Em uma sexta-feira, lá estava eu, lutando contra o impulso de entrar em contato com Ferdinando. Embora tivesse excluído seu número do meu celular, minha obsessão por ele era tão intensa que o gravei na memória. Ainda assim, eu estava decidida a não adicioná-lo novamente nos meus contatos.
Quando a noite cedeu lugar à manhã, chegou a hora de ir à escola. Não havia como escapar; eu sabia que teria que encarar Ferdinando e seus olhares debochados mais uma vez. Me vesti rapidamente, tomei um café apressado, peguei minha mochila e saí de casa.
O pátio da escola estava mais vazio do que o normal, o que me trouxe um breve alívio. O silêncio e a falta de movimentação me permitiam respirar um pouco melhor, já que uma multidão naquele momento só tornaria mais difícil lidar com a pressão que eu sentia. Subi as escadas até minha sala, com o coração apertado, e lá estava ele. Ferdinando, rindo e conversando com seus amigos, como se nada tivesse acontecido. Como se, no dia anterior, ele não tivesse partido meu coração em mil pedaços.
Quando cheguei, Ferdinando me lançou um olhar duro, como se eu tivesse cometido o pior erro da vida. Tentei fingir que não percebia, passei direto e fui me sentar na minha carteira, próxima à janela. Mas, mesmo tentando me desligar, uma parte da conversa deles chegou até mim, e o que ouvi me abalou profundamente.— Por que você não pega ela? — a voz de Ferdinando ecoou nitidamente, se referindo a mim.— Deus me livre, quero não — respondeu um dos seus amigos, seguido por risadas debochadas. E ali começou um verdadeiro espetáculo de zombarias. As risadas cortantes deles penetravam fundo na minha alma, e o arrependimento por ter me envolvido com Ferdinando crescia a cada segundo. Se eu pudesse desaparecer naquele momento, eu teria feito sem pensar duas vezes.
O peso da vergonha me atingiu com uma força avassaladora. Senti meu rosto esquentar, e uma vontade esmagadora de chorar se instalou em mim. Não tive forças para me defender, para gritar ou reagir. Fiquei ali, paralisada, tentando fingir que as risadas não tinham nada a ver comigo, mas meu coração sabia. Era impossível fingir que aquelas zombarias não eram dirigidas a mim. E, naquele silêncio forçado, minha única vontade era sumir.
As aulas terminaram, era hora de voltar para casa. Na verdade, nem prestei atenção em nenhuma delas — passei os horários refletindo sobre os garotos que zombaram de mim. Cheguei até a xingar todos em pensamento. Não tinha costume de desejar mal a alguém, mas a raiva e revolta me consumiam em instância. Eu estava com muita raiva de Ferdinando, e precisava fazer algo a respeito para não deixar essa humilhação impune.
Cheguei em casa cabisbaixa, o coração apertado pela raiva e pela decepção. Não conseguia acreditar no que Ferdinando havia feito. Ele conseguiu descer ao nível mais baixo possível, como se tivesse prazer em me ver mal. Eu o odiava com todas as minhas forças, e ele precisava saber disso.
Adicionei seu número de volta aos meus contatos, com o único objetivo de confrontá-lo.
Eu: Você é nojento, Ferdinando! Eu te odeio! Você é desprezível, ardiloso e repulsivo!
Digitei com os dedos tremendo, liberando tudo o que estava entalado na minha garganta.
Não demorou para ele responder, e, como esperado, com seu sarcasmo habitual.
Ferdinando: Vai se tratar, mulher feia. Eu não quero mais nada com você. Vai procurar um macho que te queira.
A raiva fervia dentro de mim. Ele sequer se importava com o mal que me causou.
Eu: E você que me deixe em paz! Eu ouvi você fazendo piada de mim para os seus amigos. Espero que você tenha vergonha e me deixe em paz, não mexa mais comigo!
Ferdinando: Ou o quê? — provocou ele, debochado.
Eu: Ou eu vou infernizar a sua vida.
Ferdinando: Acha que eu tenho medo de você? Pra mim, você é um nada. Um lixo.
Respirei fundo, sentindo a adrenalina percorrer meu corpo. Estava cansada, mas não me deixaria vencer.
Eu: Lixos são recicláveis. Já você, Ferdinando, é um caso perdido.
Finalizei, sentindo uma satisfação amarga.
Ele não continuou a discussão. Sabia que, se insistisse, não sairíamos dali. Eu era o tipo de garota que não engolia desaforo, e ele finalmente entendeu isso. O silêncio dele, por fim, me deu a certeza de que o confronto havia terminado, pelo menos por enquanto. Fiquei me perguntando: "Por que ele ainda não me bloqueou? Será que ainda pensa em voltar a me querer algum dia?" A ideia de perguntar isso diretamente parecia absurda, algo ridículo demais da minha parte. Afinal, eu também poderia bloqueá-lo, mas não o fiz. A verdade é que, por mais que Ferdinando me tratasse de forma distante, eu não queria cortar o contato. No fundo, ainda o amava e desejava manter essa conexão, por mais tóxica que fosse.
Esses pensamentos, somados à tristeza que me consumia, acabaram me levando ao sono. Dormir era meu único refúgio. Era o momento em que todos os meus problemas desapareciam como num passe de mágica, e eu podia me perder num mundo onde a dor não existia.
Na manhã seguinte, fui acordada pelo som familiar de risadas. Ao abrir os olhos, vi minha irmã Diana e sua filha, Pamella, na sala. Elas vieram passar o sábado e o domingo conosco, algo que inicialmente me pegou de surpresa, mas que logo achei uma boa ideia. Eu realmente precisava de uma distração, de alguém para conversar. E como via minha irmã caçula com tão pouca frequência, parecia a oportunidade perfeita para fortalecer nosso laço.
