Beijo

Ela paralisou no lugar, mas depois se virou com um grande sorriso no rosto, dizendo:

— Esqueceu que limpei tudo? — sim, ela limpou, mas continuava algo errado.

Logo, um cheiro delicioso se espalhou pela casa. Ela serviu dois pratos, eram almondegas com arroz. Celine se sentou, e então me olhou.

— Pergunte… — ela pegou uma almondega e comeu, me olhando com expectativa.

— Aisha, como ela era? — agora era eu que tinha expectativas, que tipo de mulher roubou o meu coração?

— Sombria, nunca sorria para ninguém, somente para você. Era ciumenta, um tanto possessiva, mas entendo um pouco, afinal, vocês estavam juntos há uns sete anos. — sete anos… — Fui no velório dela, não havia ninguém, Arthuro pagou o caixão, mas ele não foi por estar com você no hospital.

— Não tinha ninguém? — isso significava que Aisha não tinha amigos.

— Quando ela foi enterrada, fui a única pessoa que viu. — Celine apertou as mãos, parecendo irritada.

— A-Amanhã, pode me levar até onde ela foi enterrada? — eu precisava ir até lá.

— Sim, eu posso. — ela continuou comendo, então fiz o mesmo.

Realmente ela tinha boas habilidades, e eu gostei, não me lembro se gostava disso, mas eu comeria todos os dias facilmente.

— Celine, você limpou minha casa, mas um dos quartos estava bagunçado. O quarto de hóspedes. — acabei me lembrando disso.

— Sério? Acho que eu esqueci? Pode me mostrar qual dos dois é? Posso arrumar agora. — ela sorriu para mim, tantos sorrisos já estavam me deixando agoniado.

— Não precisa. — eu falei.

— Sem problema nenhum, apenas me mostre! — ela me puxou, e eu fui obrigado a levantar.

Ainda me lembrava de do lugar, então fui com ela, apontando para o quarto. Celine me puxou para dentro inesperadamente, não sei porque eu não queria entrar lá outra vez.

— Você tem razão, eu realmente não arrumei esse quarto. — ela foi até a cama, e então puxou o cobertor para dobrar.

Nesse momento, algo caiu da cama, fui até lá, e peguei. Era um caderno, e tinha o meu nome. Abri, e vi algumas anotações por alto.

Então, eu parei e pensei: a pessoa que bagunçou esse quarto fui eu?

Nesse momento, comecei a olhar bem os detalhes, havia algumas roupas jogadas do lado da cômoda. E sim, eram minhas. Como tive a certeza disso? Bom, eu apenas senti que é assim.

— Celine, você é minha vizinha há um tempo, certo? — ela concordou com a cabeça. — Me responda, você ouviu alguma discussão ou brigas por parte minha e de Aisha?

Fazia sentido se eu estivesse dormindo em outro quarto.

— Bom, antes do seu acidente, teve sim uma discussão entre vocês. Acho que uns dois dias antes. — ela continuou arrumando a cama.

— Entendo. — acabei decidindo sair do quarto, enquanto Celine ficou arrumando.

Fui até o quarto e Aisha e eu dividíamos. Claro, não teria como ter algo concreto, pois já havia sido arrumado.

Talvez Celine soubesse de algo, eu poderia perguntar depois.

— Esse cheiro… — ainda estava forte, como se novamente alguém tivesse despejado o vidro de perfume no quarto.

Fiquei andando por lá, e aroma doce e sedutor estava me deixando inebriado. Parecia cada vez melhor, mas em um certo momento, começou a me sufocar, por estar tão forte.

— COF, COF! — me afastei da cama, pois lá estava pior.

Nesse momento, Celine entrou no quarto.

— Uau, o cheiro está forte aqui. — ela cobriu o nariz, e então puxou o lençol.

Ela saiu levando ele consigo, e então me senti um pouco aliviado. Tinha uma janela, fui até lá e abri. A vista era bonita, realmente encantadora. Pude respirar um pouco, e então, o cheiro que estava sufocante, ficou maravilhosamente bom outra vez.

Por que esse perfume me encanta tanto? Não conseguia entender. O quarto ainda estava repleto disso, e não achei ruim.

Ouvi passos, provavelmente Celina já estava voltando ao quarto. A luz se apagou repentinamente, e quando me virei, vi apenas a silhueta de uma mulher.

Uma imagem borrada me veio a mente, mas ainda sem rosto. Estiquei minha mão, assim como no meu sonho, mas consegui tocar. Era real, mas…

— Celine? — era a única pessoa que poderia ser.

Mas, ela não me respondeu. Estava tão escuro que não conseguia ver seu rosto, mas meu coração acelerou. A luz da cidade não era o suficiente para iluminar minha janela do último andar.

— Celine, é você? — eu repeti, esperando por uma resposta.

Ainda havia energia lá fora, significava que ela apagou propositalmente a luz do quarto. Então, nesse momento a surpresa veio. Ela passou a mão pelo meu rosto, e depois clavícula. Sua respiração quente no meu pescoço me causou arrepios.

Então, ela me puxou para um beijo, que por segundos, não pareceu fazer sentido, até que algo estranho aconteceu dentro de mim.

Foi como uma explosão de sentimentos, algo desesperador. Algo que não sei se já senti antes na vida, mas nunca me deixou tão abismado e atento. O beijo se intensificou, e eu perdi completamente a razão. Não sabia mais o que estava acontecendo, aquela é realmente Celine?

Quando menos percebi, ela me jogou na cama, mas o que estava intenso se tornou algo estranho. Ela sentou ao lado da cama, e passou a mão no meu busto pelas minhas roupas. Olhei para a silhueta dela, mas nesse momento…

Vi outra mulher, ou levemente a face dela. Mas quem é ela? Por que me veio a mente?

Minha mente estava em branco, sons baixos saíram da minha boca, quando um nome acabou escapando.

— A-Aisha… — eu sussurrei.

Ela parou imediatamente, se afastando de mim. Então, a luz foi acesa novamente. Celine estava me encarando.

— Celine? — claro, eu sabia que era ela, mas por um segundo…

— Desculpe pelo que fiz, como sabe, te admiro há muito tempo… — e isso ao menos seria certo? Eu era comprometido, e ela conhecia a Aisha.

Ela estava parada na porta, me encarando com aquele olhar intenso, mas, ao mesmo tempo, assustador. Era como se ela quisesse dizer algo, mas não conseguia.

Me levantei da cama, e tentei fingir naturalidade depois do que aconteceu. Por que ela me beijou? Não faz sentido. E pior de tudo, por que eu aceitei? Por que me senti embriagado? Mas pior, por que parece que já fiz isso com ela antes?

— Aisha… ela realmente te amava muito, você não imagina o quanto. — novamente, um olhar sombrio dela, direcionado a mim.

Eu não disse mais nada depois disso.

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