parede. A imagem mostrava uma mulher usando um vestido semelhante ao que ela acabou de escolher. Mirella apontou para a foto.

— Quem é essa?

A estilista hesitou por um momento antes de responder:

— É uma peça histórica, senhora. Dizem que a mulher da foto era uma princesa que encontrou o grande amor de sua vida no dia de seu casamento... mas foi tragicamente assassinada naquela mesma noite.

Mirella sentiu um arrepio percorrer sua espinha, mas afastou o pensamento rapidamente. Era apenas uma história, certo?

O Retorno à Mansão

Quando chegaram à mansão, o cansaço finalmente bateu. Mirella se despediu de Luna, subiu para o quarto e foi direto para o banho. A água quente lavou o dia longo e cheio de emoções, mas algo ainda permanecia em sua mente. O vestido era perfeito, mas por que aquela história antiga a deixara tão inquieta?

Depois do banho, ela olhou para o vestido embalado cuidadosamente em uma capa protetora. Por um momento, pensou ter ouvido um som estranho vindo do corredor, mas ao abrir a porta, não havia ninguém.

Suspirando, ela fechou a porta, apagou as luzes e se deitou. No entanto, o sono foi difícil. Em seus sonhos, a princesa da foto apareceu, usando o mesmo vestido, e algo na expressão dela parecia um aviso silencioso.

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