Peguei Pamella no colo e comecei a brincar com ela. Ela era um doce de menina, capaz de extrair risadas sinceras de uma bebezinha tão inocente e frágil com apenas um aninho. Era como voltar à infância, um período que eu tanto admirava, em que ainda não nos dávamos conta de nossa própria existência, carregando em nós toda a pureza da inocência.
Enquanto isso, minha mãe organizava as roupas no guarda-roupa e, inesperadamente, uma conversa estranha começou a se desenrolar entre ela e Diana.
— Você não perdeu tempo e já abriu as pernas pro primeiro que viu — disse minha mãe, indignada com um fato que aconteceu anos atras, e que ela ainda não superou.
— A senhora vai me julgar por isso pro resto da vida. Tomara que a Donatella perca logo a virgindade, assim a senhora sai do meu pé e começa a pegar no pé dela — respondeu Diana, parecendo vislumbrar o que havia acontecido.
Engoli em seco ao ouvir aquelas falas da minha irmã. Se minha mãe soubesse que eu também não era mais virgem, minha paz estaria em risco. Pensei, então, que mais cedo ou mais tarde, ela descobriria, então que fosse agora. A coragem me dominou.
— Eu não sou mais virgem — disparei.
— Como assim? — minha mãe arregalou os olhos, incrédula.
— É isso, eu não sou mais virgem. Perdi minha virgindade com um garoto da escola — confessei, sentindo a loucura dessa revelação tomar forma.
— Você está mentindo! — minha mãe parecia se recusar a acreditar.
— É verdade, não sou mais virgem — reafirmei, com a voz trêmula, apreensiva pelo que viria a seguir.
— O que foi que você fez da sua vida, minha filha?! — A expressão dela se transformou, revelando uma indignação profunda. — Você quer ser uma puta como sua irmã?!
— Bom, eu tenho vinte e dois anos... a senhora não achou que eu seria virgem para sempre, né? — confrontei-a, sentindo um misto de revolta e desânimo.
— Eu achava que você teria um mínimo de decência e valor, mas veja, você é igual a sua irmã! — ela disparou, com desprezo nas palavras.
— Então, ser prostituta é só porque a gente transou? — Diana rebateu, defensiva.
Para dona Regiane, parecia impossível entender que os tempos mudaram, que quase ninguém se casava virgem nos dias de hoje. Ela mesma tinha filhos de pais diferentes, então não havia razão para exigir castidade das filhas. Era como tentar proibir um cachorro de roer os ossos: cedo ou tarde, ele sempre roerá. A realidade clama por um entendimento mais aberto, liberdade e respeito pelas escolhas de cada um.
— Como ele se chama? — indagou minha mãe, com uma frieza que me fez estremecer.
— Carlos Ferdinando — respondi hesitante, sentindo o nervosismo transparecer na minha voz.
— Quem é esse garoto? Onde ele mora?
Franzi a testa, a preocupação já tomando conta de mim.
— Pra que a senhora quer saber?
— Porque eu quero! Tenho todo o direito de saber com quem você anda.
— A senhora não tem direito de nada, não — retruquei, tentando parecer firme, mas sabia que ela sempre usava aquele tom autoritário para me desarmar.
— Enquanto você viver debaixo do meu teto, eu tenho todos os direitos sobre você! — Aquele argumento clássico, sempre jogado na mesa para me quebrar.
Minha mente girava em busca de uma saída rápida. Eu precisava pensar em algo que a afastasse de Ferdinando, algo que impediria uma catástrofe. De repente, lembrei de uma conversa com ele, onde ele mencionou que poderia se mudar para São Paulo.
— Ele já viajou pra São Paulo, tá morando lá agora — menti, torcendo para que ela acreditasse.
— Você tá mentindo — ela me acusou, os olhos faiscando desconfiança.
— Não, é verdade! Só estou te contando porque ele não está mais aqui.
Ela me encarou com raiva, os lábios se apertando antes de soltar a sentença que sempre me machucava.
— Eu só tenho filhas vagabundas!
Aquela frase cortou o ar como uma faca. Sem suportar mais, me retirei do quarto dela, deixando-a resmungando sozinha. Minha irmã, que assistia a cena em silêncio, também saiu de fininho, sabendo que, em breve, sobraria pra ela também.
No meu quarto, me joguei na cama, a cabeça latejando. Dormir era a única fuga que eu tinha, a única maneira de silenciar a voz dela, que ainda ecoava nos meus ouvidos. Eu não aguentava mais aquela pressão, aquela constante vigilância, mas, ao menos, não me arrependia de ter mentido. Foi a melhor escolha para proteger a situação... ou pelo menos era o que eu pensava naquele momento.
Quando acordei, já era noite. O sábado se arrastava, sem o colégio para me distrair. Peguei o tablet, esperando alguma mensagem de Ferdinando, mas algo estava errado. O perfil dele havia sumido. Meu coração disparou. Ele tinha me bloqueado? Abri o chat, e o que vi me fez gelar por completo.
A última mensagem no meu dispositivo não tinha sido enviada por mim.
Eu: Oi Ferdinando, aqui quem está falando é a mãe da Donatella. Eu sei o que você fez com ela. Você acabou com a vida da minha filha. Usou ela como uma prostituta e a descartou, mas não se preocupe, um dia você vai pagar. Oh, se vai!
Foi essa mensagem que o fez me bloquear. Minha mãe. Ela tinha estragado tudo. O choque rapidamente deu lugar à raiva. Queria gritar, queria desaparecer. Como ela pôde fazer isso? Ela destruiu qualquer chance de eu falar com Ferdinando de novo.
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Atualizado até capítulo 35
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